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Ex-voto presente nas religiões antigas

No documento Download/Open (páginas 63-94)

Quando pensamos em religiões antigas, algumas formas de crenças se destacam, mas sabemos que existiam muitas outras práticas religiosas em todo o mundo. Nossa intenção é mapear de forma sucinta - não todas - pois essa pesquisa seria impossível, mas algumas que estabeleciam a comunicação com suas divindades por meio de oferendas muito similares ao que entendemos hoje como ex- votos.

Vale ressaltar que a maioria dessas religiões antigas eram contemporâneas umas das outras, o período compreende mais ou menos três milênios a.C.. Estamos falando de uma época em que muitas culturas já haviam estabelecido códigos gráficos de escrita. Destacamos onze14 expressões religiosas antigas, muitas delas ainda estão presentes em nossos dias com as mesmas cargas simbólicas, ou reinterpretadas, porém nos chama a atenção que o elemento “oferenda” sobrevive como diálogo entre os seus devotos com suas divindades.

Destacaremos justamente essa comunicação íntima, em que o ex-voto é a materialização mais visível desse desejo comunicacional.

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São incontáveis as formas antigas de religião, de comunicação dos nossos antepassados com suas divindades. Selecionamos dez a título de ilustração, porém temos aqui uma oportunidade de futuras pesquisas de associar a prática dos ex-votos com essas manifestações antigas de religião.

a- Mesopotâmica (Suméria)

Na região da Babilônia se destacam dois grupos culturais antigos: o da

Suméria e o de Akkad. Nossa pesquisa priorizará o povo sumério, pois como já pontuamos, as oferendas eram práticas comuns em seus rituais religiosos.

O universo, segundo os sumérios, era governado por uma espécie de panteão, formado por diferentes divindades (em geral, seres de formato humano, porém com poderes supremos, como a imortalidade, por exemplo). Eram entidades que tudo governavam, e os seres humanos estavam sujeitos aos seus julgos, castigos e bênçãos. São muitas as divindades sumérias, porém os deuses considerados os pilares do universo eram quatro: An, deus do céu; Ki, deusa da terra; Enlil, deus do ar e Enki, deus da água. Como vemos, era uma religião cósmica, em que os elementos naturais ganhavam status de deuses. Neste panteão, recebem destaques também a figura de Inanna, a rainha dos céus; En-Ki, deus dos “fundamentos”, senhor da terra e Baal, deus da tempestade (considerado temperamental e vingativo). Em torno dos deuses, se construíam lendas mitológicas, que buscavam explicar a vida.

Convém destacar que o culto ao deus Baal começou com os sumérios, mas se espalhou por toda a região. Mesmo depois, com o surgimento de outras formas religiosas, a devoção a esse deus persistia.

Baal é citado inúmeras vezes no Antigo Testamento bíblico, como ídolo oponente ao Deus (único) do povo israelita. Citamos um trecho do livro do profeta Jeremias (11,11-17), que faz tanto referência ao deus Baal quanto ao tipo de culto que se prestava a ele, com oferendas em seus altares:

Por tal culpa, assim declara o Senhor: vou descarregar sobre eles uma calamidade, da qual não poderão escapar. E, quando gritarem por mim, eu não os escutarei. Então, as cidades de Judá e os habitantes de Jerusalém irão apelar para os deuses ante os quais queimaram incenso. Esses deuses, porém, não os salvarão no momento da catástrofe, porque, ó Judá, possuis tantos deuses quantas são tuas cidades; e quantas ruas tens em Jerusalém, tantos altares de infâmia ergueste para neles queimar oferendas em honra de Baal.Quanto a ti, não intercedas por esse povo, nem ores por ele, nem supliques, porque ao tempo de sua desgraça, quando clamarem por mim, não os escutarei.Por que cometeu minha bem-amada tanta maldade em minha casa? Porventura teus votos e as carnes imoladas apartarão de ti teus males, para que possas exultar? Verdejante oliveira de belos frutos - tal o nome que te dera o Senhor.

Ao estrépito, porém de imenso ruído ateou-lhe fogo, e se queimaram seus galhos. O Senhor dos exércitos, que te plantara, decretou a calamidade contra ti por causa dos crimes cometidos pela casa de Israel e pela casa de Judá, causando-me revolta os sacrifícios que fizeram em honra de Baal (BIBLIA SAGRADA AVE-MARIA, 2008, p. 1051).

