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Escrevendançando faz referência a Ciane Fernandes (2000 e 2006) que cita o termo como a tradução do título do Livro de Sally Banes “Writing Dancing in the Age of Postmodernism”. Utilizei o termo para titular procedimentos metodológicos que miscigenaram a prática à teoria e vice e versa: os laboratórios práticos de improvisação dirigida realizados durante a pesquisa e o processo de “Escrita Dinâmica”.

Os laboratórios tiveram o objetivo de dialogar o percurso teórico-prático de Rudolf Laban e as etapas de minha pesquisa de mestrado, de forma que a teoria (estudos filosóficos, sociológicos, metodológicos e em dança) pudesse dialogar com a prática (da realização da pesquisa) mediada pelo movimento criativo e expressivo.

Estudando as propostas teórico-práticas de Laban, me deparei com a figura do Anel de Moebius. Ciane Fernandes explica a genealogia desta figura relacionada ao trabalho feito, concomitantemente no âmbito teórico e prático:

Na pesquisa em artes cênicas, o Anel de Moebius permite um formato científico-artístico, em que nem a teoria nem a prática se antecipam uma à outra, mas desafiam e se recriam contínua e mutantemente num processo de

escrevendançando. (FERNANDES, 2006, p. 33)

A proposta de se movimentar uma pesquisa teórica através do corpo, explorando espaços, ritmos e qualidades de movimento é, portanto coerente com as propostas do próprio Rudolf Laban. A autora continua sugerindo que “Nada funciona isoladamente, e diferentes abordagens podem ser incluídas na mesma pesquisa, gerando novas associações e descobertas”. (idem, p. 34). Este é um diálogo constante entre o estudo e a prática onde um impulsiona o desenvolvimento do outro. Ciane Fernandes (2000, p. 38) sugere que o termo Escrevendançando inclui na mesma palavra a teoria e a prática, o fazer e o pensar, que é a tanto a proposta dinâmica da estrutura contínua do Anel de Moebius quanto o arcabouço vida- obra de Laban. A autora exemplifica que conjuntamente a sua pesquisa se debruçando sobre as obras de Pina Bausch (FERNANDES, New York University, 1995), ela desenvolveu sua própria peça de dança a fim de dialogar a pesquisa e prática da Arte do Movimento.

Minha prática laboratorial foi realizada no segundo semestre de 2008 se revelando um procedimento coerente com o Lemniscate vida-obra de Laban. Tive a oportunidade de vivenciar os processos teóricos que estavam sendo explorados através do movimento, realizando conexões interno-externas. A Escrita Dinâmica complementou o procedimento de movimentar os processos intelectuais que aconteceram nos momentos dissertativos.

Outros pesquisadores que se dedicam ao estudo do Sistema Laban revelam o uso desta forma tridimensional como analogia para se referir às organizações presentes no corpo humano. Peggy Hackney (1998, p.34) utiliza a representação gráfica do Anel de Moebius para ilustrar as conexões inter e intra corporais de forma que o movimento aconteça dinamicamente co-relacionando os meios internos com os externos. A pesquisadora aprofunda

no processo da Conectividade presente nos Fundamentos propostos por Irmgard Bartenieff “A meta dos Fundamentos Bartenieff é facilitar a interação viva entre a Conectividade interna e a Expressividade externa para enriquecimento da vida” (HACKNEY, 1998, p, 214).

A mesma relação pode ser entendida na substituição das teorias que eu estava estudando pelos processos mentais que acontecem internamente no corpo e, concomitantemente, a reposição da prática pelas ações e movimentações expressivas, permitindo assim um relacionamento de livre trânsito transversal entre as instâncias mentais e corporais. Regina Miranda utiliza também a figura do Anel de Moebius para fundamentar sua pesquisa referente às analogias entre corpo e espaço em uma investigação topológica das possibilidades da interação entre os dois. Ela compreende a fita de Moebius como:

Um percurso estimulante para a retomada de conceitos originalmente entendidos como oposições duais, reapresentando-os como modulações que se organizam em um continuum gradual, sem constituir oposição (MIRANDA, 2008, p. 58-59).

