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2 CAPÍTULO 1 – XENOFONTE E SEU PRÓPRIO TEMPO

2.4 EXÍLIO: A HÉLADE EM FINS DA GUERRA DO PELOPONESO

Como todos os outros, ou quase todos os tópicos sobre a vida de Xenofonte, este também é problemático, no entanto neste caso temos mais documentação, assim como mais dúvidas. A prática do exílio, ou ostracismo, ou expulsão19 fora amplamente utilizada pelas camadas dirigentes da sociedade ateniense. Aqueles que por algum motivo significassem para os detentores do poder certo risco, seriam convidados a se retirar de Atenas, neste sentido, o sistema democrático ateniense paulatinamente se livrava de oposições e de indivíduos ―perigosos‖. Temístocles e Tucídides são exemplos mais ilustres de exilados.

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A expressão utilizada por Pausânias é, que quer dizer: ―puxado para cima, puxado para

Então, por que Xenofonte? Como já afirmamos Xenofonte fazia parte de uma elite ciosa de seu status, como outras diferentes no tempo e no espaço. Seriam necessárias ações efetivas para que o indivíduo fosse considerado danoso à comunidade políade. E existem algumas teorias explicativas para o ocorrido: expedição à Ásia, ou seja, o abandono da cidade; associação a Ciro, considerado inimigo do povo ateniense; e, por fim, ter lutado contra os compatriotas em Coronéia, sob o comando do Rei espartano Agesilau.

Xenofonte saiu da Ática em busca de glórias, aventuras e riquezas na Ásia. Mas essa foi, sem dúvida, uma atitude paradigmática em sua vida. Anos antes da morte de Sócrates, os grupos democráticos já perseguiam elementos discordantes de sua doutrina, os membros da elite defensora da oligarquia. Com a derrota para os espartanos em Aegospotamói durante 402, a instauração do regime dos 30 e a posterior restauração da democracia, os ataques aos oligárquicos se acirram, sendo Sócrates, por exemplo, perseguido e condenado à morte, assim como outros; após a morte do mestre, Platão e outros fugiram da cidade temerosos do que poderia acontecer a si mesmos (HIGGINS, 1977).

É nesse ínterim que abandonar a cidade significa expô-la a toda sorte de risco, até mesmo abandonar o lar, a esposa, as obrigações matrimoniais poderá ser considerado um crime contra a comunidade, passível, inclusive, de exílio. Xenofonte pode ter sido condenado ao exílio, por expor a cidade através de sua viagem à Ásia.

Após as malfadadas tentativas de conquista da península grega em 490 com Dario I e 480 com seu filho Xerxes, os persas passam a assumir uma postura diferente. Passam a sistematicamente investir no conflito entre as cidades gregas, financiando, por exemplo, a frota espartana, que liderada por Lisandro, impôs uma indiscutível derrota aos atenienses ao norte da Grécia, na já citada batalha de Aegospotamói.

Entre os gregos circulava a ideia de que o ouro persa que viabilizara a conquista espartana tinha lhes sido ofertado por Ciro, o qual ansiando por aliados em sua futura guerra fraticida, teria financiado os lacedemônios. Daí justificasse a fala, a imagem de inimigo do povo ateniense. Xenofonte, por isso, teria sido condenado por vender sua força de trabalho a alguém tão danoso aos atenienses. Essa teoria tem uma historicidade, na antiguidade os relatos de Pausanias já dão conta da questão:

O Lacedemônios depois de separar Escilunte de Elis, lhes deram a Xenofonte, filho de Grilos, quando ele havia sido exilado de Atenas, o motivo de sua expulsão() foi que ele havia tomado parte em uma expedição que Ciro, o maior inimigo do povo ateniense , tinha organizado contra o seu irmão, o rei persa. Ciro, de fato, de seu trono em Sardes, vinha fornecendo a Lisandro, o filho de Aristocritus, e aos Lacedemônios, dinheiro para a sua frota. Xenofonte, portanto, foi banido e ter feito de Escilunte sua casa. (PAUSANIAS, V, 6, 5)

Em seu retorno, após os episódios narrados em Anabásis, Xenofonte teria abandonado os dez mil e seguido o rei Agesilau em sua campanha na Ásia. Durante a antiguidade havia todo um anseio pela tentativa de um exército grego dominar a Pérsia. Jasão de Pherae, como aponta Sprawski (1999), considerara que essa dupla seria capaz de tal empreitada, que somente fora efetivada por Alexandre, anos mais tarde. Alguns autores, como Arriano, biógrafo de Alexandre, afirma que sem Xenofonte ele nunca teria saído da Macedônia.

Unido a Agesilau, Xenofonte teria lutado várias batalhas, inclusive contra seus conterrâneos atenienses em Coronéia, em 399. Essa última teoria afirma que somente aí, Xenofonte teria sido exilado, entretanto, parece ser a suposição mais fragilizada em si mesma. Há ainda os comentários do próprio Xenofonte:

Assim, os Lacedemônios enviaram Thibron como governador, dando-lhe um exército composto de mil hilotas emancipados e quatro mil do peloponesios outros. Thibron também pediu aos atenienses um número de trezentos cavaleiros, dizendo que ele mesmo iria fornecer e pagar por eles. E os atenienses enviaram alguns daqueles que haviam servido como cavaleiros no tempo dos Trinta, pensando que seria um ganho para a democracia se deve viver em terras estrangeiras e perecer lá; (XEN. Helênicas, 3, 1, 4)

Ao que parece, havia uma intenção por parte dos dirigentes atenienses, através de uma forma polida, de se livrar dos indesejáveis, no caso os opositores do sistema. Através disso, pode-se discutir a natureza e os tipos de disputa entre os grupos dirigentes atenienses.

Em A constituição dos Atenienses, de Aristóteles, o autor faz um verdadeiro histórico das instituições políticas que haviam sido estabelecidas ao longo da história

recente dos atenienses. O estagirita se propunha a analisar como a democracia havia sido, dentre outros, o sistema político mais satisfatório. Contudo, o que podemos perceber é que Atenas também já fora uma oligarquia, não somente no efêmero governo dos 30, mas antes, com o regime dos 400. A acusação consiste no Fililaconismo. Ou seja, Xenofonte fora acusado de ser um amante, um aliado em potencial dos espartanos, e por isso, inimigo de Atenas, sendo assim, deveria ser expulso da comunidade dos cidadãos, já que seria nocivo à pólis.

Através desta informação, podemos concluir que não existira uma elite, mas elites, grupos de cidadãos, abastados, por vezes, que reunidos através do compartilhamento de ideias e doutrinas, se utilizavam de uma série de mecanismos à sua volta para o ―bem administrar‖ a cidade. A questão é que estes grupos são muito diversos, não se dividem somente entre democráticos e oligárquicos, Sócrates, por exemplo, não pode ser incluído, pelo menos de maneira direta, a nenhum destes grupos, todavia, com sua morte, uma ação orquestrada pelo grupo democrático, seus seguidores dispersos, migraram para vários setores, Xenofonte, por exemplo, passou a ser compreendido entre os oligarcas (HIGGINS, 1977).Por fim, estabelecer de maneira enfática, parece perigoso. Mas, através das fontes e dos debates historiográficos podemos formular algumas conclusões. Xenofonte integrara um grupo de cidadãos alinhados à causa oligárquica.