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2. ENQUADRAMENTO METODOLÓGICO

2.1. ESTUDO I: CRITÉRIOS DE DECISÃO SOBRE O DESTINO DOS DOENTES

PROFISSIONAIS DE SAÚDE

Como já referimos, o Estudo I, foi realizado em contexto hospitalar. Denominámos por “Critérios de decisão sobre o destino dos doentes dependentes no autocuidado no momento da alta hospitalar: dos discursos dos profissionais de saúde”.

Relembramos o objetivo proposto para o Estudo I:

 Identificar os critérios envolvidos na decisão sobre o destino dos doentes dependentes no autocuidado, no momento da alta hospitalar.

Metodologicamente, este estudo foi orientado por entrevistas realizadas com os elementos das equipas de saúde, como principais intervenientes neste processo de decisão e que faziam parte do contexto onde se realizou o estudo. Colocámos a estes elementos uma questão de partida, de acordo com o objetivo traçado:

De acordo com a sua experiência e prática quotidiana, quais os critérios que são utilizados na tomada de decisão sobre o destino dos doentes dependentes no autocuidado no momento da alta hospitalar? O momento da alta hospitalar é, pela sua complexidade, considerado um momento crítico para as famílias que integram membros dependentes, onde existe um conjunto de fatores associados (clínicos, cognitivos, suporte, económicos, processos familiares, culturais) determinantes e levados em conta na tomada de decisão dos profissionais de saúde sobre o destino15 do doente dependente. No entanto, relativamente à referenciação para a RNCCI, existe um conjunto de critérios (motivos) formalmente explícitos no Decreto-Lei 101/2006, de 6 de junho, orientadores dessa mesma tomada de decisão. Nesta fase do estudo, foi nosso propósito compreender, com maior detalhe, a operacionalização por parte dos profissionais de saúde, dos critérios de decisão sobre o destino do dependente após a alta hospitalar. Tendo nós presente, a existência de critérios de referenciação da RNCCI formalmente explícitos, o que significa que estes assumem grande relevância nesta tomada de decisão dos profissionais envolvidos.

2.1.1. Tipo de estudo.

Para este primeiro estudo, a nossa opção metodológica incidiu numa abordagem de perfil qualitativo, cuja finalidade, foi a compreensão do fenómeno sob o ponto de vista dos participantes, tendo em conta a sua experiência profissional. Assim, assente numa investigação exploratória e descritiva, este estudo,

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No contexto deste estudo, o destino refere-se ao local para onde o doente é encaminhado após a alta hospitalar associada ao episódio de internamento do estudo. Este local pode ser: domicílio, lar, RNCCI, família de acolhimento ou outro hospital.

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visa a exploração dos critérios envolvidos na decisão sobre o destino dos doentes dependentes no autocuidado, no momento da alta hospitalar.

2.1.2. Participantes.

Tendo presente o principal objetivo do estudo, tínhamos pela frente a tarefa de selecionar os participantes. Pela natureza da informação que pretendíamos, os critérios que estabelecemos para a seleção dos participantes estavam relacionados com o seu elevado grau de envolvimento no processo de referenciação e preparação da alta hospitalar, habitualmente, da responsabilidade da equipa multiprofissional. Por outro lado, face a este argumento, era nosso propósito, obtermos uma perspectiva multiprofissional da problemática. Este facto, levou-nos a acreditar num maior potencial de enriquecimento dos dados, pelos diferentes olhares sobre o mesmo fenómeno. No entanto, complementares. A preparação do regresso a casa deve ter uma abordagem multidisciplinar e multiprofissional (Bull & Roberts, 2001; Closs & Tierney, 1993; Martins, 2002; Petronilho, 2007).

Face a este argumento, a nossa decisão foi no sentido de realizar entrevistas aos elementos da EGA de cada centro hospitalar/hospital envolvido na pesquisa, uma vez que, pela natureza das suas funções, eram informantes cruciais para a concretização dos objetivos nesta fase do estudo. Cada EGA era constituída por três elementos: um enfermeiro, uma assistente social e um médico. No entanto, para além destes elementos, entrevistámos um enfermeiro de cada unidade de cuidados envolvida no estudo. Demos prioridade aos enfermeiros que desempenhavam um papel fundamental no processo de referenciação e preparação da alta hospitalar dos dependentes e, assim, melhor posicionados para serem interlocutores previligiados dos serviços de internamento com a EGA.