Para a autora, contrapondo o fato de que “durante muitos anos parecia importante a busca de definições e certezas, com seu conseqüente discurso de verdades fundamentadas em oposições excludentes” (MIRANDA, 2008, p. 59) os deslizamentos moebianos indicam caminhos de interpretações variadas e não excludentes em atitudes de recriação e reinterpretações de circunstâncias. Assim também atuaram as práticas laboratoriais de exploração dinâmica, fazendo com que os percursos teóricos fossem retroalimentados pelas vivências exploratórias dançantes, resultando na concretização prática da forma Lemniscate: novas possibilidades de perguntas para as respostas encontradas, como também soluções originais para as indagações matriciais da pesquisa.

A partir desta fundamentação e tendo aberto as portas para a exploração prática das investigações teóricas vigentes, foram feitas sessões de improvisação dirigida investigando através do movimento uma série de temas relacionados aos estudos teóricos e questionamentos que estavam sendo feitos durante a manufatura da pesquisa.

4.1. Os Laboratórios

Os Laboratórios integraram a metodologia desta pesquisa de forma a ter resolvido e reformatado questionamentos vigentes no processo teórico. A prática introduzida em explorações temáticas se conformou em um viés metodológico que cruzou e costurou o

andamento da pesquisa. As improvisações se consolidaram como a forma de sintetizar a teoria através do corpo. A aplicação da filosofia de Rudolf Laban em uma pesquisa baseada no próprio indivíduo foi a confirmação de que para se mergulhar em seu Universo, é preciso praticá-lo. O próprio mestre acreditava que a dança é o espaço em que movimento e pensamento encontram espaço para dialogarem e se expressarem:

As descrições verbais do pensamento-movimento encontraram sua possibilidade de expressão apenas na simbologia poética. A poesia, descrevendo os acontecimentos de deuses e ancestrais, foi substituída pela simples expressão do esforço, na dança. (LABAN, 1978, p.46)

Os encontros aconteceram junto à disciplina eletiva oferecida ao Curso de Doutorado do PPGAC “Laboratório de Performance”, cuja responsável durante o segundo semestre de 2008 foi a Prof. Dra. Ciane Fernandes. Todas as terças-feiras das 10h às 13h em sala da Escola de Dança da UFBA os inscritos na disciplina tinham o espaço livre para discussão e realização seus laboratórios junto ao seu registro videográfico. Todas as experimentações realizadas aconteceram sem o suporte sonoro musical.

Uma pesquisa em dança é movimento, mesmo em pensamento. Os laboratórios de exploração dinâmica de conteúdos selecionados da pesquisa tiveram o objetivo de movimentar através do meio corporal o movimento elétrico processado no sistema nervoso: realizar a transposição da linguagem da palavra para a linguagem das variações físicas dinâmicas buscando a conexão sináptica entre o dizível e o indizível. Poderia dizer que este foi o momento de retorno ao pensamento em dança, pois para se entender o movimento é preciso movimentar-se.

Os laboratórios foram todos registrados em vídeo para documentação e posterior análise do material de movimento produzido. O relato feito aqui de cada experimento depende da intensidade com que ele foi realizado. Alguns foram mais profundos que outros, explorando processos diversos. Porém o tamanho do passo dado acontecia conforme a necessidade do questionamento vigente na experiência.

4.1.1. Experiência Primeira: Qual meu papel na pesquisa?

A temática norteadora foi a colocação do pesquisador dentro da pesquisa através da pergunta “qual o meu papel na pesquisa?” A proposta desta primeira experimentação prática se concretizou com a exploração acontecendo em um quadrado de um metro de aresta. Ao

longo dos quarenta minutos de improvisação foram se concretizando padrões de qualidades expressivas, como também a repetição destes padrões e de formas.

A movimentação tinha uma qualidade que se assemelhava com a dinâmica observada em sinapses nervosas cerebrais, porém neste caso chamei de sinapses corporais. Seria uma transposição direta qualitativa do movimento interno para o externo. Movimentaram-se respostas, sem a preocupação com as perguntas. Senti como se fossem as conexões iniciais entre o corpo e seus movimentos internos e a atenção em mover-se de acordo com o que acontecia na fronteira do interno para o externo do corpo.

O Espaço32 delimitado surgiu como necessidade expressiva do corpo, e o como lidar dinamicamente com a situação restrita. Fazendo uma analogia com a atual pesquisa, era como se fosse uma reação à limitação do campo de estudos e a minha dúvida em como se mover dentro desta limitação, à procura de percursos e trajetos.

