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experiência me fez ver ‘olha é isso que eu quero, é nesse caminho que eu vou’ (Professor Joca

No documento filipegabrielribeirofranca (páginas 71-74)

Ramiro).

A constituição da sexualidade também é um processo que acontece gradualmente e individualmente:

“É uma coisa que eu fui construindo

muito lentamente”

. Um processo no qual o sujeito se volta sobre si mesmo e se abre para uma experiência de dessubjetivação:

“Durante a própria

graduação eu não tinha isso tão claro pra mim também e foi depois que

eu fui tomando esse caminho [...], até eu ter esse contato que foi

marcante”

. Uma experiência que o atravessa e transforma, que o torna diferente do sujeito que ele era antes de vivenciá-la. Desse modo a dessubjetivação

se constitui assim como forma histórica de subjetivação. Não há como separar uma da outra, e tampouco como separar a experiência como parte dessa relação, uma vez que ela se constitui nesta fratura entre dessubjetivação e subjetivação (FERRARI, 2013, p. 17).

O professor Joca Ramiro destaca ter passado por algumas experiências, porém, nada que o tirasse do lugar, levando-o ao

“ponto de definir”

. Sendo assim, penso que “não é possível fixar um momento [...] que possa ser tomado como aquele em que a identidade sexual e/ou a identidade de gênero seja “assentada” ou estabelecida” (LOURO, 2008a, p. 27). Os sujeitos e suas identidades estão sempre se constituindo, se produzindo, eles e elas são instáveis e, portanto, suscetíveis a transformações. No entanto, mais tarde, o professor Joca Ramiro é atravessado por uma experiência que é extremamente marcante para a definição do seu desejo sexual, que culmina na possibilidade de fazer a afirmação

“olha é isso que eu quero, é nesse caminho que eu

vou”

.Tal afirmação soa com um ar de descoberta, de liberdade, de “chegar a ser o que se é”, de encontro com um caminho possível de ser vivenciado e

experenciado: a homossexualidade. Mas, este é um caminho que ao mesmo tempo também pode aprisionar os sujeitos, tal como a heterossexualidade. Os discursos sobre as homossexualidades acabam sendo inseridos em jogos de liberdade e aprisionamento. Sendo assim:

O “chegar a ser o que se é” não está agora do lado da lógica identitária do autodescobrimento, do autoconhecimento ou da auto-realização, mas do lado da lógica desidentificadora da invenção. Uma invenção, não obstante, que não se pensa a partir da perspectiva da liberdade criadora do gênio, da soberania de um sujeito capaz de criar-se a si próprio, mas a partir da perspectiva da experiência ou, melhor, da experimentação (LARROSA, 2005, p. 66).

Construímos nossas identidades com nossas histórias de vida e essas identidades atravessam e constituem os corpos. As identidades não são fixas, elas são mutáveis, em constantes processos de transformação que refletem nos corpos, nos modos de ver e viver em sociedade. As identidades são fabricadas e essa fabricação está intimamente ligada à marcação das diferenças. Pensando com Woodward (2009):

Essa marcação da diferença ocorre tanto por meio de sistemas simbólicos de representação quanto por meio de formas de exclusão social. A identidade, pois, não é o oposto da diferença: a identidade depende da diferença. Nas relações sociais, essas formas de diferença – a simbólica e a social – são estabelecidas, ao menos em parte, por meio de sistemas classificatórios (WOODWARD, 2009, p. 39-40).

As identidades nos conduzem em diferentes direções, de tal modo que nossas identificações estão sendo continuamente deslocadas (HALL, 2001). A diferença pode ser significada pela marginalização do outro, mas ao mesmo tempo são destacadas e valorizadas a heterogeneidade e multiplicidade presentes nela. A diferença convida ao contato e à transformação, ela nos convida a descobrir e encarar o outro como parte da constituição de nós mesmos. Discursos sugerem corpos que devem e que não devem ser reproduzidos na sociedade, estabelecendo uma norma a ser reproduzida e o corpo que foge dessa norma é classificado como “desviante”. Silva (2009) observa que:

Fixar uma determinada identidade como norma é uma das formas privilegiadas de hierarquização das identidades e das diferenças. A normalização é um dos processos mais sutis pelos quais o poder se manifesta no campo da identidade e da diferença. Normalizar significa eleger – arbitrariamente – uma identidade específica como o parâmetro em relação ao qual as outras identidades são avaliadas e hierarquizadas. Normalizar significa atribuir a essa identidade todas as características positivas possíveis, em relação às quais as outras identidades só podem ser avaliadas de forma negativa. A identidade normal é “natural”, desejável, única (SILVA, 2009, p. 83).

Ao mencionar uma “identidade normal”, caio num sistema de classificação constituído por significados. Os significados são produzidos tendo em vista as formas de ordenação e organização das coisas de acordo com os sistemas classificatórios. Toda cultura possui suas próprias e diferentes maneiras de classificar o mundo. É por meio dos sistemas classificatórios que é possível atribuir sentidos e significados à convivência em sociedade. Os lugares que assumimos e os nossos posicionamentos constituem nossas identidades.

A identificação é tida como um processo de articulação, que opera por meio da diferença, envolvendo um trabalho discursivo e a marcação de fronteiras atribuídas que atingem os corpos. É necessariamente porque as identidades são construídas a partir de práticas discursivas que precisamos entendê-las como produtos institucionais e históricos, constituídas ao longo dos tempos, estabelecendo uma íntima relação no interior dos jogos de poder e exclusão. Hall (2009, p.121) lembra que “o corpo é construído, moldado e remoldado pela intersecção de uma variedade de práticas discursivas disciplinares”. Essas práticas muitas vezes se encarregam de reproduzir atos normativos regulatórios, cerceando o corpo de autonomia, criando regimes de verdade e a produção de corpos submissos a processos normalizadores. Porém, é importante destacar que os corpos também escapam e podem resistir aos processos que os disciplinam. E afinal, existe um caminho certo para nós? Guimarães Rosa diria que o caminho certo não é “nem para a frente nem para trás: só para cima. Ou parar curto quieto. Feito os bichos fazem. Os bichos estão só é muito esperando? Mas, quem é que sabe como? Viver... O senhor já sabe: viver é etcétera...” (ROSA, 2001, p. 132-133).

Continuando a pensar nos modos de constituição das sexualidades como processos ligados às experiências e à experienciação, podemos ver que parte desses processos acontecem durante a infância e são resgatados nas narrativas d@s professor@s. O professor Zé Bebelo faz uma narrativa a partir dessa perspectiva:

[...] eu tinha um amiguinho que era maior que eu e

No documento filipegabrielribeirofranca (páginas 71-74)