• Nenhum resultado encontrado

Diversos são os estudos que tratam argumentação pelo viés histórico, teórico e analítico, delineando desde a origem dos pressupostos da Retórica até uma visão mais atual da argumentação, dentre eles destacamos as pesquisas de Plantin (200127, 2008), Paulinelli (2014), Adam (2011), Pinto (2010), Amossy (2005, 2007, 2011), Fiorin (2015), Rodriguez (2005), Cabral e Guaranha (2014), dentre outros.

No contexto de uma perspectiva interdisciplinar, Pinto (2010) realiza um amplo apanhado teórico de abordagens e percurso histórico dos estudos da Argumentação, desde a retórica clássica até as abordagens linguístico-textuais. Essa autora recorre ao contributo de diversas perspectivas teóricas (Retórica, Nova-Retórica, Pragmático-semântica e Linguístico- Textual), oriundas de várias áreas das Ciências, para desenvolver condições para a análise de textos. De acordo com o trabalho de Pinto (2010, p. 11),

[...] a argumentação sempre esteve associada à história do homem em sua

práxis social. A própria vida democrática de nossas sociedades, desde a

Antiguidade, caracterizou-se pela capacidade que os indivíduos têm de debater, defender, contrapor e refutar ideias, ou seja, de argumentar, substituindo o confronto bélico pela discussão ou pelo debate. Apesar de

27PLANTIN, C. L’argu mentation entre discours et interaction. In:______. TOVAR, José Jesús d Bustos (Cord.). Lengua, discurso, texto: I Simpósio Internacional de Análise do Discurso, v.1, Espanha; Visor, 2001, p.71-92.

toda essa importância da argumentação como meio de intervenção interaccional e discursivo, ressaltada desde os primórdios, o seu estudo, se limitou, ao longo de décadas, a seguir modelos de análise que privilegiavam uma simplificação metodológica. (PINTO, 2010, p.11).

Pinto (2010) afirma que as práticas argumentativas linguísticas atuais têm os seus fundamentos na teoria e técnica de produção/recepção de discurso da antiguidade clássica, ou seja, os estudos relacionados à argumentação remetem- nos à herança aristotélica, sistematizadora dos estudos retóricos que é de suma importância para as teorias atuais sobre a argumentação. Na Nova Retórica, observa-se que ocorreu uma atualização e ressignificações de alguns preceitos aristotélicos. Atribui-se a Aristóteles, na Antiguidade clássica, o desenvolvimento dos estudos da retórica que gozava de grande prestígio no meio social, po is estava em consonância com o perfil democrático da sociedade ateniense.

Como vimos, os estudos da argumentação têm origem na tradição greco-romana, sendo Aristóteles, com os pressupostos da Retórica, seu principal precursor. Nesse contexto, Plantin (2008) também elucida sobre as origens da argumentação, afirmando que

[...] a argumentação foi inicialmente pensada como componente dos sistemas lógico, retórico e dialético, conjunto disciplinar cuja desconstrução foi completada no fim do século XIX. A construção de um pensamento autônomo da argumentação nos anos 1950 foi, sem sombra de dúvida, profundamente estimulada pela vontade de encontrar uma noção de “discurso sensato”, por oposição aos discursos fanáticos dos totalitarismos. As visões generalizadas da argumentação que emergiram nos anos 1970 tomaram perspectivas bem diferentes. (PLANTIN, 2008, p. 8).

Nesse arcabouço, Paulinelli (2014) elucida que as considerações filosóficas aristotélicas a respeito da argumentação, aliadas aos elementos próprios das Ciências da Linguagem, contribuíram para o surgimento das teorias da argumentação propostas. Ou seja, cada campo, com suas particularidades, com seus fundamentos e implicações, elegendo pontos de interesse específicos e trabalhando com orientações diferentes, apropriando-se do conhecimento legado pelos clássicos e criando ramificações que podem, em graus diferentes, contribuir para o aporte da argumentação no seu sentido mais amplo e atual.

Plantin (2001, p. 71-92) observou que as pesquisas a respeito da Retórica e da Argumentação se desenvolvem nos mais diversos campos disciplinares: os recentes trabalhos são concernentes à linguística (da língua, da enunciação e das interações) e também aos campos tradicionalmente ligados à argumentação, como a lógica, a retórica, a dialética, assim

como o direito e a filosofia. O referido autor defende que “esses diferentes domínios não têm, forçosamente, a mesma definição de argumentação e os mesmos métodos de trabalho”.

