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A pesquisa qualitativa abrange um conjunto de práticas interpretativas e materiais que permitem que um estudioso analise os fatos em seus contextos naturais e que entenda ou interprete os fenômenos em termos dos sentidos que as pessoas lhe atribuem (DENZIN; LINCOLN, 2011). A pesquisa qualitativa também se estabelece como um método exploratório, que permite identificar variáveis que não podem ser medidas facilmente ou elencadas com base em informações predeterminadas na literatura (CRESWELL, 2014).

Em convergência, identifica-se, na literatura, uma orientação que não reconhece os métodos qualitativos como independentes do paradigma positivista (ROESCH, 2013) ou como antagônicos em relação aos métodos quantitativos (ONWUEGBUZIE; LEECH, 2005; NEWMAN; HITCHCOCK, 2011). Logo, a pesquisa qualitativa pode preceder a fase de desenvolvimento de uma escala ou de testagem das hipóteses em um estudo, sendo que essa

abordagem é apropriada para a fase exploratória da pesquisa (MALHOTRA; BIRKS; WILLS, 2012; ROESCH, 2013; HAIR JUNIOR et al., 2014; WALSH; SCHAARSCHMIDT; VON KORTZFLEISCH, 2016).

A partir dessas premissas, destaca-se que Ehnert (2009b) desenvolveu um estudo de cunho qualitativo (descrito na seção 2.3.4) e elencou algumas práticas de GSRH no contexto das empresas multinacionais europeias. No entanto, a literatura que trata sobre o tema ainda não apresenta uma listagem definitiva para a mensuração desse construto (EHNERT et al., 2016). Ademais, ainda não ocorreu o desenvolvimento de estudos, no contexto brasileiro, que adotassem os itens propostos por Ehnert (2009b) ou qualquer outra escala vinculada às práticas de GSRH.

Sendo assim, embora já existam variáveis elencadas no estudo de Ehnert (2009b), optou-se pelo desenvolvimento da fase qualitativa e exploratória, antecedendo à etapa quantitativa, com o objetivo de conhecer com maior aprofundamento a realidade da amostragem de empresas pesquisadas e verificar a necessidade de adaptar variáveis no instrumento de pesquisa quantitativo, no que se refere ao bloco de questões sobre práticas de GSRH.

Dentre as atividades vinculadas à pesquisa qualitativa, pode-se citar as notas de campo, as entrevistas, as conversas, as fotografias, as gravações e as anotações pessoais (DENZIN; LINCOLN, 2011). De maneira mais específica, as entrevistas possibilitam que questionamentos mais complexos sejam explicados aos respondentes, além de oportunizar a realização de perguntas abertas, o controle do ambiente no qual será desenvolvida e a obtenção da percepção de reação não verbais dos indivíduos (PHELLAS; BLOCH; SEALE, 2012). Nesse sentido, definiu-se a realização de entrevistas semiestruturadas e em profundidade (FLICK, 2015), com profissionais que atuam em empresas consideradas como referências no desenvolvimento sustentável no contexto organizacional. Os critérios adotados para a seleção das corporações e dos respectivos profissionais foram os seguintes:

a) empresas classificadas no ISE Bovespa, considerando a carteira 2016/2017, descrita, anteriormente, na seção 1.3;

b) possibilidade de acesso às organizações, conveniência e viabilidade para a condução do estudo (YIN, 2015), incluindo a oportunidade de desenvolvimento da etapa quantitativa;

c) profissionais indicados pelas organizações, preferencialmente em cargos de gestão, e com atuação nas áreas de recursos humanos e de sustentabilidade das

empresas20. Opta-se pela inclusão dos dois processos, em virtude da importância do alinhamento e do consenso dessas áreas para a GSRH (GUERCI; PEDRINI, 2014). Além disso, destaca-se que os gestores organizacionais detêm um papel crítico em relação às práticas de gestão de recursos humanos, à alocação de recursos corporativos e às políticas de definição da relevância e de interação com os stakeholders (MITCHELL; AGLE; WOOD, 1997; JÄRLSTRÖM; SARU; VANHALA, 2016).

Também se elaborou um protocolo de pesquisa (YIN, 2015), com o objetivo de nortear os contatos com as empresas e profissionais, a condução da coleta de informações e a análise de dados da etapa qualitativa. O referido protocolo está descrito no Apêndice G.

