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Capítulo I – Teoria social da política internacional: Wendt

1.5. O estado como pessoa

Ao discorrer sobre a personalidade do estado, Wendt inicia a aplicação do construtivismo social à política internacional. Sua justificativa para o foco no estado (agente) e no sistema de estados (estrutura) já foi abordada. Cumpre agora mostrar que o estado não constitui artifício contrafático, mas um ator unitário dotado de

realidade: “[...] states are also purposive actors with a sense of Self – ‘states are people too’.” (WENDT: 1999, 194).

Para Wendt, é possível sustentar uma visão antropomorfizada do estado, assim como atribuir-lhe algumas qualidades, e.g., crenças, desejos e intencionalidade. Uma vez que fique clara a existência do estado como ator, Wendt procura identificar como a relação entre identidades e interesses fornece a base para uma definição de interesse nacional que permite evitar postulados realistas recorrentes sobre o tema.

O ponto de partida consiste em reconhecer a precedência ontológica do estado sobre o sistema de estados: assim como o corpo humano é pré-social, o estado também o é. Ambos são constituídos por estruturas internas auto-organizáveis, seja biológica, seja social (WENDT: 1999, 198). Ocorre que, muito embora se adote aqui uma visão essencialista, Wendt procura minimizá-la o quanto possível, a fim de poder compatibilizar a proposta em questão com o construtivismo social por ele advogado: “[...] many of the qualities often thought to be inherent to states, like power-seeking and egoism, are actually contingent, constructed by the international system.” (WENDT: 1999, 198).

Com efeito, Wendt busca definir o que seria um “estado essencial”, isto é, apontar as características necessárias para que se possa afirmar a existência de um estado, passível de ser identificado como ator unitário. Consequentemente, o autor faz referência a três teorias do estado recorrentes no campo da ciência política: weberiana, pluralista e marxista. A contribuição da primeira para o conceito de estado defendido por Wendt concentra-se em seu tratamento como um agente organizacional, ontologicamente independente da sociedade. A segunda, por sua vez, traz à tona a importância da relação entre política interna e política externa. Finalmente, a terceira enfatiza o papel da estrutura de autoridade política que vincula o ator estatal e a sociedade, por meio de uma relação de mútua constituição.

Demonstrando maior influência de Weber, mas sem ignorar as abordagens pluralista e marxista, Wendt define o estado nos seguintes termos: “[...] an organizational actor that is internally related to the society it governs by a structure of political authority, which in effect rolls all three views up into one.” (WENDT,

1999, 201). Como seu objetivo não consiste em analisar formas históricas dos estados, mas sim em prover uma base para o desenvolvimento de uma teoria sistêmica, Wendt pretende somente indicar os elementos de um estado essencial, isto é, aqueles fatores que seriam perceptíveis em qualquer estado, independentemente da época em questão.

Existiriam, portanto, cinco propriedades essenciais para a existência de um estado37: (i) ordenamento institucional-legal; (ii) monopólio do uso legítimo da violência; (iii) soberania; (iv) sociedade; (v) território. Enquanto (i) diz respeito à teoria marxista do estado, (ii) e (iii) possuem filiação weberiana – sendo as mais relevantes para a defesa do estado enquanto ator –, e (iv) está associada à teoria pluralista. O item (v) seria um ponto de convergência entre as três teorias (WENDT, 1999, 202).

Não basta, contudo, abordar o estado como ator. A fim de evitar críticas antirrealistas, é preciso reforçar o status emergente do estado, sob o prisma ontológico. Com este fim, Wendt recorre à noção de agência corporativa, a qual viabilizaria um aporte antropomórfico do ente estatal.

Nesse sentido, o principal problema reside no fato de agentes corporativos serem inobserváveis: “[...] we never actually see the state. What we see is at most

government, the aggregate of concrete individuals who instantiate a state at a given

moment. State action depends on the actions of those individuals, since social structures only exist in virtue of the practices which instantiate them.” (WENDT: 1999, 216). De forma mais precisa, o desafio consiste em sustentar que a ação estatal não é mero fruto do somatório de ações governamentais individuais.

