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Capítulo 2  Revisão Bibliográfica 3 

2.3   Aspectos nutricionais da carne bovina 60

2.3.3  Lípidos 69 

2.3.3.5  Factores que influenciam a quantidade e a composição de ácidos gordos na carne 105 

2.3.3.5.1  Factores intrínsecos 106 

O peso vivo é o principal factor a considerar quando se estudam as modificações da composição corporal (Castrillo, 1975). Para o mesmo grau de maturidade e de uma forma geral, quanto maior o peso ao abate, maior o nível de gordura da carcaça (Falagan, 1980; Valls, 1979).

2.3.3.5.1.2 Nível de gordura corporal

A redução do nível de gordura da carcaça tem sido um dos objectivos do melhoramento genético dos animais com interesse zootécnico. As modificações do teor em gordura da carcaça têm influência na sua composição (Wood & Enser, 1997). Nos bovinos, a relação P/S é principalmente determinada pelo nível de gordura corporal e é maior quando o teor em gordura intramuscular é mais baixo. Pelo contrário, a relação n-3/n-6 depende muito mais da dieta do que do nível de gordura corporal (de Smet, 2004).

2.3.3.5.1.3 Idade

De acordo com Hammond (1966), a idade é o factor que mais influencia a composição corporal. A deposição de tecido adiposo nos bovinos é iniciada durante a fase fetal, tendo sido observados adipócitos maduros em fetos bovinos com 6 meses de idade (Wegner et al., 1998). O aumento do nível de tecido adiposo depende da hipertrofia e hiperplasia dos adipócitos (Haugebak et al., 1974). O diâmetro dos adipócitos do tecido adiposo subcutâneo aumenta rapidamente até aos 12 meses de idade, atenuando-se esta dinâmica entre os 12 meses e os 24 meses de idade (Wegner et

al., 1998).

Para além das modificações no teor em gordura dos depósitos adiposos, à medida que os bovinos atingem a maturidade, a proporção de ácidos gordos insaturados na gordura intramuscular e subcutânea aumenta (Hecker et al., 1975). Ocorre um aumento da proporção de MUFA e uma diminuição da proporção de SFA, essencialmente devido a um aumento da relação C18:1/C18:0. Em termos de ácidos gordos individuais, as grandes alterações verificam-se nas proporções dos ácidos C14:0, C14:1, C16:1 e C18:1 e dos ácidos C18:0 e C18:2 que aumentam e diminuem, respectivamente. À medida que os animais crescem, as enzimas intervenientes na desaturação dos ácidos gordos tornam-se mais activas. Nos ovinos, pelo contrário, o teor em SFA aumenta enquanto o teor em PUFA diminui à medida que o animal atinge a maturidade (Nurnberg et al., 1999).

2.3.3.5.1.4 Raça

Tanto o teor como a composição dos lípidos intramusculares dependem do património genético dos animais (Deland et al., 2003; Ender et al., 1997; Robelin, 1986, Yang et al., 1999). Ender et

al. (1997) observaram um teor em gordura intramuscular muito mais baixo nos bovinos da raça

White-Blue Belgian (WBB) do que nos da raça Black-Pied (BP) (Tabela 2:13).

Tabela 2:13 Diferenças no teor e composição da gordura das raças White-Blue Belgian e Black-Pied

Músculo Ld WBB BP Significância

Gordura intramuscular (% de peso da carcaça) 0,6 2,1 +

Fosfolípidos (% peso do músculo) 0,4 0,4 -

SFA (% total ácidos gordos) 40,2 48,7 +

Ácido linoleico (% total ácidos gordos) 18,3 3,2 +

Ender et al. (1997)

Os animais com menores exigências de manutenção terão maior disponibilidade energética para a deposição de gordura subcutânea enquanto que os animais com maiores exigências terão maior tendência a formar depósitos internos de gordura, que são de mais fácil mobilização (Sprinkle et

al., 1998). A gordura intramuscular apresenta uma heritabilidade muito elevada (h2=0,4 a 0,6) enquanto a composição em ácidos gordos da gordura apresenta uma heritabilidade de moderada a elevada (Cameron & Enser, 1991).

