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Após analisar os docentes expurgados que faziam parte da esquerda comunista, parte-se agora para aqueles que eram vinculados à esquerda trabalhista. Nesse sentido, um importante petebista que, logo após o Golpe de 1964, teve seus direitos políticos cassados, foi Antônio

Ajadil Ruiz de Lemos.

Tendo realizado grande parte de sua educação básica no Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA), em dezembro de 1945 Ajadil Lemos formou-se bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade Livre de Direito da UPA.343 Obtendo primeiro lugar em concursos para Juiz de Direito e Promotor Público, foi nomeado promotor em 6 de setembro de 1949, exonerando-se logo a seguir, no dia 23 do mesmo mês. Passado pouco mais de um

341 RIBEIRO, Enilda; RIOPARDENSE DE MACEDO, Francisco. Sobre a repressão na Faculdade de Arquitetura da UFRGS logo após o Golpe de 1964, sobre o expurgo de alguns arquitetos daquela escola e sobre a trajetória política e profissional de ambos [21/09/2006]. Entrevistador: Jaime Valim Mansan. Porto Alegre.

342 RIDENTI, Marcelo. O fantasma da revolução brasileira. São Paulo: Ed. UNESP, 1993.

343 MEMORIAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RS (MMP-RS). Procuradores-Gerais. Disponível em <http://cnpg.mp. rs.gov.br/memorial/exprocurador?id=23>, acesso em 23/07/2007; SILVA, Antônio de Pádua Ferreira da. Sobre seu expurgo da UFRGS e sua trajetória política e docente [25/03/2008]. Entrevistador: Jaime Valim Mansan. Porto Alegre.

ano, foi nomeado Procurador-Geral do Estado, no governo Ernesto Dornelles, cargo que ocupou de 17 de fevereiro de 1951 a 31 de janeiro de 1955. Concomitantemente, em 1951, foi Presidente do Conselho Superior do Ministério Público. De 1956 a 1958, foi Presidente do Instituto dos Advogados do Rio Grande do Sul. Entre 1962 e 1963, foi Secretário do Interior e Justiça do estado gaúcho na gestão de Leonel Brizola.344 De 1º de janeiro de 1964 até 7 de maio de 1964, data em que foram cassados seus direitos políticos, exerceu a Vice-Prefeitura de Porto Alegre, junto ao petebista Sereno Chaise.345 Poucos dias depois, seria afastado também do Conselho Federal de Educação (CFE).346 Também atuou como Juiz Classista do Tribunal Regional Eleitoral.347 Em 1964, Ajadil Lemos, contando então 45 anos de idade, era catedrático da Faculdade de Direito da UFRGS.348

Sua atuação em governos do PTB nos primeiros anos da década de 1960 certamente pesou em seu reconhecimento como petebista em âmbito regional e, sobremaneira, na UFRGS. Ainda que não tenha sido possível precisar seu tempo de docência na universidade, muito provavelmente era bastante reconhecido, no meio universitário, como simpatizante do trabalhismo, em função de sua notória atuação política.

Seu afastamento se deu, assim como em outros quatro casos em 1964, pela perda de direitos políticos, ocorrida, como mencionado, em 7 de maio de 1964, o que também o impedia de atuar como advogado. Em 2004, por ocasião das atividades rememorativas ao golpe de 1964 ocorridas em Porto Alegre, Chaise recordou-se da situação em que, cassados seus direitos políticos e os de Ajadil, deixaram ambos a Prefeitura: “[...] desci as escadas deste Paço Municipal acompanhado pelo vice-prefeito Ajadil de Lemos, após uma cerimônia de despedida que contou com a presença de secretários e funcionários desta Casa”.349

344

Dados biográficos de Ajadil conforme: MMP-RS. Procuradores-Gerais. Disponível em <http://cnpg.mp. rs.gov.br/memorial/exprocurador?id=23>, acesso em 23/07/2007.

345 OLIVEIRA, Paulo Affonso Martins de. Atos Institucionais: Sanções Políticas. Brasília: Centro de Documentação e Informação/Coordenação de Publicações, 2000. p. 21.

346 FERREIRA, May Guimarães. Conselho Federal de Educação: o coração da reforma. 334 f. Tese – doutorado em Educação. Faculdade de Educação, Universidade Estadual de Campinas. Campinas, 1990. p. 182.