A aplicação da filosofia nominalista na política internacional é responsável pela hipótese do estado como ficção útil. O questionamento de Wendt sobre esse assunto consiste simplesmente em perquirir como algo que aparentemente

37Fica, contudo, a ressalva do autor: “[...] the fact that states must have certain properties does not

necessarily mean that these can be precisely specified, since social and even natural kinds have borderline cases. It might be useful, therefore, to think of the state as a fuzzy set, no element of which is essential but which tend to cohere in homeostatic clusters. The state does not seem particularly ‘fuzzy’ as social kinds go, but it too has borderline cases, which indicate that our emphasis should be on the cluster of properties, not individual ones.” (WENDT, 1999, 202). Sobre a descrição de cada uma das propriedades, cf. WENDT, 1999, 202-214.

constituiria um artifício contrafático, de caráter instrumental, termina por se mostrar praticamente indispensável (WENDT: 1999, 216).

Como contraproposta, argumenta o autor que o estado diz respeito a uma estrutura real e inobservável, porém plenamente capaz de gerar padrões de efeitos passíveis de apreensão empírica38. Mais uma vez, volta-se ao realismo científico, na medida em que a defesa do estado como uma estrutura dotada de intencionalidade não é outra coisa que a aplicação da inferência à melhor explicação.

De maneira a explicar como a estrutura dos estados confronta a hipótese nominalista, Wendt recorre a dois argumentos já conhecidos. O primeiro consiste em, a partir da análise do nível macro da estrutura estatal, postular sua existência a despeito de eventuais mudanças de crenças de determinados indivíduos.

Dito de outro modo, trata-se da forma como o conhecimento coletivo promove a socialização dos indivíduos, os quais, por sua vez, terminam por reproduzir a mesma estrutura através de suas ações: “Individuals are the ‘leading edge’ of state action, so to speak, but insofar as macro-level regularities are multiply realized by their behavior, we have a situation in which state action cannot be reduced to action by governments.” (WENDT: 1999, 217).

O segundo decorre do fato de que as ações dos governos não possuem significado aparte das respectivas estruturas que as constituem como dotadas de sentido. Logo, Wendt apenas está a aplicar, mediante estes argumentos, as linhas mestras de suas proposições discutidas no subitem anterior.

Até o momento, Wendt procurou demonstrar a realidade dos estados e sua irredutibilidade a unidades de análise que o compõem (indivíduos). Contudo, para que o círculo se complete, faltaria a intencionalidade, sem a qual não se poderia falar no estado como pessoa39. A fim de que isso seja possível, é preciso ao estado dar mostra de três atributos específicos: (i) agência corporativa, fundada na noção de

38 “If John refuses to pay taxes on the grounds that the US state is merely a fiction, then he is likely to

experience consequences just as real as he does when he stubs his toe in a table.” (WENDT: 1999, 216)

conhecimento coletivo; estrutura decisória que (ii) institucionaliza40 e (iii) autoriza41 a ação coletiva (WENDT: 1999, 218).

Antes de aprofundar o tema da antropomorfização estatal, por meio da análise das respectivas identidades e interesses, cumpre descrever alguns comentários adicionais sobre o estado como pessoa, desenvolvidos pelo autor em texto mais recente (WENDT: 2004). O escrito em questão tem como objetivo extrapolar o referido argumento, a fim de verificar a possibilidade de o estado, além de um ator

corporativo intencional, possuir outras qualidades comumente associadas à

personalidade, quais sejam: a qualidade de organismos, entendidos enquanto formas de vida, e a existência de consciência coletiva, entendida enquanto experiência subjetiva estatal (WENDT: 2004, 291).

Inicialmente, aponta o autor para a existência de três tipos de personalidade: “Phsychological persons possess certain mental or cognitive atributtes; legal persons have rights and obligations in a community of law; and moral persons are accountable for actions under a moral code.” (WENDT: 2004, 294). Relacionada a esta classificação, estaria a tipologia sobre a forma de constituição, que pode ser:

interna (estruturas e processos internos basicamente cognitivos e biológicos) e

externa (reconhecimento social de um indivíduo como pessoa).

