1 INTRODUÇÃO
1.4 Evolução da abordagem terapêutica da diabetes tipo 2
A complexidade inerente à gestão da diabetes, a par da diversidade de opções terapêuticas disponíveis, associado ainda ao facto destas poderem ser usadas em monoterapia, em associações ou simultaneamente com insulina, faz com que exista uma grande variabilidade na abordagem terapêutica desta doença.
Muitas vezes, graças à natureza progressiva da doença já referida anteriormente, ou a uma insuficiente adesão à terapêutica por parte do doente, é difícil obter controlo glicémico a curto e longo prazo. Isto leva a que a maioria dos doentes progridam através de regimes farmacoterapêuticos sucessivamente mais complexos (Rodbard et al, 2010).
Por outro lado, as guidelines de tratamento do diabético tipo 2, têm vindo a preconizar um controlo glicémico cada vez mais apertado, bem como a inclusão da metformina como agente terapêutico de 1ª linha (IDF, 2005; Duarte et al, 2007; Rydén et al., 2007; DGS, 2011; ADA, 2011).
Por fim, na última década, surgiram no mercado novas opções terapêuticas no tratamento da diabetes, quer através da introdução de moléculas inovadoras, quer da comercialização de associações fixas de ADOs já comercializados, mas que contribuíram naturalmente para uma modificação da forma como os doentes eram medicados.
42
Atendendo à diversidade expectável dos esquemas de tratamento da pessoa com diabetes tipo 2, efectuámos uma pesquisa exaustiva da literatura sobre esta temática, desde 1990 até à presente data.
Naturalmente que os resultados dos trabalhos que se apresentam de seguida têm que ser devidamente contextualizados, uma vez que foram implementados em settings distintos, recorrem a diferentes abordagens metodológicas e reportam-se a amostras seleccionadas com base em critérios de inclusão distintos, o que pode estar na origem de alguma variabilidade verificada, ainda assim, consideramos que é útil analisar a Tabela 5, já que faz uma sistematização da informação disponível sobre esquemas de utilização de antidiabéticos, nas últimas duas décadas.
Tabela 5: Resumo dos estudos que apresentam dados de padrão de tratamento de diabéticos tipo 2, publicados na literatura entre 1990 e 2011
Período de
tempo %SU %Big Monoterapia Politerapia Insulina
n.a. n.a. n.a. n.a. n.a. n.a. n.a. n.a. n.a. n.a. n.a. n.a. n.a. n.a. 77% 23% n.a. n.a. 35.9% 2.7% n.a. n.a. 63.3% 36.7% 67% 33% 43,10% 21,80% n.a. n.a. n.a. n.a. n.a. n.a. n.a. n.a. ADOs+Insulina DM1+DM2 Análise de Prescrições 22.9% 42% Referência País Diabéticos Estudados Metodologia Usada ADOs
7.8% 27% 64.9% 5,20% n.a. Wu e col (1998) Japão 67,40% 8% 39% n.a. 28,20% 48,50%
