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FORRAGEAMENTO DE ARANHAS NA VEGETAÇÃO

No documento Ecologia e Comportamento de Aranhas.pdf (páginas 67-91)

GUSTAVO Q.ROMERO &JOÃO VASCONCELLOS-NETO

O animal mais eficiente poderia encontrar alimento a uma taxa indefinidamente alta e manipular (perseguir, subjugar, consumir e digerir) os itens alimentares em um período de tempo insignificante. Evidentemente, nenhum animal age desta forma devido a vários fatores, como limitações físicas do esqueleto e musculatura, e defesas químicas e/ou mecânicas das presas (Harvey 1994). Entretanto, sabemos que animais têm grande capacidade de obter informações sobre o ambiente e utilizá-las para tomar decisões sobre onde e quando forragear. Isto levou ao desenvolvimento de modelos de comportamento de forrageamento que usam o aprendizado como um componente essencial (McNamara & Houston 1985). A dieta ótima, em quantidade e qualidade dos itens alimentares, também deve ser considerada como um componente importante, pois atuará diretamente na aptidão do animal. Portanto, estratégias de forrageamento são rigorosamente moldadas pela seleção natural (Schoener 1971; Huey & Pianka 1981; Morse & Stephens 1996).

Existem duas formas básicas de se encontrar uma presa: esperar por ela (predador senta-e- espera) ou procurá-la ativamente. Huey & Pianka (1981) compararam as várias características comportamentais, fisiológicas e cognitivas entre lagartos predadores que capturam suas presas ativamente ou por emboscada. Verificaram que enquanto os que caçam por emboscada apresentam baixas capacidade de aprendizado e taxa metabólica, e capturam presas ativas e pequenas; os predadores ativos têm grande capacidade de aprendizado e memória, alta taxa metabólica e capturam presas sedentárias, imprevisíveis e geralmente grandes. Janetos (1982b) também comenta

que a estratégia de caça ativa é favorecida quando o custo para se mover é baixo ou quando a diferença entre sítios ricos e pobres em alimento é grande.

Para obter alimento, os animais devem primeiramente encontrar um habitat favorável, depois um microhabitat favorável e, por fim, escolher os tipos de presas que irão consumir (Hassell & Southwood 1978). Entretanto, os habitats são heterogêneos e podem estar constituídos de microhabitats de diferentes qualidades (disponibilidade de presas). Por isso, a habilidade em selecionar microhabitats ou sítios de forrageamento de melhor qualidade parece ser uma adaptação para obtenção de alimento, cuja distribuição no tempo e espaço é heterogênea (Stephens & Krebs 1986). Uma vez sobre sítios de forrageamento ótimos, os predadores selecionam as presas pelo seu tamanho, táxon, comportamento, toxicidade (impalatabilidade), grau de periculosidade e disponibilidade. Mas geralmente a seleção do item é complexa e dependente de várias destas características. Enquanto alguns animais respondem diretamente aos estímulos da mancha de recursos, outros podem ser atraídos pelo item alimentar per se, como parasitóides que são atraídos por substâncias voláteis provindas diretamente das vítimas, ou polinizadores que são atraídos pelas fragrâncias florais e, portanto, encontram a mancha de recursos quase acidentalmente (Hassell & Southwood 1978).

A vegetação deve ser considerada como um complexo muito heterogêneo de ambientes (Morse et al. 1985; Sugihara & May 1990; Scheuring 1991) e os animais que vivem associados a ela devem apresentar características morfológicas e comportamentais que facilitem a captura das suas presas. Aranhas estão entre os artrópodes mais comuns que habitam a vegetação (e.g. Wise 1993) e, por geralmente não consumirem tecido vegetal, são consideradas elementos importantes nos estudos que investigam como a estrutura do habitat afeta a comunidade de artrópodes (Gunnarsson 1990, 1992; Romero & Vasconcellos-Neto 2005a).

