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1. INTRODUÇÃO

1.1 PROBLEMÁTICA E CONCEITOS CENTRAIS

1.1.5. A perceção de autoeficácia como indicador das transições dos familiares

Eficácia refere-se à capacidade dos indivíduos em desenvolver competências cognitivas, sociais, emocionais e comportamentais, que deve ser organizada e instrumentalizada de forma eficaz para servir inúmeros propósitos. Há uma diferença significativa entre possuir competências e ser capaz de integrá- las de forma apropriada em ações específicas e executá-las, adequadamente, em circunstâncias difíceis. A autoeficácia percebida preocupa-se, não com o conjunto de habilidades que os indivíduos possuem, mas com o que estes acreditam que são capazes de fazer com aquilo que possuem, em diferentes circunstâncias (Bandura, 1997b). Crenças de eficácia “operam como um fator decisivo num sistema gerador de competência humana. Assim, pessoas diferentes com habilidades similares ou as mesmas pessoas em diferentes circunstâncias podem executar mal, adequada ou extraordinariamente, dependendo das flutuações nas suas crenças de eficácia pessoal” (Bandura, 1997b, p. 37).

A autoeficácia é conceptualizada como uma crença do indivíduo na sua própria capacidade de realizar uma tarefa específica, onde é imperativo mobilizar a motivação, os recursos cognitivos e de ação, necessários para enfrentar e satisfazer as exigências específicas duma situação considerada desafiadora (Bandura, 1997a, 1997b). Portanto, a autoeficácia é um constructo psicológico individual e que se refere à confiança do indivíduo na realização de um determinado comportamento e ser capaz de superar os obstáculos na concretização desse comportamento. Sentimentos de autoeficácia resultam da interação dos comportamentos pessoais com os fatores ambientais necessários à realização desses mesmos comportamentos (Bandura, 1997b; Weng, Dai, Wang, Huang & Chiang, 2008). É parte de um processo de autorregulação e que é orientado para atingir metas. É um preditor significativo de bem- estar psicológico. É através da contínua interação com os outros que os indivíduos desenvolvem a crença de que têm a capacidade de influenciar as suas próprias vidas. No contexto da prestação de cuidados, a autoeficácia percebida, refere-se à crença de ser capaz de lidar, adequadamente, com problemas específicos da saúde/desenvolvimento, problemas estes que podem surgir num determinado momento do ciclo de vida (Pinquart & Sorensen, 2006).

No contexto das transições de vida potencialmente stressantes, como, por exemplo, a transição para o exercício do papel de cuidador, as crenças de autoeficácia podem servir como recurso pessoal ou um fator de vulnerabilidade (Bandura, 1997a). Pesquisas sobre ansiedade e capacidades cognitivas, demonstraram que um baixo sentido de eficácia no confronto com os problemas do dia-a-dia, deixa as pessoas vulneráveis a experiências adversas. Tendem a ficar preocupadas, com fracas expetativas sobre as suas competências no desempenho das tarefas específicas, interpretam a excitação fisiológica como indicador de ansiedade e o feedback vindo de outros como momentos de avaliação do seu valor individual. Deste modo, sentem-se pessoalmente incompetentes no desempenho das tarefas e, assim, responsáveis pelo fracasso perante as situações com que são confrontadas(Bandura, 1997a).

Segundo Bandura (1997a), as crenças dos indivíduos a respeito da sua autoeficácia podem ser desenvolvidas e reforçadas através de quatro formas de influência/fontes:

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Experiência com mestria na execução das tarefas

A forma mais eficaz de desenvolver uma elevada perceção de autoeficácia é através de experiências prévias com domínio das tarefas a realizar. O sucesso na execução das tarefas ajuda a construir uma robusta crença na eficácia pessoal. Envolve a aquisição de ferramentas cognitivas, comportamentais e de autorregulação para criar e executar ações, apropriadas à gestão das circunstâncias da vida em constante mudança. Se as pessoas experimentam apenas sucessos fáceis de atingir, os quais envolvem resultados de alcance rápido, são facilmente desencorajadas perante as situações de fracasso. Um sentido de autoeficácia com resiliência, exige experiência na superação dos obstáculos, através do esforço persistente. Quando as pessoas interiorizam aquilo que é necessário para alcançar o sucesso perante os desafios, perante novas situações de adversidade, sabem utilizar a experiência prévia adquirida nas situações anteriores, saindo a sua competência reforçada.