347 MMP-RS. Op. cit.

348 ADUFRGS. Universidade e Repressão: os expurgos na UFRGS. Porto Alegre: L&PM, 1979. p. 53. 349 CHAISE, Sereno apud DEMOCRACIA: Sereno recebe homenagem no dia que marca os 40 anos do golpe

militar. Prefeitura Municipal de Porto Alegre: Comunicação Social. Disponível em <http://www. portoalegre.rs.gov.br/acessibilidade_smarty/default.php?projeto_sec=144&p_secao=3&pg=2028&p_reg=567 04>. Acesso em 23/07/2007. Na Galeria dos ex-prefeitos do portal eletrônico da Prefeitura de Porto Alegre, consta que a cassação teria ocorrido no dia 8 de maio, e não no dia 9, como mencionou Sereno Chaise na ocasião, segundo a reportagem. Na Galeria menciona-se também que Chaise teria sido preso, por um dia, logo após o golpe, retornando depois ao cargo até a cassação. Conforme: GALERIA dos ex-prefeitos. Prefeitura Municipal de Porto Alegre. Disponível em <http://www.portoalegre.rs.gov.br/infocidade/ default.php?p_secao=23>. Acesso em 05/09/2008.

3.2.1 - O Grupo da Economia

Parte-se agora para a Faculdade de Ciências Econômicas, de onde foram expurgados três docentes vinculados à esquerda trabalhista, em 1964: Armando Temperani Pereira, Cibilis da Rocha Viana e Cláudio Francisco Accurso. Ainda poderia ser considerado junto a eles o prof. Pádua, expurgado indiretamente da Escola Técnica de Comércio. Os quatro professores faziam parte do Grupo da Economia. Diferentemente do Grupo da Arquitetura, estes tinham significativo alinhamento com a esquerda trabalhista.

Como mencionado anteriormente, Armando Temperani Pereira perdera seus direitos políticos por dez anos, bem como o mandato de deputado federal, com a promulgação dos Atos 1 e 2, baseados no AI-1. Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais, formou-se pela Faculdade de Direito da UFRGS em 1935.350 Notório trabalhista gaúcho, segundo Bodea, era “um dos dirigentes do Diretório Alberto Pasqualini – núcleo dos intelectuais do partido”.351 Temperani teve grande atuação política pelo PTB entre o fim do Estado Novo e o Golpe de 1964. Vereador de Porto Alegre, depois deputado estadual e na seqüência deputado federal por dois mandatos seguidos, Temperani era amplamente reconhecido como militante e dirigente trabalhista, não só no Rio Grande do Sul mas também no centro do país, onde a grande imprensa forjou o termo “Grupo Compacto” para denominar os principais líderes da Frente Parlamentar Nacionalista, que seriam ele, Almino Afonso, Sérgio Magalhães, dentre outros.352

Na universidade, Temperani era professor desde 1938, quando começou a lecionar Economia Política na então denominada Escola de Comércio de Porto Alegre, à época anexa à Faculdade Livre de Direito da UPA.353 Desde 1946 era professor catedrático da Faculdade de Ciências Econômicas da UFRGS. Portanto, em 1964, quando tinha 54 anos, já contava com um significativo reconhecimento como líder político do PTB e também como professor, derivado inclusive de 26 anos de docência na universidade, dezoito deles na Faculdade de Ciências Econômicas. Isso é confirmado por Cláudio Accurso, que com ele conviveu e, assim como ele, também foi afastado sumariamente alguns meses depois do Golpe de 1964:

350 ADUFRGS. Universidade e Repressão: os expurgos na UFRGS. Porto Alegre: L&PM, 1979. p. 47. 351 BODEA, Miguel. Trabalhismo e populismo no Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Ed. UFRGS, 1992. p.

96.

352 BONES, Elmar. Entrevista: Temperani Pereira – “Constituinte sai com um frentão”. Coojornal, Jul/1979, pp. 25-26.

353

ESCOLA Técnica da UFRGS: De 1909 até os dias de hoje. Portal da Escola Técnica da UFRGS. Disponível em <http://www.etcom.ufrgs.br/index.php?option=com_content&view=article&id=97&Itemid= 236>. Acesso em 01/09/2008.

Jaime Valim Mansan – Desses professores que, como o senhor, foram afastados em

64, quais o senhor conhecia pessoalmente? Poderia falar um pouco deles?

