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TRABALHAR E ESTUDAR, EIS A QUESTÃO: O QUE OS ESTUDANTES

4.1 Os participantes da entrevista a) Entrevistada 1: Fernanda

Cursa Pedagogia no turno vespertino, matriculando-se em algumas disciplinas do turno noturno. Ingressou no curso com 38 anos de idade, é casada e tem três filhos, sendo que a filha caçula tem 16 anos e está cursando o ensino médio no IFMG, a outra cursa Ciências Biológicas na UFSJ e o filho trabalha em uma loja de materiais elétricos. O marido de Fernanda atua como motorista.

Fernanda trabalhava no comércio, como gerente de loja, antes de ingressar na UFOP. Após começar a estudar, deixou de trabalhar formal- mente e tornou-se bolsista do Programa Institucional de Bolsas de Ini- ciação à Docência (PIBID) durante dois anos. Atualmente, possui bolsa de pesquisa do CEAD e vende lingerie.

Os avós de Fernanda não estudaram e eram agricultores. Seus pais estudaram até a quarta série. Dentre seus tios, nenhum tem formação superior.

Fernanda tem um irmão que se graduou em Engenharia Metalúrgi- ca, uma irmã que se formou em Ciências Biológicas e duas outras que não prosseguiram nos estudos.

Sobre seu percurso escolar, a estudante pontuou que:

Na verdade, eu não comecei, eu não vim pra graduação direto. O que aconteceu: eu casei nova, aí tive três filhos, aí parei de estudar, né? Mas eu sempre gostei de estudar. Sempre li muito em casa e tal. Aí, eu voltei e fiz a EJA. Eu não tinha Ensino Médio, não tinha! Aí, em 2006, eu voltei pra escola, fiz a EJA, fiz o Ensino Médio na EJA e, logo em seguida, veio aquele magistério que é normal e nível médio (Fernanda, Pedagogia vespertino, 5º período).

Fernanda passou 15 anos sem estudar, do período de 1991 a 2006, sendo que, em 2006, retomou os estudos e cursou o ensino médio na EJA (Educação para Jovens e Adultos).

b) Entrevistado 2: Anderson

Anderson é solteiro, já concluiu o curso de graduação em História pela UFOP, cuja data de ingresso foi 2009. Atualmente, reside em um imó- vel alugado que divide com colegas. Ingressou no curso de Museologia noturno no segundo semestre letivo de 2013, com a idade de 28 anos.

Anderson atuava como professor de Informática antes de ser apro- vado na UFOP e, depois disso, continuou nesse emprego, trabalhando meio período com vínculo formal. À tarde, atua como bolsista do Museu de Farmácia.

O estudante relatou que não teve vínculos com os avós, pois eles faleceram antes do seu nascimento e não soube responder a respeito da profissão e escolaridade deles. Mencionou também que não tem vín- culos efetivos com o pai, que não o registrou. O estudante e seus dois irmãos foram criados apenas pela mãe.

A mãe de Anderson estudou até a 4ª série e trabalhava como cozi- nheira em uma empresa privada, porém estava afastada do serviço há algum tempo devido a problemas de saúde.

Anderson interrompeu os estudos por dois anos no período de sua formação inicial. O estudante também destacou a pouca presença da mãe em sua vida escolar:

Na verdade eu estudei, antes de ir pro Gomes Freire, eu estudei em mais outras duas escolas, só que aí eu para- va de estudar, e minha mãe nunca me obrigou a estudar! Aí, quando eu tava nessa escola, que era uma escola mu- nicipal, eu entrei e larguei, e, depois eu estudei no San- ta Godoi, e também larguei. Aí, eu fiquei dois anos sem estudar. Mas aí, depois, eu pedi pra minha mãe me levar nessa escola, Gomes Freire, pedi pra ela me matricular e aí eu comecei a estudar e eu formei lá até a 5ª série. Que é uma escola estadual. Que é uma escola muito boa, assim, a melhor escola que eu já estudei (Anderson, Museologia noturno, 5º período).

Após a conclusão da 4ª série do ensino fundamental, Anderson deu continuidade aos estudos sem interrupção e repetências até a conclusão do ensino médio. Sobre seu percurso escolar até o ingresso no ensino superior, o estudante destacou que:

É, então! Eu entrei em 2005 aí, em 2006, eu tentei vestibu- lar e não passei, porque eu tinha que trabalhar o dia inteiro e eu não tinha tempo assim pra estudar. Aí, em 2007, eu tentei de novo e não passei! Em 2008, novamente, aí em 2008, eu resolvi tentar, como eu juntei dinheiro, eu resolvi fazer cursinho à noite pra dar uma rotina de estudos (An- derson, Museologia noturno, 5º período).

O estudante mencionou que sua irmã é freira, reside em um conven- to na cidade de Coronel Fabriciano e possui graduação em Pedagogia. Seu irmão reside em Mariana, cursou até o ensino médio e atua como funcionário público no Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE).

c) Entrevistada 3: Josiane

Josiane cursa Serviço Social no turno vespertino. Ingressou nessa fa- culdade com 34 anos, é solteira e reside com a mãe, duas irmãs e três ir- mãos no distrito de Antônio Pereira, em Ouro Preto. Seu pai já é falecido. Atuava como professora de Informática antes de ingressar na UFOP e, depois disso, permanece atuando na mesma função, trabalhando em meio horário e com vínculo formal.

Pouco conhece a história dos avós por parte de pai, pois faleceram quando a estudante era nova, mas sabe que a avó era professora sem for- mação. Sobre a atividade da avó paterna, a estudante mencionou:

Quando começou, o distrito era bem pequeno, então, as- sim, as pessoas que sabiam ler e escrever eram muito pou- cas. Então, dentro da casa dela mesma, ela reunia os vizi- nhos, os meninos, pra alfabetizar (Josiane, Serviço Social vespertino, 5º período).

