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Estratégias antibióticas para a redução de resistências

Figura 17– A bactéria pode ser resistente à ação do antibiótico por produção de enzimas, que

6. Estratégias antibióticas para a redução de resistências

A estratégia para a redução das resistências aos antibióticos assenta fundamentalmente em dois vectores:

1. Identificação dos casos e contenção da sua transmissão

2"em"1"billão" 200"em"1"mihão" 20"em"200"milhão"

População"wild%type* Mutantes"resistentes" Compromisso"do" sistema"imune" Saudável" Resolução" microbiológica" Surto" CIM"

 

2. Restrição da pressão de seleção antibiótica.

A primeira destas estratégias baseia-se no isolamento dos doentes infetados ou portadores de microrganismos resistentes34 Pode ser útil em meios relativamente fechados, em particular hospitais ou outras unidades assistenciais de internamento, sendo difícil o seu emprego em ambulatório.

Esta estratégia tem limitações conhecidas, tendo-se mesmo verificado aumento paradoxal da incidência de MRSA e Candida num ambiente de alta contenção de

contágio, como foi o da epidemia do Coronavirus em Hong Kong35. A contribuir para

esses achados poderá estar a heterogeneidade clonal do MRSA recentemente identificada36, sugerindo que a infeção por esse agente possa resultar mais de desequilíbrios microbiológicos no hospedeiro (potencialmente induzidos pelos antibióticos) do que por aquisição exógena.

A segunda destas estratégias, a restrição da pressão de seleção antibiótica, é crítica para o controlo das resistências a estes fármacos. No entanto a desejada recuperação de sensibilidade é na maioria das vezes lenta e depende dum esforço sustentado37. Pode mesmo revelar-se incompleta quando a bactéria resistente foi capaz de se adaptar de forma competitiva ao meio (caso da resistência do Staphylococcus aureus à penicilina, em que a redução significativa do uso desse antibiótico não se acompanhou de recuperação de sensibilidade).

Têm sido propostas diversas estratégias para conter a pressão antibiótica e o desenvolvimento de bactérias resistentes, como sejam a rotação de antibióticos e/ou a restrição dos mesmos38, a descalação39,40, a redução do tempo de terapêutica.

A rotação de antibióticos, utilização empírica preferencial de uma única classe durante um intervalo de tempo pré-definido, tem sido testada com resultados variáveis. A sua principal limitação é não promover uma verdadeira diminuição do consumo destes fármacos mas apenas uma alteração do padrão de prescrição, o que altera o desenvolvimento de resistências mas não as diminui41. Deve provavelmente ser limitada a situações particulares, de surtos focais de bactérias resistentes, preferencialmente de tipo monoclonal.

A restrição antibiótica42, limitação do uso de uma ou mais classes, que ficam reservadas para situações específicas (terapêutica dirigida contra bactérias

 

resistentes), pode ajudar a diminuir a emergência de novas resistências, particularmente quando as mesmas são cruzadas entre diferentes classes. Em Inglaterra a substituição do cotrimoxazol por trimetropim possibilitou a diminuição da resistência global da E. coli7. Também a restrição das fluorquinolonas e das cefalosporinas de 3ª geração tem sido proposta como medida para diminuir a proliferação de enterobacteriáceas produtoras de ESBLs43.

Num estudo prospectivo de coorte foi avaliado o impacto de 4 estratégias antibióticas empíricas sequenciais (em períodos de 4 meses) na sensibilidade bacteriana, nomeadamente a) terapêutica dirigida pelo risco epidemiológico individual, b) utilização preferencial duma classe de antibióticos, c) restrição duma classe de antibióticos e d) utilização de múltiplas classes em simultâneo (em diferentes doentes) de forma a maximizar a heterogeneidade de prescrição. Durante o período da estratégia b) verificou-se aumento da prevalência do Acinectobacter baumanii resistente aos carbapenemes, de enterobacteriáceas produtoras de ESBLs e de Enterococcus faecalis resistente à vancomicina, incidência essa que diminuiu no período d), de máxima heterogeneidade44.

A estratégia de descalação, utilização sequencial de terapêutica antibiótica empírica de largo espectro, com redução subsequente, ajustada de acordo com os resultados microbiológicos, combina os benefícios da terapêutica antibiótica inicial adequada com a diminuição da pressão de seleção38. É uma estratégia que pode ser usada complementarmente às anteriores mas está dependente da possibilidade de obter resultados microbiológicos fiáveis em tempo útil. É importante salientar que o único estudo prospectivo multicêntrico de avaliação desta estratégia mostrou, apesar de todas as suas limitações, um aumento (não significativo) da mortalidade no grupo em que foi praticada a descalação45.

A majoração da exposição antibiótica à bactéria46, de acordo com os princípios de PK referidos anteriormente, nomeadamente com posologia que privilegie doses mais frequentes de antibióticos tempo-dependente e doses mais elevadas de antibióticos concentração-dependente, pode aumentar a sua eficácia e diminuir o potencial de emergência de mutantes resistentes.

Uma estratégia global, que assente na optimização da prescrição antibiótica, restringindo o seu emprego ao tratamento das infeções bacterianas (apoiada na

 

melhoria das técnicas laboratoriais de diagnóstico), adequando a posologia às características PK/PD, selecionando antibióticos de menor espectro e com menor potencial para a indução de resistências, a limitação do tempo de antibioterapia ao mínimo eficaz, são tudo contributos para diminuir a expansão das resistências. A introdução de equipas multidisciplinares para a “gestão” do diagnóstico de infeção e da política antibiótica (Stewardship) pode facilitar a introdução de todas estas estratégias, contribuindo para o aumento da sua eficácia, diminuição de toxicidade, efeitos colaterais ecológicos (incluindo resistências) e custos.

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