A relação dos sumérios com as divindades pode ser entendida com uma explicação de Micea Eliade (2010, p. 69, grifo nosso):

O homem [...] partilhava de algum modo a substância divina: o sopro vital de En-ki ou o sangue dos deuses Langa. Isso significa que não havia uma distância intransponível entre o modo de ser da divindade e a condição humana. É verdade que o homem foi criado com objetivo de servir os deuses, os quais, antes de tudo, necessitavam ser alimentados e vestidos. O culto era concebido como um serviço aos deuses. Entretanto, se os homens são os servidores dos deuses, nem por isso são seus escravos. O sacrifício consistia sobretudo em oferendas e homenagens.

Figura 6 - Vaso de Warka – procissão com oferendas para a deusa Inanna. Bagdá (Iraque)

Fonte: Amyett, 2013

Os sumérios consideravam os seus deuses figuras com poder, porém lhes conferiam características humanas, da mesma forma eles tinham consciência que a divindade habitava em seus corpos, de forma que fica fácil imaginar que a comunicação entre essas pessoas com as suas divindades era de intimidade. Neste caso, as oferendas apareciam como algo natural: “eu ofereço isso, pois sei que ele(a) gostará”. No imaginário desse povo, o gosto dos deuses não era diferente do nosso (humano).

Uma peça arqueológica datada de 3.200 a.C., denominada “Vaso de Warka”, retrata em relevo sobre alabastro, uma espécie de procissão, na qual os devotos levavam suas oferendas (ex-votos) para homenagear a deusa Inanna, em agradecimento pela boa colheita. A cena retratada se assemelha muito aos ritos de procissão com oferendas que vemos em nossos dias, sobretudo no catolicismo popular e nas religiões de matriz africana.

b- Egípcia

Com relação ao Egito antigo, não podemos falar de uma religião específica, pois existiam muitas manifestações religiosas que concorriam entre elas. É indiscutível o papel da religião no Egito, pois toda a cultura desse povo girava em torno de elementos religiosos, vemos isso, sobretudo, na arte e na arquitetura.

A crença do Egito antigo também era politeísta, uma variável muito grande de deuses e deusas povoava o imaginário dos egípcios que criaram mitos para explicar cada um deles. Entre os deuses com maior “popularidade”, destacamos: Osíris, o deus da morte; Ísis, deusa da maternidade e da magia, o seu culto se espalhou por várias regiões como Grécia e Roma; Hórus era filho de Osíris e Ísis, considerado o deus dos céus.

A mitologia em torno da tríade de deuses girava em torno da vida, da morte e do ressurgimento, dessa forma entendemos as principais manifestações materiais de fé dos egípcios, a preocupação com os seus mortos; e com a própria morte, havia uma preparação intensa para esse momento e para o momento pós-morte. A mumificação é um exemplo claro disso.

Sobre os três principais deuses do Egito antigo e a sua relação com os ex- votos, Maria Augusta Machado da Silva (1981, p. 21,22), escreve:

No Egito o mito do deus que morre e ressuscita identificou-se com a fertilidade trazida com as cheias do Nilo, e foi fixado na grande tríade formada por Ísis (deusa do amor, dos casamentos, do trigo e da medicina), Osíris (deus dos mortos e cujo corpo, após haver sido estraçalhado por seu irmão Set, deus-crocodilo, foi recomposto por sua irmã-esposa Ísis) e Hórus (jovem deus frequentemente representado com cabeça de falcão, filho de Íris e Osíris), que, depois de haver representado o Céu, acabou por simbolizar o Sol. No período da expansão greco-romana, o culto a Ísis difundiu-se pela Grécia, Itália, Gália, Bretanha e todo o Ocidente. Em Portugal, na parede externa da Sé de Braga, há uma lápide votiva a Ísis.

Inúmeras peças votivas foram colocadas nos templos egípcios, destacando-se, na categoria de ‘duplos-orantes”, as figurinhas que representavam guerreiros às vésperas de partir para os combates e que buscavam proteção dos deuses. Também os amuletos podiam ser encontrados em grande quantidade naqueles templos.

Um fato curioso que vale a pena ser destacado neste estudo, além daquilo que já falamos, é a crença dos egípcios na deusa Basted (que era uma deusa gata, ou uma mulher com cabeça de gata). Essa deusa simbolizava os poderes do Sol, também estava associada à Lua, sendo a protetora das mulheres grávidas e dos partos. O seu culto era popular em várias localidades, porém se concentrava, sobretudo, em Bubastis, desde tempos remotos (2575 a 2134 a.C.).

