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E A LONGEVIDADE ESCOLAR

1.2 Mobilização escolar das camadas populares e longevidade escolar

1.2.1 Relações familiares e atribuições educacionais na sociedade neoliberal

O diálogo acerca das atribuições e participação familiar na educação dos filhos é marcado por posições de conflitos sobre demandas e res- ponsabilidades tanto no âmbito escolar, quanto no meio familiar. Essa relação se delineia como conflituosa no momento em que são evidencia- das as descontinuidades entre o discurso ideológico da escola e o inves- timento educacional por parte das famílias.

É evidente que essas relações de descontinuidades devem ser pensa- das de forma crítica e ser alvo de estudos para que sejam desvelados os fatores sociais que permeiam esse contexto. Contudo, para um direcio- namento prévio dessa análise, faz-se necessário compreender o contexto socioeconômico no qual está inserido o objeto desse estudo, ou seja, a escola e a família na sociedade neoliberal.

No Brasil, a adequação do sistema educacional às exigências de uma economia globalizada vem sendo implementada desde os anos 1990, mediante intervenções políticas edificadas nos paradigmas da moderni- zação e na qualidade do sistema educativo, sendo implementadas inter- venções que visam à diversificação, flexibilidade, competitividade, pro- dutividade e eficiência da escola e do ensino (LIBÂNEO, 2012).

As demandas neoliberais condicionam, periodicamente, uma rees- truturação do sistema educacional e da instituição escolar para promo- ver as adequações de formação profissional do novo trabalhador e, si- multaneamente, amenizar as desigualdades e conflitos sociais frutos das relações de heterogeneidade das classes sociais.

O contexto de reestruturação educacional contemporânea parte da premissa de que a escola precisa se empenhar na diminuição da exclu- são, da pobreza e da segregação social, visando conter possíveis ameaças à estabilidade do sistema capitalista. Por outro lado e, contraditoriamen- te, a reestruturação escolar visa atender às demandas de capacitação pro- fissional, pois o conhecimento adquire status de bem econômico.

Dentre as questões mais significativas no âmbito educacional, des- taca-se a necessidade de atuação da escola no enfrentamento das pro- blemáticas sociais e suas estratégias de ação frente a essas questões que evidenciam uma sociedade antagônica, dividida em classes e sob o do- mínio do mercado. Essas situações educacionais dizem respeito, prin- cipalmente, à necessidade de enfrentamento do fracasso escolar, fruto de inadaptação do aluno à instituição escolar, seja por diversificação do público-alvo, seja por deficiência na qualidade do ensino.

Assim como na escola, a família também vivencia profundas trans- formações diante das novas formas de sociabilidade impostas pelo ne- oliberalismo. Dentre as mudanças no âmbito familiar, destacam-se as aceleradas diversificações nos padrões e valores familiares e suas formas de participação social como unidade de consumo e reprodução da ideo- logia das classes dominantes.

Segundo Nogueira (2005, p. 575), essas transformações ocorridas no padrão familiar levaram a novas formas de relação entre família e escola, culminando em um processo em que:

Escola e família intensificam suas relações de modo nun- ca antes conhecido. A presença dos pais no recinto esco- lar e sua participação nas atividades de ensino tornam-se cada vez mais comuns. Os contatos formais e informais se multiplicam e se diversificam. No cotidiano, os canais de comunicação parecem se ampliar para além da tradicional participação nas associações de pais e mestres e da presen- ça em reuniões oficiais com professores.

Conforme apontado por Nogueira (2005), a família da atualidade está mais presente e participativa no ambiente escolar, e essa nova for- ma de interação proporciona uma redefinição dos papéis entre escola e família no processo educativo visando ao estabelecimento de relações de coparticipação entre ambas.

Acerca das novas demandas da família por mais participação no pro- cesso educativo, Nogueira (2005, p. 575) problematiza:

De um lado, a escola não se limita mais às tarefas voltadas para o desenvolvimento intelectual dos alunos, estenden- do sua ação aos aspectos corporais, morais, emocionais, do processo de desenvolvimento. De outro, a família passa a reivindicar o direito de intervir no terreno da aprendiza- gem e das questões de ordem pedagógica e disciplinar.

Com base no que Nogueira (2005) traz para o debate, é importan- te ressaltar que tanto a escola quanto a família desempenham papéis indispensáveis na formação do sujeito consciente e participativo. Cabe destacar também que as ações da escola e da família se efetivam de forma complementar, fato esse que reforça a interdependência entre ambas as esferas e, simultaneamente, faz aflorar os conflitos presentes nessa rela- ção de complementaridade.

Assim, diante das mudanças ocorridas tanto no âmbito da sociedade e da escola, quanto da família, verifica-se a necessidade de contextuali- zar as práticas de mobilização familiar na educação.

As ações das famílias visando promover a longevidade escolar dos filhos são influenciadas pelos novos parâmetros exigidos para a edu- cação na sociedade contemporânea. Paralelamente a esse contexto de mudança no paradigma educacional, se faz importante atentar-se para a leitura que as famílias fazem desse processo e como passam a com- preender e inserir a educação no contexto de suas vivências e perspec- tivas futuras.

Conforme mencionado, em se tratando de contextos que levaram à longevidade escolar de estudantes provenientes de camadas populares, é comum a inexistência de um projeto de escolarização de longo prazo por parte das famílias de camadas populares (VIANA, 2000). Contudo,

observa-se que, com as políticas inclusivas adotadas nos últimos anos, cada vez mais, jovens oriundos de camadas populares têm ingressado nos cursos universitários, sejam públicos, sejam privados. Muitos con- ciliam trabalho e estudo, e daí a importância de se conhecer melhor como se constrói tal relação e como essas duas instâncias indissociáveis na vida do estudante trabalhador atuam no processo de consolidação ou fragilização de trajetórias de longevidade escolar.

1.3 Estudantes trabalhadores de camadas