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Experiências internacionais: reflexos na democracia e na igualdade

4 MEDIDAS QUE PODEM SER REALIZADAS PARA FOMENTAR A

4.3 Experiências internacionais: reflexos na democracia e na igualdade

Em 1990, surgiu na Europa as cotas para as mulheres e essa inovação foi propagada por diversos países. A pauta em prol de uma maior participação política feminina entrou de vez

na agenda de diferentes países ao redor do mundo. O sistema de cotas, foi assumindo variadas formas de elaboração e instituição que, consequentemente, demandaram resultados diferentes dependendo dos contextos em que foram inseridas.

Ainda na década de 80 e início da década de 90, Noruega, Dinamarca, Finlândia e Irlanda, já haviam adotado alguma medida que possibilitasse maior igualdade de participação das mulheres em órgãos públicos de decisão. (VAZ, 2008, p. 37).

Diante desses exemplos, a partir da Conferência da Organização das Nações Unidas (ONU), ocorrida em 1995, a política de cotas foi discutida em âmbito mundial, possibilitando a implantação de tais ações em diversos países do mundo que contavam com representantes neste evento (VAZ, 2008, p. 43).

No Estado brasileiro, a política de cotas de gênero foi um assunto que despertou discussões polêmicas, representadas por pessoas que negam esse tipo de ação afirmativa, bem como, por pessoas que defendem o atual sistema e lutam por melhorias.

A política de cotas por sexo é uma discussão que abrange diversos países, sendo que alguns se encontram em posições avançadas no que tange ao tema. Os dados compartilhados pela União Interparlamentar (IPU), organização internacional dos parlamentos dos Estados soberanos, localizada em Genebra, apontam a posição vergonhosa na qual se encontra o Brasil no que diz respeito à participação da mulher na política brasileira.

Essa organização foi criada em 1889 e tem os seguintes objetivos: favorecer a coordenação e a troca de experiências entre os parlamentos e os parlamentares de todos os países, examinar as questões de interesse internacional e se pronunciar sobre elas, com o objetivo de provocar uma ação dos parlamentos; contribuir para a defesa e a promoção dos direitos humanos; e contribuir para o melhor conhecimento do funcionamento das instituições representativas. O IPU integra mais de 140 parlamentos. A União Interparlamentar trabalha em parceria com as Nações Unidas (ONU), com a qual compartilha objetivos (IPU, online, 2012). Esse fato é perceptível através do ranking apresentado pela IPU, nesse cenário, o Brasil ocupa a 154ª posição em um ranking internacional, elaborado pela União Interparlamentar que listou 190 países, sobre a participação da mulher nos parlamentos.

Segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), na composição atual da Câmara, das 513 cadeiras, somente 55 são ocupadas por mulheres (10,7%). No Senado, o percentual é um pouco maior. Das 81 cadeiras, 12 são ocupadas por mulheres (14,8%). São 67 mulheres entre os 594 deputados e senadores (11,2%), (TELES, online, 2017).

As taxas brasileiras ficam abaixo da média mundial, em países do Oriente Médio de maioria mulçumana onde as violações aos direitos humanos são frequentes apresentam

números maiores que o Brasil de representação feminina. Países como a Somália, Líbia, Jordânia, Síria, Marrocos, Indonésia, Paquistão, Iraque, Afeganistão, Tunísia, Emirados Árabes e mesmo a Arábia Saudita superam o Brasil em termos de participação política da mulher nos parlamentos.

O Brasil, apresenta níveis de representatividade baixos que ficam abaixo da média mundial, que chega a ser de 22,1% de mulheres ocupando cadeiras nos parlamentos. Os números brasileiros são inferiores aos da média do Oriente Médio, com uma taxa de participação feminina de 16% (CHADE, online, 2015).

Sem qualquer sentimento de desprezo, é constrangedor o fato do Brasil encontrar- se a baixo de países árabes, como Arábia Saudita e Tunísia por exemplo, no ranking de representação política feminina, mesmo com o conhecido fato desses países apresentarem em suas legislações diversas restrições aos direitos das mulheres, eles conseguem apresentar indicativos melhores em termos de representação política feminina do que o Brasil. O Brasil tem uma legislação muito avançada, mas que não é acompanhada pela dinâmica do seu povo.

Diante desta realidade, surge a imprescindibilidade de ampliação desses espaços como condição para garantir o respeito aos direitos humanos das mulheres e a participação em igualdade de condições com os homens, para que em consequência destes atos ocorra uma transição verdadeiramente democrática e as mulheres se convertam em participantes ativas na vida política.

Um dos primeiros países a adotar as cotas na América do Sul, foi a Argentina ao incorporar esse mecanismo em sua legislação, com o objetivo de aumentar a representação feminina na Câmara, em 1991 (VAZ, 2008, p. 43).

Na América do Sul, a posição do Brasil também é de inferioridade no Congresso Nacional em relação a todos os países que compõem essa parte do continente americano. Na américa só não perde para o Haiti e Belize. O curioso é que esses dados não se repetem em países vizinhos como Argentina, Uruguai e Paraguai, que vêm a cada ano demostrando que a desigualdade de gênero na esfera política não tem tanta força como no Brasil.

A grande maioria dos países latinos americanos se encontrava em posições desanimadoras no ranking mundial. Nos últimos dados lançados pela plataforma da União Interparlamentar (2014), o continente americano ficou à frente dos demais continentes, principalmente da Europa, que até 2006 dominava o ranking com 29% de parlamentares do sexo feminino (IPU, online, 2014).