Neste capítulo discutiremos diferentes tipos de comportamento de captura de presas por aranhas errantes sobre a vegetação, como e porque escolhem determinados microhabitats para forragear, quais as conseqüências desta escolha para o indivíduo e sua prole, porque algumas

espécies de aranha ocorrem especificamente sobre determinadas espécies de plantas e em que situações as aranhas se alimentam fluidos vegetais (e.g. néctar) e pólen.

Principais guildas e famílias de aranhas na vegetação

As aranhas desenvolveram várias estratégias para capturar suas presas. Enquanto alguns grupos adotam a postura senta-e-espera, outros forrageiam ativamente na vegetação. Uma classificação recente dos diferentes modos de forrageamento em aranhas, baseada em análises quantitativas de características ecológicas das famílias, foi proposta por Uetz et al. (1999), que propuseram oito guildas: 1) caçadoras por espreita (ex. Salticidae e Oxyopidae), 2) caçadoras por emboscada (ex. Thomisidae e Pisauridae), 3) corredoras na vegetação (ex. Anyphaenidae e Clubionidae), 4) corredoras no solo (ex. Lycosidae e Gnaphosidae), 5) construtoras de teia em forma de funil (ex. Agelenidae e Amaurobiidae), 6) construtoras de teias em forma de lençol, composto por uma malha irregular de fios (ex. Linyphiidae), 7) construtoras de teias orbiculares (ex. Araneidae, Tetragnathidae e Uloboridae) e 8) construtoras de teias tridimensionais (ex. Theridiidae e Pholcidae).

As famílias das aranhas que compõem as guildas das caçadoras por espreita, por emboscada e das corredoras na vegetação geralmente são as habitantes mais comuns de vegetação. Em um estudo extensivo, Nentwig (1993) registrou muitas espécies de aranha associadas a flores, folhas e troncos de várias espécies de planta no Panamá, e todas as aranhas observadas pertenciam a estas guildas. Até 70% das aranhas encontradas nas flores de Lantana camara (Verbenaceae) eram Thomisidae e mais de 90% das aranhas coletadas nestas flores caçavam por emboscada ou por espreita. Estas flores também foram ocupadas por aranhas das famílias Salticidae, Anyphaenidae, Oxyopidae, Pisauridae e Clubionidae. Por outro lado, 46% das aranhas sobre as flores de Palicourea guianensis (Rubiaceae) pertenciam à família Salticidae. Em flores de Rhynchospora nervosa (Cyperaceae), Nentwig (1993) observou grande quantidade de aranhas das famílias Salticidae, Thomisidae, Oxyopidae e Clubionidae. Este autor também verificou que as principais

famílias de aranhas errantes associadas a folhas foram Salticidae, Pisauridae e Anyphaenidae, sendo que Salticidae e Pisauridae ocorreram preferencialmente em folhas lisas e xeromórficas, enquanto Anyphaenidae ocorreu preferencialmente nas folhas com tricomas. Segundo Nentwig (1993), as aranhas mais comuns sobre troncos de árvores pertenceram à família Salticidae, com aproximadamente metade de todas as aranhas amostradas.

Uma vez que as aranhas das guildas das caçadoras por espreita, por emboscada e das corredoras na vegetação não constróem teias, mas vivem em constante contato com a vegetação, podem ter relações mais estreitas com este tipo de substrato que as aranhas construtoras de teias, porque além de usarem plantas diretamente para forrageamento, usam este tipo de substrato também para abrigo e reprodução. Consequentemente, as aranhas que compõem estas guildas são os principais predadores nas interações tri-tróficas e os principais agentes de controle biológico (veja capítulos 14 e 15 deste livro).