Experiências vicariantes fornecidas pelos modelos sociais

Ou seja, a oportunidade de observar outros a executar a tarefa. Ver as pessoas semelhantes a si com sucesso pelo esforço persistente influencia as crenças de autoeficácia, levando a acreditar que também se é capaz de dominar atividades comparáveis. O impacte da modelação sobre as crenças de eficácia pessoal é fortemente influenciado pela similaridade percebida com os modelos. As pessoas procuram modelos eficientes que possuem as competências a que aspiram. Através de seus comportamentos e formas de pensar expressas, os modelos competentes transmitem conhecimentos e ensinam habilidades e estratégias eficazes aos observadores para gerir as exigências do ambiente. Assim, os enfermeiros, através de processos de intervenção bem planeados, sistemáticos, contextualizados a cada família e com o seu envolvimento nas decisões, constituem “modelos” importantes no desenvolvimento das competências necessárias aos familiares cuidadores.

Persuasão social (receber um reforço positivo dos outros)

Pessoas persuadidas verbalmente que possuem a capacidade de dominar determinadas atividades são suscetíveis de mobilizar um maior esforço quando surgem problemas. Ajudar a construir e a reforçar a perceção de autoeficácia que leva ao sucesso na execução das tarefas é mais do que transmitir avaliações positivas. Passa também por encorajar as pessoas à autoavaliação do seu desempenho em termos de autoaperfeiçoamento e não apenas como triunfo sobre os outros.

Condição física e emocional no julgamento das suas capacidades quando envolvidos nas tarefas

As pessoas também dependem, em parte, do seu estado físico e emocional, quando fazem um juízo sobre as suas capacidades. Normalmente, interpretam as reações de stress e tensão como sinais de vulnerabilidade para um mau desempenho. Nas atividades que envolvem força e resistência, as pessoas julgam a sua fadiga e as dores como sinais de debilidade física. O humor também afeta o julgamento sobre a eficácia pessoal. Humor positivo aumenta a autoeficácia percebida. Influenciar positivamente as crenças de eficácia passa por melhorar o estado físico, reduzir o stress e as tendências emocionais negativas, bem como, construir interpretações corretas sobre a condição de saúde. O estado afetivo pode ter um efeito muito generalizado sobre as crenças de eficácia pessoal nas diversas dimensões do funcionamento humano.

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A supervisão do papel exercido pelos familiares cuidadores, após o regresso a casa do dependente, deve ser um aspeto central do exercício profissional das equipas de enfermagem. Assim, as intervenções de enfermagem visam facilitar o processo de aquisição do papel e passam por desenvolver a capacitação e dar suporte aos familiares cuidadores (Schumacher, 1995). Na transição para o papel de familiar cuidador, é crucial que o enfermeiro seja capaz de identificar as competências dos familiares, acerca das necessidades de cada situação específica, à qual, terão de dar resposta eficaz na assunção do papel. A natureza do envolvimento, os cuidados a assegurar, as mudanças a efetuar e o período de tempo de todo este processo, terão de ser foco de atenção dos enfermeiros. Na sua decisão clínica, estes profissionais devem enfatizar os aspectos considerados positivos no exercício do papel dos familiares cuidadores. Caso seja oportuno, incentivá-los a participar em grupos de ajuda, onde, através da partilha de dificuldades e experiências, se promove o seu envolvimento no processo de tomar conta (Zagonel, 1999). O elogio das competências dos familiares cuidadores, reforça-lhes a autoeficácia e, assim, sentem-se mais competentes para poderem lidar com os desafios (Mok, Chan, Chan, & Yeung, 2002).

A construção de autoeficácia por parte dos indivíduos na execução das tarefas tem apelado, consideravelmente, a uma organização teórica e de investigação, que permita o desenvolvimento de instrumentos de medida nesta área (Crncec, Barnett & Matthey, 2008). Schumacher et al. (2000), através da concretização de estudos, identificaram nove (9) “processos de cuidar” (competências), associados à habilidade dos familiares cuidadores para assegurar os cuidados necessários ao dependente (Tabela 1.3).

Assim, o papel de prestador de cuidados, conceptualmente, foi definido como a habilidade do familiar para se envolver, eficaz e progressivamente, nos nove “processos de cuidar”. O familiar cuidador, torna- se competente, quando consegue obter os melhores resultados possíveis dos cuidados que presta, como uma adequada gestão dos sinais e sintomas, a prevenção de lesões, a identificação precoce de problemas, entre outros. A habilidade nos cuidados prestados leva a resultados positivos.

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Uma das dimensões que nos parece determinante das transições e que é objeto do nosso estudo, é o destino após a alta hospitalar, enquadrando este, numa lógica de respostas de saúde e sociais disponíveis às famílias que integram membros dependentes. Damos como exemplo, as próprias famílias, as tipologias da RNCCI, os lares e as famílias de acolhimento. No próximo capítulo, o(s) destino(s) dos dependentes após a alta hospitalar, será matéria da nossa reflexão e, em particular, as respostas disponíveis na área geográfica do nosso estudo: o distrito de Braga.

1.1.6. Os destinos dos dependentes no autocuidado após a alta hospitalar e as transições