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Etapa 1: Registros do cotidiano das escolas pesquisadas

Capítulo 7. Coleta e Análise dos Dados

7.3. Segunda fase da pesquisa: Aplicação do QAL

7.3.1. Etapa 1: Registros do cotidiano das escolas pesquisadas

Pelos registros o que nos chamou atenção foi a quantidade de escolas com ausência de gestores e coordenadores, o que atrasava em quase uma hora o início das aulas. Alguns professores esperavam os diretores e coordenadores para conseguir material didático, outros já com o material não entravam porque diziam que não tinham como conter os alunos nos corredores.

A rede estadual sofre constantemente no momento da escolha de seus gestores. Por falta de chapa eleitoral para concorrer às eleições, a Secretaria de Educação se vê obrigada a mandar interventores para assumirem a escola. A desorganização também é notada no calendário letivo que em todas as 18 escolas da rede estadual pesquisadas, estava atrasado, alguns terminavam o ano letivo de 2011 em maio de 2012.

Muitos professores, nem mesmo se habilitam a participar do pleito eleitoral, por medo da violência gerada por membros da comunidade onde se situa a escola e pela falta de apoio das Coordenadorias de Ensino e da Secretaria de Educação, bem como a gratificação financeira de R$ 200,00 que impossibilita um candidato a diretor geral, conseguir adjuntos para concorrer.

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Estes números equivalem dizer que a pesquisa foi realizada em 28% dos bairros de Maceió; 23% das escolas da rede pública estadual e municipal de Maceió que ofertam do 6º ao 9º ano e 11% de todos os professores da rede pública estadual e municipal de Maceió que lecionam do 6º ao 9º ano.

Muitas escolas possuíam enorme carência de funcionários e professores. Em algumas, os pais de alunos se reversavam na limpeza das salas de aula, banheiros e pátio. Também encontramos escolas que a merenda dos alunos era feita e distribuída pela direção da Escola porque não havia merendeiras, geralmente esta merenda era mais prática e menos nutritiva, de acordo com os alunos era constituída por bolacha e suco.

Esta reivindicação por um quadro completo de funcionários nas escolas foi refletido nas evocações, independente de atendimento das escolas ou dos bairros em que estavam situadas, como sem funcionário, sem gestão, sem coordenação, sem professores, quadro

incompleto e sem profissionais.

Na rede municipal, por ser escolas de menor porte e em sua maioria atenderem do 1º ao 5º ano e poucas do 6º ao 9º, ou seja, alunos menores de idade e com a presença mais efetiva dos pais, não enfrentam este problema, mesmo inseridas em comunidades com alta vulnerabilidade social.

As queixas dos professores pesquisados eram constantes contra o sistema público educacional, contra a indisciplina e desinteresse dos alunos, alguns chegaram a chorar enquanto nos falavam sobre a desvalorização que encontravam dentro da própria escola e da sociedade e o medo de lecionar.

Numa das escolas que visitamos, localizada em um bairro violento e com histórico de agressões contra a comunidade escolar, todos os professores pesquisados nos relataram que faziam uso diário de remédios controlados.

Alguns professores de escolas que atendiam a adolescentes infratores ou apenados diziam que era melhor terem feito concurso para carcereiro porque poderiam prender os alunos e usar armas, demonstrando um clima de total insegurança com relação ao corpo discente.

Muitos destes alunos não escondem suas infrações, seja por terem sido filmados pela mídia ou como forma de intimidação para delimitar seu espaço na escola. Todavia é cobrada, incisivamente, adequação às normas das Escolas para estes alunos pela equipe que os acompanha (orientador das regiões assistidas, assistente social, psicólogo e defensor). A Escola tem a obrigação de entregar um relatório semestral sobre cada um deles à Justiça, para que esta avalie os avanços e retrocessos do indivíduo no seu processo de ressocialização.

As escolas estaduais possuíam estrutura física maior que as escolas municipais, também tinham quadra de esporte; sala de vídeo; equipamentos eletrônicos de suporte às aulas e laboratório de ciências. Apenas 1 escola da rede municipal não possuía biblioteca.

A estrutura física das escolas da rede municipal era precária em sua maioria, escolas com poucas salas de aula, no máximo 10; quadros a giz; sem quadra de esporte, as que possuíam quadra não era utilizada ou por estarem ao lado das salas de aula ou por serem descobertas.

A maioria das escolas municipais se localiza em áreas de difícil acesso, ou seja, o transporte urbano não passa por elas e os professores recebem uma gratificação de R$ 100,00 por mês para se locomoverem até elas.

Ao tentar chegar a algumas escolas em bairros violentos, ouvimos fogos de artifício e os professores disseram que os traficantes faziam isso sempre que entrava na comunidade alguém ‘estranho’, todavia não fomos impedidos de fazer coleta em nenhum das escolas por conta da ação de criminosos.

Nas escolas que atendem e se localizam em bairros violentos ou não violentos e nas escolas que mesmo não matriculando estes alunos estavam inseridas em bairros violentos, vimos de tudo: depredação do patrimônio escolar com pichações pela escola, carteiras quebradas e até sendo arremessadas de um andar a outro pelos alunos; histórico de sequestro, de morte, de atentados a bala e de ameaça aos funcionários da escola; brigas com alunos ensanguentados; incêndio possivelmente provocado pelos alunos; professores sem motivação para ensinar, o que culminava em aulas mais curtas, ou seja, o professor demorava a entrar na sala e saía antes de terminar o tempo de aula, que na rede estadual é de 60 minutos.

Nas escolas que atendem a estes alunos, os professores trabalham com mais receio porque como eles mesmos nos afirmaram “quem já fez uma vez, faz de novo e pior”, fazendo referência às infrações ou crimes praticados pelos alunos e provável reincidência.

Numa escola que se localizava num bairro violento, mas não atendia a adolescentes infratores ou apenados, o fato de um pai ter entrado na escola para matar uma professora que retirou seu filho da sala, mesmo tendo ocorrido há alguns anos, servia de ‘aviso’ para outros professores.

O impedimento em colocar regras disciplinares na sala de aula pelo fator medo macula a autonomia do professor e limita sua atuação nos contratos didáticos, como resultado temos uma verdadeira confusão, onde a inversão de valores predomina.

Os alunos estereotipados como ‘delinquentes’, percebendo as fraquezas dos professores, ditam as regras em sala de aula e influenciam outros a usarem dos mesmos subterfúgios para obterem vantagem. Os professores também entendem que o período da internação ou da prisão é o momento de aprimoramento das práticas ilícitas dos alunos. Até

mesmo alguns alunos chamam as Unidades de Internação e a Unidade Prisional de ‘faculdade do crime’.

Em algumas conversas, percebemos que poucos professores acreditam que estes alunos podem ser ressocializados e a escola sem estrutura para recebê-los, é um impedimento para o êxito deste processo. Em nenhuma escola pesquisada encontramos assistentes sociais ou psicólogos para auxiliarem no tratamento aos alunos que cumprem medidas socioeducativas e até os alunos que chegavam às salas drogados.

Mesmo diante deste quadro, percebemos que os professores de Matemática, nutriam um sentimento de esperança com relação à Escola. Já os professores de Arte e de Educação Física eram os mais pessimistas, principalmente por conta das condições de trabalho a que eram submetidos – sem quadra poliesportiva, sem bola, sem rede, sem material na escola para desenhar ou pintar e sem poder solicitar aos alunos por conta das condições precárias dos mesmos – e pela cobrança de vários membros da comunidade escolar para que eles dessem aula de forma dinâmica para os alunos.