Khunti e col (1999) Reino Unido Informação de Auditorias Truter (1998) África do Sul
DM1+DM2
(n=1 100) Análise de Prescrições
n.a. Pogach e col (1998) EUA
DM2
(n=139 646) Registos Médicos 52%
57% 8%
n.a. 11,40% Wandell e col (1997) Suécia DM1+ DM2
n.a. n.a. Lioinis e col (1996) Grécia
DM1+DM2
(n=287) Registos médicos; visitas 64,90% 100%
n.a. 44% Vauzelle-Kervroedan e col (1995) Suécia
DM2
(n=241) Inquérito
7,80% 12,80% Vauzelle-Kervroedan e col (1995) França
DM 1+DM2
(n=1172) Inquérito 56% 62,10%
1.17% 10% Garancini e col. (1995) Itália
DM 1+DM2 (n=4547) Captura-Recaptura n.a. 20% Schranz (1994) Malta DM1+DM2 (n=11 112) Registos médicos 38,60% 39% n.a. n.a. Midthjell (1994) Noruega DM1+DM2 (n=2242) Inquérito n.a. 18% Vauzelle-Kervroedan e col (1993) França
DM2
(n=265) Inquérito 100% 54%
0.6% 55.2% Ferber e col (1993) Alemanha
DM1+DM2
(n=6478) Dados das Seguradoras
0.2% 27.7% Calle-Pascual e col (1993) Espanha
DM1+DM2
(n=853) Registos de Clínica Especializada 25.9% 39.6%
2.7% 9.9% Calle-Pascual e col (1993) Espanha
DM1+DM2
(n=538) Análise de Prescrições
0,20% 47,50% Vaccaro e col (1992) Itália
DM1+DM2 (n=296) Análise de Prescrições 85.8% 52.3% n.a. 41.8% Forrest (1990) Suécia DM1+DM2 (n=3482) Análise de Prescrições n.a. 0.97% Nielsen e col (1986) Dinamarca
DM1+DM2
(n=553) Análise de Prescrições 58.2% 35.6% Cohen e col (1990) Israel
DM1+DM2
44
Período de
tempo %SU %Big Monoterapia Politerapia Insulina
60.4% 24.7% 79,60% 3,90% 57,20% 31,40% n.a. n.a. '97=35,2% '97=8,2% '97=43,7% '97=13,1% '97=18,3% 1997-200 '00=26,1% '00=14,2% '00=43,7% '00=22,3% '00=13,0% 1999 59,50% 9,50% 60,90% 13,20% 1993-2003 n.a. n.a. ↑ todos países n.a. n.a. 1998-2003 n.a. n.a. Portugal 2006 46,80% 53,20% '94=42,1% '94=9,7% 1994-2004 '04=26,5% '04=34,8% n.a. n.a. 2004 34,80% 50,00% 69,90% 17,70% '00=17,5% '00=4,9% '00=31,3% '00=27,5% 2000-2003 '03=15,2% '03=9,8% '03=32,2% '03=25,8% '94=67% 1994-2007 '07=34% '07=54% n.a. n.a.
2005-2007 n.a. n.a. n.a. n.a.
2000-2006 n.a. n.a.
'99=59,3% '99=46,2% '99=66,4% '99=33,6% 1999-2006 '06=46% '06=57,8% '06=50,5% '06=49,5%
1999-2004 53% 40% -- --
Referência País Diabéticos Estudados Metodologia Usada ADOs ADOs+Insulina
1994-03, excepto I e P ↑ de forma variável ↓ como terap inicial terap inicial: 13% - 49,9% ≈ 8% da coorte inicial ↓ ligeiramente ↑ marcado (quase dobro) -- -- (n=35 514) n.a. mantev e-se quase inalterado (n=67 981) '00=5,4% '03=5,5% '00=8,3% '03=7,8% (n=23 729) 7,10% 16,90%
Plat e col (2009) Holanda
DM1+DM2 Base de dados (novos utilizadores em 1999) --
n.a.
'99=25,9% ''06=26,8% população abrangida
Mann e col (2009) EUA
DM1+DM2
Base de dados (NHANES)
'99=81,7% '06=90,2% Reino Unido
DM2 Base de dados de clínicos gerais (GPRD)
n.a.
