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EVOLUÇÃO DO DIMORFISMO SEXUAL DE TAMANHO EM ARANHAS

No documento Ecologia e Comportamento de Aranhas.pdf (páginas 144-175)

ADALBERTO J.SANTOS

Entende-se como dimorfismo sexual qualquer diferença morfológica entre machos e fêmeas. Além das óbvias diferenças nos órgãos genitais, machos e fêmeas podem apresentar variações em várias características, como tamanho, coloração, plumagem e presença ou tamanho de presas, garras, chifres ou cornos. O que torna o dimorfismo sexual especialmente interessante para o estudo da biologia evolutiva é o fato de estar freqüentemente associado à ocorrência de seleção sexual (Anderson 1994).

Dentre as inúmeras formas de dimorfismo sexual conhecidas, o dimorfismo sexual de tamanho, quando machos são maiores ou menores que as fêmeas, é uma das mais disseminadas (Fairbain 1997). Em vertebrados endotérmicos (mamíferos e aves) os machos são em geral maiores que as fêmeas (Nylin & Wedell 1994, Fairbain 1997). O oposto ocorre nos vertebrados ectotérmicos, principalmente anfíbios e répteis, e nos artrópodes, cujos machos podem ser significativamente menores que as fêmeas (Anderson 1994, Fairbain 1997). As hipóteses apresentadas na literatura para explicar a evolução do dimorfismo sexual de tamanho são tantas e tão diversificadas quanto os grupos onde o fenômeno foi observado (Anderson 1994, Fairbain 1997, Nylin & Wedell 1994).

Aranhas são freqüentemente citadas como exemplo de grupo com acentuado dimorfismo sexual de tamanho (Darwin 1871, Ghiselin 1974). De fato, dentre as mais de 38.000 espécies de aranhas descritas, existem casos de variação extrema de tamanho entre machos e fêmeas (Figs. 7.1, 7.2), embora haja grande variação entre grupos. A Fig. 7.3 mostra as relações entre tamanho de

fêmeas e machos em 100 gêneros de aranhas, incluindo desde espécies onde não há dimorfismo sexual até outras em que os machos apresentam pouco mais de um sexto do comprimento total das fêmeas. Em alguns grupos pode-se observar grande variação intraespecífica de tamanho corporal, de modo que em algumas populações é possível encontrar machos maiores que fêmeas. Entretanto, não existem espécies com machos com mais que 1,5 vezes o tamanho das fêmeas, embora o oposto seja bastante comum. É justamente esta variação entre grupos que faz com que as aranhas constituam modelos interessantes para o estudo da evolução do dimorfismo sexual de tamanho.

Alguns casos de dimorfismo em aranhas merecem ser citados como exemplo de quão extremas podem ser as diferenças entre os sexos. Um caso particularmente interessante é o das aranhas boleadeiras do gênero Mastophora (Araneidae), um grupo de 48 espécies, melhor conhecidas por seu peculiar comportamento de captura de presas (Yeargan 1994, Levi 2003, veja capítulo 12 deste livro). Neste grupo as fêmeas podem ser de 6 a 8 vezes maiores que os machos. Observações de campo com três espécies da América do Norte (M. bisaccata, M. cornigera e M. hutchinsoni) indicam que os machos emergem das ootecas já adultos ou sub-adultos, faltando apenas uma ou duas mudas para atingirem a maturidade sexual (Gertsch 1955). Isto pode ser um indicativo de que a seleção sexual favorece o amadurecimento precoce dos machos destas espécies, às custas do desenvolvimento em tamanho.

Outro exemplo de dimorfismo sexual acentuado são as espécies dos gêneros Tidarren e Echinotheridium (Theridiidae). Nestes gêneros os machos não ultrapassam 1,5 mm de comprimento de corpo, o que é de um quinto a metade do tamanho das fêmeas (Levi 1955, 1980). O que é característico nestas aranhas é que os machos adultos carregam apenas um dos palpos, porque o outro é amputado pouco antes da última muda (veja uma descrição do comportamento de amputação em Knoflach & Van Harten 2000). Uma explicação antiga para este comportamento é que os machos destes gêneros seriam tão diminutos que não poderiam carregar os dois palpos, e por isto removeriam um deles. Esta hipótese, entretanto, é refutada pelo fato de que existem espécies de aranhas com machos do mesmo tamanho, ou mesmo menores, que carregam palpos