2.3.3.5.1.5 Velocidade de crescimento

O ganho médio diário é função de factores genéticos e de maneio. Estes factores são responsáveis pela modificação da curva de crescimento e também pela composição corporal. A velocidade de crescimento (velocidade com que o estado adulto ou maduro é alcançado) interfere nas proporções entre tecidos. Quando a velocidade de crescimento é maior, produz-se menor proporção de tecido muscular e maior proporção de tecido adiposo, sobretudo subcutâneo. Em geral, quanto maior a taxa de crescimento de um animal, maior o seu teor em gordura para um dado peso corporal (Sully & Morgan, 1982).

2.3.3.5.1.6 Sexo

O sexo é um factor de variação da composição lipídica (Costa et al., 2006; Hecker et al., 1975; Kazala et al., 1999; Zembayashy et al., 1995). Segundo Terrell et al. (1969), os machos castrados possuem teores mais elevados de C14:0, C16:0 e C18:0 na gordura intramuscular do que as fêmeas com o mesmo peso. No entanto, neste estudo efectuado para o mesmo peso corporal, as fêmeas eram mais velhas, o que torna a interpretação dos resultados ambígua. Um ácido gordo

pode ser influenciado pelo sexo a uma determinada idade e a outra idade essa influência não se verificar.

Um estudo realizado por Eichhorn et al. (1985), em músculos com diferente localização, revelou que os machos inteiros apresentavam cerca de 5% mais PUFA nos lípidos totais do que os machos castrados. O teor em C18:2 e C18:3 foi maior nos machos inteiros do que nos machos castrados, tendo estes últimos apresentado maior proporção de C18:1. Malau-Aduli et al. (1998) referem ter encontrado menor teor em C18:2c9c12 nos fosfolípidos intramusculares das fêmeas do que nos machos castrados.

Deland et al. (2003) e Monteiro et al. (2006) encontraram teores significativamente mais elevados de C18:1c9 e MUFA na gordura intramuscular das fêmeas do que na dos machos castrados. Corroborando estes dados, Zembayashi et al. (1995) observaram maiores teores de C18:1, MUFA e UFA e maiores rácios MUFA/SFA e UFA/SFA na gordura intramuscular de fêmeas do que na de machos castrados, ambos com idêntica percentagem de gordura intramuscular e subcutânea.

2.3.3.5.1.7 Localização anatómica

O perfil de ácidos gordos depende do depósito adiposo. Segundo Webb et al. (1998), o nível de saturação dos lípidos aumenta dos depósitos mais externos (depósito subcutâneo) para os mais internos (Tabela 2:14). Este facto estará relacionado com as diferenças de temperatura nos diferentes locais do organismo (Lawrence & Fowler, 1997).

Tabela 2:14 Composição em ácidos gordos de diferentes depósitos adiposos de bovino

Depósito Ácido gordo (g/100g)

C16:0 C18:0 C18:1 C18:2

Subcutâneo 25-28 10-14 38-52 2-3

Peri-renal 25-31 18-26 34-36 2-4

Intramuscular 24-27 13-14 38-47 3-4 Rule et al. (1995)

O teor e composição da gordura intramuscular dependem da localização anatómica muscular. Quanto mais oxidativo é o músculo, maior o teor de MUFA e mais baixa a percentagem de SFA nos lípidos intramusculares (Andrés et al., 2001). De um modo geral, os músculos glicolíticos contêm menos LT e LP do que os músculos oxidativos, devido ao facto de utilizarem o glicogénio como fonte principal de energia em vez dos ácidos gordos. Os fosfolípidos dos músculos oxidativos contêm uma proporção mais elevada de cardiolipina e PE do que os glicolíticos. Este facto está relacionado com o maior número de mitocôndrias dos músculos

oxidativos (Cassens & Cooper, 1971). No entanto, os resultados obtidos por Andrés et al. (2001) e Leseigneur-Meynier & Gandemer (1991) sugerem que o teor lipídico muscular não depende apenas do perfil metabólico das fibras musculares. Alguns músculos predominantemente glicolíticos como o Ld apresentam, maior teor em lípidos do que outros mais oxidativos como o Pm (Leseigneur-Meynier & Gandemer, 1991). Existem outros factores que influenciam o teor e a composição dos lipídos intramusculares e que em determinadas situações apresentam maior relevância biológica do que o perfil metabólico muscular (Costa et al., 2008).

2.3.3.5.2 Factores extrínsecos

2.3.3.5.2.1 Dieta

Durante a fase pré-ruminante os vitelos alimentam-se quase exclusivamente de leite. A composi- ção da fracção lipídica da carne de vitela está relacionada com a composição do leite ingerido que contém desde ácidos gordos com 4 carbonos até ácidos gordos de cadeia muito longa, com 26 carbonos, incluindo ácidos gordos de cadeia ramificada e isómeros dos ácidos gordos insaturados, alguns em concentrações bastante reduzidas (Kramer et al., 1997) (Tabela 2:15).

