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E A LONGEVIDADE ESCOLAR

1.3 Estudantes trabalhadores de camadas populares no ensino superior: do acesso à

permanência na universidade

Baseando-se na existência ou inexistência de situação de trabalho entre os estudantes, Romanelli (1995, p. 453) apresenta as seguintes categorizações:

- O “estudante em tempo integral”: não exerce atividade remunera- da e possui a capacidade de dedicação exclusiva aos estudos, pois é man- tido economicamente pela família, podendo ser aluno tanto do período diurno quanto do noturno;

- O “estudante trabalhador”: há predominância de atividade remu- nerada, mas, segundo o autor, essa categoria de estudante não se envolve com o seu emprego ou atividade, pois seu futuro profissional é planejado considerando a qualificação a ser obtida no curso superior. Outro ponto importante ressaltado é que esse estudante continua sendo parcialmente mantido pela família;

- “Trabalhador estudante”: para esse estudante, a atividade profis- sional possui grande importância, não havendo dependência financeira da família, uma vez que ele mesmo contribui ou pode contribuir com o orçamento familiar. O autor afirma que, para essa categoria, estudar é uma decisão pessoal que pode ser baseada em valores individuais ou em aspirações por melhoria profissional e financeira.

Terribili Filho (2007) também descreveu as classificações dos es- tudantes de acordo com a existência de atividade remunerada e elabo- rou algumas ressignificações baseando-se nas definições de Romanelli (1995), acrescentando a ocupação de estagiário como ramo de atividade para o estudante trabalhador e definindo a ocupação de estudante como:

- Aquele que apenas estuda, independentemente do período (etapa do curso) e do horário em que cursa a graduação ou de como é provida sua subsistência (se é mantido por apoio familiar, financiamento ou bol- sa de estudos);

- O “estudante trabalhador” tem como principal atividade o estudo, associando aele uma atividade remunerada que pode ser um trabalho formal ou informal, fixo, temporário ou estágio;

- O “trabalhador estudante” é aquele que tem o trabalho como ati- vidade primária em sua vida e, através dos estudos, procura a ampliação de conhecimento e/ou o diploma, visando, principalmente, melhor qua- lificação e ascensão profissional.

Para Vargas e Paula (2013), em se tratando de estudantes-traba- lhadores de camadas populares, além da necessidade de medidas que garantam os recursos básicos para a permanência na universidade, existe outra necessidade eminente para o processo de formação desses universitários, ou seja, o ajuste das exigências da escolarização à ne- cessidade de trabalhar. “Por vezes, o trabalho dificulta a escolarização, por vezes, a ausência de trabalho impede a escolarização” (VARGAS; PAULA, 2013, p. 465).

Santana (2013, p. 71), em sua dissertação de mestrado sobre os alu- nos dos cursos noturnos da Universidade Federal da Bahia, afirma:

O predomínio de aulas no período noturno permite que o estudante exerça uma atividade remunerada durante os anos de graduação, tanto para obter recursos financei- ros para sua manutenção no curso escolhido quanto para apoiar economicamente a família. O estudante busca, em geral, através dos cursos de graduação, a sua formação profissional e um diploma, acreditando que terá uma vida mais promissora no futuro.

De acordo com as considerações de Santana (2013), percebe-se que há uma relação intrínseca entre o horário em que o estudante cursa a graduação e a existência de atividade remunerada.

Para o presente estudo, não foram localizados dados estatísticos ofi- ciais acerca do perfil dos estudantes do ensino noturno, porém Terribili Filho e Nery (2009) inferem, com base na observação, que a maioria dos estudantes do ensino noturno é composta por estudantes-trabalhadores.

Ressalta-se também que existem estudantes do período diurno que trabalham, principalmente aos finais de semanas, de forma esporádica, porém, no caso do estudante noturno, o trabalho apresenta-se de forma regular, sendo, na maioria das vezes, de segunda à sexta-feira e com cargas horárias superiores a seis horas diárias.

Acerca dessa necessidade específica dos estudantes-trabalhadores de camadas populares, Terribili Filho e Nery (2009) discutem a impor- tância dos projetos pedagógicos dos cursos noturnos serem distintos dos cursos diurnos, em função das particularidades do alunado da noi- te, composto, na maioria, por estudantes-trabalhadores.

Certamente, os estudantes que se dividem entre o trabalho e a uni- versidade possuem maior necessidade de organização do tempo e das tarefas diárias do que os estudantes que não trabalham. Acerca das di- ficuldades enfrentadas pelos estudantes-trabalhadores, Vargas e Paula (2013) mencionam que, no caso do ensino noturno, o horário de início da aula normalmente coincide com o término da jornada de trabalho, o que ocasiona constantes atrasos por parte dos estudantes ou aulas que se iniciam frequentemente após o horário. Para essas autoras, os estudan- tes chegam ao ambiente universitário já cansados e estressados com o trânsito e possuem um entendimento dos prejuízos acadêmicos que tais situações lhes proporcionam.

Complementando as considerações de Vargas e Paula (2013), Ter- ribili Filho e Nery (2009) trazem a discussão sobre o tema as questões do “entorno universitário”, ou seja, das circunstâncias da vida social que impactam diretamente na relação com o estudo, como o acesso ao transporte coletivo, as condições de trânsito e a falta de segurança, as- pectos que devem ser considerados nas discussões das políticas públicas educacionais.

Trabalhar e estudar requer uma grande motivação e envolvimento pessoal com o curso, porém cabe também destacar que a relação com o estudo é uma construção coletiva em que o estudante assimila, de seu meio familiar e social, as bases para a motivação e dedicação à sua vida escolar.

Assim, a mobilização familiar, seja intencional ou não, pode criar disposições pessoais que garantam o êxito e o alcance da longevidade escolar, mesmo o trabalho estando presente na trajetória desses jovens e demandar maior empenho e abdicação de momentos de lazer, descanso e sociabilidade com a família e amigos.

1.3.1 O estudante de camadas populares e o ensino

superior: mobilização para garantir êxito em