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Na semiótica geral, é necessário examinar o coração, os pulmões, as mamas, o abdome e as extremidades.
O obstetra faz, minuciosamente, a inspeção obstétrica propriamente – palpação, ausculta e toque.
A atitude e a marcha foram estudadas no Capítulo 5, dedicado às modificações do organismo materno.
Inspeção
▶ Cabeça. Junto aos limites do couro cabeludo, ocorre a formação de lanugem, bastante evidente, em consequência da intensificação da nutrição dos folículos pilosos, reflexos do metabolismo próprio da grávida e principalmente das influências hormonais, o que constitui o
sinal de Halban. Em muitas gestantes, nota-se pigmentação difusa ou circunscrita, mais nítida nas
zonas muito expostas à luz (fronte, nariz e região zigomática), de tonalidade escura, manchando a pele, denominada cloasma ou máscara gravídica. Essa alteração da deposição do pigmento será amenizada ao poupar a pele da insolação. A hiperpigmentação da gestante pode ser consequência da hiperfunção do lobo anterior da hipófise, por intermédio de suas células basófilas que, secretando hormônio melanotrófico, exageram a pigmentação, com preferência pelas regiões nas quais, na vida embrionária, foi realizada a oclusão da cavidade abdominal.
▶ Pescoço. Em virtude da hipertrofia da tireoide, sua circunferência aumenta, ficando mais evidente por volta do quinto ou sexto mês.
▶ Glândula mamária. A inspeção mostra as mamas com volume maior, em consequência da hipertrofia e das modificações que gradativamente vão ocorrendo para prepará-las à amamentação. A partir de 16 semanas, aparece secreção de colostro, que pode ser percebido pela expressão da base, na direção dos canais galactóforos (nessa pesquisa, deve-se proceder corretamente, evitando fazer apenas a compressão da região justamamilar que, além de infrutífera, poderia constranger a paciente). A aréola primitiva, com cor mais escura que fora da gestação, apresenta, ao redor, a aréola secundária, menos pigmentada, de limites imprecisos, chamada também aréola gravídica (sinal de Hunter).
A melhor circulação que acompanha o desenvolvimento das mamas deixa perceber uma trama de vasos venosos na pele: é a rede de Haller. Na aréola primitiva, durante a gestação, aparecem os tubérculos de Montgomery, em número de 12 a 15, que costumam regredir no puerpério e são de duas naturezas: glândulas mamárias acessórias, ou sebáceas, hipertrofiadas. O exame das mamas, além de mostrar essas características que traduzem modificações gravídicas, e, portanto, orientam no diagnóstico, deve ser feito a fim de verificar malformações do mamilo (umbilicação ou inversão) que mostrem a dificuldade ou incapacidade para a amamentação.
▶ Abdome. Globoso ou ovoide, o abdome exibe as resultantes da distensão de sua parede pelo útero gravídico em crescimento. A cicatriz umbilical, anteriormente apresentada como depressão, passa a ser plana e, por vezes, até saliente. Nas primigestas, a musculatura da parede, conservando sua capacidade de contenção, mantém o útero em boa posição; contudo, nas
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multíparas, fica comprometida a tonicidade da aponeurose e das fibras musculares, geralmente estabelecendo-se a diástase dos retos anteriores, o que condiciona o ventre pêndulo, sendo a causa comum de vícios de apresentação e de distocia pela falta de coincidência do eixo do útero com o do feto e o da bacia.
Nas mulheres de pele mais escura, em especial, evidencia-se a hiperpigmentação da linha alva (linea nigra).
Na gestante, a inspeção também mostra o aparecimento de estrias ou víbices, produzidas pela sobredistensão do retículo de fibras elásticas. Ao fim do ciclo gravídico-puerperal, esmaecem; no entanto, persistem na maioria das vezes. Há dois tipos de estrias: “recentes”, da gravidez atual, com cor violácea e fundo azulado; e “antigas”, brancas ou nacaradas, com aspecto perláceo.
▶ Membros inferiores. Costumam apresentar dilatação circunscrita de vasos sanguíneos, exagerados pela influência da gestação, ou até mesmo varizes aumentadas. No final da gravidez, em muitos casos, observa-se o edema.
▶ Aparelho genital externo. A pigmentação da pele mostra-se mais carregada, formando- se aréola escura em torno do ânus.
A influência hormonal da gestação e, mais adiante, o fator mecânico modificam a mucosa, que se mostra hiperpigmentada, tumefeita e com coloração alterada. De rosada torna-se cianótica, violácea ou azulada. Essas alterações são percebidas muito precocemente no vestíbulo e nas proximidades do meato urinário e se intensificam à medida que a gravidez progride, sendo conhecidas como sinal de Jacquemier, pelos europeus, e sinal de Chadwick entre os norte- americanos.
Palpação
A palpação obstétrica é feita a partir do útero e de seu conteúdo.
A altura uterina é estimada tendo-se o cuidado de reconhecer a resistência óssea do púbis e delimitar, sem comprimir, o fundo do útero, com a borda cubical da mão. A fita métrica mede o arco uterino, o que torna possível calcular a idade da gravidez, acompanhar o crescimento fetal, assim como suspeitar da gemelidade e do excesso de líquido amniótico (polidramnia).
A circunferência abdominal é avaliada ao nível da cicatriz umbilical; na gestante a termo, tem em torno de 90 a 92 cm, em mulher não obesa.