Tabela 2:15 Composição média do leite de vaca

Fracção lipídica

Ácido gordo C6:0 C8:0 C10:0 C12:0 C14:0 C16:0 C16:1 C18:0 C18:1 C18:2

% Molar 1 1 2-3 5-6 10-18 32-34 2-4 10 19-30 2-4

Christie (2005)

A gordura do leite caracteriza-se por apresentar uma grande quantidade de ácidos gordos de cadeia curta (C4-C10) e média (C12-C17) e uma baixa proporção de ácidos gordos de cadeia longa (C>18), com composição a variar nos ruminantes de forma natural ao longo da lactação, qualitativa e quantitativamente (Palmquist et al., 1993).

As variações sazonais da composição das espécies pratenses poderão influenciar a composição da carne e do leite dos animais produzidos em regime extensivo (Costa et al., 2006; Kelly et al., 1999).

2.3.3.5.2.2 Lactogénese

Os ácidos gordos com menos de 10 carbonos são resultado da lipogénese mamária, através da síntese de novo, assim como cerca de metade da proporção dos ácidos gordos que possuem entre 12 e 16 carbonos. Os ácidos gordos com mais de 16 carbonos têm origem nas reservas corporais

ou a dieta (Demeyer & Doreau, 1999), uma vez que a glândula mamária não é capaz de alongar o C16:0 a C18:0 (Chilliard et al., 2000).

A suplementação lipídica inibe a síntese de novo de ácidos gordos pela glândula mamária (Page

et al., 1997). Segundo Hansen & Knudsen (1987), a composição dos triglicéridos formados na

glândula mamária depende não só da quantidade, mas também da composição dos lípidos da dieta. O ácido palmítico estimula a síntese de novo de ácidos gordos, enquanto que o esteárico e o linoleico são inibidores.

Os ácidos gordos sintetizados na glândula mamária têm como origem os ácidos gordos não esterifïcados ou as lipoproteínas ricas em triacilgliceróis. A captação de ácidos gordos pela glândula mamária depende em grande parte da respectiva concentração plasmática (Pethick & Dunshea, 1993). No caso dos TG, há necessidade da intervenção da lipoproteína lipase (LPL) que desempenha uma elevada actividade na glândula mamária, apresentando a absorção de TG uma elevada correlação com sua concentração plasmática (Barber et al., 1997). A absorção pela glândula mamária de ácidos gordos ligados às lipoproteínas plasmáticas de alta densidade (HDL) é baixa, o que ajuda a explicar o baixo teor de PUFA no leite (Demeyer & Doreau, 1999). Para compensar esse facto e não comprometer a fluidez do leite, a actividade da Δ9 desaturase é elevada na glândula mamária (Kinsella, 1972). Esta enzima insatura o C18:0 a C18:1, podendo também insaturar outros ácidos gordos de cadeia média (Demeyer & Doreau, 1999). No entanto, a Δ9 desaturase tem pouca acção sobre ácidos gordos com menos de 18 carbonos e por esta razão a maioria dos ácidos gordos de cadeia curta (SCFA) são saturados (Chilliard et al., 2000). Cerca de 40% do ácido esteárico que é absorvido pela glândula mamária é insaturado, originando ácido oleico. Segundo Enjalbert et al. (1998), mais de 50% do ácido oleico do leite é originado pela actividade desta enzima.

O isómero trans predominante no leite é o C18:lt11 (Precht & Molkentin, 1997) que representa mais de 80% dos ácidos gordos ruminais trans-monoinsaturados da gordura do leite (Griinari & Bauman, 1999). Da sua metabolização na glândula mamária resulta principalmente o ácido C18:2c9t11 (Corl et al., 2001; Jiang, 1996; Mosley et al., 2006; Precht & Molkentin, 1997).

2.3.3.5.2.3 Manipulação da dieta

A utilização da manipulação da dieta com o objectivo da alteração do perfil de ácidos gordos dos depósitos adiposos dos animais apresenta maior eficiência nos monogástricos do que nos ruminantes. A composição lipídica corporal dos monogástricos depende muito dos lipídos da

dieta, sendo esta relação mais marcada no tecido adiposo subcutâneo do que no tecido muscular (de Smet et al., 2000; Mourot & Hermier, 2001).

