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6 TRAJETÓRIA DO ESTUDO DE CASO

6.1 O ESTUDO DE CASO

O estudo de caso é uma metodologia de pesquisa que possui como atributo característico a possibilidade de aprofundamento linear e vertical junto ao objeto de pesquisa demarcado, uma vez que todos os esforços de investigação ficam “[...] concentrados no caso visado, não estando o estudo submetido às restrições ligadas à comparação do caso com outros casos [...]” (LAVILLE; DIONNE, 1999, p.156). O estudo de caso é sempre bem demarcado, devendo ter seus contornos claramente definidos, uma vez que possui um interesse próprio e singular (LÜDKE; ANDRÉ, 1986, p.17). Assim, o propósito do estudo de caso não é produzir conhecimento com elevado potencial de generalização, revelando as características, em escala, de toda uma população ou conjunto de fenômenos correlacionados, mas, sim “[...] proporcionar uma visão global do problema ou de identificar possíveis fatores que o influenciam ou são por ele influenciados [...]” (GIL, 2002, p.55).

Um ponto que merece atenção redobrada reside na distinção entre a metodologia de estudo de caso e a pesquisa histórica. É corrente a confusão entre as duas perspectivas. Ambas as metodologias lidam com um campo epistemológico delimitado e convergente; ambas dispensam o controle sobre o objeto de estudo ou de elementos que o compõe. Com efeito, para Yin (2001, p.27)

o estudo de caso é a estratégia escolhida ao se examinarem acontecimentos contemporâneos, mas quando não se podem manipular comportamentos relevantes. O estudo de caso conta com muitas das técnicas utilizadas pelas pesquisas históricas, mas acrescenta duas fontes de evidências que usualmente não são incluídas no repertório de um historiador: observação direta e série sistemática de entrevistas. Novamente, embora os estudos de casos e as pesquisas históricas possam se sobrepor, o poder diferenciador do estudo é a sua capacidade de lidar com uma ampla variedade de evidências – documentos, artefatos, entrevistas e observações – além do que pode estar disponível no estudo histórico convencional.

Não obstante a ressalva dos limites epistemológicos para a generalização dos resultados de um estudo de caso (YIN, 2001, p.29), observamos que, se conduzido de modo criterioso, a possibilidade de generalizar dados provenientes de estudos de caso é significativamente potencializada. O fundamental é assegurar a identidade entre o objeto de estudo e o seu universo. Ou seja, garantir um grau relevante de homogeneidade entre os elementos fundamentais do universo do objeto de pesquisa e o próprio objeto. Para o presente trabalho, por exemplo, o perfil institucional de uma universidade federal brasileira possui, mesmo em sua singularidade, uma estrutura composta com características muito semelhantes às características do universo do sistema federal de ensino superior.

Assim, ao demarcar uma unidade do sistema federal de ensino superior, estaremos formalizando uma aproximação de todo o sistema nacional, através de um exceto significativo, considerando o contexto das referências legais, administrativas e políticas, que são de caráter universal e amplamente compartilhadas entre as universidades federais; contexto, aliás, implementado e cobrado pelo mantenedor, o governo federal. Ainda assim, vale observar a ressalva de Yin (2001, p.29)

uma resposta muito breve é que os estudos de caso, da mesma forma que os experimentos, são generalizáveis a proposições teóricas, e não a população ou universos. Nesse sentido, o estudo de caso, como o experimento, não representa uma “amostragem”, e o objetivo do pesquisador é expandir e generalizar teorias (generalização analítica) e não enumerar freqüências (generalizações estatísticas) .

A partir de uma atividade de pesquisa em uma unidade do sistema federal de ensino superior, no caso, a UFBA, esperamos, portanto, constituir uma percepção coerente do universo do sistema com base nos elementos que se repetem na fração do mesmo sistema, e que se constitui o nosso objeto de estudo. Também será possível, como sugere Yin (2001, p.29), inferir e produzir generalizações de caráter teórico sobre a gestão de universidades federais a partir da análise da dinâmica dos

fluxos documentais relativos à memória institucional e à informação de documental de caráter arquivístico.