Cláudio Francisco Accurso – Acho que o mais expressivo de todos era o Professor Temperani Pereira. Era a pessoa mais brilhante da faculdade. Era um autodidata. Conhecia um pouco de Marx, conhecia a Economia, já tinha escrito um manual, que nós chamávamos “o capa verde”, e também era conhecido por todo mundo como “o capa verde”,354 e tinha feito um outro texto sobre Keynes. Ele era uma pessoa brilhante. Não só porque era uma pessoa extremamente inteligente, como um orador de primeiríssima qualidade. Coisa que a gente não enxerga mais, não vê orador nenhum assim. Tinha uma cultura bonita, humanística, ampla. Sem dúvida, era a figura destacada na universidade. Ele gostava de mim e eu gostava muito dele. A gente conversava bastante sobre problemas da Economia. Homem nacionalista.355 Formado em 1956, como economista, pela Faculdade de Ciências Econômicas da UFRGS, no ano seguinte Cláudio Francisco Accurso participou do Curso de Capacitação em Problemas de Desenvolvimento Econômico, na Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL), como observador. De 1957 a 1958, cursou Especialização em “Desenvolvimento Econômico”, na Escuela de Estudios Econòmicos Latino-Americanos para Graduados, na Universidade do Chile (ESCOLATINA). Em 1959, ingressou na UFRGS como docente, atuando junto à disciplina de Teoria do Desenvolvimento e Programação Econômica.356 Quando do Golpe, faltava três meses e uma semana para completar 35 anos de idade.357

Accurso não era vinculado a nenhum partido político. No entanto, tinha uma postura nacionalista muito identificada com a de Temperani Pereira. Além disso, teve participação, juntamente com Antônio de Pádua Ferreira da Silva, em “movimentos nacionalistas” vinculados ao ISEB:

Eu não tinha muito contato com o Pádua, porque ele era da Escola Técnica, ligada à faculdade. Mas eu conheci o Pádua também fora daqui, nos movimentos nacionalistas, ele participava muito. Por isso, foi expurgado. Posteriormente, encontrei-o no Conselho Estadual de Educação/RS, ambos como conselheiros. Havia o famoso ISEB – Instituto Superior de Estudos Brasileiros –, que promovia conferências. Eu e o Pádua éramos ativistas desse trabalho.358

Accurso, diferentemente dos outros professores do Grupo da Arquitetura e de Temperani, não era um professor tão antigo na universidade, pois havia se afastado por dois anos para estudos no exterior, em seguida atuando como docente por pouco mais de cinco anos. Entretanto, mesmo que em 1964 tivesse menos tempo de docência do que os outros

354 Provável referência à publicação, de capa verde-oliva: TEMPERANI PEREIRA, Armando. Introdução à Economia Política. Porto Alegre: Livraria do Globo, 1946.

355 ACCURSO, Cláudio Francisco. Sobre seu expurgo da UFRGS e sua trajetória profissional [16/01/2006]. Entrevistador: Jaime Valim Mansan. Porto Alegre.

356

Conforme Curriculum Vitae cedido pelo prof. Cláudio Accurso para fins desta pesquisa. 357 Id. ibid.

docentes atingidos, entende-se que já reunia condições, na ocasião, para um significativo reconhecimento na universidade e, especialmente, na Faculdade de Ciências Econômicas. Disso é indício o fato de ter sido considerado, pelos alunos da citada unidade de ensino, um bom professor, como ele mesmo relatou:

Os alunos do Centro Acadêmico tinham promovido um levantamento objetivando qualificar o desempenho dos professores, no fundo era isso. [...] Ocorre que o resultado apontou o Nagipe [Buaes] como o último lugar no conceito dos alunos, último lugar entre todos os professores. Conseqüentemente, ele ficou com uma enorme raiva dos seus alunos do Centro Acadêmico, principalmente do presidente do Centro, que era o Marconi Isolan, que ainda vive. A partir de então, o Nagipe não deixou o Marconi ser aprovado, jogando-o em segunda época e não deixando que ele passasse. No ano seguinte, reprovou-o de novo. [...] E o interessante é que só era reprovado na matéria do Nagipe. E, na época da terceira tentativa, quando finalmente conseguiu ser aprovado, o Marconi trabalhava comigo em um grupo de economistas, porque, então, estávamos fazendo um plano para o governo. O Marconi era um bom economista e muito trabalhador. Naquela ocasião, eu tinha vindo de Santiago do Chile, me formado entre o pessoal da CEPAL e no curso de Pós-Graduação da Universidade do Chile. Tendo bons contatos, consegui muitas bolsas para o pessoal daqui. Eu queria formar uma equipe grande para trabalharmos com planejamento. Como o Marconi estava interessado na área de Orçamentos, enviei-o e ele foi um entre seis a fazerem o curso lá. [...] Acontece que o Nagipe ficou furioso porque eu enviei o Marconi quando ainda não tinha passado com ele! Diante da Comissão de Inquérito, a primeira pergunta que o Nagipe me fez foi como é que eu tinha mandado o Marconi fazer curso no exterior se não tinha passado na cadeira dele. Eu respondi o seguinte: “Essa sua pergunta está mal dirigida, não tem que ser feita para mim. O senhor tem que se dirigir para o Secretário-Geral das Nações Unidas e perguntar como é que ele aceita alunos, nos cursos dele, que não passaram com o senhor”. Aí foi aquela gargalhada na comissão. Um deles, não sei qual, disse para o Nagipe: “Olha, professor, o senhor tem que ter cuidado com as suas perguntas, porque senão vamos terminar brigando com a ONU”. Cabe salientar que não houve mais perguntas! No outro dia saiu meu nome, expurgado da Universidade! Então, não foi por subversão, não foi por comunismo, não foi por corrupção, não foi por nada! Puramente, ele queria mostrar que tinha força... hoje em dia eu sei que o ressentimento dele, em parte, talvez fosse por isso. Cumpre também, mais uma vez, salientar outro detalhe: eu tinha sido muito bem classificado na qualificação dos alunos, enquanto ele, ao contrário, foi o último! Provavelmente ele achava que eu estava por trás dessa história. Ocorre, porém, que os alunos é que fizeram o levantamento, toda aquela avaliação. Eu apenas estava entre os demais professores avaliados, não tendo relação nenhuma com a realização promovida por eles.359

