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Muitas organizações, inseridas em um mercado global altamente competitivo, necessitam aumentar seus lucros e reduzir seus custos, para o atendimento das necessidades dos acionistas (MARIAPPANADAR, 2003). Diante desse cenário, as corporações realizam ações no sentido de diminuir custos, reestruturar ou até mesmo eliminar processos (downsizing), intensificar as atividades (aumento da carga de trabalho individual), reduzir o quadro de funcionários e promover mudanças significativas na corporação (MARIAPPANADAR, 2003; MARIAPPANADAR, 2012a; APP; BÜTTGEN, 2016).

Os processos de mudanças constantes e a concorrência acirrada fazem com que as corporações dependam, cada vez mais, da performance dos profissionais. No entanto, esse quadro provoca uma série de consequentes que se incorporam à rotina dos trabalhadores (PLUTA; RUDAWSKA, 2016): o aumento quantitativo e qualitativo das obrigações e responsabilidades dos funcionários e a consequente ampliação das jornadas laborais; a necessidade de realizar tarefas diversificadas, que exigem múltiplas competências e a habilidade de adaptação às mudanças constantes; por conseguinte, a aprendizagem contínua torna-se imprescindível e há pressão por desempenho, eficiência e atingimento de resultados tangíveis.

A partir dessa conjuntura, identifica-se um crescente interesse, entre profissionais e pesquisadores, sobre as questões sociais e externalidades negativas que se originam das práticas organizacionais mencionadas. Em paralelo, existe uma expectativa de identificar como a GSRH pode auxiliar na existência de uma sociedade permeada pelas premissas da sustentabilidade (MARIAPPANADAR, 2012b).

Na visão de Mariappanadar (2003), o conceito de externalidades é amplamente utilizado nas áreas de economia e gestão pública, porém, existe pouco enfoque sobre esse elemento no campo de estudos sobre gestão de recursos humanos. Para o autor, as externalidades estão relacionadas aos aspectos da interdependência e da ineficiência. As externalidades dizem respeito às práticas que uma organização desenvolve internamente e que objetivam a maximização da produtividade dos funcionários e os ganhos econômicos, sem considerar os impactos desse tipo de iniciativa no bem-estar dos indivíduos, de suas famílias e da sociedade (MARIAPPANADAR, 2013; MARIAPPANADAR; AUST, 2017).

Mak et al. (2014) corroboram com essa perspectiva e afirmam que muitas organizações têm determinado as questões financeiras como objetivos primordiais. Nesse contexto, algumas práticas de recursos humanos, tais como a intensificação do trabalho, o envolvimento e a capacitação dos trabalhadores, foram introduzidas para o alcance da eficiência e eficácia em custos, nas operações. Essa conjuntura impõe pressões nos funcionários e cria externalidades negativas para os indivíduos, seus familiares e para a comunidade em geral (MAK et al., 2014; CLEVELAND; BYRNE; CAVANAGH, 2015).

Quando as políticas organizacionais priorizam o sucesso financeiro em detrimento do bem-estar dos funcionários, ocorrem impactos negativos em dois níveis: em nível pessoal, afetando a saúde mental e o bem-estar físico do profissional e seus familiares e; em nível social, por meio do aumento das taxas de criminalidade, dos divórcios e de outras questões vinculadas ao contexto comunitário (CLEVELAND; BYRNE; CAVANAGH, 2015; PLUTA; RUDAWSKA, 2016). Por conseguinte, esses fatores, em longo prazo, prejudicam o sucesso e a sustentabilidade da própria organização.

Partindo-se da visão de que as externalidades representam os custos que as ações empresariais impõem à sociedade, é possível inferir que essas impactam diretamente na visão que os stakeholders terão em relação à corporação. Se uma organização, por exemplo, não apresentar preocupação em relação à segurança no trabalho e esse fato é divulgado pelos seus funcionários, poderão ocorrer dificuldades na atração e retenção de profissionais. Essa

situação poderá afetar, até mesmo, a disposição das pessoas em adquirir produtos da empresa (BIGLAN, 2009).

Diante dessas constatações, as organizações precisam desenvolver um enfoque no atendimento das necessidades dos acionistas (maximizando o rendimento econômico das operações), mas também devem considerar o bem-estar dos stakeholders (reduzindo os danos aos indivíduos, seus familiares e à sociedade) (MAK et al., 2014). Desse modo, as estratégias sustentáveis de recursos humanos necessitam integrar a rentabilidade da organização e a equidade socioeconômica (MARIAPPANADAR, 2003).

Com base nas proposições dos estudos de Mariappanadar (2003; 2012a; 2012b), descreve-se, na Figura 15, um modelo que contextualiza as externalidades negativas oriundas de algumas decisões organizacionais e o papel das práticas de GSRH. Salienta-se que as informações, provenientes dos indicadores apresentados na ilustração, oportunizam a sensibilização dos gestores e empresários sobre a importância das ações de gestão em relação aos funcionários da empresa (MARIAPPANADAR, 2012a).