Neste sentido, estamos perante uma amostra teórica (Polit, Beck & Hungler, 2004) ou intencional (Lincoln & Guba, 1985; Patton, 1990; cit. por Streubert & Carpenter, 2002). “Os indivíduos são selecionados para participar na investigação de acordo com a sua experiência, em primeira mão, da cultura, interação social ou fenómeno de interesse” (Streubert & Carpenter, 2002, p. 25). Com este tipo de participantes, pretende-se um conjunto de dados densos e ricos acerca do fenómeno em estudo.

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A Tabela 2.1 apresenta os profissionais de saúde entrevistados relativamente à sua categoria profissional e contexto onde exerciam a sua prática clínica.

Verificamos que dos dezoito (18) profissionais entrevistados, 11,1% (2) são médicos; 16,7% (3) são assistentes sociais e, 72,2% (13) são enfermeiros. Destes, cinco (5) são especialistas em reabilitação; quatro (4) são graduados; dois (2) são especialistas em médico-cirúrgica e, por último, um (1) é chefe e o outro (1) é supervisor.

2.1.3. Contexto do estudo.

Face aos objetivos globais do estudo, teríamos de eleger contextos onde o número de casos de internamento de pessoas dependentes no autocuidado fosse significativo. Não era propósito do nosso estudo identificar indivíduos a partir de diagnósticos médicos específicos (doenças), uma vez que, posicionámo-nos numa perspectiva disciplinar (de enfermagem) em que o fenómeno da dependência no autocuidado representa um conceito central da disciplina. Daí, poder estar associado a processos de transição de saúde-doença, mas, também, poder estar associado às transições de desenvolvimento com particular enfoque no envelhecimento, onde a progressiva detioração dos sistemas corporais é inevitável ao longo do tempo e, em particular, os sistemas neuro-músculo-esquelético. Face às novas tendências demográficas e ao aumento da esperança média de vida, a conjugação destas duas situações é, na verdade, aquela que mais ocorre.

Os contextos de cuidados de saúde, em particular os hospitais, relativamente à sua estrutura organizacional, são tradicionalmente medicocêntricos, onde os internamentos nas unidades de cuidados estão organizados em função da doença específica ou, se quisermos, por especialidades médicas (ex. ortopedia, pneumologia, neurologia) e do tipo de tratamento (médico ou cirúrgico). Os serviços de medicina, pela sua natureza, são contextos de cuidados que se caracterizam por uma grande prevalência de doentes com grande variedade de doenças agudas e crónicas incapacitantes e, assim, geradoras de dependência no autocuidado. Na maioria dos casos, pessoas idosas. Daí, termos selecionado para o desenvolvimento do nosso estudo, unidades de internamento de “medicina”. Como já justificámos, no sentido de obtermos uma amostra com um número significativo de casos, mas, também, para proporcionar um conhecimento do fenómeno tendo em conta uma zona geográfica mais ampla, optámos por incluir no estudo, contextos (hospitais) de proximidade com o nosso local de trabalho - Escola Superior de Enfermagem da Universidade do Minho. Assim, foram identificados seis hospitais da região norte do país, pertencentes às sub-regiões do Cávado e Ave16. Dois (2) destes hospitais estão localizados na região do Cávado – hospitais de Barcelos e de Braga - e quatro (4) estão localizados na região do Ave – hospitais de Guimarães e Fafe (Centro Hospitalar do Alto Ave) e hospitais de Famalicão e Santo Tirso (Centro Hospitalar Médio Ave). Nestes seis hospitais, selecionámos para o estudo, a totalidade dos serviços de medicina existentes. A Tabela 2.2 mostra-nos, com maior detalhe, a distribuição dos hospitais/centros hospitalares e respetivos serviços de internamento englobados no estudo.

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2.1.4. Procedimento de recolha de dados.

