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Pesquisas Científicas: A presença de infratores e apenados nas Escolas e suas

Capítulo 2. A Escola, o infrator e o apenado nas Leis e em pesquisas científicas

2.4. Pesquisas Científicas: A presença de infratores e apenados nas Escolas e suas

Ao pesquisar as expressões dos adolescentes, em regime de semiliberdade, em relação a obrigação de frequentar as escolas regulares e o que esta situação representava para eles, Arone (2006) tinha como objetivo investigar e analisar os sentidos e significados da escola para adolescentes neste regime.

Os sujeitos de pesquisa de Arone (2006) foram adolescentes em semiliberdade que estavam no ensino médio regular de escolas públicas estaduais do Estado de São Paulo. Dentre suas indagações, uma nos chamou atenção por ter relação com o nosso objeto de pesquisa, será que o adolescente em conflito com a lei constrói relações com a comunidade

de sua escola regular, nos parâmetros de significação considerados adequados para a sociedade?

Durante sua dissertação, são expostas as dificuldades encontradas por ela para que os estudantes se expressassem verbalmente. A autora supõe que isso se deve ao fato de que como pesquisadora, a mesma adquire para os adolescentes um status de autoridade e os mesmos, na situação de internados7, costumam relacionar autoridades a pessoas que farão seu julgamento.

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Neste caso vale a recomendação de ficar calado, pois tudo que se fala poderá ser usado contra ele8.

As relações construídas por estes adolescentes vistas pelos atores educacionais9 são de conflito. A existência de alunos nestas condições na escola causa perplexidade para estes atores que mencionaram uma série de intervenções pedagógicas e disciplinares que não surtiram efeito. Então retomamos um dos questionamentos do nosso projeto de pesquisa: Os

tantos alunos, adolescentes, quer tenham cometido atos infracionais ou não, mas que trazem no discurso um forte apelo ao contexto social negativo, a estes não se direciona a escola?

Os resultados encontrados por Arone (2006) foram que estes adolescentes procuram acolhimento e aceitação dentro da escola e da sociedade, eles desejam ser vistos como sujeitos

em desenvolvimento e não numa situação de provisoriamente sujeitos. Mais uma vez

remetemos estes resultados para à nossa pesquisa, e indagamos qual a função social da escola para estes atores, em especial para os professores?

Entendemos que a escola pública, dentro de seus aspectos políticos e sociais, é um lugar privilegiado para o enfrentamento das desigualdades sociais, através de um projeto político pedagógico que efetivado, faça dos partícipes do processo educativo, sujeitos capazes de lutar pela igualdade de condições, sendo este apenas um dos elementos do qual depende a transformação.

Os alunos que recebemos, em sua maioria, já cumpriram ou cumprem medidas socioeducativas, outros são egressos do Sistema Penitenciário. Visando preservar a identidade destes adolescentes, somente têm acesso ao histórico do aluno, a secretaria escolar, coordenação e direção da escola.

A experiência profissional comprova que os alunos que estão/estiveram em conflito com a Lei ou os apenados costumam anunciar publicamente este fato, mesmo que tenha acontecido há tempos atrás. Percebemos que esta é uma forma que eles encontram de coagir e demarcar território dentro da escola, já que as escolas de fora das UI’s ou das Penitenciárias recebem alunos nesta situação e alunos que nunca cometeram atos infracionais ou crimes. Estes adolescentes usam inclusive este dado para intimidar professores.

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A Constituição Federal de 1988 inseriu, entre os direitos fundamentais, a prerrogativa do silêncio. Disposto no art. 5º, inciso LXIII: o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado.

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A autora não deixa claro que são estes atores educacionais, durante a dissertação fala-se em atores docentes, porém, acreditamos que ela se refere no caso de atores educacionais aos diretores, supervisores, orientadores e professores da escola. Este grupo não foi sujeito de pesquisa da autora, contudo, estas afirmações sobre a relação destes alunos com os demais componentes da escola vieram de sua experiência profissional na escola como professora, diretora e Conselheira Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente da Cidade de São Paulo.

Como uma forma de demonstrar que não estão numa situação de menosprezo em relação aos outros colegas, costumam se referir ao tempo no regime de internação como um período de férias num hotel, em que estão comendo às custas do governo e com segurança particular paga para protegê-lo. Percebemos que esta é uma tentativa de não serem estereotipados negativamente.

Ferreira (2011), em seu projeto de pesquisa sobre a identidade étnico-racial no regime de LA, levanta a hipótese de que, possivelmente, a fragilidade no processo da construção da identidade étnico-racial e a consequente baixa autoestima causada por ela, contribuem para a reincidência de atos infracionais, particularmente pelos adolescentes no regime de LA que frequentam escolas públicas de Maceió.

De acordo com a autora, isso ocorre uma vez que tais jovens passam a se identificar a grupos delituosos como forma de pertencimento social, incorporando de forma efetiva a identidade desses grupos nas suas práticas cotidianas.

Segundo Ferreira e Lima (2011),

Nesse contexto, o acesso à educação dos jovens em cumprimento de medida socioeducativa em meio aberto de Liberdade Assistida (LA) ocorre como medida protetiva, vinculada às ausências de acesso à educação básica. Especialmente para esse grupo social que recorrentemente é um educando

invisível no espaço educacional, nas suas necessidades de acionar uma

educação inclusiva e reflexiva, para o convívio social positivo. Esse mesmo educando quando passa a ter visibilidade no espaço escolar é marcado por diversas estigmatizações e violências simbólicas ao longo da sua jornada educacional (FERREIRA; LIMA, 2011, p. 2).

Dentro destas escolas não existe um olhar dirigido para esta problemática, o currículo é comum a todos e não há programas ou políticas públicas voltadas para esta realidade ou para esta outra cultura.

Como apresentamos nas pesquisas de Arone (2006) e Ferreira e Lima (2011), identificam-se em situações específicas, as implicações de determinadas práticas pedagógicas no cotidiano escolar. A ausência de uma reflexão sobre esta temática dentro das escolas também contribui para o processo determinístico na vida de jovens que entram em contato com a cultura das unidades ou das prisões.

Alguns obstáculos são percebidos, pela experiência profissional, quando se priorizam vieses burocráticos e discursos punitivos que contribuem com a exclusão de alunos, em particular, dos que estão em processo de ressocialização. As escolas acabam sofrendo com

estas atitudes em detrimento ao atendimento de seu corpo discente e da realização do projeto escolar.

Nestes casos, a função social da escola imbricada nos PCN, corroborada por pesquisadores da área de educação e ratificada no ECA e na Lei de Execuções Penais, ficam em segundo plano. Teoria e prática pedagógica podem sofrer um cisma no momento que o olhar dos educadores se volta para o cumprimento de obrigações desvinculado de um efetivo projeto de sociedade isonômico.

Para além desta perspectiva, questionamos até que ponto uma escola que não acompanha a evolução social, seus conflitos e interesses, contribui para os baixos índices de desempenho escolar nas disciplinas.