Feito o esclarecimento, Wendt destaca sua escolha no sentido de tratar o estado como pessoa do ponto de vista psicológico – por tal abordagem ser a mais recorrente na literatura de RI – com ênfase nos aspectos constitutivos internos – por representarem um hard case para o aporte científico-realista (WENDT: 2004, 293- 295).

Não é preciso expor minuciosamente a argumentação de Wendt a este respeito. O artigo em questão é relevante, entretanto, por dois motivos. Primeiro, pela sua conclusão sobre a personalidade estatal. Muito embora a definição de indivíduo enquanto pessoa de Wendt envolva a tríade organismo biológico, consciência e

intencionalidade, no caso do estado, sua definição enquanto pessoa poderia dar-se

40 “To say that collective action is institutionalized is to say that individuals take it for granted that

they will cooperate. The expectation of cooperation is sufficiently deep that their collective action problem is solved.” (WENDT: 1999, 219).

41 Autorização nada mais significa que a possibilidade das ações individuais serem constituídas como

apenas nos seguintes termos: um superorganismo42 (mas não um organismo), desprovido de consciência coletiva (entendida como first-person experience, ou simplesmente subjetividade), porém dotado de intencionalidade.

Além disso, em STIP o autor chega a falar em emergência (WENDT: 1999, 221) para caracterizar as relações entre o estado e seus componentes (ainda que sem aprofundar o conceito)43, enquanto que, em The state as a person Wendt se contenta com a superveniência, a seu ver suficiente para sustentar o argumento a favor da realidade estatal. É verdade que tudo isto pode parecer, de certa maneira, mais distante que o desejável da realidade internacional. Todavia, a intenção de Wendt com o recente artigo foi justamente levar o realismo subjacente à personalidade estatal às últimas consequências, para em seguida considerar a melhor alternativa cientificamente viável: “[...] before we accept only a limited realism about state persons, we should at least consider what a more robust one might look like.” (WENDT: 2004, 292). Posto em uma frase, limites e possibilidades do estado como pessoa.

O segundo ponto que torna o escrito digno de menção, consiste no fato de apontar tendências rumo à guinada quântica. Na verdade, o próprio texto Social

theory as a Cartesian science, ainda um “paper” na época, é citado pelo autor (WENDT: 2004, 314 nota de rodapé n. 120). Interessam, contudo, referências feitas,

en passant, a dois temas centrais a serem tratados por W2: o problema mente/corpo e

o ressurgimento do pampsiquismo na filosofia da mente contemporânea, ambos tendo como pano de fundo o que Chalmers denominou como sendo “the hard

problem of consciousness” (CHALMERS: 1996, xii)44.

42 “A superorganism is a collection of single creatures that together possess the functional

organization implicit in the formal definition of organism [composta pelos elementos individualidade,

organização, homeostase, autonomia e reprodução genética].” (WENDT: 2004, 309). Colônias de abelhas e formigas seriam, por exemplo, superorganismos. No entendimento de Wendt, superorganismos são diferentes dos organismos tal como os estados o são dos indivíduos: “[...] they are made up of individuals who do not immediately die if the collective is destroyed, and they do not engage in genetic reproduction.” (WENDT: 2004, 310). Cumpre apenas notar que, a partir de W2, a vida de um organismo é descrita a partir das seguintes propriedades: individualidade, organização,

autopoieis, autonomia, capacidade de reprodução e subjetividade (WENDT: 2011, 59 e 69).

43 Se em STIP o tema da emergência não é pormenorizado, em The state as a person Wendt reconhece

a dificuldade de sua definição, tendo em conta que o conceito se sobrepõe em diversos aspectos ao de superveniência. De qualquer modo, para os fins de política internacional, a diferença entre superveniência e emergência estaria no maior grau de autonomia que esta é capaz de conferir ao estado quando comparada com aquela.