Estratégias complexas de forrageamento

As estratégias de captura de presas são geralmente mais complexas em aranhas que forrageiam ativamente na vegetação. Enquanto as caçadoras por emboscada esperam imóveis pelas suas presas, geralmente em sítios mais freqüentados por elas (e.g. flores) e direcionam seus esforços apenas para capturá-las, as caçadoras ativas devem encontrar, perseguir, capturar e subjugar suas presas. Os comportamentos de captura de presas por aranhas que habitam a vegetação são indubitavelmente mais complexos nos membros da família Salticidae. Aranhas desta família são ativas e perseguem e capturam suas presas após a detecção visual (Jackson & Pollard 1996). Muitas vivem sobre ramos e folhagens, que são ambientes tridimensionais e topograficamente complexos (Jackson & Blest 1982; Jackson & Hallas 1986a). A geometria complexa destes ambientes faz com que um salticídeo freqüentemente veja uma presa que não pode ser alcançada simplesmente caminhando até ela (Tarsitano & Andrew 1999). Nestas circunstâncias, salticídeos devem tomar

desvios para alcançar uma posição de onde possam atacar a presa. Para isso, desenvolvem comportamentos complexos, como discutido a seguir.

Hill (1979) desenvolveu uma série de experimentos com várias espécies de Phidippus (Salticidae) para verificar como salticídeos mantinham o rumo correto em direção à presa. Para isso, construiu objetos em diferentes configurações para simular a vegetação, de modo que, quando as aranhas eram introduzidas neste substrato, teriam várias rotas, umas mais longas e outras mais curtas e com ângulos diferentes, para alcançar a presa (uma mosca suspensa em uma linha). Hill verificou que Phidippus geralmente utilizava as rotas mais curtas para alcançar a presa. Durante o deslocamento, estas aranhas retinham uma memória de curto prazo da posição do inseto (ângulo e distância), davam paradas para se re-orientar e memorizavam novamente o novo ângulo e distância da presa. As aranhas também utilizavam informações visuais do local da presa em relação aos objetos encontrados no trajeto. O autor sugeriu que salticídeos podem utilizar pelo menos três sistemas de referência independentes para determinar a posição da presa em um espaço tridimensional: direção da rota, gravidade e informações visuais do ambiente.

Tarsitano & Andrew (1999) testaram a escolha de Portia labiata (Salticidae) por tipos de rota que proporcionavam ou não acesso à presa. Para isso, construíram um aparato contendo uma plataforma basal de 30 x 30 cm e em duas das suas extremidades encaixaram mastros verticais. Um arco sobre a plataforma ligou um mastro a outro. Uma das extremidades deste arco foi cortada de modo a produzir um intervalo que simulava uma barreira para a aranha. Uma presa (aranha artificial) foi encaixada no centro deste arco e cada aranha foi liberada no centro da plataforma, abaixo do arco. Os autores verificaram que P. labiata optou pela rota completa, sem o intervalo, para alcançar a presa após uma série de inspeções visuais prévias de ambas rotas.

Os aparatos utilizados nestes estudos simularam a complexidade da vegetação e, a partir deles, foram elucidadas algumas maneiras pelas quais as aranhas da família Salticidae resolvem problemas para alcançar uma presa em ambientes topograficamente complexos. Entretanto, pouco

se sabe sobre comportamentos de aranhas de outras famílias que forrageiam ativamente na vegetação.

Escolha do sítio de forrageamento

Vários estudos demonstraram por meio de experimentos ou observações de campo como e por que as aranhas selecionam um sítio de forrageamento e quais conseqüências esta escolha pode trazer para o sucesso na captura de presas, para a aptidão individual e indiretamente para a sobrevivência da prole. Muitos destes estudos foram especialmente conduzidos utilizando-se aranhas da família Thomisidae como modelos de predador senta-e-espera (Fig. 4.1). Resultados destes estudos serão discutidos a seguir.

Conseqüências da escolha do sítio para o sucesso na captura de presas

Aranhas devem maximizar seu ganho energético pela escolha dos sítios de forrageamento de melhor qualidade (maior abundância de presas), conforme previsto pela teoria do forrageamento ótimo. Nesta seção, comentaremos alguns estudos que demonstram que, em geral, as aranhas têm habilidade para selecionar os sítios mais ricos em presas.