▶ Consistência uterina. A palpação reconhece a consistência elástica-pastoso-cística (característica do amolecimento da parede uterina da gestante) e, devido à quantidade de líquido amniótico, sua maior ou menor tensão. Por meio dela, é possível determinar a existência de polidrâmnio. Durante a gestação, notam-se as contrações de Braxton-Hicks e, no decurso da dilatação e da expulsão, metrossístoles regulares, traduzindo a atividade uterina do trabalho de parto.
▶ Regularidade da superfície uterina. A palpação possibilita identificar a superfície lisa e regular da parede do útero gravídico normal ou a existência de nódulos e saliências, denunciando tumores miomatosos, de natureza variada. É necessário ter atenção para não
confundir o achado com o que se nota ao palpar das pequenas partes fetais (pés, mãos, cotovelos e joelhos), em contato íntimo com a parede do órgão gestatório, principalmente se ela estiver adelgaçada.
▶ Conteúdo uterino. Observado por meio do método palpatório, visa o reconhecimento do feto nele contido, além de sua apresentação e posição.
Sistematizando a técnica da palpação, consideraremos a seguir suas diversas fases (manobras
de Leopold-Zweifel).
▶ Primeiro tempo. Delimita-se o fundo do útero (Figura 6.1), com ambas as mãos comprimindo a parede abdominal com as bordas cubitais, tendo contato, quanto possível, com a sua face posterior e anterior. As mãos se dispõem encurvadas, procurando reconhecer, com a face palmar, o contorno do fundo do útero e a parte fetal que o ocupa. Na maioria dos casos, sente-se aí o polo pélvico, com a característica de ser mais volumoso que a cabeça, esferoide, de superfície irregular, resistente, mas redutível, deixando perceber, eventualmente, as cristas ilíacas como duas proeminências. No caso de o polo cefálico estar nesse ponto, verifica-se corpo de superfície regular, resistente e irredutível, com duas regiões características – o occipital e a fronte. Havendo quantidade suficiente de líquido, anota-se o “rechaço”. Uma das mãos imprime súbito impulso ao polo fetal que, deslocado, desaparece, denominando-se rechaço simples; quando ele volta à situação primitiva e é percebido pela palpação, trata-se de rechaço duplo. Com as duas mãos, também é possível verificar esse rechaço, jogando o polo de uma contra a outra. Em comparação com as nádegas, o rechaço é muito mais nítido com a cabeça, posto que seu formato, sua consistência e sua mobilidade, relativamente à coluna, conferem tal qualidade.
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▶ Segundo tempo. Procura-se deslizar as mãos, do fundo uterino em direção ao polo inferior do órgão, com o cuidado de sentir o dorso fetal e as pequenas partes ou membros, de um ou outro lado do útero. A região dorsal do feto apresenta-se como superfície resistente e contínua, plana (no sentido longitudinal) e convexa (no transversal). É mais facilmente percebida nas variedades anteriores.
Quando o dorso se orienta para trás, ficam mais perceptíveis as pequenas partes fetais que tomam contato mais direto com a parede anterior; caso elas estejam à esquerda, aquele ficará à direita e vice-versa.
▶ Terceiro tempo. Conhecida, mais particularmente, por manobra de Leopold ou Pawlick, tem como objetivo a exploração da mobilidade do polo que se apresenta com relação ao estreito superior. Seria um dos tempos da técnica sistematizada por Leopold, e nela procura-se apreender o polo entre o polegar e o dedo médio da mão direita, imprimindolhe movimentos de lateralidade que indicam o grau de penetração da apresentação na bacia. Quando ela está alta e móvel, esse polo balança de um lado para outro.
▶ Quarto tempo. Deve-se explorar a escava em último lugar. Nesse ponto, o polo cefálico é frequentemente encontrado e, ao palpar, apresenta caracteres mais nítidos. O examinador volta suas costas para a cabeça da paciente, colocando as mãos sobre as fossas ilíacas, caminhando em direção ao hipogástrio, paralelas à arcada crural, afastadas uma da outra cerca de 10 cm. Com as extremidades dos dedos, procura penetrar na pelve. Ao abranger o polo que aí se apresenta, verifica pelas suas características se é cefálico (menor, liso, consistente, irredutível) ou pélvico (maior, irregular, amolecido e deixando-se deprimir). Trata-se, respectivamente, de apresentação cefálica ou pélvica.
Na córmica (situação transversa), a escava está vazia.
A entrada dos dedos exploradores na bacia depende do grau de insinuação do polo apresentado. Quando móvel, os dedos quase se tocam pelas extremidades e descem por igual. Cogitando-se de cabeça encaixada, e devido à flexão cefálica, os dedos, em correspondência com o occipital, mergulham mais profundamente que os postos em relação à fronte. Sente-se, então, com consistência dura, a saliência da fronte, que ascende.
Na apresentação pélvica, mesmo insinuada, os dedos de um lado e de outro penetram igualmente. Nas situações transversas, a cabeça fetal estará locada em uma fossa ilíaca, o polo pélvico na oposta e o dorso disposto em sentido transverso ou oblíquo.
Ausculta
Pretende-se ouvir os batimentos cardiofetais (bcf), os quais informam, durante a gestação, se o concepto está vivo ou morto, não sendo possível inferir com exatidão suas condições de higidez, a não ser por meio do monitoramento dos batimentos, técnica descrita mais adiante.
No parto, a vitabilidade fetal pode ser razoavelmente analisada pela ausculta, embora o registro cardiotocográfico o faça mais facilmente e com apurada fidelidade.