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Capítulo 2  Revisão Bibliográfica 3 

2.3   Aspectos nutricionais da carne bovina 60

2.3.1  Oligoelementos (Fe, Zn, Se) e macroelementos (P, K e Na) 61 

2.3.2.1  Vitamina E 63 

O termo vitamina E é genérico para um conjunto de substâncias com a actividade biológica do α- tocoferol (Faustman et al., 1998), sendo conhecidos pelo menos 8 isómeros com a actividade

Tabela 2:6 Composição média da carne e do fígado de vitela (valores por 100g). Macronutrientes e oligoelementos Mg (mg) P (mg) K (mg) Na (mg) Se (µg) Zn (mg) Fe (mg) B2 (mg) B3 (mg) B12 (µg) B9 (µg) B6 (µg) Entrecosto grelhado 21 180 320 50 6-8 5-6 3 0.26 5 2 15 400 Alcatra crua 19 200 320 70 6-8 5-6 2.5 0.3 4.1 2 9 300 Alcatra cozida 19 170 250 52 6-8 5-6 3.5 0.24 3 2 7 Rosbife 25 230 400 65 6-8 5-6 3.5 0.25 5 2 14 400 Fígado 25 320 365 92 6 3 13.7 65 300 710 DDR 400 800 400-600 6000-8000 60 12 9-16 1.5-1.6 14 2.4 330 1800

biológica da vitamina E, isolados de óleos vegetais. Estes compostos, com diferente estrutura química, são: α, β, γ e δ-tocoferol e α, β, γ e δ-tocotrienol (Figura 2:26). Referindo-se a terminologia α-, β-, γ- e δ- à posição do grupo metilo. No que concerne ao controlo da oxidação lipídica os tocoferóis são substancialmente mais potentes e activos do que os tocotrienóis, com destaque para o α-tocoferol.

Figura 2:26- Representação dos tocoferóis e tocotrienóis

A maioria dos óleos contêm tocoferóis, sendo em geral tanto maior a sua quantidade quanto maior o grau de insaturação do óleo. Os animais são incapazes de sintetizar vitamina E, dependendo da dieta para suprir as suas necessidades (Faustman et al., 1989). Segundo o National Institute of Health (2002), o consumo diário recomendado de vitamina E nos humanos é de 22 UI (fonte natural) e 33 UI (fonte sintética). A forma sintética do α-tocoferol não é biologicamente tão activa quanto o composto natural, apresentando-se comercialmente como ésteres sem qualquer actividade antioxidativa. Uma vez hidrolisados no intestino liberta-se o α- tocoferol que recupera a sua actividade anti-oxidante. Depois de absorvido, o α-tocoferol é transportado até ao fígado sob a forma de quilomicra, que segrega o α-tocoferol posteriormente para o plasma, como parte integrante das lipoproteínas de muito baixa densidade (VLDL) e de baixa densidade (LDL) (Liu et al., 1995). A deficiência de vitamina E está associada a lesões nos sistemas reprodutor, nervoso, imunitário e cardiovascular e ainda a distrofia muscular e a lesões no fígado (Corino et al., 1999; Knekt et al., 1994; Stampfer et al., 1993; Weitberg & Corvese, 1997). Contudo, a sua função mais importante in vivo é como antioxidante, protegendo os ácidos gordos polinsaturados, dos radicais livres produzidos, muitas vezes pelas próprias enzimas membranares. Segundo Burton et al. (1983), apenas 1 molécula de α-tocoferol é suficiente para proteger cerca 1000 moléculas de lipídos. A vitamina E também apresenta uma acção inibidora na formação de nitrosaminas no estômago, a partir dos nitritos da dieta, conhecidas pelo seu carácter carcinogéneo.