proporcionalmente do mesmo tamanho (ou mesmo maiores), sem a recorrer a amputações (Knoflach & Van Harten 2000: fig. 23). Por outro lado, a remoção de um dos palpos pode beneficiar os machos desses gêneros, aumentando sua capacidade locomotora. Um estudo recente (Ramos et al. 2004), baseado em experimentos com machos sub-adultos antes e após a amputação, mostrou que indivíduos com um palpo se locomovem com maior velocidade em fios de teia, conseguem percorrer maiores distâncias e apresentam maior probabilidade de sobrevivência após a exaustão. Uma vez que os machos de aranhas se locomovem muito mais que as fêmeas, a fim de localizar teias de parceiras em potencial, e freqüentemente competem para copular primeiro com determinada fêmea (veja abaixo), é plausível supor que o comportamento de amputação fixou-se nas espécies destes gêneros como uma adaptação à competição intrasexual.

Estes são apenas alguns exemplos de dimorfismo sexual de tamanho em aranhas, e outros serão citados ao longo desta revisão. Por que existem diferenças tão extremas de tamanho entre machos e fêmeas de aranhas? Como se explica que em algumas espécies os machos tenham o mesmo tamanho das fêmeas, enquanto que em outras da mesma família, ou até do mesmo gênero (Piel 1996, Hormiga et al. 2000) estes são tão pequenos? Até o momento foram propostas pelo menos 13 hipóteses para explicar as variações no grau de dimorfismo sexual de tamanho em aranhas (Vollrath 1980a, Downes 1981, Jocqué 1983), e muitas delas não são mutuamente exclusivas. Nesta revisão, serão descritas e comparadas as hipóteses mais discutidas na literatura, bem como os métodos empregados na elaboração e teste destas hipóteses (Quadros 7.1 e 7.2). A evolução do dimorfismo sexual de tamanho é estudada através de duas abordagens metodológicas: análises de dados comparativos envolvendo várias espécies ou estudos detalhados de história de vida de espécies-modelo. Estas abordagens são complementares, e por isto ambas serão analisadas.

A maioria dos estudos com espécies-modelo se baseia em dados de história de vida de espécies do gênero Nephila (Tetragnathidae, Fig. 7.1B). Este gênero inclui algumas das mais estudadas espécies de aranhas, tanto no que se refere a comportamento e ecologia quanto a fisiologia ou bioquímica. Até o momento foram descritas 27 espécies de Nephila, distribuídas em

todos os continentes, sendo N. maculata (da Nova Guiné), N. edulis (Austrália) e N. clavipes (América) as mais estudadas. Algumas características fazem deste grupo um excelente organismo- modelo para biologia evolutiva, como sua ampla distribuição, alta abundância local, seu tamanho avantajado e seus hábitos de construir teias em áreas abertas, o que freqüentemente facilita observações de campo. Além disto, este gênero apresenta espécies com alto dimorfismo sexual de tamanho, já que as fêmeas podem ser até 11 vezes maiores que os machos (Higgins 2002). A primeira, e também uma das mais discutidas, hipótese a ser apresentada nesta revisão usa uma espécie de Nephila como modelo. Como será mostrado a seguir, este fato teve uma importância especial para a discussão desta hipótese por autores subseqüentes.

O Modelo da Mortalidade Diferencial (MMD)

Esta hipótese surgiu como uma elaboração de um modelo proposto por Ghiselin (1974), conhecido como “a síndrome do macho anão”, originalmente baseado em dados de história natural de peixes marinhos da superfamília Ceratioidea. Os ceratióides são predadores que ocorrem em regiões afóticas de alta profundidade dos oceanos, embora as larvas sejam em geral planctívoras de baixa profundidade. Na fase adulta os machos destes peixes são significativamente menores que as fêmeas, apresentam várias características morfológicas adaptadas para localizar parceiras para acasalamento e são incapazes de se alimentar. Quando encontram fêmeas, após um longo período de buscas do qual poucos sobrevivem, os machos se ligam a seus corpos, mantendo-se como ectoparasitas até o momento da desova. Segundo Ghiselin (1974) estas características estariam ligadas à baixa densidade de fêmeas adultas nos oceanos e, portanto, ao alto custo para sua localização, o que favoreceria machos pequenos, de maturação precoce e alta capacidade de deslocamento. Em teoria, este modelo se aplicaria a diversos grupos animais, como cracas, alguns moluscos marinhos, pequenos metazoários marinhos dos filos Echiura e Cycliophora (Ghiselin 1974, Vollrath 1998) e, segundo Vollrath & Parker (1992), aranhas.