Morse & Fritz (1982) investigaram como fêmeas adultas da aranha Misumena vatia (Thomisidae) se comportam em relação à qualidade de locais de forrageamento sobre a planta Asclepias syriaca (Asclepiadaceae), considerando três escalas diferentes de manchas: inflorescências, ramos e clones. Nas inflorescências há flores brancas, que são novas e ricas em néctar, e amarelas, que são velhas e pobres em néctar. Os autores verificaram que quanto maior a proporção e o número de flores brancas em cada inflorescência, maior a taxa de visitas por insetos. Experimentos foram conduzidos introduzindo-se aranhas em inflorescências e em ramos de diferentes qualidades. Como resultado, os autores verificaram que as aranhas introduzidas nas manchas com mais flores brancas permaneceram nestas por mais tempo do que as aranhas que foram introduzidas nas manchas com mais flores amarelas (veja também Robakiewicz & Daigle

2004). Entretanto, 30% das aranhas permaneceram por bastante tempo nos sítios pobres em presas. Os autores supõem que este resultado é conseqüência de visitas ocasionais das presas nestes sítios pobres, que significou um estímulo suficiente para que as aranhas permanecessem no local. A maioria das aranhas introduzidas nos ramos de alta qualidade permaneceu e capturou presas, enquanto grande parte das que foram introduzidas em sítios pobres migraram para sítios mais ricos. Entretanto, houve grande variação no número de aranhas que permaneceu ou migrou para outros sítios. Os autores sugerem que esta variação pode ser causada pela alta variabilidade nas freqüências de visitas de polinizadores às inflorescências.

As principais plantas usadas como sítios de forrageamento por Misumena vatia (Thomisidae) na área onde Morse desenvolveu seus estudos são A. syriaca, Solidago juncea (Asteraceae) e Rosa carolina (Rosaceae). Morse (1981) verificou que M. vatia permanece por mais tempo e captura maior biomassa de insetos nas duas primeiras espécies que na terceira, provavelmente porque os itens alimentares preferidos (e.g. abelhas Apis mellifera) ocorreram mais nestas plantas. Durante o dia M. vatia capturou maior biomassa de insetos quando sobre Solidago do que quando sobre Asclepias e Rosa, mas durante a noite capturou maior biomassa de presas sobre Asclepias. Esta diferença no sucesso de captura de presas entre dia e noite ocorreu porque no período noturno grande quantidade de mariposas da família Noctuidae visitavam as flores de Asclepias e foram os únicos itens alimentares capturados neste período. Morse (1981) sugere que M. vatia ocorreu mais freqüentemente sobre Solidago e sobre Asclepias porque estas plantas são as mais visitadas por insetos acessíveis durante o dia e noite, respectivamente (veja também Morse 1984, 1986).

Morse (1979) estudou o comportamento de captura de presas por M. vatia sobre roseiras R. carolina, que são freqüentemente visitadas pelas abelhas grandes (e.g., Bombus spp.), por uma pequena mosca (Toxomerus marginatus, Syrphidae) e por outros dípteros e himenópteros pequenos que têm aproximadamente 1/60 da biomassa das abelhas. Apesar das abelhas Bombus terem sido os visitantes florais mais freqüentes, as aranhas tiveram maior sucesso de captura de presas menores.

Pela teoria do forrageamento ótimo, abelhas Bombus compõem o item mais importante neste sistema, pois além de serem mais freqüentes, são as maiores presas disponíveis. Se as aranhas se especializassem em capturar esta presa, ganhariam 7% a mais de alimento em relação aos outros itens. Apesar disso, não houve tendência a uma especialização. Morse supõe que, neste caso, a especialização não é favorecida porque, apesar do ganho energético em capturar as presas grandes, estas são muito difíceis de serem capturadas e o tempo entre uma captura e outra é muito longo. Em outro estudo, Morse (1983) comparou os padrões de forrageamento entre as aranhas M. vatia e Xysticus emertoni (Thomisidae) e verificou que a primeira aranha capturou principalmente Apis mellifera, e espécies de Noctuidae e Geometridae, mas raramente capturou Bombus spp. Misumena vatia capturou todos os tipos de presas usadas por X. emertoni, mas em contraste, incluiu mais Bombus na sua dieta. Com isso, M. vatia consumiu uma biomassa de presas duas vezes maior do que X. emertoni. Com estes resultados, Morse supõe que X. emertoni falhou em optar por sítios mais ricos em presas e comenta que aranhas deste gênero são primariamente caçadoras de liteira e, por isso, devem ser mais bem adaptadas a capturar presas no solo e não na vegetação.