Através da palavra resumi o conteúdo dinâmico no seguinte parágrafo:

Um metro quadrado. Cabeça, cabeça cabeça... escuta o chão. Deslizamento vertical para cima. Atenção na ponta dos dedos. Tempo. Limite do espaço e cabelo. Tempo. Entrega do corpo ao ar, entrega ao espaço. Náuseas – repulsão e recolhimento. O cabelo, a cabeça, entrega do corpo ao ar. Limite do espaço. Posso e não posso. Até onde posso? Olhar e ver o ‘mundo’ o espaço ao redor, ouvir de outro canal. Olhar e ouvir com a pele. Cabeça, cabeça, cabeça. Posso? Não posso. Posso. Entrega do corpo ao ar... até onde posso?33

A reflexão gerada após a experimentação possibilitou um entendimento sobre os processos teóricos que estavam desenrolando no momento. Com a visualização do material de registro tive a chance de observar o comportamento corporal gerado como também uma chance de observar as resoluções que o corpo encontrou através do movimento e que resultaram em um esclarecimento dos caminhos teóricos da pesquisa. O caos sináptico e a delimitação de espaço trouxeram sensações de náuseas e mal estar corporal. A oposição entre a entrega ao ar, o momento de permitir a entrada do alimento aéreo e as dinâmicas “nervosas” de balançar e chicotear com a cabeça refletiram a minha própria instabilidade e confusão com relação aos caminhos e percursos disponíveis.

      

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O uso da palavra Espaço com “E” maiúsculo está relacionado a categoria Espaço do Sistema Laban. Ela se distingue da palavra espaço com “e” minúsculo, que se refere ao posicionamento e movimento do corpo quando em relação ao seu volume circundante.

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4.1.2. Experiência Segunda: O percurso de pesquisa – direções possíveis

O tema desta exploração foi: O percurso que estava fazendo com a pesquisa, opções, soluções, procuras e achados. Mais especificamente pensei em explorar a multiplicidade de focos da pesquisa; direções e direções contrárias. A possibilidade de mudança e como mudar; a procura de caminhos para mudar. O escapar, deixar escapar, escorregar, reter. O estudo destas qualidades teóricas na prática corporal abriram a possibilidade de uma compreensão paralela, e inclusive a descobertas de possibilidades e condutas de pesquisa.

A multiplicidade de focos provinha da multiplicidade de possibilidades teróricas detectadas: após ter coletado os dados das entrevistas da maioria dos indivíduos e tendo recolhido novas informações que começaram a modificar o projeto inicial da pesquisa, estavam se apontando novas formas de tratamento dos dados e conseqüentemente novos caminhos possíveis.

A possibilidade de mudança é talvez a situação mais difícil de se lidar. O medo, a insegurança e a dúvida foram sentimentos que estavam povoando meu corpo e conseqüentemente meus movimentos. Ainda havia dúvidas sobre a estabilidade das possibilidades em nascimento.

O escapar e o reter me trouxeram a reflexão sobre a necessidade de permitir um fluxo livre de informações e saber reter o necessário e dispensar o desnecessário. Assim, explorei os movimentos corporais que lidam com a permissão do fluxo de dinâmicas, imagens e possibilidade criativas.

O laboratório iniciou com uma caminhada para um reconhecimento Corpo-Espacial do lugar. Em seguida o “anti-movimento” começou a ser explorado, gerado por um estado de múltiplos focos simultâneos (qualidade de espaço direto multiplicada). O percurso começou a se desconstruir no sentido contrário ao que cronologicamente estamos acostumados a percorrer. O resultado foi o início de um recolhimento que aconteceu através da multiplicação ainda maior da quantidade de focos-objetivos despertados. Portanto, o ímpeto de expansão, quanto maior, mais gerava o recolhimento.

Esta primeira etapa do laboratório me possibilitou uma posterior reflexão sobre o fazer teórico. A fisicalidade do movimento demonstrou que o intuito de expansão, neste caso

multiplicado e multidirecional resulta em um recolhimento-retrocesso prático. Será que não era exatamente esta dinâmica que estava acontecendo na pesquisa?