O Modelo da Mortalidade Diferencial (MMD) de Vollrath e Parker (1992) foi elaborado a partir de observações de história de vida de Nephila clavipes no Panamá. Assim como as outras espécies estudadas neste gênero, N. clavipes apresenta um ciclo de vida anual: as fêmeas nascem, atingem a maturidade reprodutiva, copulam, constróem suas ootecas e morrem em menos de um ano, sendo que os filhotes nunca encontram seus pais. No Panamá, diferente do que acontece em populações na América do Sul e América do Norte, esta espécie apresenta não uma, mas duas gerações anuais (Vollrath 1980b).

Durante o período de desenvolvimento, machos e fêmeas não apresentam diferenças de comportamento, construindo suas teias nos mesmos tipos de hábitats. Por isto, durante esta fase da vida ambos apresentam taxas de mortalidade similares (Fig. 7.4). Uma mudança significativa de comportamento ocorre quando os machos ficam adultos, cerca de um mês antes das fêmeas e em média com três mudas a menos. Os machos adultos abandonam suas teias e se deslocam pela vegetação à procura de fêmeas, o que implica em altas taxas de mortalidade para estes indivíduos (Vollrath 1980b). Enquanto isto as fêmeas, já maiores que os machos, apresentam taxas de mortalidade iguais ou ainda menores do que no início do desenvolvimento (Fig. 7.4). Os machos que sobrevivem ao período de deslocamento pela vegetação e encontram fêmeas passam a viver como comensais em suas teias e se acasalam várias vezes até morrerem, o que sempre acontece antes da postura dos ovos. Segundo Vollrath & Parker (1992), a alta mortalidade dos machos no início da fase adulta desviaria a razão sexual da população para fêmeas, o que diminuiria a competição entre machos, eliminando pressões seletivas que favoreceriam indivíduos maiores. De acordo com um modelo matemático apresentado por estes autores, estas características de história de vida levariam à evolução de machos pequenos e de maturação precoce. Este modelo foi validado por dados retirados da literatura que sugerem que o dimorfismo sexual de tamanho é mais acentuado em aranhas construtoras de teias e aranhas que caçam por emboscada, se comparadas a espécies errantes (Vollrath & Parker 1992: fig. 3). Espécies em que tanto os machos quanto as

fêmeas se deslocam freqüentemente não apresentariam diferenças de taxas de mortalidade entre os sexos, o que não favoreceria machos pequenos.

O modelo de Vollrath e Parker tem sido intensamente discutido, e na maioria das vezes refutado, na literatura nos últimos anos. Embora algumas observações de história natural com outras espécies tenham apresentado suporte a esta hipótese (Main 1990, Piel 1996), várias falhas nas premissas deste modelo, e nos métodos de análise empregados por Vollrath & Parker (1992) foram apontados.

Um dos problemas desta hipótese é que ela baseia-se em dados história de vida de algumas populações de uma espécie (N. clavipes) em uma área geográfica restrita (Panamá). Por isto, não se sabe o quanto suas conclusões são generalizáveis, uma vez que existem poucos estudos de campo sobre padrões de mortalidade de machos e fêmeas ao longo do desenvolvimento. Em um estudo recente com duas espécies de Lycosidae, Walker & Rypstra (2003) refutaram a conexão proposta por Vollrath & Parker (1992) entre dimorfismo sexual de tamanho e diferenças intersexuais de história de vida. À primeira vista, as espécies estudas por estes autores se encaixariam com perfeição no MMD: a espécie com maior dimorfismo, Hogna helluo, apresenta fêmeas e juvenis sedentários, caçadores por emboscada. Por outro lado, em Pardosa milvina tanto machos quanto fêmeas são caçadores errantes e não apresentam diferenças significativas de tamanho. Seria de se esperar, de acordo com o modelo de mortalidade diferencial, que machos apresentassem maiores taxas de mortalidade que fêmeas em H. helluo, mas não em P. milvina. Entretanto, Walker & Rypstra (2003) observaram o oposto. Este estudo apresenta um problema metodológico, os ensaios de campo não foram feitos simultaneamente, mas em anos diferentes para cada espécie. Infelizmente os autores não apresentam dados sobre a densidade de predadores em cada período de estudo, o que certamente poderia afetar seus resultados. Mesmo com estes problemas, o estudo de Walker & Rypstra concorda em um detalhe com outros trabalhos publicados: machos de aranhas são em geral mais ativos que fêmeas, já que cabe a eles localizar parceiras para acasalamento. Isto é

verdade tanto em espécies com alto dimorfismo sexual de tamanho, quanto em espécies monomórficas (Schmitt et al. 1990).