Para testar se o tamanho das manchas de plantas com flores e as espécies das plantas exercem algum efeito no sucesso de captura de presas por Misumenoides formosipes (Thomisidae), Schmalhofer (2001) manipulou o tamanho das manchas das plantas Bidens aristosa e Solidago juncea (Asteraceae) inseridas em potes. Agrupamentos de potes (n = 5) simularam manchas grandes e potes individuais simularam manchas pequenas. O número de insetos que visitou as inflorescências de Bidens foi três vezes maior do que Solidago. Entretanto, manchas maiores de Bidens e Solidago atraíram o mesmo número de insetos, mas os insetos que freqüentaram manchas grandes de Bidens apresentaram maior tamanho (e.g. mamangavas, abelhas grandes e lepidópteros). Indivíduos de M. formosipes que foram experimentalmente introduzidos nestas plantas capturaram maior número de insetos, incluindo indivíduos maiores, quando sobre manchas grandes de Bidens em relação às manchas pequenas desta planta e a manchas grandes e pequenas de Solidago.

Consequentemente, ganharam mais massa quando forragearam sobre Bidens. Durante o experimento, a autora observou grande taxa de migração de M. formosipes de Solidago para Bidens.

Em um estudo recente desenvolvido no Brasil, Romero & Vasconcellos-Neto (2004a) verificaram que aranhas da espécie Misumenops argenteus (Thomisidae) ocorreram mais freqüentemente sobre ramos da planta Trichogoniopsis adenantha (Asteraceae) com maior número de capítulos em fase de ântese do que em ramos com maior número de capítulos em fase de botão, de pré-ântese, de pré-dispersão e de dispersão. Entretanto, esta ocorrência diferencial de M. argenteus entre os diferentes tipos de ramos se deu somente na estação chuvosa (dezembro a maio) e não na estação seca (junho a novembro). No período chuvoso, os ramos com mais capítulos em ântese atraíram maior quantidade de insetos (visitantes florais e herbívoros) do que ramos com capítulos nas demais fases de desenvolvimento. Entretanto, no período seco os insetos ocorreram de forma aleatória entre os diferentes tipos de ramos. Os machos adultos não selecionaram especificamente sítios com mais presas, o que sugere que eles estariam em busca de fêmeas para acasalamento e não de alimento. Além disso, os jovens recém emergidos das ootecas selecionaram capítulos na fase pré-dispersão, que são pobres em presas mas fornecem abrigos entre os estigmas murchos tombados sobre as brácteas.

Em outro estudo sobre o mesmo sistema descrito acima, Romero & Vasconcellos-Neto (2003) demonstraram que M. argenteus se alimentou de grande diversidade de itens alimentares. Entretanto, esta aranha capturou alguns itens alimentares com maior freqüência do que o esperado pelo acaso. Estes itens foram formigas, espécies de Chironomidae (Diptera), Grillidae (Orthoptera) e Braconidae (Hymenoptera), que são insetos ápteros ou que permanecem nos ramos por bastante tempo e, por isso, foram mais facilmente capturados. Em contraste, estas aranhas nunca capturaram Melanagromyza sp. (Diptera), que é um inseto muito comum sobre a planta, porém muito ágil. Esta agilidade pode favorecer o inseto contra o ataque destes tomisídeos (Romero & Vasconcellos-Neto 2004b). Além do mais, M. argenteus rejeitou algumas cigarrinhas (Membracidae), possivelmente porque estes insetos estavam sob proteção de formigas (Camponotus sp.). Dentre os visitantes

florais, as aranhas preferiram mariposas Ctenuchinae (Arctiidae) e rejeitaram borboletas Ithomiinae (Nymphalidae). Ambos grupos de visitantes possuem tamanhos semelhantes e seqüestram alcalóides pirrolizidínicos, compostos tóxicos freqüentemente rejeitados por vários outros artrópodes, incluindo outras aranhas. Uma possível explicação para esta preferência é que as mariposas têm as pernas muito mais curtas do que as das borboletas. Desta forma, ficam mais próximas das flores e se tornam presas mais vulneráveis às aranhas.