A oxidação lipídica é iniciada nos ácidos gordos polinsaturados dos fosfolípidos membranares (Lauridsen et al., 1997) sendo influenciada pela presença de pró-oxidantes, como a hemoglobina, a mioglobina, os citocromos e o ferro não hémico, e pelos níveis de antioxidantes, como o α- tocoferol, os carotenóides, a histidina, alguns dipéptidos e enzimas (Bertelsen et al., 2000; Yang

et al., 2002).

Quando os PUFA são oxidados na membrana celular ocorre uma cascata de reacções químicas que na presença do α-tocoferol são interrompidas nas etapas iniciais (Lauridsen et al., 2000; Schaefer et al., 1995b). Segundo Asghar et al. (1990), o α-tocoferol está presente nas membranas subcelulares junto a coenzimas como a NADPH oxidase, capazes de catalisar a formação de radicais livres. O efeito antioxidante do α-tocoferol é superior quando existe a combinação com um antioxidante hidrosolúvel, como a vitamina C (Mitsumoto et al., 1991a).

Figura 2:27 Mecanismo de actuação do α-tocoferol individualmente e em sinergia com a vitamina C

O grupo fenólico do α-tocoferol actua como dador de electrões, desactivando a catálise e suprimindo a formação de radicais peróxido (Dirinck et al., 1996; Faustman et al., 1998). A vitamina E liberta um átomo de hidrogénio que é capturado por um radical peróxido (ROO•) sendo reduzido a hidroperóxido (ROOH). Apesar da estabilidade manifestada pelos radicais da vitamina E, estes podem reagir com outros radicais, terminando a cadeia de reacções associadas à oxidação lipídica (Figura 2:27). A eficiência desta protecção depende da relação α-tocoferol/teor de ácidos gordos insaturados presentes nas membranas e da presença de determinadas enzimas e outros pró-oxidantes. A vitamina E pode ser regenerada pelo ascorbato ou pela glutationa, embora o primeiro mecanismo de regeneração não seja ainda totalmente compreendido in vivo (Gille & Sigler, 1995).

O grau de oxidação lipídica é avaliado pela determinação de produtos de degradação dos ácidos gordos polinsaturados. Os métodos analíticos mais comuns doseiam as substâncias que reagem com o ácido tiobarbitúrico (TBARS), como medida do grau de oxidação da carne e produtos cárneos.

A concentração de α-tocoferol no organismo depende do tecido e do órgão considerados. De um modo geral, o fígado e as glândulas adrenais possuem maior concentração de α-tocoferol do que o tecido muscular e adiposo (Arnold et al., 1992). Lauridsen et al. (1997) referem que as diferenças no teor de α-tocoferol entre músculos estão relacionadas com o sistema vascular e com o seu teor em lípidos, possuindo os músculos mais oxidativos maior capacidade de armazenamento (Chan et al., 1996; Jensen et al., 1998; Lauridsen et al., 1997; Liu et al., 1995). As fibras do tipo I e IIA geralmente possuem maior capacidade oxidativa, maior densidade capilar e maior teor em lípidos do que as do tipo IIB. Por esta razão necessitam de mais α- tocoferol para prevenir o desenvolvimento de oxidações lipídicas. A existência de um maior número de componentes subcelulares nos músculos com elevada capacidade oxidativa pode contribuir para uma maior acumulação de α-tocoferol neste tipo de músculos do que nos de carácter glicolítico (Lauridsen et al., 1997). Um número maior de mitocôndrias e microsomas possibilita maior área membranar e maior capacidade de armazenamento de α-tocoferol (Asghar

et al., 1991a; Lauridsen et al., 2000; Liu et al., 1995). Por outro lado, os lipídos das mitocôndrias

e dos microsomas são muito susceptíveis à oxidação devido ao seu elevado teor em fosfolípidos ricos em ácidos gordos polinsaturados (Wen et al., 1997).