Mesmo que sejam obtidos mais dados mostrando uma correlação entre diferenças intersexuais de história de vida e taxas de mortalidade em várias espécies de aranhas, um problema teórico do MMD permanecerá não resolvido. As relações entre taxas de mortalidade, tamanho e idade de maturação sexual foram estudadas em vários organismos. Em geral, indivíduos que adiam a maturação sexual, e portanto atingem maior porte na idade adulta, são favorecidos por uma maior fertilidade e, muitas vezes, maior capacidade de defesa contra predadores. Entretanto, quando a probabilidade de morte antes da idade reprodutiva é alta, por exemplo devido à pressão de predação, a seleção natural favorece maturação precoce, com menor tamanho dos adultos (Stearns 1992). Isto não se aplica ao modelo da mortalidade diferencial porque os machos de N. clavipes apresentam probabilidade de sobrevivência menor que as fêmeas após a maturação sexual (Fig. 7.4). Uma vez que a mortalidade de juvenis de ambos os sexos é similar nesta espécie, não seria esperado que um deles fosse selecionado para atingir a maturidade sexual antes do outro. Ao contrário, se a pressão de predação é o principal fator de mortalidade de machos adultos, uma possível resposta evolutiva seria os machos adiarem a maturação sexual, de modo a atingir maior tamanho corporal. Existem alguns exemplos na literatura que mostram que aranhas de maior porte são menos vulneráveis a predadores (Higgins 2002, Walker & Rypstra 2003).

Outra falha nas premissas do MMD é o suposto desvio da razão sexual operacional resultante da alta mortalidade dos machos, o que diminuiria a pressão de competição por fêmeas. Observações de campo com Nephila clavipes mostraram que as teias das fêmeas freqüentemente abrigam mais de um macho, podendo conter até oito indivíduos. Isto implica em intensa competição por acesso à fêmea, o que se traduz em lutas onde os machos maiores ganham com maior freqüência, e têm mais oportunidades de cópula (Christenson & Goist 1979). O mesmo foi observado para Nephila plumipes (Elgar & Fahey 1996) e N. maculata (Robinson & Robinson 1976b). Os dados de Vollrath (1980b) mostram que o desvio para fêmeas da razão sexual

operacional de N. clavipes ocorre a partir da segunda metade da estação reprodutiva. Isto significa que por metade do período de acasalamento, os machos estão sujeitos a competição por acesso às fêmeas. Estes dados são especialmente importantes quando se considera que N. clavipes apresenta sistema de acasalamento com precedência de esperma do primeiro macho. Como será melhor explorado abaixo, nesta espécie o primeiro macho a copular com determinada fêmea fertiliza uma proporção maior de seus ovos que os machos que o sucedem (Christenson & Cohn 1988). Com isto, a estratégia adotada por estes machos é colonizar as teias das fêmeas quando estas ainda estão imaturas (a única forma segura de ser o primeiro macho a copular) e lutar para manter outros machos afastados até que elas fiquem adultas (Austad 1984). Como no início da estação reprodutiva há mais fêmeas sub-adultas (Vollrath 1980b), é justamente neste período, quando há cerca de três machos para cada fêmea, que se espera uma competição mais intensa entre os machos.

Além de todos estes problemas nas premissas do MMD, Vollrath & Parker têm sido criticados na literatura por uma falha nos métodos de análise estatística empregados. Ao comparar grupos de aranhas com diferentes comportamentos de captura de presas (aranhas errantes vs. aranhas de teia e caçadores de emboscada) em relação ao dimorfismo sexual de tamanho, eles trataram cada espécie como uma informação independente. Este procedimento é atualmente considerado condenável, uma vez que ele ignora o efeito do parentesco filogenético entre as espécies (Quadro 7.2). Atualmente sabe-se que espécies filogeneticamente aparentadas não podem ser tratadas como estatisticamente independentes em estudos deste tipo, o que demanda o uso de métodos específicos de análise, conhecidos coletivamente como Métodos Filogenéticos Comparativos (Harvey & Pagel 1991, Diniz-Filho 2000). A inclusão de informações filogenéticas em estudos de ecologia evolutiva teve um profundo impacto sobre o estudo do dimorfismo sexual de tamanho em aranhas, como será mostrado no tópico a seguir.