Pinto (2010, p.34-35) considera que as contribuições dos estudos aristotélicos são relevantes para as teorias atuais sobre a argumentação. Para ela, os postulados de Aristóteles apontam que os argumentos são utilizados em função da adaptação ao público, conforme os gêneros28: judicial, deliberativo e ep idíctico. O Judicial correspondia aos “discursos proferidos frente a juiz, atendendo aos interesses de cada uma das partes opostas envolvidas em um processo e o sítio institucional era o tribunal”. Tal gênero “objetivava a definição, pelo juiz, do certo ou errado em relação a um fato ocorrido”. No tocante ao gênero Deliberativo, ocorria, institucionalmente, em assembleias ou conselhos, visando determinar o que convinha realizar na comunidade e incluía as práticas discursivas empregadas quando da declaração de uma guerra ou, ainda, quando da necessidade de construção de algumas obras públicas. Já o gênero epidíctico ou demonstrativo “englobava os discursos de celebração (tanto de festas quanto de lutos)”. (PINTO, 2010, p. 34-35).

No que tange à definição de retórica, na visão do raciocínio argumentativo de Aristóteles, a pesquisadora lembra que é a arte de persuadir relativamente às coisas comuns sob o ângulo do justo e do injusto, bem como a “capacidade de extrair de qualquer tipo de assunto o grau de persuasão que ele comporta” e que era um “instrumento” que poderia ser usado a serviço tanto do bem quanto do mal)”, baseado em três tipos de provas, a saber: i) ethos: centrada na imagem do orador construído discursivamente; ii) logos: baseia-se no próprio discurso e iii) pathos: ancora-se nas paixões/emoções provocadas no auditório pelo discurso. (PINTO, 2010, p. 36-37).

28

Pinto (2010) pontua que os estudos da problemática dos gêneros originou -se na Antiguidade. Ou seja, o estudo do termo gênero obteve seu ponto de partida, no mundo ocidental, a partir do emprego do termo por Aristóteles para definição das partes da tragédia grega, composta de três elementos: co meço, me io e fim. Isso mostra o interesse em classifica r os gêneros do discurso. Observamos que a classificação aristotélica, inclu ía três tipos de discurso: (1) discurso deliberativo; (2) discurso judiciário; (3) discurso demonstrativo. Para Aristóteles, os ouvintes do discurso também possuíam três tipos de classificação: a pessoa que fala, o assunto de que se fala e a pessoa a quem se fala . Conforme o objetivo de cada pronunciamento, determinadas funções eram elencadas. Para o discurso deliberativo, tinha-se a classificação aconselhamento/desaconselhamento. Para a seg unda classificação atribuída ao discurso judiciário era fe ita: acusação/defesa. No que se refere à terceira classificação, ter-se-ia o elogio/censura para o discurso demonstrativo. A perspectiva teórica de Aristóteles, baseando -se na retórica, apresentava observações no que tange ao tempo verbal de cada tipo de discurso, pois, segundo ele, “cada um destes gêneros tem por objeto uma parte do tempo que lhe é próprio” (ARISTÓTELES, s.d., p. 39 apud VIAN, 1997, p. 34). O gênero deliberativo utilizar-se-ia do futuro, pelo fato da deliberação que seria feita; já para o gênero judic iário seria utilizado o te mpo passado, levando, pois, em conta as acusações que se referissem a algo já acontecido; por fim, para o último gênero demonstrativo, o tempo que seria usado e ra o presente, uma vez que, para elogiar ou censurar, fala -se essencialmente do estado presente das coisas. Considerando as perspectivas dos estudos textuais, trata mos dos gêneros na seção gênero discursivo/textual.

Muitos autores que tratam da conceituação de argumentação que se mostram afinadas com os posicionamentos que delimitamos para nossas análises poderiam ser mencionados e evocados. Como exemplo, citemos a abordagem de Breton (1996), para quem “a argumentação pertence à família das ações humanas que têm como objetivo convencer. [...] [Sua especificidade é] pôr em ação um raciocínio em uma situação de comunicação” (BRETON, 1996, p. 3 [1999, p. 7]).

Enquanto que para Alvarado e Yeannoteguy (2007, p. 64), “argumentar é dirigir ao outro (um interlocutor) um argumento, é dizer uma boa razão para admitir uma conclusão e induzir as condutas pertinentes”.

Já nas palavras do autor Bonini (2005), argumentar é “direcionar a atividade verbal para o convencimento do outro ou, mais especificamente, é a construção por um falante de um discurso que visa modificar a visão de outro sobre determinado objeto, alterando, assim, o seu discurso”. (BONINI, 2005, p, 220-221)29

.