Nos ruminantes, os PUFA ingeridos são hidrogenados pela flora ruminal, formando ácidos gordos mais saturados (Choi et al., 1997; Christie, 2003; Jenkins, 1993). No entanto, Ashes et al. (1992) referem que a microflora ruminal não hidrogena, de forma relevante, o ácido eicosapentaenóico (EPA) e o ácido docosahexaenóico (DHA). Quando a ingestão de ácidos gordos insaturados é elevada, a capacidade de hidrogenação por parte dos microrganismos do rúmen diminui, ocorrendo uma maior absorção intestinal de ácidos gordos insaturados. Esta poderá ser uma das razões para a sazonalidade que se verifica na razão ácidos gordos saturados/insaturados (SFA/UFA) do tecido adiposo dos ruminantes em países de clima temperado (Lawrence & Fowler, 1997). Nestes países, as pastagens jovens apresentam elevada quantidade de ácidos gordos polinsaturados Bauchart et al. (1984a).

O enriquecimento do leite e da carne em PUFA pode também ser conseguido através da inibição na taxa de hidrogenação ruminal (Beam et al., 2000), através da utilização de compostos ionóforos e da redução do pH ruminal (Demeyer & Doreau, 1999).

A administração a ruminantes de alimentos ricos em ácidos gordos n-3, como o óleo de linhaça, óleo de peixe e de colza é uma prática habitual hoje em dia (Bauchart, 2003, comunicação pessoal; Mandell et al., 1997a; Scollan et al., 2001). Desta forma, consegue-se aumentar o teor dos ácidos gordos C18:3n-3, EPA (C20:5n-3), DHA (C22:6n-3) e de CLA na carne e no leite (Chilliard et al., 2001).

O pasto é uma fonte importante de ácido α-linolénico (18:3n-3) (Enser et al., 1998; Nurnberg et

al., 1998). Esta é uma das razões da gordura intramuscular dos animais em pastoreio apresentar

relações mais elevadas de PUFA/SFA e de n-3/n-6 (French et al., 2000) do que a os animais alimentados com concentrado (Mandell et al., 1997b; Nurnberg et al., 1998; Williams et al., 1983).

Os lípidos das forragens verdes são constituídos, em média, por 1/3 de pigmentos (clorofilas, carotenos e tocoferóis) e por 2/3 de lípidos esterificados. Estes últimos possuem 70-80% de glicolípidos (galactolípidos), concentrados nos cloroplastos das células e por 15-20% de fosfolípidos, concentrados no conteúdo citoplasmático e nas membranas celulares (Hudson & Warwick, 1977).

Os galactolípidos, formados por galactose, glicerol e ácidos gordos insaturados diminuem com a idade da folha e com a redução da relação folha/caule (Van Soest, 1994). Bauchart et al. (1984a) referem que as gramíneas de climas temperados possuem cerca de 1 a 3% de ácidos gordos, apresentando os valores mais elevados na Primavera e no Outono, constituindo o ácido α- linolénico (C18:3n-3) entre 55-65% do total de ácidos gordos. No entanto, a composição das gramíneas podem variar largamente com a espécie vegetal considerada, o estadio de crescimento, a porção da planta e o maneio produtivo (Garton, 1960; Gray et al., 1967). Os concentrados comerciais possuem em média 50% de ácido linoleico (C18:2n-6) e 30% de ácido oleico (C18:1n-9) (Bauchart, 1981).

As espécies forrageiras tropicais apresentam um perfil de ácidos gordos bastante diferente das existentes no clima temperado (O´Kelly & Reich, 1976). Estes autores referem que algumas gramíneas tropicais, como o Panicum maximum, têm como principal ácido gordo o C16:0 (30%), ainda que as concentrações de C18:2 (28%) e de C18:3 (23%) sejam também consideráveis. As gramíneas tropicais apresentam valores de ácidos gordos significativamente mais elevados no Verão do que no Inverno, sendo estas diferenças sazonais menores nas gramíneas de climas temperados (Bauchart et al., 1984b). Estas variações sazonais poderão estar na origem das diferenças de composição observadas nos depósitos adiposos dos bovinos em pastoreio (Kelly et

al., 1999).