Padrões filogenéticos de dimorfismo sexual em aranhas – parte 1

O primeiro estudo sobre padrões de dimorfismo sexual de tamanho em aranhas a avaliar o efeito do parentesco filogenético entre as espécies foi publicado por Head (1995). Neste trabalho foram analisadas as relações entre tamanhos de machos e fêmeas de várias espécies de aranhas da América do Norte, listadas por Kaston (1981). Para descontar o efeito do parentesco filogenético entre as espécies, foram usadas famílias como unidade de análise. Além disto, os dados foram analisados em relação a uma hipótese filogenética apresentada por Kaston (1981) através regressão de contrastes filogeneticamente independentes (Quadro 7. 2). Os resultados mostraram que fêmeas tendem a ser maiores que machos, uma vez que a regressão linear entre tamanho de fêmeas e tamanho de machos apresentou inclinação maior que 1 (Head 1995). Além disto, os resíduos desta regressão se mostraram significativamente correlacionados ao número de ovos produzidos por cada espécie, sugerindo que diferenças de tamanho entre machos e fêmeas poderiam ser explicadas por diferenças de fecundidade (Head 1995). Com estes resultados, pode-se concluir que o dimorfismo sexual em aranhas seria o resultado de seleção natural para aumento da fecundidade através do aumento do tamanho das fêmeas, o que ficou conhecido na literatura como a Hipótese da Vantagem em Fecundidade (fecundity-advantage hypothesis). Em outras palavras, não são os machos de aranhas que são pequenos, as fêmeas é que são grandes.

Os resultados de Head (1995) merecem ser analisados em detalhe. É importante mencionar que, ao contrário do que este autor conclui, o simples fato de se obter uma reta com inclinação acima de 1 em uma regressão entre tamanho de machos (no eixo x) e tamanho de fêmeas (no eixo y), não indica quem aumentou ou quem diminuiu de tamanho. O que este resultado mostra é que as fêmeas são em geral maiores que os machos, não permitindo determinar se são elas que crescem mais que os machos ou se são estes que param de crescer em um tamanho menor (Quadro 7.1). Por outro lado, o fato dos resíduos desta análise apresentarem uma correlação positiva significativa com a fecundidade das espécies (medida pelo número de ovos produzidos) claramente sugere que as variações de tamanho entre os sexos estão ligados ao aumento do tamanho das fêmeas, que assim

produziriam mais ovos. A relação entre tamanho de fêmeas e fecundidade já foi demonstrada em vários grupos de artrópodes (Berringan 1991). Em aranhas, tanto comparações intraespecíficas (Myashita 1986, Higgins 2002, Legrand & Morse 2000) quanto interespecíficas (Petersen 1950) mostram claramente que fêmeas maiores produzem mais ovos. Esta relação se mantém mesmo descontando-se o efeito do parentesco filogenético entre as espécies (Marshall & Gittleman 1994, Head 1995, Prenter et al. 1999).

Os resultados descritos acima vão de encontro às previsões de Vollrath & Parker (1992), uma vez que o Modelo da Mortalidade Diferencial prevê que o dimorfismo sexual em aranhas seria resultado de uma diminuição no tamanho dos machos em relação às fêmeas. O uso de métodos filogenéticos comparativos permitiu também questionar outra premissa do MMD, a relação entre dimorfismo sexual de tamanho e comportamento de caça. Prenter et al. (1997, 1998) mostraram através de regressão de contrastes filogenéticos que aranhas de teia e caçadoras de emboscada não são necessariamente mais dimórficas que aranhas errantes.

Um dos aspectos mais evidentes e mais marcantes destes estudos está na relação observada entre tamanho de machos e tamanho de fêmeas (Prenter et al. 1997, 1998), resultante de análise de regressão com contrastes filogenéticos. O que estes autores obtiveram foram retas de inclinação muito próxima a 1, o que sugere que levando-se em conta uma ampla amostragem taxonômica, e descontando-se o efeito do parentesco filogenético, aranhas não são um grupo com alto dimorfismo sexual. Apesar disto, todas as observações mencionadas acima mostram que, quando há um desvio significativo de tamanho entre os sexos, as fêmeas tendem a ser maiores que os machos. Isto foi demonstrado por Prenter et al. (1999), que novamente analisaram a relação entre tamanho de machos e fêmeas e fecundidade, desta vez empregado hipóteses filogenéticas melhor corroboradas (Coddington & Levi 1991). Observou-se que aranhas não apresentam dimorfismo sexual acentuado quando se desconta o efeito do parentesco filogenético entre as espécies. Entretanto, fêmeas tendem a ser maiores que os machos, e estas diferenças de tamanho estão correlacionadas à fecundidade das espécies, como observado por Head (1995).

Todos os dados comparativos entre grupos de aranhas analisados até o momento sugerem que a seleção para aumento de fecundidade através do aumento de tamanho das fêmeas seria a

No documento Ecologia e Comportamento de Aranhas.pdf (páginas 144-175)