O site facinioegito, produzido por Ismael de Sá Neto (1998, p. 1, grifo nosso), faz referências aos ex-votos oferecidos à deusa Basted no Egito Antigo:

DURANTE O TERCEIRO PERÍODO Intermediário (c. 1070 a 712 a.C) começaram a ser construídas necrópoles para abrigar múmias de gatos. Esses animais eram criados no templo de Bubastis com o objetivo de serem sacrificados à deusa e mumificados. Devotos da divindade adquiriam tais múmias que eram envoltas em tecido, colocadas em sarcófagos feitos sob medida e enterradas como oferendas à Bastet em túmulos subterrâneos cobertos com uma abóbada. Quando os reis líbios da XXII dinastia (c. 945 a 712 a.C.) fizeram de Bubastis sua capital, por volta de 944 a.C., o culto da deusa tornou-se particularmente desenvolvido.

A PARTIR DA XXVI DINASTIA (664 a 525 a.C.), agora já no chamado Período Tardio (c. 712 a 332 a.C.), tornou-se comum os adeptos da deusa lhe oferecerem, em seus templos, ex-votos na forma de estatuetas que representavam a divindade sob a forma de gato. Feitas geralmente de bronze, mas também de outros materiais, as esculturas costumavam trazer no pescoço um colar ou o olho Uedjat e brincos de ouro nas orelhas. Ao ser representada na forma humana podia trazer nas mãos um cetro, uma planta de papiro, um sistro, instrumento musical que tocava nas festividades, etc. No braço podia carregar um cesto que, às vezes, aparece cheio de gatos.

Curiosamente, próximo aos templos dedicados à deusa Basted, arqueólogos encontraram alguns cemitérios (de animais) repletos de gatos mumificados em uma espécie de oferecimento à divindade. O gato mumificado funcionaria como uma espécie de ex-voto para agradar a deusa.

Figura 7 - Gato Mumificado – oferenda (espécie de ex-voto) à deusa Basted (Egito) – Museu Britânico

Fonte: Reeve, 2006

A oferenda nas práticas religiosas egípcias não eram exceções, mas toda religiosidade foi marcada fortemente pelo relacionamento simbólico da “troca”, do pagamento de promessa para com as divindades.

c- Grega

As características da religião grega, bem como a romana fortemente influenciada pela grega, mereceriam um estudo à parte, pela riqueza de elementos constituídos, sobretudo mitológicos. Porém, citaremos os principais elementos dessa cultura religiosa antiga, destacando de modo especial nosso objeto de estudo, os ex- votos.

A religião da Grécia Antiga professava a fé em doze principais deidades, geralmente associados com as forças da natureza, que viviam no Monte Olimpo, o local dos deuses. As deidades eram concebidas em torno de mitos que regiam a fé,

cada um dos deuses tinham características extremamente humanas, todos passíveis de acertos, mas também de erros. As virtudes dos deuses conviviam pacificamente com seus vícios. Porém, os deuses eram imortais, diferenciando-se assim dos seres humanos.

Dos doze deuses superiores do Olimpo, destacamos: Zeus, deus de maior poder, regia sobre deuses e humanos, associado ao relâmpago; Hera, esposa de Zeus, deusa do matrimônio, do parto e da família; Posêidon, deus do oceano, irmão mais velho de Zeus; Atena, deusa da sabedoria, filha de Zeus. Como vemos, no Monte Olimpo, os deuses eram quase todos ligados mitologicamente por laços familiares.

Figura 8 - Imagem de Asclépio (século III a.C.) – terracota – Museu Britânico

Fonte: Arquivo do autor

Existia também, entre os deuses maiores, o deus Apolo, deus do sol. Apolo, segundo a mitologia, envolveu-se em uma relação amorosa com uma mortal, chamada Corônis. Dessa relação nasceu Asclépio, um deus menor, deus da medicina. Segundo o mito, ele nasceu de cesariana, após a mãe ser morta por

Apolo. Asclépio foi criado por um centauro chamado Quíron, foi este que ensinou as técnicas de cura a Asclépio. No exercício da medicina, ele curou várias pessoas, inclusive, segundo a lenda, trazia mortos de novo à vida, por esse dom, seu pai se encolerizou e o matou com um raio. Porém, mesmo depois de morto, foi digno do culto dos seres humanos, e sua fama de médico “espiritual” se espalhou por várias localidades, inclusive, templos foram erguidos a ele.