'94=38% '07=28% população abrangida
Alexander e col (2008) EUA
DM2
Base de dados
'94=82% '07=47%
n.a. 9,30% Lub e col (2006) Holanda
Base de dados / Informação de dispensa das farmácias
prev pop total: 1,8% - 2,4%
↑ prev tratados=85%
Melander e col (2006)
10 países
europeus Informação de reembolso
↑ de forma v ariáv el n.a. duplicou UK e D; igual B,P, I ↑ prev tratados=11% ↑ prev tratados=227% Walley e col (2005) Reino Unido
Centros de Saúde / Informação de reembolso ↑ prev tratados=80% n.a. população abrangida DM1+DM2 população abrangida
Pablos-Valasco e col (2005) Espanha Centros de Saúde 84,10% 9,40% 2,10% '97=5,8% ''00=5,9% Cohen e col (2003) EUA Seguradoras
'97=49,2% '00=53,5% DM1+DM2 população abrangida DM1+DM2 (n=2 924) DM1+DM2 ('00 n=177 718) 23.1% 2.5% DM2 ( '97 n=81 324) Análise de Prescrições 48.7% 4,30% 7,10% Wandell e Gafvels (2002) Suécia
DM2 (n=160)
2,10% 14,50% Khaja e col (2001) Bahrain
DM 2 hipertensos
(n=1 463) Análise de Prescrições 88,60% 83.5% Dailey e col (2001) EUA
DM2
(n=37431) Segui/o coorte que iniciou ADO
1,50% 13,40% Vauzelle-Kervroedan e col (1999) França
DM1+DM2
(n=3 339) Prescrições / Seguradoras 85.1%
Duarte-Ramos e col (2006)
DM2 Questionários aplicados a doentes recrutados em farmácias
Falcão e col (2008) Portugal
DM1+DM2 Médicos Sentinela (Centros de
Saúde) 87,40% (n=4 561)
Mazzaglia e col (2008) Italia Rathmann e col (2007) Alemanha
DM1+DM2 Base de dados (Disease Analyser Database) '94=48,1% '04=52,4% n.a. '94=18,1% '04=26,1% (n=46 017) DM2
Base de dados de clínicos gerais
'00=65,5% '03=67,2% Yurgin e col (2007) Alemanha (n=5 135) Base de dados de clínicos gerais 87,60%
DM2
Período de
tempo %SU %Big Monoterapia Politerapia Insulina
2006-2008 -- -- 2006-2008 -- -- Jan-Mai 2006 28,10% 33,33% 24,70% 71,80% só SU '93=50,8% só Big '93=0% '93=51,1% '93=1,01% 1993-2005 '05=19,1% '05=24,1% '05=49,7% '05=13,9% 1994-2004 2005-2006 '00=78,6% '00=53,4% 2000-2008 '08=56,4% '08=66,5% ≈ 50% ≈ 50% 34% 10% 7% (n=13 877)
Referência País Diabéticos Estudados Metodologia Usada ADOs ADOs+Insulina
Rodbard e col (2010) EUA
DM2 Inquéritos populacionais 63% -- -- 40% '00=8,7% '08=10,2% mantev e-se quase inalterado população abrangida
Baviera e col (2011) Italia
DM1+DM2
Base de dados de reembolso
'00=75,9% '08=76,6%
n.a. pequena ↓ população >18anos
(n=218)
Neutel e col (2010) Canada
DM1+DM2 Coorte (NPHS) ↑ cerca 30% '93=1,36% '05=2,95% '93=20,3% '05=7,5% ('93 n=242; '05 n=324)
Beard e col (2010) EUA
DM1+DM2
Base de dados
''93=50,1% '05=60,6% Sultana e col (2010) India
DM2 Questionários aplicados a doentes hospitalizados 94,74%
--
mantev e-se quase inalterado Stewart e col (2009) EUA
DM1+DM2
-- Bases de dados de seguradoras (n=214 480) moderada tendência ↑ moderada tendência ↑ 11,46% ↓ ao longo do tempo '94=20% '04=46% ↑ ao longo do tempo pequena ↓
Cortez-Dias e col (2009) Portugal
DM1+DM2 Doentes de Médicos de Medicina
Geral e Familiar 89% -- -- 5% 6%
46
Da análise da Tabela 5, depreende-se que nos trabalhos que englobaram uma avaliação longitudinal, foi possível identificar, de um modo geral:
(i) um aumento da proporção de doentes tratados com ADOs;
(ii) uma diminuição da percentagem de doentes tratados com sulfonilureias e (iii) um aumento da percentagem de doentes tratados com metformina,
o que está de encontro com as guidelines mais recentes (Cohen et al, 2003; Walley et al, 2005; Melander et al, 2006; Lub et al, 2006; Rathman et al, 2007; Mazzaglia et al, 2008; Alexander et al, 2008; Filion et al, 2009; Mann et al, 2009; Stewart et al, 2009; Beard et al, 2010; Neutel et al, 2010; Baviera et al, 2011).
De acordo com dados do Relatório Anual do Observatório Nacional da Diabetes – Portugal, referentes a 2010, 89.4% dos diabéticos tipo 2, no nosso país, estavam medicados com antidiabéticos orais, 7.4% com insulina e 3.2% faziam terapêutica combinada de ADOs e insulina (OND, 2010).