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2. A INSTITUIÇÃO

2.4. INSTITUCIONALIZAÇÃO

2.4.3. Espaços escolares

A escola tende a buscar uniformidade dos seus membros, tanto através da uniformidade do conhecimento – por intermédio do currículo, da determinação das disciplinas a serem estudadas, da escolha dos conteúdos pretensamente em ordem de complexidade – como do comportamento e do espaço– organização de filas, salas de aula, disposição das carteiras, disciplina no pátio. O “espaço objetivo”, no entanto, não faz sentido sem as relações que são constituídas dentro dele, nessa perspectiva, afirma Frago,

Em certo sentido, o espaço objetivo – para denominá-lo de alguma maneira – não existe. E se existe, não conta – salvo como possibilidade e como limite. O que conta é o território, uma noção subjetiva ou caso se prefira, objetivo-subjetiva – de índole individual ou grupal e de extensão variável. (FRAGO, 1998, p.63)

Para a legitimação dessa ordem, faz-se necessária a demarcação minuciosa dos espaços escolares – que também denotam hierarquia – com o intuito de manter a uniformidade do comportamento, delimitando-o a espaços preestabelecidos. Dessa forma, existem os espaços que podem ser frequentados pelos alunos, espaços dos professores, da direção, das cozinheiras, secretaria, dentre outros. O espaço, então, é sempre construído socialmente e jamais pode ser considerado como neutro, mas carrega signos, símbolos e significados, oriundo de relações sociais complexas. Ainda de acordo com Frago (1998, p.64),

O espaço comunica; mostra, a quem sabe ler, o emprego que o ser humano faz dele mesmo. Um emprego que varia em cada cultura; que é um produto cultural específico, que diz respeito não só às relações interpessoais – distâncias, território pessoal, contatos, comunicação, conflitos de poder –, mas também à liturgia e ritos sociais, à simbologia das disposições dos objetos e dos corpos – localização e posturas –, à sua hierarquia e relações.

Há, apesar dos mecanismos de controle e hierarquias criados dentro da instituição escolar, interstícios que funcionam como espaços de socialização em que os movimentos são difusos e improdutivos. Ou seja, alguns espaços são ocupados de forma que as hierarquias são apaziguadas, o diálogo ocorre de forma fluida, sem formalidades e não existe o imperativo da produtividade e da utilidade. Para Santos (2002), nesses espaços prevalece a perspectiva das horizontalidades, é o espaço do banal, da contiguidade, dos agentes implicados e da contrarracionalidade – entendida como irracionalidade pelos espaços verticais que por sua vez são espaços de racionalidade e de interesses corporativos.

Nesta perspectiva, Eizirik (2001) aponta, através de observações do contexto escolar, a falta de interesse dos alunos pelas atividades formais da escola, já que estas muitas vezes estão desprendidas da vivência cotidiana dos alunos:

Em minha observação da escola, a vida estava justamente fora da sala de aula, borbulhante, efervescente – nos recreios, nos corredores, no cafezinho, na cantina, nos cochichos; o saber estava desligado da realidade, o que contribuía sobremaneira para diminuir o interesse e a motivação para o ensinar e o aprender. (EIZIRIK, 2001, p.121)

Na escola existe a delimitação clara desses espaços, sendo que na maioria dessas instituições a sala de aula é o lugar em que o professor tem autonomia em relação à direção e a coordenação e este tem – ou supõe-se que deveria ter – controle sobre os alunos. A direção é o espaço em que os diretores transitam e demarcam sua hierarquia diante dos demais funcionários e alunos. A secretaria, lugar onde ficam os documentos e cuja jurisdição fica sob a responsabilidade das secretárias. A cozinha, lugar específico das cozinheiras que, por questões de higiene, não deve ser frequentada por outros funcionários nem pelos alunos. O pátio, por fim, lugar em que os alunos têm total liberdade para brincar, conversar, se expor, sem a vigilância de outros atores hierarquicamente superiores, esse é o espaço mais horizontalizado da escola, onde os alunos se sentem tão pertencentes quanto as demais pessoas da escola.

Na Escola Municipal Cláudio Manoel da Costa (EMCMC), no entanto, os alunos atribuem diferentes significados a estes espaços, ou por desconhecimento da função de cada

um deles ou pela flexibilidade dos mecanismos de controle encontrados em alguns ambientes. Aparece nas falas dos discentes entrevistados que a maioria não sabe qual a finalidade da Secretaria, alguns arriscam dizer que é o lugar em que os papéis são guardados, pois possui muitos armários, mas não sabem dizer qual a destinação burocrática desses papéis. A configuração arquitetônica da Sala dos Professores e da Direção permite que os estudantes transitem por estes espaços sem maiores repreensões, já que fica uma do lado da outra e existe uma porta – que fica sempre aberta – conectando as duas. Apesar de entenderem que a Sala da Direção é o lugar para onde são levados para receber sanções disciplinares, durante o intervalo é comum que alguns alunos adentrem neste espaço e há possibilidade de interagir com os professores e diretores. O pátio é o lugar onde os alunos ficam mais distantes das normas disciplinares e que, portanto, sentem-se mais à vontade para falar, brincar, se expressar. No entanto, o período que têm para desfrutar deste espaço é muito pequeno já que, na maioria do tempo que ficam na escola, eles estão nas salas de aula, sobrando apenas 15 minutos para o intervalo.

Fotos nº 08 e nº 09: O intervalo

Fonte: arquivo pessoal Kueyla Bitencourt

Não há, nesta escola, nenhum atrativo para os alunos na hora do intervalo, eles dispõem de pouco espaço e não possuem bolas ou outros brinquedos para se divertir. Comumente brincam de “pega-pega” ou de “lutinha”. Na opinião das auxiliares de disciplinas – pessoas que observam os alunos durante o intervalo – eles brigam muito, pois refletem o ambiente de violência das comunidades onde vivem. Quase todo dia algum aluno fica machucado e raramente os professores e diretores frequentam este espaço na hora do intervalo.Pérez Gomez (2001), ao fazer referência à cultura escolar e, mais especificamente, à cultura institucional, observa que a ausência de espaços informais, de convivência, distintos das salas de aula, é muito comum em instituições que oferecem cursos técnicos, em que não se propõem a exercer função socializadora e contentam-se com a transmissão do conhecimento acadêmico disciplinar. No entanto, ao tratarmos de instituições escolares que

abrangem turmas do ensino fundamental I é insofismável a presença de ambientes socializadores para as crianças.