Feito o excurso, voltemos ao tema das identidades e interesses do ator estatal. Filosoficamente, a identidade seria tudo aquilo que torna uma coisa o que ela é. Wendt prefere, no entanto, restringir o conceito, de modo a considerar a identidade como uma propriedade de atores providos de intencionalidade, responsável pela produção de predisposições comportamentais e motivacionais (WENDT: 1999, 224). Com isso, a identidade seria uma qualidade subjetiva, fundada na percepção que o ator tem de si mesmo. Ao mesmo tempo, dependeria do modo pelo qual esse ator é representado pelos demais, denotando, portanto, um caráter intersubjetivo: “John may think he is a professor, but if that belief is not shared by his students then his identity will not work in their interaction.” (WENDT: 1999, 224). Logo, a identidade é constituída por estruturas internas e externas, composta por ideias tanto do ego quanto do alter45.

Tendo em conta a pluralidade de identidades que decorreriam dessa relação interno-externo, Wendt propõe uma tipologia quadripartite. A primeira delas é a

identidade pessoal ou corporativa (no caso de organizações), responsável pela

distinção entre determinado ator e os demais entes. Aqui, o ego é exógeno em relação ao alter, do ponto de vista de sua constituição.

A segunda, a identidade tipo, decorre de características compartilhadas por pessoas, tais como valores, opiniões, linguagem ou mesmo pontos historicamente em comum, como o lugar de nascimento, desde que possuidoras de um significado ou de um conteúdo social (WENDT: 1999, 225). Muito embora possua uma dimensão cultural, ainda se trata de qualidades intrínsecas aos atores, tal como no primeiro caso. Contudo, se na identidade pessoal o ator é capaz de possuir tão somente uma dentre as eventuais possibilidades, no caso da identidade tipo, é lícita a acumulação de várias identidades ao mesmo tempo. Formas de governo e regimes políticos seriam exemplos desta modalidade no âmbito estatal.

O terceiro tipo, identidade-papel (role identity), leva a um outro patamar a função exercida pela cultura e sua respectiva noção de alteridade: “Whereas the characteristics that give rise to type identities are pre-social, role identities are not

45 Por razões estilísticas, os binômios self/other e ego/alter serão utilizados como equivalentes, assim

como Wendt o faz (WENDT: 1999, 359), ainda que utilize o primeiro par com maior frequência. Essa ressalva é importante para evitar interpretações errôneas, tendo em conta que o termo ego não raro é usado como sinônimo do “eu”, da individualidade per se, e.g., MEAD: 1967, 203, dentre outros.

based on intrinsic properties and as such exist only in relation to Others.” (WENDT: 1999, 227). A identidade-papel não pode ser exercida por um ator, per se, na medida em que depende do compartilhamento de expectativas entre ego e alter, cuja definição de papéis seguirá o grau de interdependência e de “intimidade” entre os mesmos (WENDT: 1999, 227 e 228).

A soberania, por exemplo, pode ser vista inicialmente como uma identidade corporativa. Ao mesmo tempo, ela pode ser vista também como uma identidade- papel, uma vez que o conceito pressupõe o reconhecimento do referido status pelos demais estados, embasado em normas comportamentais e direitos substanciais (WENDT: 1999, 228)46.

O último tipo seria a culminação lógica da relação self/other, por meio de sua identificação. Neste caso, teríamos a identidade coletiva, na qual ocorre não somente a combinação das modalidades anteriores de identidade, como também sua transcendência. Aqui, o assunto vai além da interdependência, tornando a distinção

self/other no mínimo confusa e, em casos excepcionais, inexistente.

Logo, a identidade coletiva promove a identificação do ego com o alter, tendo em conta que um passa a se ver no outro, porém nunca de forma absoluta. Semelhante postura tende a gerar certa forma de altruísmo, pois o bem-estar alheio passa a ser visto como indissociável do bem-estar próprio. Ainda que os atores sejam racionais, seus interesses serão calculados, neste caso, com base nos interesses do grupo (WENDT: 1999, 229)47.