Continuando a exploração laboratorial, escolhi por realizar uma libertação através da expansão súbita, quebrando a barreira da imobilidade multifocal. Optei por não me permitir mais o recolhimento e manter a expansão máxima constante. Na exaustão da expansão o corpo se “revoltou” repentinamente e iniciou um recolhimento de qualidade indireta e retorcida que chegou ao máximo do recolhimento e da torção multidimensional. Este estado levou a uma fuga quase que desgovernada dos membros que se atiravam direta e subitamente conquistando o Espaço até atingir um jogo entre a fuga dos membros do centro corporal e a busca do limite máximo externo.

Esta experiência terminou num caminhar, que mostrou como o corpo havia sido modificado com o trajeto exploratório. O ponto de partida já não era mais o mesmo ponto de partida do início. Algo se transformou e que impossibilitou o retorno ao ponto inicial. O passo progressivo foi dado.

4.1.3. Experiência terceira: O caminho ou o objetivo?

Este laboratório contou com uma trilha sonora interna que soou em meu corpo durante toda a experimentação: “Sonata ao Luar” de Beethoven. O tema se condensou na exploração das conexões interno-externo e o fluxo de via dupla entre elas.

A cautela, a calma, a atenção e as conexões interno-externas agindo minuciosamente na sucessão de movimentos. O movimento se iniciava em um ponto e era transmitido sucessivamente atravessando até terminar em alguma das extremidades. O corpo rastejante como uma minhoca que calmamente se locomove e se projeta sem ansiedades, obedecendo sua velocidade própria porém com a sustentação contínua do tempo e do fluxo, permitindo pequenas variações das outras qualidades. Assim fui me projetando pelo espaço e explorando possibilidades disponíveis nas sucessões e transmissão de movimento. Em certo instante comecei automaticamente a desvendar novas organizações corporais mandtendo o mesmo objetivo de projeção espacial.

A escrita do interior – retira – coração. O coração que se empurra para dentro. Fora. O coração que impulsiona. Dentro. Fora. Relaxa. A mão que acaricia o chão . Tira. Sai pulso, levanta peito do pé. Tira. Coloca. Impulsos.

Coração, acaricia o chão. Pulsa o corpo, pulsa em toques. Sentar. Rastejar sentada... ondas e ondas34

Um segundo momento iniciou após uma pausa do movimento e um voltar-se para dentro de mim: “deixar ser”. Levantei e comecei a caminhar desenvolvendo uma espécie de dança das pernas, levando o corpo em objetivos espaciais diretos e unidirecionais, até a mudança para um outro objetivo. Um ato simples de caminhadas direcionais com mudanças precisas de objetivo demonstrou-se mais difícil do que parecia. Posteriormente detectei que a dificuldade estava justamente em um problema que é recorrente em mim (inclusive no trabalho teórico): a indefinição, dúvida e confusão de onde, quando e como se direcionar e perseguir um objetivo. Esta fala já demonstra que o problema não está na chegada, mas no percurso a ser escolhido para realizar a empreitada rumo ao desfecho.

A prática me conduziu a compreender que era preciso ter atenção minuciosa tanto na sucessão de ações e etapas da pesquisa, como também nos percursos escolhidos para se percorrer. Não adianta somente escolher um objetivo se o caminho para ele é/está inseguro.

4.1.4. Experiência quarta: Atenção sobre o percurso

Este momento teve a temática voltada para minhas relações comigo mesma. Uma análise sobre a minha postura perante a pesquisa e a exploração das reações corporais em vista as atitudes teóricas sendo feitas. Em resposta ao laboratório anterior, o foco foi nos percursos e não nos objetivos, a procura de analisar o como percorrer e as possibilidades infinitas do corpo sobre o percurso disponível.

Inicialmente aconteceu um reconhecimento do Espaço e do corpo apoiado neste Espaço tridimensional. O que significa o corpo estar presente em um Espaço? Como ele se comporta perante a densidade do ar, o limite do chão? Comecei a fazer movimentos e voltar e refazer. Uma ação de aprendizagem junto com um produto de dúvida. Refazer um movimento para observar seu percurso e as qualidades acionadas. Mas cada repetição nunca é idêntica a anterior e assim foram aparecendo novas características que compunham a ação, a cada repetição. Percebi que existia a dúvida de checar se o movimento era aquele mesmo. A atenção sobre o percurso poderia trazer alguma resposta? Seria o caminho que fosse percorrido de forma clara, precisa e expressiva a maneira de se atingir o objetivo desejado?       