Em grego seu nome era Asclépio; e no latim, uma vez que seu culto se popularizou também entre os romanos, recebeu o nome de Esculápio (GOMES GORDO, 2015, p. 39).

Todos os deuses, desde os maiores até os menores, recebiam ex-votos como agradecimentos por graças alcançadas, mas sem dúvida nenhuma foi com a devoção a Asclépio que essa prática se consolidou entre os gregos e também romanos.

Figura 9 - Ex-votos oferecidos a Asclépio (Útero, intestino, olho, orelha, seio em terracota) – (Século III a.C.) – Museu Britânico

Alfons Weiser, sobre os ex-votos oferecidos a Asclépio, escreve:

Dos trezentos santuários a ele consagrados, os mais famosos eram os de Cós, Corinto, Atenas e Pérgamo. Mas foi Epidauro que se tornou o mais importante centro do culto de Asclépio. No século IV a.C., o arquiteto local Teodoro erigiu o templo de Asclépio. Deve-se a Trasimedes de Paros a estátua de Asclépio no trono, com o bastão, a serpente e o cachorro. Inúmeros peregrinos se dirigiam a Epidauro, em busca de alívio, e muitos eram os que voltavam curados. Dessas curas ainda hoje nos falam, p. ex. sessenta inscrições gravadas em placas de pedras, bem como uma série de ex-votos que chegaram até nós (WEISER, 1978, p. 39).

Alguns exemplares de ex-votos oferecidos a Asclépio podem ser vistos hoje expostos no Museu Britânico, é impressionante as semelhanças desses objetos com alguns tipos de ex-votos que encontramos atualmente em santuários, ermidas e cruzeiros espalhados em diferentes partes do mundo.

d- Romana

É impossível pensar em uma sociedade romana antiga, sem pensarmos também no fator religioso, não existia separação do que era da esfera cívica e do que era da religião, a crença sobrenatural regia toda vida dessa sociedade. Com respeito a esse fato, ao estudar sobre a origem de Roma, o professor da Universidade de Paris, Alexandre Grandazzi (2010, p. 151), escreve:

A religião lembra-se então do nascimento da cidade, porque é esta que lhe fornece o ambiente em que ela se define como fenômeno coletivo e público: assim, a religião romana arcaica e a cidade inicialmente têm um desenvolvimento interdependente. Dos populi

albenses e seus vilarejos espaços na Roma das quatro regiões,

passou-se dos cultos familiares, chamados gentílicos, aos cultos públicos que demandam o arranjo de espaços e construções específicas. Significativamente, a miniaturização dos objetos deixa de ser empregados nos cultos funerários privados para estar presente nos depósitos votivos dos templos.

A cidade cresce ao lado de seus templos, e a prática votiva de oferendas aos deuses não eram isoladas, mas faziam parte da cultura da essência educativa desse povo, há registros históricos do surgimento da religião romana desde o século VIII a.C.. Sobre as obrigações religiosas dos romanos, Regina Maria da Cunha

Bustamante (2014, p. 110) diz: “não cumprir as obrigações religiosas para com os deuses abalava a sociedade, pois desequilibrava a ordem do mundo ao provocar a ira divina. Não havia distinção entre laico e o religioso; a religião estava onipresente: abrangia tanto a vida privada quanto a pública”.

A religião da antiga Roma era politeísta, com muita similaridade com a cultura grega. Os deuses romanos “concebidos” mitologicamente encontram seus similares na mitologia grega. Por essa razão, muitos estudiosos não separam as duas culturas, mas as chamam de greco-romana. Os deuses eram imortais, porém contraditórios, carregavam tanto as virtudes humanas quanto os seus vícios.

Apresentamos alguns dos principais deuses romanos com os seus correlatos gregos: Júpiter, o deus do dia (Zeus); Apolo, deus do sol e da medicina (Apolo); Juno, deusa protetora do casamento, parto e da mulher, de uma forma geral (Hera); Marte, deus da guerra (Ares); Vênus, deusa do amor e da beleza (Afrodite); Diana, deusa da lua, da caça e da castidade (Ártemis); Ceres, deusa da fecundidade da terra e da agricultura (Deméter); Baco, deus do vinho e da alegria (Dionísio); Cupido, deus do amor personificado (Eros).

