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Factores de animação do espaço público e os diferentes domínios de actuação municipal

4. A animação do espaço público como estado

4.4. Relações entre factores, indicadores e acções municipais de animação do espaço público

4.4.2. Factores de animação do espaço público e os diferentes domínios de actuação municipal

domínios de acção municipal de animação dos espaços públicos

Visando preparar a reflexão exploratória sobre as acções municipais de animação do espaço público que se seguirá, procuro neste ponto relacionar os factores de animação com aqueles que considero ser os grandes domínios de actuação dos municípios na animação dos espaços. Estas relações são apresentadas na Tabela 4.3.

Recordo os quatro domínios definidos, já apresentados:

- Enquadramento urbanístico, que se refere às opções, a uma escala alargada, sobre o uso

do solo (zonamento, edificabilidades, estrutura…) e sobre a forma da cidade;

- Desenho urbano como actividade que define o tecido urbano através da relação entre

espaços públicos, edifícios e parcelas e que pode englobar, também, decisões sobre localização e distribuição de funções;

- Projecto de espaço público e de edifícios como momento em que se define e materializa

o tecido urbano definido pelo desenho e respectivos usos; e

- Gestão do espaço público como todas as acções, subsequentes à execução do projecto,

levadas a cabo pelos administradores do espaço visando assegurar o seu funcionamento. Todes estes domínios detêm uma dimensão funcional e outra formal, mesmo que em alguns casos uma se sobreponha claramente à outra. Adicionalmente, a actuação em cada um destes âmbitos pode impelir um regresso ao âmbito anterior, exigindo reformulações de decisões e acções tomadas.

Tabela 4.3 – Factores de animação e domínios de acção municipal de animação do espaço público

FACTOR DE ANIMAÇÃO

ENQUADRAMENTO

URBANÍSTICO DESENHO URBANO

PROJECTO DE ESPAÇO PÚBLICO E DE EDIFÍCIOS GESTÃO DO ESPAÇO PÚBLICO 1. Urbanidade da envolvente x 2. Conectividade e permeabilidade x X 3. Relação com o trânsito motorizado x X x x 4. Forma urbana acolhedora X x 5. Conforto climático X x x 6. Valor simbólico X x x 7. Percepção de segurança x X x x 8. Mobiliário, equipamento, pormenores de design x x 9. Bom estado de conservação x x 10. Coisas para ver e fazer x x x

O enquadramento urbanístico permite, então, influir sobre os factores que dependem, claro está, de decisões tomadas a esta escala alargada, da definição de usos, densidades, da estrutura e da forma da cidade: a urbanidade da envolvente, a conectividade e permeabilidade dos espaços; a relação com o trânsito motorizado, entendida de forma ampla, no sentido do quão orientada para a circulação automóvel a cidade é; e a percepção de segurança, não só na sua ligação ao trânsito motorizado, mas também na sua acepção de temor da criminalidade, pelo papel, por exemplo, que a criação de áreas monofuncionais, vazias em determinadas alturas, pode ter na sua segurança de facto e na percepção da mesma.

O desenho urbano, ao configurar tecidos, tem um impacto profundo na maioria dos factores, sendo bastante óbvia a sua importância para a criação de formas urbanas acolhedoras; a configuração de malhas determina também a conectividade e a permeabilidade dos espaços. Pode influenciar, ainda, o conforto climático ao determinar orientações e exposições solares, ao configurar malhas mais ou menos protectoras do vento e ao definir alturas dos edifícios, por exemplo. Ao traçar vias e alargamentos funcionais, tem um papel fulcral na definição da relação entre espaços e o trânsito motorizado. Analogamente, a criação de sentimentos de segurança está, também, bastante ligada à configuração da malha urbana e dos percursos no seu seio, na sua inter-relação com a distribuição funcional.

A sua relação com o factor “coisas para ver e fazer” é algo mais indirecta: por um lado, o desenho influencia desde logo a probabilidade de concentração de atractores de indivíduos, seja pela configuração

da malha, seja pela distribuição de actividades que define; por outro, pode determinar já determinados pontos de vista e enquadramentos paisagísticos, incluindo a acentuação (ou criação) de valores simbólicos ou estéticos, com potencial para consumo passivo que caberá ao acto projectual sublinhar.