Uma definição formal do estudo de caso admite que o método pode ser utilizado sempre que se fizer necessário lidar com condições contextuais muito complexas, onde o isolamento de variáveis ou a identificação precisa de um fenômeno específico não é possível, seja porque o fenômeno é diretamente influenciado por muitos fatores simultâneos, ainda que conhecidos; seja porque os fatores, ainda que poucos, não foram descritos e identificados de modo convincente.

O estudo de caso revela-se, portanto, um método eficaz quando oferece a possibilidade de se obter uma compreensão sintética do fenômeno em seu contexto, assegurando o seu envolvimento causal, fundamental para preservar a legitimidade do objeto que se quer estudar. A propósito, Yin (2001, p. 23)) lembra que um estudo de caso é uma investigação empírica que:

- investiga um fenômeno contemporâneo dentro de seu contexto da vida real, especialmente quando;

- os limites entre o fenômeno e o contexto não estão claramente definidos.

Assim sendo, o estudo de caso, hoje, “[...] é encarado como o delineamento mais adequado para investigação de um fenômeno contemporâneo dentro de seu contexto real, onde os limites entre o fenômeno e o contexto não são claramente percebidos [...]” (GIL, 2002, p.54). E, exatamente no nosso caso, admitindo a complexidade do nosso objeto de estudo, e procurando preservar o seu caráter unitário, não consideramos a possibilidade de intervir previamente com a finalidade de estabelecer distinções entre o fenômeno dos fluxos de informação arquivística e memória institucional na UFBA e o seu contexto imediato.

Caso procedêssemos de forma contrária, estaríamos correndo o risco de isolar variáveis e/ou fatores decisivos para a compreensão global do fenômeno. Trata-se, exatamente, de um dos propósitos fundamentais estabelecidos, também, por Gil (2002) para o método do estudo de caso:

e) explicar as variáveis causais de determinado fenômeno em situações muito complexas que não possibilitam a utilização de levantamos e experimentos (GIL, 2002, p.54).

Com efeito, o estudo de caso não procura “controlar” o contexto e o conjunto de suas variáveis; procura correlacionar um efeito ou disposição global de um dado contexto imediato a um fenômeno específico. Lembramos que outra vantagem do estudo de caso reside na baixa interferência que causa ao contexto do

objeto de estudo e ao próprio objeto, uma vez que apreende a realidade em sua integralidade, sem intervenções que procuram deliberadamente discernir e discriminar o contexto de variáveis e fatores do objeto de estudo. A investigação de estudo de caso, portanto,

- enfrenta uma situação tecnicamente única em que haverá muito mais variáveis de interesse do que pontos de dados, e, como resultado;

- baseia-se em várias fontes de evidências, com os dados precisando convergir em um formato de triângulo, e, como outro resultado;

- beneficia-se do desenvolvimento prévio de proposições teóricas para conduzir a coleta e a análise de dados (YIN, 2001, p.32-33).

Ainda segundo Yin (2001, p. 33)

[...] o estudo de caso como estratégia de pesquisa compreende um método que abrange tudo – com a lógica de planejamento incorporando abordagens específicas à coleta de dados e à análise de dados. Nesse sentido, o estudo de caso não é nem uma tática para a coleta de dados nem meramente uma característica do planejamento em si, mas uma estratégia de pesquisa abrangente.

O estudo de caso possibilita, ainda, o estudo por contraste, observando as adaptações e especificidades locais e os atributos do universo em questão, no caso, o sistema federal de educação superior. Em outras palavras, ao destacar as singularidades de uma fração do sistema, que são os atributos próprios do objeto de estudo que não se coletivizam no universo das universidades federais, acrescentamos novas características ao conjunto das características totais do sistema federal de ensino superior, além de detectar as resistências e discrepâncias locais quando da adaptação de uma determinação geral para o universo das universidades federais. Assim, o estudo por contraste entre o fundo homogêneo do sistema e uma eventual exceção do objeto de pesquisa pode caracterizar tanto um desvio quanto uma inovação organizacional.

O estudo de caso permite, portanto, através da comparação com o universo institucional das universidades federais, identificar na UFBA suas singularidades, o que possibilita descrever um delineamento preciso do seu perfil orgânico-estrutural. No nosso caso específico, vale ressaltar, o interesse recairá sobre os sistemas responsáveis pelo fluxo da informação de caráter arquivístico e pela dinâmica da memória institucional nas instâncias decisórias da UFBA.