Em uma perspectiva mais ampla sobre o conceito de argumentação, Amossy (2011) compreende a argumentação como a tentativa de modificar, de reorientar, ou mais simplesmente, de reforçar, pelos recursos da linguagem, a visão das coisas da parte do alocutário.

Meyer (2005, p.15 apud AMOSSY, 2011, p.131) define que argumentar consiste em encontrar os meios para provocar uma unicidade de resposta, uma adesão do interlocutor à sua resposta, e assim, suprimir a alternativa de seus pontos de vista originais, isto é, a pergunta que encarna essas alternativas (MEYER, 2005, p. 15).

Situado nesse percurso histórico, o estudo de Amossy (2011) considera que o discurso em situação argumentativamente orientado comporta em si mesmo uma tentativa de fazer ver as coisas de uma determinada maneira e agir sobre o outro. A posição contrária não precisa ser apresentada na íntegra, na medida em que a palavra é sempre uma resposta à palavra do outro, uma reação ao dito anterior q ue ela confirma, modifica ou rejeita.

Para Amossy (2011), no contexto dos estudos linguísticos, cabe ao analista descrever as modalidades da argumentação verbal da mesma forma que os outros processos linguageiros, numa estreita relação com eles. Para a autora, é preciso distinguir entre a intenção e a dimensão argumentativa. Mesmo que, por sua natureza dialógica, o discurso comporte, como qualidade intrínseca, a capacidade de agir sobre o outro, de influenciá- lo, é

29

BONINI, A. A noção de sequência textual na análise pragmático-te xtua l de Jean- Michel Adam. In:______. MEURER, J. L.; BONINI, A. M OTTA-ROTH, D. (Org.). Gêneros: teorias, métodos, debates. São Paulo: Parábola Ed itoria l, 2005.

preciso diferenciar entre a estratégia de persuasão programada e a tendência de todo discurso a orientar os modos de ver do(s) parceiro(s).

Nas observações de Pinto (2010, p12), alicerçadas pela Teoria do Texto, é preciso notar que os gêneros argumentativos têm finalidade e função persuasivas, ou seja, “buscam a adesão de um interlocutor a determinada ideia”. Tais gêneros podem ser objetos de descrições diferenciadas, em conformidade com as diferentes práticas sociais em que estão inseridos e com os mais diversificados recursos textuais escolhidos pelo agente produtor do texto.

Seguindo esse quadro teórico- metodológico, percebemos que os postulados da Nova Retórica buscaram atualizar os preceitos aristotélicos na esfera dos estudos linguísticos e pragmáticos. Vale destacar que o ressurgimento dos estudos da retórica argumentativa foi retomado a partir da segunda metade do século XX por estudiosos como Perelman e Toulmin. Tais autores da Nova retórica preocuparam-se com as técnicas argumentativas do discurso escrito, diferentemente dos teóricos clássicos que focaram no discurso oral.

Na abordagem dos estudos da Nova Retórica, de Chaïm Perelman, filósofo e jurista, e da argumentação no discurso, de Ruth Amossy, é possível correlacionar os principais aspectos de cada corpo teórico. Dessa forma, ao articular os postulados filosóficos de Perelman e as contribuições da Análise do Discurso, Amossy (2005, 2007, 2011) promove um notável avanço no campo dos estudos da argumentação, fornecendo ao campo dos Estudos da Linguagem um referencial teórico- metodológico que permite a realização de uma ampla análise linguístico-discursiva de diversos corpora de natureza persuasiva.

Platin (2008, p. 8)30 afirma que a argumentação “foi inicialmente pensada como componente dos sistemas lógico, retórico e dialético”. Para ele, a acepção de argumentação recebeu notoriedade por volta de 1958, momento em que dois estudos retóricos surgiram: “Os usos do argumento”, de Toulmin, publicado na Inglaterra e “O tratado da argumentação: a nova retórica”, de Perelman e Olbrechts-Tyteca, publicado na Bélgica. A obra perelmaniana, segundo Amossy (2011), impactou o cenário linguístico dos anos de 1960 e 1970, mas com ênfase nos estudos sobre o gênero judiciário e o discurso filosófico, repercutindo em contextos circunscritos e especializados de filósofos do Direito, buscando aliar os elementos da Retórica de Aristóteles a uma visão atualizada do assunto, empenhando a elaboração de uma Nova Retórica. Dessa maneira, assumimos que o discurso se tornou o objeto central de diversas tendências da Linguística moderna, como a Análise do Discurso, a Teoria do Texto e a Semântica Argumentativa, dentre outras.