2.3.3.5.2.4 Maneio

O sistema de produção tem implicações no teor em gordura intramuscular (Vestergaard et al., 2000). Um estudo efectuado por Wegner & Matthes (1994), com bovinos Hereford e Black-Pied produzidos em regime extensivo e intensivo, respectivamente, revelou que os músculos dos animais Hereford apresentavam menor diâmetro das fibras musculares e dos adipócitos.

A alternância entre fases de restrição e realimentação pode implicar diferenças na composição dos tecidos entre os animais submetidos a estas fases e os animais em crescimento contínuo (Hoch et al., 2003). De um modo geral, os trabalhos que descrevem o efeito que as fases de restrição/realimentação têm na composição química da carne dos animais, revelam que os teores proteíco e lipídico são fortemente afectados (Carstens et al., 1991), No entanto, Laborde et al. (2001) não encontraram diferenças no teor de lípidos intramusculares entre animais submetidos a restrição e crescimento compensatório e animais em crescimento contínuo, abatidos para o mesmo nível de gordura corporal (estimada por ultra-sons). As diferenças encontradas foram

composição corporal dos animais dependido das características da restrição (severidade e duração) e das características da realimentação (nível e qualidade alimentar), assim como da idade a que os animais são restringidos (Hornick et al., 1999).

2.3.3.5.3 Promotores do crescimento

A administração de agonistas β-adrenérgicos provoca a diminuição do teor de gordura da carcaça, actuando directamente no tecido adiposo, estimulando a lipólise (Peterla & Scanes, 1990) e, consequentemente, o aumento do teor plasmático de ácidos gordos livres (FFA) (Beermann et al., 1987).

A somatotropina estimula a síntese proteica e diminui o armazenamento de ácidos gordos (Rehfeldt et al., 1993) devido a uma diminuição da sensibilidade dos adipócitos à insulina. Esta hormona além de reduzir a deposição de ácidos gordos, também provoca a redução do tamanho dos adipócitos.

A diminuição da lipogénese ocorre devido à redução do transporte da glucose, da actividade de várias enzimas lipogénicas, como são os casos da ácido-gordo sintetase, das enzimas geradoras de NADPH e da acetil-CoA (Donkin et al., 1996; Dunshea et al., 1992; Harris et al., 1993).

As catecolaminas estimulam a glicólise e a lipólise sem efeito significativo no metabolismo proteico (Castellino et al., 1990; Del Prato et al., 1990).

2.3.3.6 Oxidação lipídica

A oxidação lipídica é um processo autocatalítico geralmente iniciado ao nível dos ácidos gordos insaturados da fracção fosfolipídica das membranas celulares, devido à presença de radicais livres (Allen & Foegeding, 1981) (Figura 2:41). Os radicais livres são formados por certas oxidases, cuja acção é favorecida pela presença de metais de transição como o Fe2+ e o Cu+, ácidos gordos insaturados, mioglobina, hemoglobina, citocromos, luz, calor, condições alcalinas (Dziezak, 1986) e influenciada pelas condições de abate (stress, pH, estimulação eléctrica, temperatura de arrefecimento da carcaça) e pela presença das vitaminas E e C. O radical O• é um dos radicais livres mais potentes (Nakazawa et al., 1996). A oxidação lipídica aumenta a taxa de formação de metamioglobina, que por sua vez actua como catalisador da reacção (Enser, 2001). O ataque dos radicais livres aos ácidos gordos insaturados depende do tamanho da sua cadeia e do seu número de ligações duplas (Cosgrove et al., 1987). O elevado teor em ácidos gordos polinsaturados dos fosfolípidos da carne e a sua maior susceptibilidade a ataque dos agentes oxidantes presentes nas

células, permite que a oxidação se inicie ao nível subcelular (Gray, 1996; Igene et al., 1979; Sevilla et al., 1986).