Figura 15 – Modelo dos indicadores de danos oriundos das externalidades negativas das práticas organizacionais

Mariappanadar (2012a) explica que o agrupamento, em três classes, das externalidades negativas, justifica-se por meio da concepção dessa categorização. O agrupamento que trata dos danos psicológicos está relacionado, principalmente, ao estresse no trabalho, que se manifesta quando o indivíduo não tem oportunidades suficientes para se recuperar das pressões e demais situações estressoras vinculadas ao ambiente laboral. A classe que representa os indicadores sociais está fundamentada na influência das tensões do trabalho do indivíduo em sua família. Nesse sentido, as condições de trabalho irão impactar no estado emocional do trabalhador e essa questão poderá proporcionar tensões ou felicidade no âmbito familiar. Por fim, a terceira classe representa os impactos que as condições inadequadas e de estresse no trabalho ocasionam na saúde dos profissionais, tais como o desenvolvimento da depressão, dependência de álcool e drogas e transtornos psicossomáticos diversos.

A partir da visão de Mariappanadar (2003; 2012a; 2012b), destaca-se que as práticas organizacionais podem ocasionar danos à saúde ou prejuízos sociais aos trabalhadores. Mais especificamente, os danos à saúde relacionados ao trabalho são definidos como a percepção dos funcionários sobre as restrições em alcançar um estado de saúde positivo e sobre os indicadores e situações associadas ao trabalho, que podem conduzir a consequências negativas à saúde (MARIAPPANADAR, 2016). Os danos à saúde relacionados ao trabalho (representados na Figura 16) são classificados em três dimensões (MARIAPPANADAR, 2016):

a) fatores de risco para a saúde psicológica (risk factors for psychological health): dimensão que indica as manifestações iniciais de danos à saúde, a partir das externalidades negativas do contexto corporativo. Variáveis como o estado de ânimo, a autoconfiança e a saúde emocional compõem essa dimensão;

b) restrições para um estado de saúde positivo (restrictions for positive health): dimensão que aborda questões vinculadas ao estilo de vida do indivíduo e às possíveis restrições impostas pelo trabalho, para a consecução de ações para a preservação da saúde. Como exemplo dessas ações, pode-se citar o desenvolvimento de atividades para o controle do peso corporal, os esforços empregados na busca do equilíbrio entre trabalho e lazer e a realização regular de exercícios físicos;

c) efeitos colaterais do trabalho (side effects of work): dimensão que representa as consequências adversas das práticas relacionadas ao trabalho para o indivíduo. O

aumento do consumo de bebidas alcoólicas e café, os distúrbios do sono e as licenças do trabalho por motivos de saúde, são variáveis associadas a esse fator.

Figura 16 – Dimensões dos danos à saúde relacionados ao trabalho

Fonte: Adaptada de Mariappanadar (2016).

Fundamentado no estudo de Mariappanadar (2016), verifica-se que o construto danos à saúde relacionados ao trabalho é caracterizado como multidimensional, embasado em três dimensões reflexivas de primeira ordem. Sendo assim, essa argumentação corrobora com a elaboração da seguinte hipótese:

H2: Os danos à saúde relacionados ao trabalho representam um construto latente, reflexivo e

de ordem superior, compreendido pelos seguintes fatores: a) fatores de risco para a saúde psicológica, b) restrições para um estado de saúde positivo e c) efeitos colaterais do trabalho.

A introdução de práticas de GSRH, em uma organização, possibilita minimizar os impactos nos indicadores relacionados às externalidades negativas, por intermédio da melhoria das condições gerais de trabalho (MARIAPPANADAR, 2012a, conforme apresentado na Figura 15), reduzindo possíveis danos causados aos stakeholders (funcionários, familiares e sociedade) (MARIAPPANADAR, 2016; CRICHTON; SHRIVASTAVA, 2017; MARIAPPANADAR; AUST, 2017; DE PRINS; STUER; GIELENS, 2018). Nessa perspectiva, um importante objetivo da GSRH é reduzir os danos

oriundos das práticas organizacionais, promovendo a saúde ocupacional e o bem-estar dos indivíduos (JÄRLSTRÖM; SARU; VANHALA, 2016; LANGE, 2016; MARIAPPANADAR, 2016; DE PRINS; STUER; GIELENS, 2018).

Como exemplo de práticas de GSRH que convergem com o contexto apresentado, pode-se citar: o aprimoramento das relações de trabalho; ações para o bem-estar do profissional; intervenções para a valorização e oportunidades de desenvolvimento; atividades que favoreçam a saúde e a segurança ocupacional e que permitam que o indivíduo obtenha um equilíbrio entre sua vida profissional e pessoal (GOLLAN, 2000; EHNERT, 2009b; HIRSIG; ROGOVSKY; ELKIN, 2013; CLEVELAND; BYRNE; CAVANAGH, 2015; JÄRLSTRÖM; SARU; VANHALA, 2016).

Em suma, considerando-se que as características do ambiente de trabalho podem ocasionar danos à saúde dos profissionais (BEEHR; NEWMAN, 1978; HÖGE, 2009; COTTINI, 2012; MARIAPPANADAR, 2016; CRICHTON; SHRIVASTAVA, 2017) e que uma função importante da gestão de recursos humanos é promover a melhoria desse ambiente, a saúde (física e mental), a segurança e o bem-estar dos trabalhadores (GONÇALVES; NEVES, 2012; BECKER; SMIDT, 2016; LANGE, 2016; BALUCH, 2017; CRICHTON; SHRIVASTAVA, 2017; MARIAPPANADAR; AUST, 2017; DE PRINS; STUER; GIELENS, 2018), apresenta-se a seguinte hipótese de pesquisa:

H3: As práticas de gestão sustentável de recursos humanos têm um impacto significativo e

negativo nos danos à saúde relacionados ao trabalho.

Na sequência, são descritas as relações existentes entre a GSRH e o