30

Por sua vez, nesse contexto, vimos que os estudos perelmanianos ressaltam que a argumentação visa a provocar ou incrementar a “adesão dos espíritos ” às teses apresentadas ao seu assentimento, caracterizando-se como um ato de persuasão. É notório que os trabalhos desse autor deram impulso aos estudos sobre a argumentação. Nessa linha, nas palavras de Pinto (2010), a argumentação é “elaborada e co-orientada em função da adesão de um público”. (PINTO, 2010, p. 46¨). Essa autora assevera que os estudiosos da Nova-Retórica destacam três tipos de auditórios a serem considerados na construção argumentativa, a saber: universal, individual e o íntimo (PINTO, 2010).

No campo das teorias dos estudos linguísticos contemporâneo s, Amossy (2007, 2015), cujos esforços têm sido direcionados no sentido de propor uma articulação dos postulados da Nova Retórica aos instrumentos de uma análise linguística, com foco no viés textual- discursivo, apresenta avanços consideráveis para as pesquisas em argumentação. Essa autora é considerada a sucessora de Perelman na recuperação dos estudos retóricos, ao propor uma teoria de análise da argumentação em uma vertente textual-discursiva, partindo de clássicas considerações filosóficas e aliando-as aos elementos próprios das Ciências da Linguagem.

Em suas pesquisas, Amossy (2005, 2007, 2011) tem buscado uma redefinição da retórica perelmaniana como um dos ramos da Linguística do Discurso, ao fornecer- lhe instrumental teórico- metodológico adequado ao estudo concreto do discurso argumentativo. Essa autora postula que a obra de Perelman encontra-se bastante articulada aos recursos da linguística do discurso nas suas vertentes enunciativa e pragmática, no que se refere à atenção dada à situação de enunciação, à função do alocutário, ao saber comum e aos pressupostos que autorizam a interação verbal, assim como à eficácia da palavra definida em termos de ação. Em seus estudos, a pesquisadora identifica que a obra perelmaniana possui pressupostos do quadro enunciativo de Benveniste (1989).

Nessa mesma direção, Amossy (2007, p. 128)31 postula que a argumentação “[...] depende das possibilidades da língua e das condições sociais e institucionais q ue determinam parcialmente o sujeito, fora dos quais a orientação ou a dimensão argumentativa do discurso não pode ser apreendida com discernimento”.

Segundo essa autora, a Retórica, da qual se alimenta os pressupostos perelmanianos e também a linguística da enunciação, analisa a linguagem "em situação", na sua dimensão

31

AMOSSY, R. O lugar da argumentação na análise do discurso: abordagens e desafios contemporâneos. Tradução de Adriana Zavaglia. Fil ologia e linguística por tuguesa, São Paulo, n. 9, p. 121-146, 2007. Disponível e m: < file :///C:/ Users/pc/Downloads/59776-77213-1-PB%20(1).pdf>. Acesso em 10 mar. 2016.

intersubjetiva, em que o eu implica um tu, mesmo quando este não esteja explicitado por marcas linguísticas.

Nesse prisma, de acordo com Paulinelli (2014, p.397-398)32, a perspectiva retórica adotada pela Nova Retórica, considera que todo enunciado é direcionado no sentido do alocutário “com vistas a orientá-lo nos modos de ver e de pensar. O sujeito falante aciona o aparelho formal da enunciação não só para se comunicar, mas também para agir sobre o indivíduo a quem se dirige”, ou seja, os raciocínios, na argumentação, são desenvolvidos “por um locutor em função de um alocutário, nomeados respectivamente, por Perelman (1987), de orador e auditório, a exemplo da denominação que essas duas instâncias receberam na retórica clássica”.

Nessa ótica, outro ponto que destacamos são os pressupostos do Tratado da argumentação, no qual Perelman e O lbrechts-Tyteca (1996)33 mostram que todo o processo argumentativo, desde a escolha das premissas até as pala vras empregadas pelo orador no seu projeto de dizer persuasivo, é sujeito à incidência de valores, por isso a argumentação, para eles, é uma lógica dos juízos de valor. Esses autores mostram que, na seleção de epítetos e de qualificações para um determinado objeto, há uma orientação argumentativa, ou seja, as escolhas estão a serviço de um propósito argumentativo direcionado.