O contato inicial com as organizações, bem como a confirmação da adesão na presente pesquisa foram realizados com o apoio do Núcleo de Pesquisa e Estatística (NUPE)21 da Universidade FEEVALE. Destaca-se que se optou por buscar esse auxílio, uma vez que contatos prévios foram realizados, pontualmente, com algumas empresas e não se obteve o retorno esperado. Nesse sentido, a apresentação de um núcleo formalizado de pesquisa, mencionando o envolvimento e apoio de outras instituições de ensino e pesquisa renomadas (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES; Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS; Universidade de Caxias do Sul - UCS) viabilizou o desenvolvimento do presente estudo com a participação de uma amostra de empresas vinculadas ao ISE Bovespa.

Os profissionais vinculados ao NUPE FEEVALE contataram as 34 empresas classificadas no ISE Bovespa (carteira 2016/2017), por intermédio da realização de 134 ligações telefônicas e o envio de e-mails. Após a realização dos contatos iniciais (durante os meses de abril, maio e junho de 2017), oito empresas informaram que não participariam da pesquisa, 22 corporações não responderam ao convite, mesmo com os contatos reiterados, e quatro empresas encaminharam o aceite de participação na fase qualitativa: CCR S.A., Klabin S.A., Natura Cosméticos S.A. e Sul América S.A. Com essas confirmações, realizou-se a

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Uma das empresas participantes do estudo optou pela participação, na fase qualitativa, apenas do gestor da área de sustentabilidade, tendo em vista que esse profissional, atualmente, realiza um trabalho específico de integração entre os temas gestão de recursos humanos e sustentabilidade.

21 Maiores informações disponíveis em < https://www.feevale.br/servicos/nucleo-de-pesquisa-e-estatistica-- nupe>.

coleta de dados qualitativos com sete profissionais das referidas corporações, considerando-se que a fase qualitativa requer o estudo de um número de casos mais restrito, porém, com profundidade (MALHOTRA; BIRKS; WILLS, 2012).

A condução das entrevistas ocorreu a partir de um roteiro (Apêndice I), elaborado com base nos objetivos específicos do estudo e nos achados da revisão de literatura desenvolvida (Apêndice H). As entrevistas foram realizadas presencialmente ou online (via

Skype), sendo que os profissionais concordaram com essa condução, que contribuiu para uma

maior flexibilidade de horários para a realização dos encontros, bem como com a redução de custos com deslocamentos. Destaca-se que as entrevistas foram gravadas e, posteriormente, transcritas, seguindo as orientações da literatura (GIBBS, 2009; FLICK, 2015). Nesse sentido, organizou-se um compêndio de 81 páginas de entrevistas transcritas, com base em 284 minutos (aproximadamente cinco horas) de gravação. As informações relacionadas à coleta dos dados qualitativos estão descritas no Quadro 19.

Quadro 19 – Informações relacionadas às entrevistas para a coleta dos dados qualitativos

Fonte: Elaborado pela autora.

No período que antecedeu à realização das entrevistas, realizou-se a apresentação, para cada profissional, das principais informações vinculadas à tese: os temas associados, os objetivos, a justificativa, o modelo teórico e as hipóteses de pesquisa. Posteriormente, descreveu-se as etapas metodológicas do estudo. A referida explanação objetivou esclarecer possíveis dúvidas e sensibilizar os gestores para que ocorresse a adesão dos funcionários da empresa na fase quantitativa. Na sequência, foram conduzidos questionamentos que

Entrevistado Código de

identificação Área de atuação

Lotação do entrevistado Data da entrevista Duração Condução da entrevista Entrevistado 1 E1 Recursos Humanos São Leopoldo (RS) 01/06/17 00:49:30 Entrevista presencial

Entrevistado 2 E2 Sustentabilidade São Paulo (SP) 20/06/17 00:23:38 Entrevista

on line Entrevistado 3 E3 Sustentabilidade Rio de Janeiro (RJ) e São Paulo (SP) 19/06/17 00:58:36 Entrevista on line Entrevistado 4 E4 Recursos Humanos Jundiaí (SP) 04/07/17 00:27:24 Entrevista on line

Entrevistado 5 E5 Sustentabilidade Jundiaí (SP) 20/06/17 00:31:33 Entrevista

on line

Entrevistado 6 E6 Recursos

Humanos Cajamar (SP) 21/08/17 00:50:10

Entrevista

on line

Entrevistado 7 E7 Sustentabilidade São Paulo (SP) 24/07/17 00:43:30 Entrevista

possibilitaram a caracterização dos indivíduos entrevistados. No Quadro 20 descreve-se o perfil dos sete profissionais.