É importante observar que divergências pessoais e ressentimentos podem ter influenciado, em maior ou menor grau, a atuação de professores da CEIS/UFRGS na perseguição a determinados indivíduos no interior da universidade. Entretanto, ainda que alguns dos expurgados apontem nesse sentido, entende-se não ser possível mais do que problematizar a questão, posto que não se teve acesso à versão da outra parte envolvida. Isso, em grande medida, porque a maioria dos participantes da CEIS/UFRGS já faleceu, como, por

359 ACCURSO, Cláudio Francisco. Sobre seu expurgo da UFRGS e sua trajetória profissional [12/01/2006]. Entrevistador: Jaime Valim Mansan. Porto Alegre. Teria sido classificado em primeiro lugar na referida avaliação docente elaborada pelos estudantes, segundo: ADUFRGS. Universidade e Repressão: os expurgos na UFRGS. Porto Alegre: L&PM, 1979. p. 36.

exemplo, Laudelino Medeiros e Nagipe Buaes; e, em parte, porque um dos que ainda estão vivos, que se conseguiu localizar (o secretário da comissão, Guy Hellen Sosa Britto, que atualmente é juiz de Direito aposentado), não aceitou conceder entrevistas ou depoimentos para os fins da pesquisa que embasa esta dissertação.

Seguindo na análise do Grupo da Economia, Cibilis da Rocha Viana foi outro docente afastado sumariamente da Faculdade de Ciências Econômicas em 1964, quando contava quase 45 anos de idade (havia feito 44 anos em agosto de 1963). Inicialmente formado no curso de contador da Escola Superior de Comércio que, à época, era anexa à Faculdade Livre de Direito da UFRGS, tornou-se depois bacharel em Ciências Econômicas pela Faculdade de Ciências Econômicas da UFRGS. Posteriormente ingressou como docente no mesmo curso, chegando ao cargo de catedrático de Contabilidade Geral, através de concurso (defesa de tese, exame de títulos e provas escrita e oral). Foi também auditor de Finanças Públicas da Secretaria da Fazenda, bem como Chefe do Gabinete de Planejamento do governo Leonel Brizola no Rio Grande do Sul, de 1959 a 1961, após o que partiu para Brasília para assessorar Jango, de 1961 a 1964.360

O próprio Cibilis Viana observou, em entrevista:

[De 45 a 64] Eu era professor e era auditor de finanças públicas da Secretaria da Fazenda. [...] Não, não tinha vínculo [com o PTB]. [Mas] Eu trabalhei com Leonel Brizola, trabalhei com ele quando ele foi governador. Ele me requisitou da universidade. Eu era funcionário do Estado, não é? [...] [Trabalhei] No gabinete de Planejamento. [...] Não tive [atuação política nesse período], [pois] eu era professor na universidade. [Mas] sempre tive um pensamento mais de esquerda. [...] Eu fui presidente da União Estadual dos Estudantes [UEE/RS]. Fiz campanha política pra entrada do Brasil na Guerra, depois pela democratização. Depois tive uma campanha política na vida estudantil. [...] E aí eu fui trabalhar com o Brizola quando ele se elegeu governador. Ele me requisitou e eu fui trabalhar com ele. Porque eu já o conhecia, ele já conhecia o meu trabalho, eu tinha obras publicadas, era professor. [...] Tinha obras publicadas, já. E fui chefiar o gabinete de Planejamento, junto ao Palácio do Governo. Depois, quando o Jango, o presidente Goulart, assumiu a Presidência da República, com a mobilização do Brizola na Cadeia da Legalidade, que impediu que os militares dessem o golpe, o Jango, quando foi pra Brasília, eu fui junto. [...] [Fui ser] Assessor da Presidência. E aí, quando veio o golpe de 64, eles me cassaram.361