Além das aranhas geralmente escolherem os melhores sítios para forragear, como visto acima, algumas ainda têm a habilidade de mimetizar diferentes espécies de flores, tornando-se simultaneamente crípticas para suas presas (e.g. abelhas), mas também para seus predadores (e.g. pássaros). Théry & Casas (2002) demonstraram que fêmeas de Thomisus onustus (Thomisidae) adaptam a coloração de todo seu corpo para flores sobre as quais tentam se esconder. Usando métodos de espectroradiometria, os autores verificaram que para as aranhas parecerem crípticas, igualaram-se à cor de diferentes espécies de flor (Mentha e Senecio) na amplitude de visão de cor usada por pássaros (UV-azul-verde-vermelho) e por abelhas (UV-azul-verde). Em um estudo desenvolvido no sudeste do Brasil, J. Vasconcellos-Neto e colaboradores (dados não publicados) verificaram que fêmeas de Epicadus heterogaster (Thomisidae, Fig. 4.1) apresentam fluorescência em luz UV (337.1 nm) com um pico de emissão na região azul (450-500 nm). Tanto adultas quanto jovens apresentam polimorfismo de coloração, variando entre branco, amarelo e lilás. Estas aranhas são muito semelhantes a uma flor, porque além da coloração vistosa, possuem projeções no abdômen e coloração amarela nas extremidades das suas pernas (para as brancas e lilases) que assemelham-se a anteras de flores (Fig. 4.1). Além disso, seu comportamento lento durante o deslocamento nas folhas assemelha-se a flores agitadas pelo vento. Com estes comportamentos, colorações e morfologia, as aranhas podem se passar por flores e confundir visitantes florais. De fato, os autores presenciaram em campo alguns visitantes florais (e.g. borboletas, dípteros sirfídeos, abelhas e vespas) se aproximando e sendo capturados pelas aranhas.

Como as aranhas escolhem e/ou encontram os sítios de forrageamento?

Vimos na seção anterior que as aranhas têm grande habilidade de selecionar sítios de forrageamento de melhor qualidade. Mas como encontram tais sítios? Nesta seção, mostraremos que as aranhas usam informações do ambiente, como freqüência de visita de presas entre os diferentes substratos, e memorizam e relacionam estas informações com características do substrato (coloração, textura e odor) de melhor qualidade. As aranhas encontram estes substratos por meio de informações visuais, táteis e olfativas, como veremos a seguir.

Para verificar se as aranhas memorizam o caminho para alcançar o melhor sítio e se reconhecem e diferenciam à distância tais sítios, Morse (1993a) liberou fêmeas adultas de M. vatia em gramíneas e, depois de várias horas, verificou que mais de 80% das aranhas se moveram para Asclepias, em detrimento de outras espécies de plantas, com ou sem flor, igualmente abundantes na área de estudo. Uma vez sobre Asclepias, as aranhas selecionaram ramos com flores. Em um experimento subsequente, Morse (1993a) liberou aranhas em gramíneas logo abaixo de plantas Asclepias com quatro ramos floridos e quatro ramos vegetativos (sem flores). As aranhas que escolheram os ramos floridos foram recolhidas e novamente liberadas nas bifurcações entre os ramos floridos e vegetativos. Entretanto, a escolha pelos dois tipos de ramos foi aleatória, indicando que as aranhas têm habilidade para reconhecer o caule das plantas que fornecem ramos de boa

No documento Ecologia e Comportamento de Aranhas.pdf (páginas 67-91)