Quadro 20 – Perfil dos entrevistados na fase qualitativa exploratória

Entrevistado Cargo Gênero Idade Grau de instrução Tempo de empresa Tempo de experiência da função Outras áreas de atuação anterior E1 Coordenador de

Gente e Gestão Feminino

40 anos

Pós-

graduação 15 anos 5 anos

Gestão da qualidade E2 Analista Sênior de Sustentabilidade Masculino 29 anos Pós- graduação 4 anos e 9 meses 4 anos e 9 meses Professor de biologia e ciências E3 Superintendente de Sustentabilidade Masculino 43 anos Pós- graduação 1 ano e 8 meses 1 ano e 8 meses Recursos Humanos e Relações Corporativas E4 Coordenador de Gestão de Pessoas Masculino 35 anos Pós-

graduação 16 anos 2 anos Operações

E5 Assistente de Sustentabilidade Feminino 28 anos Pós- graduação 2 anos e 6 meses 2 anos e 6 meses Qualidade, Meio Ambiente, Saúde e Segurança do Trabalho E6 Gerente de Recursos Humanos Feminino 34 anos Graduação 5 anos e 6 meses 5 anos e 6 meses Treinamento Comercial E7 Gerente de Sustentabilidade Feminino 46 anos Pós-

graduação 21 anos 6 anos

Inovação e Desenvolvimento de Produtos e Embalagens, Inovação Científica e Gerência Técnica Fonte: Elaborado pela autora.

Além das entrevistas, buscou-se identificar alguns documentos complementares (CORLEY; GIOIA, 2004) que tratam sobre o desenvolvimento sustentável das organizações e sobre as práticas de gestão de recursos humanos (conforme estudos prévios realizados por Ehnert (2009b) e Ehnert et al. (2016)). Para tanto, analisou-se a menção desses itens durante as entrevistas e a disponibilidade de materiais nos sites das empresas que aderiram ao estudo.

Os materiais disponíveis nos sites das corporações representam uma forma de diálogo contínuo e aberto com os stakeholders, enfocando aspectos sobre o desenvolvimento sustentável e as relações com as partes interessadas, alicerçadas na transparência, na legitimidade, na confiança e na responsabilidade. Além disso, os documentos expostos em

sites auxiliam no processo de comunicação entre o empregador e os funcionários atuais e

potenciais, acentuando esse grupo como um stakeholder importante no cenário organizacional (EHNERT, 2009b).

Mais especificamente, os relatórios de sustentabilidade permitem que as empresas demonstrem o seu desempenho social e ambiental e forneçam à comunidade uma visão ampliada sobre como as organizações lidam com os desafios da sustentabilidade (HIGGINS; COFFEY, 2016). Geralmente, os relatórios apresentam a descrição da organização, sua visão e seus objetivos de desenvolvimento sustentável e uma série de indicadores que ilustram o desempenho da corporação (ROCA; SEARCY, 2012). Em suma, os referidos relatórios devem apresentar informações qualitativas e quantitativas sobre como a empresa conseguiu melhorar a sua eficácia e eficiência econômica, ambiental e social, em um determinado período, e integrar esses aspectos com um sistema de gerenciamento de sustentabilidade (DAUB, 2007). A partir das argumentações explicitadas, o Quadro 21 relaciona os documentos corporativos analisados.

Quadro 21 – Documentos corporativos analisados

Empresa Código de

identificação Documentos analisados

Klabin S.A. O1

- A Sustentabilidade na Klabin em 2016 (Relatório de Sustentabilidade) - Código de Conduta

- Diferenciais – Gente & Gestão

- Política de Direitos Fundamentais nas Relações de Trabalho - Política de Sustentabilidade

SulAmérica

S.A. O2

- Descrição dos benefícios SulAmérica - Faça Parte do Time SulAmérica

- Política Corporativa de Sustentabilidade Sul América S.A. - Política de Remuneração

- Relatório Anual 2016 – Índice de Indicadores - SulAmérica – Código de Conduta Ética - Temas estratégicos

CCR S.A. O3

- Código de Conduta Ética Grupo CCR

- Instrução Normativa Saúde e Segurança do Trabalho - Objetivos Gerais e Diretrizes

- Política de Responsabilidade Social

- Política para Transações com Partes Relacionadas - Relatório Anual e de Sustentabilidade 201622

Natura Cosméticos

S.A.