O acto projectual é, naturalmente, influente na maioria dos factores, exceptuando aqueles que dependem exclusivamente de decisões tomadas num âmbito mais alargado: a urbanidade da envolvente e a conectividade e permeabilidade dos espaços. Tal não significa, porém, que o projecto não seja fundamental para reforçar (ou, em alguns casos, contrariar) efeitos de decisões tomadas nesses âmbitos mais alargados. Ao nível do conforto climático, é sobretudo neste momento de actuação que se tomam as decisões mais relevantes para capitalizar oportunidades ou, por outro lado, contrariar más opções tomadas no desenho urbano. Árvores, desenho das fachadas, localização de espaços de estadia, de espaços abrigados e expostos ao sol, tudo isto são opções fundamentais para o conforto climáticos dos espaços e que têm lugar no projecto de espaço público e de arquitectura. É também aqui que o teor “acolhedor” da forma urbana definida pelo desenho se concretiza, incluindo aspectos como a definição horizontal e vertical dos espaços, dimensões absolutas e relativas das componentes do espaço público, a promoção de transparência, de acesso (físico e visual, sobretudo) e da harmonia entre ocupação marginal e espaço público.

Os pormenores de desenho, em particular a organização da transição entre espaços e do acesso a estes e o dimensionamento relativo das suas componentes, e a dotação de equipamento (iluminação pública, por exemplo) são fundamentais para a percepção de segurança (do trânsito motorizado e do crime). Portanto, a relação imediata com o trânsito motorizado também passa por pequenos detalhes de desenho e equipamento que permitam atenuar eventuais efeitos nefastos duma presença próxima de trânsito motorizado.

O papel do projecto do espaço público e de edifícios na promoção da existência de coisas para ver e fazer encontra-se não só na sua capacidade de definição de usos, mas também parcialmente imbricado com o seu potencial para a criação de valores estéticos e simbólicos; ou seja, o projecto de espaço público e de edifícios podem, eles mesmos, criar coisas para os indivíduos verem e fazerem, e essas “coisas” podem ser (e são-no o mais das vezes) elementos de valor estético ou simbólico. Incluem-se neste domínio não apenas objectos contempláveis, mas também os que promovam um envolvimento activo dos utentes do espaço, como é o caso dos elementos de mobiliário urbano e da arte pública. Mas o projecto pode ainda intervir para que, havendo coisas para ver e fazer, existam condições para fazê-lo em conforto; é neste âmbito que se aplicam as várias considerações tecidas a propósito, por exemplo, da localização e orientação dos espaços sentáveis, de mudanças de nível, da localização de palcos ou outros elementos. É, pois, claro que o projecto de espaço público e de edifícios é o acto em que, por excelência, se tomam as decisões afectando o mobiliário urbano, a provisão de equipamento e, naturalmente, os detalhes de design.

Por fim, é de realçar que, ainda que o estado de conservação dos espaços dependa bastante das práticas de manutenção dos mesmos, há várias decisões tomadas no projecto, como, por exemplo, as relativas aos materiais de construção, que o influenciarão no futuro.

As práticas de gestão do espaço público podem ter impacto na generalidade dos factores de animação, também. A gestão do espaço é aqui entendida de forma lata, englobando não só as acções da entidade com essas mesmas responsabilidades de gestão, mas também de outros agentes que sobre ele actuam, nomeadamente os provisores de actividades, marginais ou no próprio espaço público; naturalmente que a actuação destes agentes é condicionada pela postura da entidade gestora perante os seus intentos.

A provisão de determinado tipo de mobiliário (e.g. cadeiras e mesas móveis, guarda-sóis…) depende de uma prática de gestão, ainda que a sua decisão possa ter sido já contemplada no processo de concepção espacial. É sobretudo através da inclusão de elementos de mobiliário que as práticas de gestão podem interferir no conforto climático dos espaços.

A relação com o trânsito motorizado também pode ser bastante determinada pelas práticas de gestão dos espaços, desde logo pela possibilidade de intervenção na própria presença (e nas suas modalidades) de veículos no espaço público. Daqui decorre, parcialmente, a relação entre gestão do espaço público e a percepção de segurança no seu seio, relação esta que existe também ao nível de esforços para combater e dissuadir a criminalidade e para criar percepções de ambientes seguros; são exemplos disto os já mencionados casos de reforço de policiamento nos espaços exteriores e instalação de sistemas de videovigilância.

A gestão dos espaços públicos, desde logo através dos actos de licenciamento e consequentes actividades permitidas, seja por acções que promovam os níveis de conforto dos espaços ou ainda da programação de actividades no seu seio, é um momento chave no fomento da existência de coisas para ver e fazer nos espaços públicos. É ainda pelo recurso a esta promoção activa de ocorrências que as práticas de gestão podem, num prazo mais alargado, contribuir para a formação de valor simbólico (ou até estético, numa acepção não visual do termo) nos espaços públicos.

Por fim, a gestão dos espaços é, obviamente, fundamental para a promoção do bom estado de conservação dos mesmos, não só através de operações de limpeza urbana, mas também da manutenção e recuperação físicas das suas componentes.

5.

Acções municipais de animação do espaço público