• Nenhum resultado encontrado

Estudo sobre a identidade comparativa e estratégias de aculturação

Outro estudo, realizado mais tarde (Ros e Huici 1996), tratou, entre outras questões, de estabelecer uma relação entre a nossa conceptualiza- ção de identidade comparativa e o modelo de Berry (1980 e 1984b) sobre as diferentes formas de aculturação. Foi publicada uma descrição porme- norizada deste estudo em Huici, Ros e Gómez (2003). Berry descreveu algumas das estratégias empregues pelas minorias étnicas em situações de aculturação no seio de sociedades plurais. Estas estratégias consistem em manter ou não a distintividade étnica e em aceitar ou não a cultura do grupo maioritário. Embora o modelo original se refira a processos de aculturação de minorias étnicas, pensou-se que seria possível estabelecer um certo paralelismo com a situação existente em Espanha na fase de transição política para a democracia no que se refere à manutenção da diversidade cultural. No modelo de Berry alude-se precisamente à im- portância do facto de a sociedade maioritária seguir uma ideologia assi- milacionista ou uma ideologia tolerante perante a diversidade étnica. Im- porta considerar que em Espanha ocorreu uma mudança entre a época da ditadura, em que predominava uma ideologia assimilacionista e se contrariava a manifestação de sinais de diversidade cultural (como o uso de línguas autóctones que não fossem o castelhano), e o tempo da de- mocracia, em que se assiste ao fomento da igualdade entre os diversos grupos e a uma aceitação dos sinais de diversidade cultural. Assim, por exemplo, a democracia traduziu-se na institucionalização do uso das lín- guas autonómicas, que passaram a ser reconhecidas como línguas oficiais, além do castelhano, na Constituição de 1978.

As formas de aculturação propostas por Berry (1984b) são a assimila- ção, a integração, a separação e a marginalização. A assimilação consiste na adopção da cultura do grupo maioritário sem atender à manutenção da cultura do grupo minoritário. A integração caracteriza-se pela manu- tenção de ambas as culturas. A estratégia de separação caracteriza-se pelo interesse em manter a cultura própria do grupo minoritário e não adoptar

a do grupo maioritário. Quanto à marginalização, consiste na falta de in- teresse por qualquer das referidas culturas. Significa isto que as estratégias de aculturação se definem a partir do interesse relativo pelas culturas que coexistem numa dada sociedade.

Em princípio, o modelo de partida podia relacionar-se com a nossa conceptualização de identidade comparativa, que pressupõe, como já dissemos, a consideração simultânea de duas identidades ou, por outras palavras, a identificação relativa com duas categorias sociais.

Espera-se, pois, que exista uma relação entre as preferências pelas for- mas de aculturação propostas por Berry e a identidade comparativa, isto é, o grau de identificação com as categorias autonómica e nacional. Ao estabelecer a corresponência entre as duas perspectivas, seria de esperar que se verificasse: preferência pela estratégia de integração nos casos de alta identificação com a comunidade autónoma e com a Espanha; pre- ferência pela estratégia de assimilação nos casos de alta identificação com a Espanha e baixa identificação com a comunidade autónoma; preferên- cia pela separação nos casos de alta identificação com a comunidade au- tónoma e baixa com a Espanha; preferência pela marginalização quando houvesse baixa identificação com ambas as categorias.

Participaram neste estudo 464 estudantes universitários (85% mulheres e 15% homens) de faculdades pertencentes a seis comunidades autóno- mas espanholas (Andaluzia, Catalunha, Castela, Galiza, Madrid e País Basco). Os inquiridos foram classificados em função da identidade na- cional (alta/baixa) e da identidade autonómica (alta/baixa). Em termos gerais, os resultados obtidos corroboraram parcialmente as hipóteses no respeitante às preferências por estratégias de aculturação. Com efeito, houve dois grupos que se ajustaram às previsões: o grupo de identidade autonómica alta e identidade espanhola alta preferiu a estratégia da inte- gração e o grupo com identidade autonómica alta e baixa identidade es- panhola escolheu a estratégia da separação. Já o grupo em que ambas as identidades eram baixas pendeu para a estratégia da integração, e não para a da marginalização, e o grupo com alta identidade espanhola e identidade autonómica baixa escolheu não só a estratégia da assimilação, como se esperava, mas também a da integração. Verificou-se claramente que a estratégia da integração era preferida por três dos quatro grupos.

Ao compararmos os grupos uns com os outros, verificamos que os re- sultados se ajustam mais às previsões: assim, a marginalização foi mais escolhida pelo grupo com ambas as identidades baixas do que pelos três grupos restantes; a assimilação foi mais escolhida pelo grupo com alta identidade espanhola e baixa identidade autonómica do que pelos ou-

tros; a integração teve mais preferência por parte do grupo com ambas as identidades elevadas do que entre os outros três; a separação teve mais escolha por parte do grupo com identidade autonómica alta e baixa iden- tidade espanhola do que por parte de qualquer outro grupo. Tudo con- siderado, obtivemos um apoio moderado para as hipóteses de investiga- ção. Interessa sublinhar, por um lado, que a preferência pela integração surge relativamente distribuída pelos vários grupos e, por outro, que a marginalização é uma opção pouco contemplada por qualquer deles.

Por outro lado, este estudo revelou resultados semelhantes aos obtidos em trabalhos anteriores quanto à relação entre alta identidade compara- tiva e favoritismo nos casos em que o endogrupo correspondia à categoria autonómica e o exogrupo ao resto dos espanhóis.

Num estudo publicado na mesma altura que o nosso, Florack e Piont- kowski (2000) estabelecem uma relação entre a identificação europeia e nacional (no caso concreto, com a Alemanha e com a Holanda) e as ati- tudes face à participação e à aculturação no contexto da integração na União Europeia. A identificação com a Europa traduz-se no apoio à par- ticipação em diversos domínios sócio-estruturais, como o comércio, a justiça, etc. Também ficou patente um efeito conjunto das identificações a diferentes níveis na manutenção da cultura nacional. Os indivíduos com baixa identificação europeia e alta identificação nacional mostra- ram-se mais defensores da distintividade cultural da respectiva nação. Ve- rificou-se, pois, que uma alta identidade comparativa se traduz num menor apoio à estratégia de assimilação.

Identidade comparativa: relações