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Bem, olha, vou te explicar meu desenho Ele se resume a ah um tema geral, é ah , aqui ah à lei da terça parte, vou te explicar um pouco do princípio, como fazer para situar

No documento Olha e vê: caminhos que se entrecruzam (páginas 180-184)

ver ele na TV d) John morreu Mas ele estava doente e) A: As flores estão lindas B: Mas elas

B: Bem, olha, vou te explicar meu desenho Ele se resume a ah um tema geral, é ah , aqui ah à lei da terça parte, vou te explicar um pouco do princípio, como fazer para situar

meus elementos... como eu faço para distribuir todos os meus elementos sobre minha folha. Em arte, há uma regra... a regra da arte que faz com que você divida sempre a folha em três partes.‖

(48) [A arrive chez B. Une fois qu‘il a mis son manteau au vestiaire, B lui dit: Regarde, on va al- ler dans ma chambre, on va être mieux pour pla- coter168.

Por fim, outro emprego de regarde2b bem como de vois-tu2 se dá como palavra-frase. Trata-se de orientação do F para que o O atente a uma idéia mencionada de modo explícito, como em (49), ou sugerida, como em (50), pelo F. No exemplo (49), ocorre como um elemento lingüístico para chamar a atenção à informação antecedente (uso anafó- rico). Em (50), regarde apresenta valor de conclusão que não é total- mente verbalizada, mas que provavelmente está no alcance da compre- ensão do O. Novamente aqui se tem a idéia de mobilização cognitiva que é sinalizada e/ou lembrada na conversação por meio do MD regar- de. Vejamos os exemplos:

(49) A: C‘est une bonne idée, ça. B: J‘ai toujours pensé que j‘avais bonnes idées. On ne me fait pas assez confiance, c‘est tout! Regarde...! C‘est loin d‘être bête ma suggestion.169

(50) [C diz alguma coisa. B ouve e diz a A:] Olha! (tradução nossa)170

Neste exemplo, regarde sinaliza, conforme Dostie (2004), uma informação implícita que F e O conhecem/compartilham e é recuperável por ambos, uma vez que faz parte da bagagem de seu conhecimento comum. Pode ser entendido como um marcador de suposta conivência. A simples presença do MD deveria ser suficiente para fazer o O com- preender o que o F tem em mente. Ou seja, o esforço cognitivo exigido do O é importante, de modo particularmente marcado quando regarde2b aponta rumo a uma idéia que não está claramente expressa (DOSTIE, 2004).

Como se observa na análise sincrônica, Dostie (2004) verificou que, como MD, permanece o valor assumido da forma fonte para regar- de, de um lado, devido ao caráter significativamente voltado para o es- forço cognitivo exigido do O e, de outro, em razão do valor diretivo

168 ―[A chega na casa de B. Depois de colocar seu casaco no vestiário, B lhe diz]: Olha, a gente vai para meu quarto, é melhor para conversar.‖

169 ―A: Essa é uma boa idéia.

B: Sempre pensei que eu tivesse boas idéias. As pessoas não confiam suficientemente em mim, é isso. Olha...! Está longe de ser idiota minha sugestão.‖

conservado pelo imperativo em P2, embora seja possível também em P4.

A análise diacrônica empreendida pela autora, por sua vez, reve- lou que regarde aparece nos textos literários do século XVII, o que sig- nifica que já estava em uso no século XVI. Os dados diacrônicos coleta- dos confirmam também os valores do MD regarde evidenciados nos dados sincrônicos.

Por fim, a autora apresenta um paralelo entre regarder e écoute e mostra a impossibilidade de equivalência completa entre ambos, tendo em vista que desenvolvem polissemias distintas e sofrem influência lexical e gramatical que permitem sua emergência. Detacam-se, entre outras, o aspecto ostentatório permanente em regarde e a ação verbal dele decorrente, o que não ocorre com écoute.

4.5.2 Os MDs espanhóis171 „mira‟ e „¿ves?‟ Mira e suas variantes (mire e mirad) foram investigados na fala

espanhola por Pons Bondería (1998)172, ao passo que Cuenca e Marin (2000)173 expõem uma análise constrastiva dos verbos de percepção ver e mirar gramaticalizados, segundo as autoras, como vamos a ver/a ver,

171 É sabido que o espanhol é uma língua de grande extensão territorial e variedade. É sabido também que constitui-se como língua oficial dos seguintes países: Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia, Costa Rica, Cuba, Equador, El Salvador, Espanha, Guatemala, Guiné Equatorial, Honduras, México, Nicarágua, Panamá, Paraguai, Porto Rico, República Dominicana, Uruguai, Venezuela e os assentamentos do Saara. Ademais, é falado, como língua não oficial, em outros territórios como Belize, Estados Unidos, Filipinas, Gibraltar e Marrocos. Em todos os níveis da língua, o espanhol apresenta variação; porém, em alguns níveis mais do que em outros. Moreno Fernández (2000, p. 35-46 apud CONCEIÇÃO PINTO; SILVA, 2005), com base nas diferen- ças da língua espanhola de diferentes territórios, dividiu-a em 8 zonas lingüísticas, a saber: a) Zonas lingüísticas do espanhol da América: A1. Caribe; A2. México e América Central; A3. Andes; A4. Rio da Prata; A5. Chile; b) Zonas lingüísticas do espanhol da Espanha: E1. Região castelhana; E2. Região andaluza; E3. Região canária.