Ainda que Cibilis Viana não tenha ocupado, à época, nenhum cargo de representação política, como Temperani Pereira e outros já mencionados, suas assessorias técnicas a Brizola e Jango, justamente naquelas circunstâncias de fins da década de 1950 e início dos anos 1960, provavelmente foram decisivas para seu afastamento. É claro que, a priori, cargos técnicos

360 VIANA, Cibilis da Rocha. Sobre seu expurgo da UFRGS e outros aspectos de sua trajetória [04/09/2008]. Entrevistador: Jaime Valim Mansan. Via correio eletrônico;

Id. Sobre seu expurgo da UFRGS e outros aspectos de sua trajetória [03/09/2008]. Entrevistador: Jaime

Valim Mansan. Por telefone, do Rio de Janeiro.

como os que ele exerceu não repercutiam (nem repercutem) na sociedade com a mesma amplitude que o exercício direto de um mandato, como no caso de Temperani Pereira. Portanto, a associação de sua imagem com o trabalhismo talvez não fosse tão forte quanto a que, de acordo com os indícios encontrados, Temperani Pereira possuía. Mesmo assim, e especialmente no interior do círculo de membros da faculdade onde atuava como docente, sua participação em dois governos envolvidos em várias polêmicas de forte repercussão não deve ter passado despercebida. Aliás, bastaria que o vínculo fosse notado apenas pelos docentes que constituíram a CEIS/UFRGS, considerando-se o modo de ação do grupo de “investigadores”.

Cabe ainda destacar, nesse mesmo sentido, a atuação política de Cibilis Viana quando ainda era estudante. Como estudara na mesma escola de onde foi afastado sumariamente, sua figura já devia ser ali conhecida desde os tempos de estudante, inclusive pelo fato de ter ocupado cargo de destaque na política estudantil (presidência da UEE-RS). Mais que as pautas por ele defendidas nessa trajetória de militante estudantil, importa observar que tal atuação implicava em aumento de chances de que sua pessoa se tornasse mais conhecida na comunidade acadêmica e, particularmente, dentre docentes, discentes e servidores técnico- administrativos vinculados com a Faculdade de Ciências Econômicas.

Além disso, como o próprio Cibilis Viana observou, ele já possuía algumas obras publicadas quando foi convocado por Brizola, outro elemento que contribuía para seu possível reconhecimento na universidade.

Cibilis Viana teve seus direitos políticos suspensos em 7 de maio de 1964, perdendo assim tanto o cargo de auditor de finanças públicas da Secretaria da Fazenda do Rio Grande do Sul como o cargo de professor na universidade.362 Em 29 de julho de 1964, como que para reafirmar seu expurgo como docente, foi publicado decreto afastando-o do cargo de professor catedrático da UFRGS, do qual já havia sido afastado pela perda de seus direitos políticos (o que inviabilizava a atuação do atingido em qualquer instituição pública).363

Atrás da Faculdade de Ciências Econômicas ficava a Escola Técnica de Comércio da UFRGS, em um pequeno prédio de um único pavimento, onde lecionava o professor Antônio

de Pádua Ferreira da Silva.364 Tendo estudado no CMPA e diplomado-se em 1946 como

362

OLIVEIRA, Paulo Affonso Martins de. Atos Institucionais: Sanções Políticas. Brasília: Centro de Documentação e Informação/Coordenação de Publicações, 2000. p. 77.

363 Ibid. 364

Diferentemente do que indica a nota biográfica do prof. Pádua (apresentada em: ADUFRGS. Universidade e Repressão: os expurgos na UFRGS. Porto Alegre: L&PM, 1979. pp. 46-47), ele nunca chegou a lecionar na Faculdade de Ciências Econômicas, ao menos não diretamente, em seus cursos superiores. Conforme:

licenciado e bacharel em Matemática e Física pela Faculdade de Filosofia da URGS (quando ingressou ainda era UPA), antes de se formar já estava casado, tinha um filho e era fiscal concursado do Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Industriários (IAPI) no Rio Grande do Sul, o que o levou a recusar um convite para lecionar na Faculdade de Filosofia, no curso de Matemática, logo após se formar, em função do salário de fiscal ser bem maior.365