Sobre os avós maternos, a estudante relata que residiam em Santa Rita Durão, distrito de Mariana, sendo a avó, do lar, sem escolaridade, e o avô, juiz de paz:

Da minha avó, eu, eu acho que ela nunca fez nada não! Ela sempre foi do lar mesmo, aí ela conta assim, que ela apli- cava injeção no povo, né? Que antigamente era assim, né? Fazia dessas coisas mesmo. E meu avô, ele, eu acho que ele não tinha muita formação também não! Mas ele era juiz de paz, né? De cartório, esses negócios, era disso. E tra- balhava de, acho que como tropeiro antigamente né? Que era de um distrito também, de Santa Rita Durão. Que eles moravam (Josiane, Serviço Social vespertino, 5º período).

O pai de Josiane estudou até a antiga 2ª série e trabalhava como motorista de caminhão autônomo. A mãe estudou até a antiga 4ª série, e a estudante não mencionou se a mãe trabalhava ou já trabalhou.

Josiane concluiu o ensino médio no ano 2000 e permaneceu oito anos sem estudar:

Aí eu fiz o Ensino Médio no ano 2000, lá em Antônio Pe- reira. Eu queria fazer um curso técnico, só que eu tentei, mas não passei, não podia zerar lá, aí eu zerei em Física. Depois eu fiquei revoltada com aquilo, eu fiquei oito anos sem estudar! Comecei a trabalhar, depois de oito anos, aí peguei, resolvi fazer um outro curso técnico, particular. Eu fiz técnico em Instrumentação Eletrônica e Controle de Processos (Josiane, Serviço Social vespertino, 5º período).

Sobre seu perfil familiar, Josiane mencionou que sua família é bem grande: “Eles [a família paterna] são de nove irmãos, da minha mãe tam- bém são nove irmãos e, nós também somos nove irmãos!”.

A estudante relatou que tem uma irmã formada em Pedagogia, e seus outros sete irmãos possuem formação técnica ou ensino médio, sendo que um deles tem a pretensão de cursar Engenharia Civil.

d) Entrevistado 4: Reginaldo

Reginaldo é casado, reside em Cachoeira do Campo, distrito de Ouro Preto, com a esposa e um filho de dez anos. Ingressou no curso de Estatística noturno com a idade de 33 anos.

Antes de ingressar na UFOP, trabalhava como servidor público de nível médio ou técnico. Ainda permanece exercendo essa função e cum- pre jornada diária de oito horas, totalizando quarenta horas semanais.

Sua esposa possui formação superior e está fazendo especialização na área de educação infantil e atua como professora da educação básica.

Sobre os avós, o estudante mencionou que eram trabalhadores ru- rais sem escolaridade:

Então! Eu sou de uma família rural, né? De pessoas muito trabalhadora! É... Meus avós não tiveram... Eram analfa- betos mesmo! O meu avô era um pouco, ele sabia fazer contas muito bem, mas não sabia escrever. A minha avó era dona do lar mesmo e não tinha noção nenhuma de es- crita, às vezes, algumas contas bem mais simples mesmo. O meu avô conseguia fazer ainda, que mexia com carvão, então aí ele sabia fazer umas contas melhores aí. É, tipo, quantas bestas de lenha que eu vou usar pra encher um forno. Então, ele conseguia resolver essas questões muito rápido, com matemática mesmo sem ir à escola! Esses são avós maternos. Os paternos eu não sei, porque eu sou filho, não tenho pai declarado. Aí não sei, então não conheci os avós paternos (Reginaldo, Estatística noturno, trancou o 5º período).

Reginaldo mencionou que a mãe também é trabalhadora rural, já atuou como doméstica e estudou até a terceira série.

Sobre seus irmãos, o estudante disse que tem um irmão que reside em Ouro Branco, atua como operador na empresa Gerdau e tem preten- são de fazer curso superior a distância no polo do IFMG, em Ouro Bran- co. Seu outro irmão possui curso técnico, atua como trabalhador rural e permaneceu residindo no local de origem da família no distrito de Santa Rita de Ouro Preto. Reginaldo tem uma irmã que reside em Mariana, fez curso técnico em Contabilidade, mas não atua na área e trabalha em uma loja na área de atendimento ao público.

Em sua trajetória escolar, Reginaldo repetiu apenas a 6ª série e co- mentou que teve dificuldades de adaptação, pois estudou por um ano em um internato na cidade de Cachoeira do Campo que já fechou. Após o retorno para a comunidade rural de Bandeiras, em Santa Rita, o estu- dante concluiu o ensino fundamental no turno noturno, na área urbana de Santa Rita.

Posteriormente, cursou o ensino médio noturno integrado com téc- nico em edificações no IFMG de Ouro Preto. Após a conclusão do ensi- no médio, Reginaldo ficou, aproximadamente, cinco anos sem estudar, trabalhou e constituiu família.

Em 2008, ingressou no curso de Matemática na UFOP, porém não o concluiu e, no segundo semestre letivo de 2013, ingressou no curso de Estatística. Contudo, o estudante também pontuou dificuldades de con- tinuar o curso e, em novembro de 2015, optou por trancar sua matrícula. A entrevista foi realizada considerando que o estudante manifestou disponibilidade de participar em data anterior ao trancamento e, para a pesquisa, seria de grande relevância conhecer a realidade de, pelo me- nos, um estudante trabalhador que trancou ou evadiu-se do curso.

4.2 Mobilização familiar em torno da educação e