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Este processo se expandiu para a repetição de frases inteiras de movimento, onde ficaram claras as etapas necessárias para realizar a frase, retroceder ao início e fazê-la novamente, diversas vezes. Fui notando que a possibilidade de modificar o movimento através da alteração uma de suas qualidades, resultava em uma modificação do movimento como um todo. Percebi também que estava explorando e me permitindo visualizar meu próprio movimento no momento em que o estava realizando.

Em determinado momento percebi que facilmente minha movimentação assumia uma qualidade de fluxo contido com espasmos e contrações súbitas. Quando percebia que estava entrando neste padrão eu mudava para uma qualidade oposta que deixava minha movimentação suave e livre.

Com este laboratório compreendi que estava fazendo uma análise sobre minha própria atitude perante a pesquisa, pois pesquisei o meu movimento e minhas escolhas compreendendo que pequenas mudanças geram percursos que se diferem, mesmo quando em menor escala. O foco sobre o percurso é tão importante quanto o foco sobre o objetivo, em outras palavras a atenção sobre a metodologia é tão significativa quanto o direcionamento sobre o objetivo da pesquisa. O como percorrer o caminho gera descobertas e reflexão sobre o próprio ato de realizar o movimento, tanto teórico quanto prático.

4.1.5. Experiência quinta: Pergunta - Resposta

A partir de uma inquietação provinda da pesquisa teórica tematizei este encontro para a exploração das qualidades de movimentos produzidas nas atitudes corporais de: pergunta- resposta e inquietação-descoberta. A experimentação foi direcionada para possibilitar uma vivencia corporal que pudesse esclarecer os movimentos teóricos da pesquisa. Novamente busquei a materialização do questionamento interno em movimento do corpo, ou seja, mais uma vez realizar a conexão mobebiana da conectividade interno-externas. Ao final do laboratório, ao escrever o relatório da prática percebi que havia explorado somente o conjunto pergunta-resposta.

Tive uma impressão de que a pele, minha fronteira corporal, mantinha o limite do movimento intenso molecular interno e que a expressão deste corpo, no olhar exterior era uma pausa estática. Me perguntava o que seria a materialização deste movimento interno de

múltiplas qualidades dinâmicas em expressividade externa. Neste dia de experimentação encontrei uma resposta a este questionamento: dança.

A experimentação começou com uma movimentação pessoal que chamei de “abrir as portas” do interior. Esta abertura trouxe a tona jogos de oposição de movimento: o primeiro onde o olhar (foco visual) determinava o destino do movimento; o segundo onde o corpo agia contra o domínio do foco (olhar). Quando o foco precede o movimento (envolvendo grandes ou pequenos deslocamentos) ele acontece desenvolvendo uma qualidade específica direta e objetiva de iniciação (através do olho e cabeça), desenvolvimento (em sentido à locomoção para o ponto de destino) e desenho (com tendência a linearidade).

Quando o movimento inicia no corpo e se direciona à um destino, antes do foco visual direcioná-lo ele se desenvolve de forma mais indireta e realiza desenhos mais curvilíneos. As diferentes iniciações do movimento desenvolvem dois tipos diferentes de ação, que resultam em expressividades distintas. Mantive esta exploração dicotômica até que o movimento se tornasse independente do pensamento, ou seja, que ele não precisasse passar pelo raciocínio para acontecer. Este procedimento deixou a investigação (dos dois tipos de iniciação explorados) com qualidade mais fluida.

Ao perceber a modificação de fluxo, me permiti explorar com mais atenção esta qualidade como principal determinante dos processos que estavam acontecendo (percursos, buscas e conquistas espaciais).

A análise do registro videográfico me permitiu perceber a presença da pergunta e a da resposta em forma de movimento. A expressão corporal da pergunta provinha do percurso que se inicia através do foco visual, isto é, o percurso inicialmente é desconhecido e o foco visual anuncia o lugar onde se vai chegar (o que ser quer saber). A resposta já é o movimento que revela o percurso, independente do foco visual, ou seja o percurso é o principal movimento, já conhecido e materializado (como acontece no caso de u ma resposta).

4.1.6. Experiência sexta: Inquietação - Descoberta

Propus neste laboratório investigar a conectividade interno-externa dos movimentos intelectuais opostos de inquietação-descoberta, já que este tema havia ficado pendente na