A relação comunicacional com esses deuses passava pela prática votiva dos ex-votos. Duas cidades, Pesto e Lácio, se destacavam neste período por abrigarem templos de grandes movimentações de peregrinos que buscavam cumprir os seus votos (GOMES GORDO, 2015, p. 36). O livro Enciclopédia Mariana (1969, p. 810, tradução nossa) relata a força cultual dos romanos de oferecerem ex-votos aos seus deuses:

No templo da antiquíssima Lucus Feroniae, descoberto no Lácio junto ao Soracter (cujo saque recorda Tito Lívio feito por Aníbal), foram encontrados milhares de estatuetas em terracota, que representam partes do corpo, animais, inclusive a mesma deusa Ferônia; os dois primeiros tipos eram votos de ação de graças por curas atribuídas a ela, tanto de homens como de animais; o outro tipo indicava o voto propiciatório oferecido para obter a proteção da deusa. Da mesma inspiração são os ‘votos’ encontrados em escavações em Pesto em que Hera-Juno era invocada como protetora da fecundidade e da maternidade. Idênticos detalhes (ex- votos) foram encontrados nas ruínas do templo de Capua.

Todos os deuses romanos, assim como já dissemos dos gregos, recebiam oferendas de agradecimentos por graças alcançadas, porém se destaca na religião

romana antiga o deus da medicina Esculápio, sendo o seu correlato grego o deus Asclépio.

Figura 10 - Ex-voto (placa votiva dedicada a Esculápio – I d.C.) - Museu Nacional de Arqueologia de Lisboa

Fonte: Arquivo do autor

No Museu de Arqueologia de Lisboa (Portugal), encontramos um ex-voto em formato de placa votiva (mármore), oferecido a Esculápio. A peça é datada do século I d.C., vale ressaltar que a devoção aos deuses romanos se espalhou por todas as regiões de domínio do Império Romano. Na placa escrita em latim, podemos ler: “Consagrado a Esculápio, por Marcus Afranius Euporio e Lucio Fabius Daphnus, augustais, como oferenda deram”.

e- Creta (minoica)

Creta é uma grande ilha do Mediterrâneo, localizada ao sul da Grécia, no mar Egeu. Podíamos ter incluído os aspectos religiosos arcaicos dessa ilha na descrição da religião da Grécia antiga, porém sua simbologia e mitos são próprios, de grande riqueza cultural, sobretudo com relação ao nosso objeto de pesquisa que é o ex- voto.

Quase tudo que se sabe sobre a Creta antiga é fruto de escavações arqueológicas. Segundo o John L. Mackenzie (1983, p. 194), a antiga história de Creta teve três períodos denominados de “minoicos” por causa de Minos – que segundo a mitologia grega era o rei de Creta, filho de Zeus com a princesa Europa: “o minoico primário (3.400 – 2.000 a.C.), o minoico médio (2.000 – 1.580 a.C.) e o minoico tardio (1.580 – 1.250 a.C.).”

As escavações são provas de que Creta era uma civilização bastante avançada contendo grandes construções e palácios requintados. Eles dominavam a escrita, chamada hoje de Linear B de Creta, que começou a ser decifrada por um grupo de pesquisadores liderados por Michael Ventris (MACKENZIE, 1983, p. 194). A decifração da escrita Linear B de Creta é essencial na compreensão dos elementos religiosos presentes nessa cultura.

O culto minoico era, sobretudo, orientado por dois pilares: animista (com base na relação com a natureza e com a vegetação) e feminista (a presença maciça de deusas, como a deusa-mãe, por exemplo). A conclusão para essa teoria são as escavações arqueológicas de Gnossos15, sobre a predominância feminina no imaginário religioso dos minoicos, Mircea Eliade nos diz:

As estatuetas femininas multiplicaram-se durante o neolítico, elas são caracterizadas por uma saia em forma de sino que deixa os seios à mostra, e pelos braços levantados num gesto de adoração. Quer representem ex-votos ou “ídolos”, essas estatuetas indicam a preeminência religiosa da mulher e principalmente a primazia da deusa. Os documentos posteriores confirmaram essa primazia. A julgar pelas representações de procissões, festas palacianas e cenas de sacrifícios, o pessoal feminino desempenhava um papel considerável. As deusas são representadas cobertas por um véu ou

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Considerado o maior sítio arqueológico de Creta, através das escavações, percebeu-se a importância desse local para vida pública, política e religiosa de seus habitantes, sobretudo no

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