Para além da acção antioxidante, o α-tocoferol ajuda a estabilizar o complexo de oximioglobina (Faustman et al., 1989; Lanari et al., 1994). O mecanismo exacto pelo qual o α-tocoferol, um antioxidante liposolúvel, protege a oximioglobina que é hidrosolúvel não é bem conhecido (O´Grady et al., 2001). A localização do α-tocoferol, próxima dos fosfolípidos facilmente oxidáveis das membranas celulares sugere que a estabilização do pigmento estará relacionada com a capacidade de inibir a oxidação lipídica (Monahan et al., 1994a; Schaefer et al., 1995a). Segundo estes autores, os produtos da oxidação lipídica são mais hidrosolúveis do que os lípidos e podem entrar no citoplasma onde interagem com a oximioglobina, promovendo a sua oxidação. Foi sugerido por Lanari et al., (1993) e por Yin & Faustman (1994) que a oxidação da oximioglobina é iniciada pelos radicais livres formados no processo da oxidação lipídica. A oxidação lipídica é um processo que consome oxigénio e a oxidação da oximioglobina é marcadamente influenciada pelo nível de oxigénio. As tensões baixas de oxigénio favorecem a formação da metamioglobina. É possível que a oxidação lipídica provoque a descida do oxigénio dissolvido para níveis favoráveis à oxidação da mioglobina. Ainda não se sabe se a oxidação da oximioglobina ocorre primeiro e catalisa a oxidação dos lípidos ou vice-versa (O´Grady et al., 2001). Têm sido realizados muitos estudos sobre a oxidação lipídica e sobre a oxidação da

oximioglobina, utilizando soluções de oximioglobina relativamente puras em combinação com lípidos microssomais ou lipossomais. Apesar de importantes, estes sistemas estão longe de representar a enorme complexidade dos compostos existentes nos músculos, nos quais se incluem enzimas antioxidantes e pró-oxidantes, iões metálicos, compostos redutores e agentes que formam quelatos.

A dieta é um dos factores que mais influencia a concentração de α-tocoferol muscular. Segundo McClure et al. (2002), a carne proveniente de bovinos produzidos com uma dieta à base de concentrados apresenta, em média, cerca de 4 μg de α-tocoferol/g de músculo. Quando os bovinos são criados em sistema de pastoreio o teor de α-tocoferol na carne pode chegar a 9,3 μg/g de músculo (Faustman et al., 1998). Faustman et al. (1998) e Cannon et al. (1996) referem que é necessário no mínimo 3,0-3,7 μg/g de α-tocoferol para haver estabilização da cor da carne. A suplementação da dieta com α-tocoferol resulta em níveis musculares mais elevados neste composto, traduzindo-se em menor oxidação lipídica da carne (Cannon et al., 1996; Chan et al., 1996; Jensen et al., 1996; Lahucky et al., 2002; Monahan et al., 1994a; Schwarz et al., 1998; Zerby et al., 1999), menor formação de metamioglobina (Chan et al., 1996; Eikelenboom et al., 2000; Faustman et al., 1998; Liu et al., 1995; Mitsumoto et al., 1991b) e menor exsudação (Buckley et al., 1995; Cannon et al., 1996; Eikelenboom et al., 2000; Schwarz et al., 1998; Winne & Dirinck, 1997), aumentando o período de vida útil comercial carne (Dirinck et al., 1996).

Segundo Greer et al. (1998) e Sanders et al. (1997), a suplementação da dieta com α-tocoferol estabiliza os pigmentos cárneos sem ter efeitos negativos no crescimento, na qualidade da carne e no desenvolvimento microbiano. A adição de α-tocoferol à carne não é tão eficiente quanto a sua ingestão in vivo, dado que o α-tocoferol não é directamente incorporado na membrana onde ocorre a oxidação lipídica (Faustman et al., 1989; Mitsumoto et al., 1993). A adição post-mortem de α-tocoferol proporciona uma elevada superfície de contacto com o músculo, mas este contacto é apenas superficial e não intramembranar.

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