O4

- Natura Relatório 2016

- Relacionamento com o público interno - Relatório Anual Natura 2016

- Relatório de Administração 2016 - Trabalhe Conosco

- Visão de Sustentabilidade 2050 Fonte: Elaborado pela autora.

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O Relatório Anual e de Sustentabilidade 2016 informa que a empresa possui políticas formalizadas de gestão de pessoas e de remuneração e benefícios. No entanto, recebeu-se a informação, por meio do canal de relações com investidores, que os referidos documentos não estão mais vigentes e disponíveis.

Os dados oriundos das transcrições das entrevistas e dos documentos corporativos foram submetidos à análise de conteúdo (BARDIN, 2009), com o apoio do software MAXQDA, versão 12 e versão 2018. O referido programa apresenta interface acessível (GIBBS, 2009), auxilia na condução de projetos de pesquisa embasados em métodos qualitativos, quantitativos e mistos e permite importar, organizar, analisar, visualizar e publicar diversas formas de dados, incluindo documentos em formato PDF ou DOC e páginas

web (MAXQDA, 2017). Salienta-se que as características mencionadas conduziram à escolha

do software, por se adequarem às necessidades da presente pesquisa.

A análise do conteúdo das entrevistas e documentos foi realizada a partir do processo de codificação baseada em conceitos (GIBBS, 2009), com a existência prévia de um sistema de categorias (categorias a priori) (BARDIN, 2009). Nesse caso, as categorias ou conceitos que os códigos representam se originam da literatura e de estudos anteriores, havendo a possibilidade de elaborar uma lista preliminar de códigos para, posteriormente, codificar os dados (GIBBS, 2009).

A partir dessas definições, o processo de codificação foi realizado com base na identificação de trechos dos textos que exemplificavam os códigos definidos a priori (BARDIN, 2009; GIBBS, 2009), originários do estudo de Ehnert (2009b). Entretanto, destaca-se que ocorreu a necessidade de ajustar as nomenclaturas empregadas na lista de códigos (GIBBS, 2009), em virtude da adaptação ao contexto pesquisado. A Figura 21 exemplifica o processo de codificação, por meio da demonstração de um segmento da análise do Relatório Anual e de Sustentabilidade 2016, da empresa CCR S.A..

Após a finalização do processo de análise das entrevistas e dos documentos das organizações, identificou-se a ocorrência de codificação de 346 trechos, a partir da existência de 27 códigos definidos a priori (GIBBS, 2009). Desses, 22 códigos foram definidos com base no estudo de Ehnert 2009b. Três códigos objetivaram categorizar os trechos que tratavam sobre as contribuições das práticas de gestão de recursos humanos para a sustentabilidade organizacional, nas dimensões econômica, social e ambiental. Os dois códigos restantes foram aplicados nos segmentos que tratavam sobre o tema liderança sustentável e sobre os impactos das práticas de GSRH no comportamento e no bem-estar dos profissionais.

Figura 21 – Exemplo de codificação baseada em dados

Fonte: Elaborada pela autora, a partir da análise com o suporte do software MAXQDA.

Destaca-se que, além das ponderações já descritas na presente seção, buscou-se aplicar alguns critérios de qualidade durante a execução da fase exploratória (GIBBS, 2009; MILES; HUBERMAN; SALDANA, 2014), expressos no Quadro 22.

Quadro 22 – Critérios de qualidade da fase exploratória da pesquisa

(Continua) Critério de

qualidade Descrição do critério Considerações que foram seguidas

Objetividade Neutralidade do pesquisador

- Os métodos e procedimentos gerais estão detalhados e descritos. - Há uma explanação sequencial de como os dados foram coletados, processados, condensados e apresentados nos resultados.

- Há um registro dos métodos e procedimentos do estudo,

detalhados o suficiente para serem avaliados por outro pesquisador.

Confiabilidade

Consistência e integridade do

estudo

- Os resultados demonstram um alinhamento com outras fontes de dados secundários e uma conexão com a teoria.

- Os dados foram coletados de forma apropriada em relação à escolha das empresas, dos entrevistados e dos momentos de interação com esses profissionais.

- Ocorreu a elaboração de um protocolo de pesquisa e de um roteiro de entrevista, sendo que a condução desse processo foi realizada por um único acadêmico, reduzindo a possibilidade de diferentes percepções e interpretações.

- Ocorreu uma revisão do processo de transcrição e da análise dos dados.

(Conclusão)

Fonte: Elaborado pela autora, a partir de Miles, Huberman e Saldana (2014).

A sequência do estudo descreve os procedimentos metodológicos associados à etapa quantitativa.