Figura 2:41 Processo de oxidação lipídica

Segundo Rhee (1988), o complexo metamioglobina-peróxido de hidrogénio inicia a oxidação lipídica na carne fresca, com os PUFA a gerarem vários produtos de oxidação como: aldeídos, cetonas, ácidos, epóxidos, polímeros (Larick et al., 1992), responsáveis pelos odores e flavores desagradáveis (Gray, 1996). Os produtos de oxidação dos lípidos reagem com as proteínas, provocando perda da sua funcionalidade e redução do valor nutritivo da carne (Engeseth et al., 1993). Por outro lado, a oxidação dos fosfolípidos das membranas celulares ocasiona a perda da estrutura e das funções que a membrana desempenha (Lahucky et al., 2002; Monahan et al., 1994b; Wen et al., 1997). A quebra da integridade da célula muscular pode afectar a sua capacidade para actuar como barreira de permeabilidade selectiva, contribuindo para aumentar as perdas por exsudação da carne (Hertog-Meischke et al., 1997). A produção de radicais livres tem implicações nas características sensoriais e fisico-químicas da carne, prejudicando o flavor, textura, cor e valor nutritivo (Corino et al., 1999). Para além da degradação da qualidade organoléptica dos alimentos, alguns destes compostos poderão estar implicados no desenvolvimento de doenças cardiovasculares e de cancro (Guardiola et al., 1996; Pikul et al., 1984).

As alterações bioquímicas e a ruptura dos sistemas celulares que normalmente acompanham a transformação do músculo em carne fornecem condições para um desequilíbrio entre os factores

+ Oxigénio

+ PUFA RH

PUFA RH

Radical ácido gordo R

Radical peróxido ROO

Hidroperóxido ROOH + Radical ácido gordo R

Aldeídos, cetonas, ácidos, epóxidos, polímeros

pro-oxidantes e a capacidade antioxidante (Buckley et al., 1995), facilitando a formação de radicais livres para propagação das reacções de oxidação (Pearson et al., 1977). Não se conhece bem o mecanismo de iniciação do processo de oxidação uma vez que a formação espontânea de um radical lipídico ou a reacção directa dos ácidos gordos insaturados com o oxigénio molecular é termodinamicamente desfavorável (Buckley et al., 1995). Alguns autores referem que é a existência de metais de transição, como o ferro, capazes de gerar espécies com a potencialidade de retirar um protão a um ácido gordo insaturado que iniciam o processo. Para além da iniciação, estes metais também poderão desempenhar um papel fundamental na propagação da oxidação, uma vez que catalisam a quebra de hidroperóxidos lipídicos (Govindarajan & Hultin, 1977). A susceptibilidade da fracção lipídica do tecido muscular à oxidação depende da superfície de exposição da carne, do seu pH e da temperatura da carcaça. No entanto, o factor mais importante é a proporção de PUFA (Lahucky et al., 2002). Os músculos com maior teor de fosfolípidos e consequentemente de PUFA são mais susceptíveis à oxidação (Lauridsen et al., 1997).

O rácio entre as concentrações de PUFA e de α-tocoferol é um indicador importante da estabilidade oxidativa dos lípidos musculares e das taxas dos processos oxidativos. Qualquer evento que quebre a integridade das membranas musculares e altere a compartimentação celular facilita a interacção próoxidantes-ácidos gordos, promovendo a formação de radicais livres e a propagação das reacções de oxidação (Buckley et al., 1995). O colesterol presente em alimentos como o leite e produtos lácteos, os ovos, a carne e produtos cárneos pode sofrer oxidação e formar produtos de oxidação do colesterol (COPS). De um modo geral, o calor, o pH, a luz, o oxigénio, a actividade da água, a radiação e o teor de ácidos gordos insaturados e de radicais livres são os principais factores que afectam a formação de COPS. O seu isolamento e quantificação em materiais biológicos é difícil devido à presença de substâncias interferentes como o colesterol, os triacilgliceróis, os fosfolípidos, entre outros (Csallany et al., 1989).

O mecanismo de oxidação do colesterol é semelhante ao dos ácidos gordos. Os fosfolípidos e os ácidos gordos ligados ao colesterol estão intimamente associados, fazendo parte integral da bicamada lipídica da membrana celular. Deste modo, os hidroperóxidos formados durante a oxidação dos ácidos gordos desempenham um papel muito importante na oxidação do colesterol (Smith, 1981).

Segundo Osada et al. (1993), o colesterol puro mantêm-se estável quando é aquecido durante 24h a 100ºC. No entanto, quando é aquecido na presença de ácidos gordos polinsaturados, é rapidamente oxidado, formando-se vários produtos de oxidação. A oxidação do colesterol pode ser iniciada pela subtracção de um hidrogénio, predominantemente na posição C-7, seguido da

adição de uma molécula de oxigénio, levando à formação do 7α-hidroperoxicolesterol (7α-OOH) ou do 7β-hidroperoxicolesterol (7β-OOH). Estes são os primeiros produtos de oxidação do colesterol que se formam com o aquecimento. A redução do 7α-OOH e do 7β-OOH dá origem ao

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