Por seu turno, Pinto (2010) tratando dos estudos de Perelman e O lbrechts-Tyteca (1988) ressalta que a argumentação corresponde ao co njunto de recursos verbais utilizados por um orador de forma a incitar o auditório a aderir a uma tese.

Nessa perspectiva, Amossy (2002)34 considera que a incidência dos valores e, consequentemente, da subjetividade na língua, é estudada de forma mais pontual pela linguística, através da pesquisa dos procedimentos linguísticos (modalizadores, termos avaliativos etc.) pelos quais o locutor imprime sua marca à enunciação, se inscreve na mensagem e se situa em relação ao outro. Paulinelli (2014, p.405), com base em Amossy (2002), destaca que essa marca pode ser encontrada pela análise linguística dos substantivos axiológicos (positivos ou negativos), dos adjetivos afetivos (aqueles que enunciam, ao mesmo tempo, uma propriedade do objeto que eles determinam e uma reação emocional do sujeito

32

PAULINELLI, M . de P. T. Retórica, argu mentação e discurso em retrospectiva. Linguage m e m (Dis)curso – Le md, Tubarão, SC, v. 14, n. 2, p. 391-409, maio/ago. 2014. Disponível e m:

<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&p id=S1518-76322014000200381>. Acesso 20 jan. 2016.

33

PERELMAN, C.; OLBRECHTS -TYTECA, L. Tr atado da argumentação: a nova retórica. Tradução Maria Ermantina Ga lvão G. Pe reira. São Pau lo: Mart ins Fontes, 1996.

34

AMOSSY, R. Nouvelle rhétorique et linguistique du discours. In: KOREN, R.; AMOSSY, R. (Orgs.) Après

falante diante desse objeto) e dos verbos ocasional ou intrinsecamente subjetivos. Analisar a linguagem e como ela se inscreve argumentativamente e concretamente no discurso, revelando a esquematização que restitui um raciocínio abstrato, permite ver como funciona, efetivamente, a estratégia de persuasão em dada situação de comunicação.

Nesse enfoque, de acordo com Amossy (2011, p.132), reconhecemos que o

o discurso argumentativo não se desenrola no espaço abstrato da lógica pura, mas em uma situação de comunicação em que o locutor apresenta seu ponto de vista na língua natural com todos os seus recursos, que compreendem tanto o uso de conectores ou de dêiticos [...].

Nesse aparato, essa autora considera e acrescenta outra condição intrínseca à linguagem: a da interação. Através de que um locutor leva em conta o alocutário sobre quem quer agir e em proveito de quem ele mobiliza um conjunto de recursos linguísticos e de estratégias discursivas mais ou menos programados. Em suas reflexões, Amossy (2011) entende que a argumentação se situa no quadro de um dispositivo de enunciação, na qual “o locutor deve adaptar-se ao seu alocutário, ou mais exatamente, à imagem que ele projetou” (nos termos de Perelman, o auditório é sempre uma construção do orador) (AMOSSY, 2011, p. 133).

É nessa perspectiva comunicacional e sóciohistórica que se faz necessário estudar a maneira como a argumentação se inscreve no âmbito textual-discursivo e no jogo do interdiscurso, considerando a escolha dos termos linguísticos, conectores, valor do implícito, o modo como o texto assimila a fala do outro pelas numerosas vias do discurso relatado, do discurso direto, dentre outros recursos linguístico-enunciativos mobilizados que são relevantes para conferir maior força argumentativa aos textos.

Diante de tais observações é possível indagar se toda enunciação carrega dentro de si um caráter argumentativo. A princípio, considera-se que o ato de utilizar a palavra nem sempre se destina a convencer alguém de alguma coisa. No nosso cotidiano, é possível encontrar textos que não possuem orientação estritamente argumentativa. Entretanto, mesmo não tendo a intenção de convencer, podemos depreender que na situação comunicativa buscamos exercer alguma influência, orientando as maneiras de ver e de pensar sobre o mundo e as coisas. Dessa forma, a argumentação é concebida como algo inseparável do funcionamento global do discurso, contribuindo para que os analistas da linguagem possam examinar a inscrição da argumentação na materialidade linguageira e em uma situação de comunicação concreta.

Tratar da argumentação, com base nessa reflexão, nos conduz também a outras observações de Amossy (2011) em diálogo com os postulados de Authier-Revuz (2004) sobre a relação da heterogeneidade da linguagem e a relação com os constructos da argumentação. Nesse contexto, a autora afirma que:

a heterogeneidade constitutiva é um dos fundamentos da fala argumentativa