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4.5 Aproximando a lupa do dado: as categorias de análise

4.5.1 Explorando os indícios: no rastro dos dados

Trata-se aqui de uma investigação das formas de articulação da teoria na escrita acadêmica como produção de conhecimento, por meio de análises linguísticas. A análise das dissertações permite, além de depreender as formas de representação do discurso outro da área de linguística, estabelecer relação entre as produções e o modo de orquestração de vozes na tessitura do texto.

Observamos que há entre as dissertações certa proximidade quanto ao número de páginas, por terem sido produzidas em instituições brasileiras. As diferenças entre elas podem ser lidas nos indícios deixados na materialidade linguística do texto pelo modo explícito e/ou pelo implícito: a citação, a alusão, o discurso direto, o discurso indireto, o discurso indireto livre, as modalizações, a paráfrase e simulacro. Esses são alguns mecanismos enunciativos mobilizados pelos pesquisadores, que, ao realizarem o trabalho de escrita, produzem efeitos no modo como engendram as vozes no texto.

Cumpre dizermos que, para a análise consideramos apenas excertos que tratam de conceitos bakhtinianos, para, por intermédio deles, observar a relação que o pesquisador estabelece com a teoria na escrita. Os excertos foram retirados da introdução da dissertação, da fundamentação teórica e da análise dos dados, para observarmos como o conceito foi articulado e quais estratégias engendraram as vozes na materialidade linguística. A escolha prioriza partes específicas dos trabalhos em que o pesquisador lida com os conceitos bakhtinianos. Eles foram retirados de diferentes seções e capítulos das dissertações, mas privilegiamos os capítulos de fundamentação teórica e de análise dos dados bem como os que representam modos de articulação de conceitos bakhtinianos na construção escrita da pesquisa. Critério utilizado para seleção de dados: formas do discurso relatado, citações, colocação verbal, pronomes e alguns procedimentos que indiciam um discurso exterior (aspas, itálico). As categorias serão explicadas e descritas no capítulo de análise, uma vez que as formas de análise que foram desenvolvidas estão relacionadas ao que foi observado e verificado nos dados.

Tendo em vista o que foi apresentado até aqui, no próximo capítulo iniciamos a análise do corpus. O intuito é apresentar os arranjos linguísticos que sinalizam formas de articular a presença do outro e interpretar as estratégias que o pesquisador em formação mobiliza para engendrar as diferentes vozes inseridas, por diferentes tipos de representação do discurso outro, na produção escrita de sua pesquisa e apontar os processos de produção de escrita acadêmica.

ARTICULAÇÃO DE VOZES NA ESCRITA DO PESQUISADOR EM FORMAÇÃO

Este capítulo é dedicado à análise da articulação dos pressupostos teóricos apresentados no início do trabalho, a qual proporcionará um olhar mais acurado para a escrita de dissertações de mestrado. Para isso, ao invés de apenas retomarmos outras pesquisas, com o objetivo de mostrar o que já foi dito e reforçar o que é falho, propomo-nos analisar a escrita do pesquisador em formação, com base em três processos de produção de escrita acadêmica – paráfrase, alusão e simulacro –, buscando compreender e descrever as formas de articulação do dizer do “outro” e como elas podem ser observadas por meio de arranjos linguísticos presentes na escrita das dissertações analisadas.

A partir das vozes citadas, mostramos os modos de articulação dos discursos na materialidade linguística do texto e apontamos os processos de produção de escrita acadêmica que podem fundar uma nova linhagem de produção de conhecimento. Esse trabalho discursivo se realiza a partir das diferentes formas de articulação do dizer do “outro” e que não se limita a reproduzir formas ou modelos, mas demanda encontrar, em certa medida, as formas linguísticas que o pesquisador mobiliza ao articular as vozes para sustentar seu ponto de vista na escrita da pesquisa. Essa discursividade pode ser lida e interpretada a partir de elementos linguísticos que as dissertações contêm.

Consideramos as formas de articulação de vozes como constitutivas da escrita acadêmica e centrais para se lerem os arranjos que engendram os discursos na escrita do pesquisador em formação e, por essa razão, dedicamos total atenção à discussão sobre as marcas do outro no discurso. No universo de escrita acadêmica, a paráfrase e a alusão são processos de produção escrita que possibilitam a apropriação e a manutenção do conhecimento produzido ao longo da história, assim como o simulacro da orquestração das múltiplas vozes que recontam e ressignificam os discursos no meio acadêmico.

Para o trabalho de análise, dividimos este capítulo em três momentos: no primeiro, focalizamos a presença de paráfrase; no segundo, a das formas de alusão; e, no terceiro, o de simulacro da orquestração de vozes, visto por meio de formas linguísticas de articulação das diferentes vozes na materialidade linguística do texto.

Esses processos de produção de escrita acadêmica – paráfrase, alusão e simulacro –, que evidenciam as formas linguísticas de articulação do “outro”, serão analisados separadamente nas próximas seções.

5.1 PARÁFRASE: atividade de reformulação do dizer do outro

O foco desta seção é a presença de paráfrase na escrita acadêmica. Entendemos paráfrase como um arranjo linguístico de organização e reformulação de um conhecimento anteriormente produzido. Nesta investigação, ela será utilizada como recurso para observamos em que medida o pesquisador em formação, ao longo do processo de escrita, consegue reformular e engendrar o conhecimento que mobiliza em seus textos. A paráfrase é um dos processos de produção escrita acadêmica que pode mostrar, pela materialidade da língua, a relação daquele que escreve com sua filiação teórica.

Fuchs (1985, p. 134) afirma que as formulações parafrásticas se traduzem como formas características de emprego metalinguístico da linguagem. Esse conceito pode ser aproximado aos de polissemia e heterogeneidade não marcada (AUTHIER-REVUZ, 2004), na medida em que diz respeito a uma tentativa de sistematizar formas de enunciar de um sujeito que escreve uma pesquisa. A autora ressalta que a paráfrase pode ser desenvolvida por sinonímia, equivalência ou reformulação.

Na análise das dissertações, concentramos nossa atenção na paráfrase de reformulação, por ser esta um modo de escrita que costuma evidenciar a capacidade de quem escreve para dar um pequeno pontapé inicial na proposição do discurso e que mantém traços do texto ao qual faz referência mas que também demonstra características formais, cognitivas ou socioculturais próprias do sujeito que produz a escrita. Esse tipo de paráfrase possibilita descrevermos os excertos selecionados a partir da observação das estratégias que o pesquisador utiliza ao mobilizar o outro discurso e dá-lo a ver na escrita.