Após decidirmos sobre os contextos onde iríamos desenvolver o estudo, iniciámos os contactos com as instituições de saúde. Numa primeira abordagem, contactámos com os enfermeiros responsáveis pelos serviços de internamento no sentido de explicar os objetivos globais da nossa investigação e perceber da sua abertura e disponibilidade para colaborarem. Ultrapassada esta etapa e acordados os procedimentos em cada unidade de cuidados, solicitámos a sua colaboração para a identificação de um elemento da equipa de enfermagem por serviço de internamento, no sentido de colaborar como informante na recolha de dados. Como já referimos anteriormente, os critériosque estabelecemos para a seleção dos informantes, centraram-se no seu elevado grau de envolvimento no processo de referenciação e preparação da alta hospitalar. A participação no estudo assentou numa entrevista (com gravação áudio), a qual incluiu uma pergunta aberta para dar resposta aos objetivos desta fase da investigação. Do mesmo modo, em cada hospital/centro hospitalar, contactámos o gabinete da EGA, também com o propósito de indagar a disponibilidade dos seus elementos para participarem no estudo. Terminado este processo, no qual tivemos uma boa recetividade por parte dos responsáveis e dos restantes elementos contactados (enfermeiros dos serviços de internamento e elementos da EGA), providenciámos os pedidos de autorização formal aos Conselhos de Administração das instituições envolvidas. Assim, após a devida autorização (Anexo C), démos início ao desenvolvimento do estudo e, no concreto, à recolha de dados. As entrevistas aos profissionais de saúde do Estudo I decorreram entre maio e julho de 2009.

2.1.5. Técnica de recolha de dados.

Após obtermos a autorização para dar início ao estudo, contactamos os informantes-chave para a calendarização das entrevistas. Estas foram realizadas no seu contexto de trabalho. Utilizámos o método de entrevista não estruturada (Gerrish & Lacey, 2008; Polit et al., 2004) ou entrevista aberta (Streubert & Carpenter, 2002). As entrevistas não estruturadas, dentro dos diferentes tipos de entrevistas, são as mais profundas e, por sua vez, as menos controladas. Têm como finalidade, examinar com detalhe uma área de interesse ou fenómeno, são muito informais, tendem a apresentar uma natureza de conversação e são dirigidas, fundamentalmente, pela perspetiva e ponto de vista do participante (Gerrish & Lacey,

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2008; Polit et al., 2004). Permite aos participantes explicarem a sua experiência vivida sobre o fenómeno em estudo (Streubert & Carpenter, 2002). Habitualmente, este método é utilizado quando o conhecimento prévio sobre o fenómeno em estudo é escasso. Sabíamos que os critérios (motivos) que estão na base da decisão dos profissionais de saúde sobre o processo de referenciação dos doentes dependentes no autocuidado para a RNCCI estão formalmente explícitos (Decreto-Lei 101/2006) e operacionalizados através de um conjunto de domínios – avaliação biopsicossocial - contidos no Instrumento de Avaliação Integral (IAI)17. Todavia, parece-nos ser útil e clinicamente relevante, uma melhor compreensão sobre este processo de tomada de decisão, com grande enfoque no processo diagnóstico dos diferentes profissionais intervenientes. De referir que não foi possível realizar as entrevistas planeadas a cinco elementos contactados, por dificuldades na sua marcação. Destes elementos, dois eram médicos, um era assistente social da EGA e dois eram enfermeiros dos serviços de internamento.

2.1.6. Análise dos dados.

As narrativas resultantes da pergunta aberta aos participantes no Estudo I foram analisadas através da análise de conteúdo, como técnica de tratamento de dados. A análise de conteúdo é um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens e indicadores que permitem a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/receção (variáveis inferidas) destas mensagens (Bardin, 2009). Após a colheita de dados procedeu-se à transcrição das entrevistas, constituindo o corpus documental atendendo à exaustividade, representatividade, homogeneidade e respetiva adequação. Seguiu-se a codificação dos dados, que se reporta ao processo de transformação e agregação dos dados brutos em unidades que permitem a descrição concisa das características relevantes do conteúdo. Dos dados recolhidos através das entrevistas realizadas emergiram as categorias, os respetivos temas (unidades de registo) e as unidades de contexto (Bardin, 2009).

2.2. ESTUDO II: DESTINO E PERFIL DOS DOENTES DEPENDENTES NO AUTOCUIDADO FACE