A Bolívia diferentemente do Brasil, através das eleições paritárias, conquistou o segundo lugar no ranking apresentado pela IPU e vem aumentando cada vez mais a

representatividade feminina dentro do Parlamento nacional, com uma participação equilibrada da mulher na política conforme publicado pelo Observatório de Gênero em 2014 (BRASIL, 2014).

Embora, a existência da Lei de Cota Feminina na Argentina, visando facilitar o acesso das mulheres ao Congresso, as parlamentares ainda hoje percebem os desafios que devem enfrentar para posicionar-se diante de oportunidades inferiores.

A forte participação das mulheres na trajetória de redemocratização desses países, possibilitou espaços políticos mais favoráveis que pode ter influenciado a adoção de cotas pelos países da América Latina (ARAÚJO, online, 2001).

Os países que estão fortalecendo a sua democracia e viabilizaram a participação feminina através de políticas de cotas e outras ações afirmativas, são aqueles em situação de pós-conflito, na qual as mulheres tiveram chances de ficar unidas após perdem os seus companheiros. Experiências que certamente são lições a serem apreendidas e que muito podem contribuir nesse processo histórico que hoje vivenciamos.

Em 2015, o primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau, anunciou a formação de seu governo e, pela primeira vez na história do país, nomeou um governo igualitário no ponto de vista de gênero. O governo, que tem 30 ministérios, foi dividido entre 15 homens e 15 mulheres (SALVADOR, online 2015).

Como se vê, o Brasil não acompanhou o ritmo das tendências internacionais ocorridas nos últimos anos. Houve mudanças importantes derivadas, sobretudo, da adoção de políticas de ação afirmativa, especialmente as cotas, com o propósito de elevar a participação feminina na vida pública, porém o percentual de mulheres eleitas é muito baixo.

A troca de experiencias entre diversos países é fundamental para que haja aperfeiçoamento dos sistemas de cotas, bem como para que sejam visualizadas as suas fragilidades e a evolução no desenvolvimento desses sistemas no Brasil, como no resto do mundo. Esses meios facilitam no processo da reforma política.

A Costa Rica e a Argentina demonstraram em suas experiências, a importância de um sistema de cotas para garantir o aumento da participação das mulheres na política, além de outras medidas como as sanções aos partidos que não tiverem o compromisso de cumprir a lei. Em Ruanda, onde se encontra atualmente a maior representação política feminina do mundo, com 48,8% de representação parlamentar com o uso das cotas eleitorais de gênero que aceleraram uma maior representação das mulheres no parlamento em poucos anos após um conflito interno no país é um exemplo de quando se quer mudar a estrutura de um Estado todos tem que ir à luta.

O genocídio enfrentado por esse Estado e os desafios da reconstrução nacional forneceram, portanto, boas oportunidades para as mulheres de Ruanda demonstrar suas habilidades e libertarem seus próprios potenciais. Durante o governo de transição que durou de julho de 1994 a maio de 2003, as mulheres filiadas ao partido RPF foram colocadas em muitas posições de tomada de decisão, dentro das cotas do partido RPF, nas nomeações políticas do governo de transição. (KANTENGWA, 2009, p. 143).

Aqui fica constatado que países com as mais diferentes realidades, muitas vezes mais graves das que são presenciadas no Estado brasileiro, conseguiram reverter esse quadro antidemocrático em relação às mulheres que é a sub-representação destas nos centros de poder. Tudo o que o Brasil não avançou durantes esses anos pode estar associado a má vontade dos nossos gestores em enfrentar de forma incisiva a desigualdade de gênero.

Na experiência brasileira, se observa que os avanços obtidos no plano internacional tiveram o condão de impulsionar as transformações internas. Nesse sentido, destacam a influência de documentos internacionais, como por exemplo, a Convenção sobre a Eliminação da Discriminação contra a Mulher, de 1979, a Declaração e o Programa de Ação da Conferência Mundial de Direitos Humanos de Viena, de 1993, a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, de 1994 e a Declaração e a Plataforma de Ação da Conferência Mundial sobre a Mulher de Pequim, de 1995.

Desse modo, os avanços constitucionais e internacionais, que consagram a perspectiva da igualdade entre os gêneros, têm a sua força normativa reduzida, mediante uma cultura que praticamente despreza o alcance dessas inovações. Os extraordinários ganhos internacionais, constitucionais e legais não implicaram automaticamente a sensível mudança cultural, que, muitas vezes, adota como referência os valores da normatividade pré-1988 e não os valores da normatividade introduzida a partir da Carta democrática de 1988, reforçados e revigorados pelos parâmetros protetivos internacionais (PIOVESAN, online, 2004).

Diante das experiências de outros países, fica claro que a aplicação da lei de cotas não é o bastante para que haja o aumento na quantidade de cadeiras ocupadas por mulheres. Portanto, o debate sobre a reforma política deve ser pautado pelo estudo de experiências internacionais que têm tido eficácia em termos de aumento no número de eleitas, sendo necessário capacitar e criar programas de apoio, realizando campanhas de incentivo, a fim de despertar as condições para que as mulheres participem dos processos decisórios.

4.4 O Estado Democrático de Direito como um aliado na abertura de espaços na política