172 O autor, com enfoque baseado na teoria de Halliday e Hasan (1976) e de van Dijk (1977), investigou o corpus Val.Es.Co, cujas gravações foram obtidas mediante método de observação participante e transcritas segundo método denominado ―jeffersiano‖, adaptado para o espanhol. 173 O suporte teórico que embasa este estudo provém da lingüística cognitiva (por exemplo, HEINE; CLAUDI; HÜNNEMEYER, 1991) e da teoria da gramaticalização (por exemplo, HOPPER; TRAUGOTT, 1993). Compõem o corpus de investigação das autoras gravações de programas de televisão em espanhol e catalão. Ressalta-se também que, às páginas 219-223, observa-se um levantamento apurado dos estudos pioneiros que tratam dos usos conectivos dos verbos de percepção ver e mirar em espanhol coloquial.

mira/mire, nas línguas espanhola e catalã174. ¿Ves?, mire e mirá, empre- gados no espanhol falado em Mérida (Venezuela), foram descritos por Domínguez e Alvarez (2005)175. Também deste país, porém da capital Caracas, provém a pesquisa dos MDs mira efetuada por Galué (2002)176.

Para Pons Bondería, mire e mirad desempenham diferentes valo- res na conversação, desde o significado literal do verbo de percepção até o emprego como conector textual177. O autor explica essa expansão de uso de acordo com uma série de etapas. Do sentido literal em que o F usa mira para convidar o O para prestar atenção a um elemento da enun- ciação, ou seja, a um componente do contexto discursivo, resulta o em- prego das formas verbais prototípicas. Desse sentido de base, mira passa a apresentar valor fático de chamada da atenção do ouvinte para o pró- prio enunciado proferido pelo F. Nesses contextos, conforme o autor, mira pode ser parafraseado pelo verbo de percepção escúchame e tem valor perlocutivo, visto que pretende que o O faça algo. Vejamos o e- xemplo:

(51) A: síí/ perooo hombre/ no hay que ir tam- pocoooo/

[provocando allí/ al personal↑] L: [pero es incómodo/ es incómodo]

S: provocando nada/ el queee- se ponga-que see- que s‘excite ya se apañará↓ es su problema/ ¿no?/ (RISAS)/ no no por ver a uma tia em bequini↑ A: no↓ pero [nooo]

C: [pero] eso tiene más {que ver com la (( comodidad)) deee]

A: [pero eso em verano] / primero/ mira] C: al nadar/ si hace mucho movimientoo A: si voy em biquini tengo que tomar [primeroo] [AP.80.Al, 352] catafórico178

174 Na seção 4.5.4, apresentamos mais detalhadamente os MDs em catalão. Aqui, vamos nos deter somente nos exemplos de MDs em espanhol.

175 As autoras analisaram o Corpus sociolingüístico de Mérida (Venezuela).

176 Galué (2002) investigou uma amostra constituída por 15 informantes em situação de diálogo e entrevistas, com falantes caraquenhos (Venezuela) de ambos os sexos, nível socioeconômico médio-alto, idade entre 20 a 65 anos.

177 Pons Bordería (2001, p. 226-227) coloca a dificuldade em diferenciar conectivos e MDs. Segundo o autor, os conectivos são apenas uma classe inserida noutra ampla de MDs, que compreende também elementos como modalizadores, reformuladores, marcadores de polidez, entre outros.

178

―A: siimm/ maaas homeem/ não tem que ir tambééém/ [provocando ali/ o pessoal↑]

Dessa função fática primária, mira expande seu sentido e deriva uma espécie de função fática interna que opera anafórica e cataforica- mente, chamando a atenção do O para o contexto precedente ou avisan- do-o da importância do segmento seguinte. Nesses contextos, mira pode ser parafraseado fíjate, pois serve como um guia ou instrução para o processamento interno do enunciado. A função fática interna relaciona- se diretamente aos usos enfáticos ou de reforço do que é dito. A ênfase, por sua vez, pertence, conforme Pons Bordería, ao terreno da modalida- de, considerada como a atitude do F frente ao que é dito. Dessa forma, mira passaria a desenvolver diferentes valores conversacionais:

(i) desacordo frente ao que é dito, quando aparece isoladamen- te. Por exemplo:

(52) V: em resumen// quee habtenía un asesor↑ // un asesor // pagado también del ayuntamiento de A./ que es V. F. que es el secretario de *** // y ese tío↑ ese tío estaba percibiendo otras tantas/ o- tras tantas como el señor alcalde↑/ del presupuesto de las arcas municipales/ el presupuesto munici- pal// (en)tonces resulta que ese tío/ pues también veía que se le ibaa/ y no noo/ aguanta aguanta que aunque presenten la moción/ tal/ cual/ aguan- ta↑// ahora resulta que ya no está↑/ porqueee el L. le ha dicho/ chh/ fuera de ahí// y el- y el cabritoo/ por aguantar um mes más um mes más↑// la sen- tencia del juez puede ser dura ¿eh? PUEDE SER muy dura

S: ¡uy! mira [J.82.Al, 702] (PONS BORDERÍA, 1998, p.223)179

No documento Olha e vê: caminhos que se entrecruzam (páginas 180-184)