Uma vez que as identidades não explicam sozinhas as ações tomadas pelos atores, Wendt busca inserir no debate o tema dos interesses: “Without interests identities have no motivational force, without identities interests have no direction.” (WENDT: 1999, 231). Identidades implicam interesses, mas não se reduzem a estes. Se as identidades dizem respeito àquilo que os atores são, representando designações de tipos sociais e estados do ser, os interesses se referem ao que os atores querem e, portanto, representam as motivações que auxiliam na explicação do comportamento dos agentes (WENDT: 1999, 231). Posto de forma clara, os interesses são

46 De fato, podemos associar a primeira forma de identidade à dimensão interna da soberania,

enquanto a segunda diria respeito à dimensão externa. Sobre o tema da soberania, cf. WENDT: 1999, 206-209.

pressupostos pelas identidades por uma simples razão: se eu não sei quem eu sou, não terei meios de precisar aquilo que desejo.

Assim como há variações nas formas de identidade, o mesmo ocorre com os interesses. Neste caso, Wendt apenas diferencia interesses objetivos – imperativos funcionais indispensáveis para a reprodução de uma identidade – de interesses subjetivos – crenças dos atores sobre como alcançar suas necessidades identitárias, sendo que estas configuram, no fundo, a motivação mais imediata para o respectivo comportamento.

O problema surge, contudo, do fato de interesses estarem enraizados em identidades – pessoal, tipo, papel ou coletiva. Assim, a fim de atender a necessidades decorrentes de sua identidade, o agente pode deparar-se com um caso de contradição (ainda que às vezes aparente) entre interesses objetivos e subjetivos. Wendt cita o seguinte exemplo:

“To successfully reproduce her identity, a beginning professor must typically have two interests: to publish and to teach. How should she weight them? That will depend on both personal and contextual factors, but the possibility of mistakes – not just in behavior but in how she defines her interests in the first place – is very real. If she is disposed to understand her interests, however, she will proceed as a lay scientist, using a combination of Reason and Experiment to continually test whether her beliefs about her interests are helping her enact the identity of ‘professor’. This might not become clear for several years during which she may face structural uncertainty about whether the subjective and objective interests are properly aligned – and this is an example where the implications of an identity are relatively well defined.” (WENDT: 1999, 233).

No caso de atores corporativos, como o estado, a situação se torna mais complexa, dado o maior leque de consequências de suas identidades para seus interesses correspondentes. Muito embora o autor defenda a necessidade de uma compatibilização entre interesses objetivos e subjetivos, ao abordar o tema do interesse nacional, Wendt tem em mente a primeira modalidade.

Assim, o interesse nacional seria definido a partir de alguns requisitos fundamentais para a reprodução da identidade estatal: (i) sobrevivência física, entendida como a garantia da continuidade da manutenção do complexo estado- sociedade, ainda que algumas de suas unidades deixem de existir; (ii) autonomia, entendida como capacidade de controlar fatores essenciais como alocação de recursos e escolha de governos; (iii) bem-estar econômico, entendido como a manutenção do modo de produção em um grupo e, portanto, sua fonte de recursos;

(iv) auto-estima coletiva, entendida como a necessidade de um grupo de se sentir bem sobre si mesmo, seja sua motivação o respeito, seja sua motivação o status (WENDT: 1999, 235-237 e 243).

O que importa aqui, em última instância, é a recusa de Wendt em aceitar os interesses como plenamente pré-sociais (crítica tanto a neoliberais quanto a neorrealistas) sem, contudo, implicar uma visão do estado como tabula rasa (WENDT: 1999, 234), na qual qualquer interesse poderia ser inscrito (crítica ao construtivismo radical)48. Constitui, portanto, uma postura coerente com as premissas gerais de seu construtivismo social. Se, por um lado, Wendt reconhece a importância do construtivismo para enfatizar as possibilidades de mudança da realidade existente, por outro lado, o autor recorda ao longo de toda sua obra que tal mudança está longe de ser fácil:

“I am impressed with how resilient the state is. No matter how much transnational actors grow in importance, no matter how much state autonomy is undermined by international regimes or economic interdependence, states keep trying – and apart from a few ‘failed states’ most successfully – to reproduce themselves. Continued success may depend ultimately on profound adaptations in their form (like internationalization), but their structure gives them a powerful homeostatic disposition which makes it unlikely they will wither away. [grifos nossos]” (WENDT: 1999, 238)49.

Com isso, Wendt oferece a base para rejeitar um dos postulados mais caros ao realismo: a definição do estado como um ator guiado, por natureza, pelo