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Fatores afetivos e a aprendizagem de línguas: a escrita e a correção

Os fatores afetivos exercem influência no processo de aprendizagem de L2 (Bailey, 1983; Gardner e MacIntyre, 1993; Dörnyei, 1998). Segundo McLeod (1987), a escrita é tanto uma atividade emocional quanto cognitiva, ou seja, nós sentimos e pensamos quando escrevemos. Os psicólogos usam o termo ‘cognitivo’ para se referir ao processamento de informações ou invocação de conhecimento. Por sua vez, o termo ‘afetivo’ refere-se ao domínio das emoções e sentimentos (McLeod, 1987). Os aspectos afetivos que podem ser considerados no processo da escrita são, segundo McLeod (1987), a auto-estima, a ansiedade, a capacidade de riscos, a motivação, e as crenças.

1.3.1 A auto-estima

Coopersmith (1967, p. 4-5, citado por Brown, 1994b) define a auto-estima como

a avaliação que o indivíduo faz e costumeiramente mantém de si próprio; ela expressa uma atitude de aprovação ou desaprovação e indica até que ponto o indivíduo acredita ser capaz, importante, bem-sucedido e respeitável. Em resumo, a auto-estima é um julgamento pessoal de valor que é expresso nas atitudes que o indivíduo tem consigo mesmo. É uma experiência subjetiva que o indivíduo exprime aos outros por relatos verbais e por outro comportamento expressivo aparente.

As pessoas formam sua auto-estima por meio de experiências individuais, bem como pelas experiências vivenciadas com outras pessoas e, também, por intermédio de avaliações do mundo ao seu redor (Brown, 1994b). Várias pesquisas foram feitas para verificar a influência da auto-estima na aprendizagem de línguas e os resultados mostram que há uma correlação positiva entre auto-estima e aprendizagem bem-sucedida (Brown, 1994b). O excesso de correção pode levar à baixa auto-estima e, conseqüentemente, bloquear o processo de aprendizagem (Andrés, 1999).

1.3.2 A ansiedade

A ansiedade, como um fator influenciador na aprendizagem de línguas, serviu de tema para várias pesquisas e discussões (Bailey, 1983; MacIntyre e Gardner, 1989; Gardner, Day e MacIntyre, 1992; Brown, 1994a, 1994b; Oxford, 1990, 1999). A ansiedade está relacionada com sentimentos de apreensão, frustração, desconforto e preocupação. Ela pode ocorrer em resposta a uma determinada situação (como, por exemplo, escrever em uma L2, falar em público, fazer testes etc.), ou pode ser uma característica da personalidade do indivíduo, ou seja, o indivíduo é sempre ansioso (Oxford, 1999). Ela pode, ainda, atuar como debilitadora, bloqueando o desempenho lingüístico do indivíduo, ou como facilitadora, mantendo o indivíduo alerta à situação de aprendizagem (Brown, 1994b).

Por meio de estudos feitos a partir de diários de aprendizes, Bailey (1983) demonstrou que a competitividade pode levar à ansiedade. Isso ocorre quando os aprendizes se comparam a outros aprendizes e idealizam uma auto-imagem que raramente possuem. Scarcella e Oxford (1992) concordam que a competitividade pode levar à ansiedade, mas sugerem que essa relação não ocorre com todos os aprendizes. Algumas vezes, os alunos, principalmente em sociedades competitivas, crescem com a competitividade (Oxford, 1999).

A ansiedade em relação à escrita é geralmente compreendida como sentimentos negativos em relação ao próprio escritor (baixa auto-estima), à situação de escrita ou a uma determinada atividade que causa transtornos durante o processo da escrita (McLeod, 1987).

Alguns autores, como, por exemplo, Scarcella e Oxford (1992), afirmam que a ansiedade pode ser aumentada devido a certos tipos de interação entre professores e alunos. A correção severa dos erros, bem como a forma ridicularizante e desconfortante de lidar com eles perante a classe estão entre os fatores que provocam ansiedade na interação professor–aluno (Oxford, 1999).

Segundo Tsui (1995), a ansiedade em sala de aula pode ser minimizada mediante o estabelecimento de uma boa relação entre alunos e professores, o uso de trabalhos em grupo e a oportunidade de os alunos discutirem com os seus pares antes de oferecerem respostas.

1.3.3 A capacidade de correr riscos

A capacidade de correr riscos é uma característica importante da aprendizagem bem-sucedida de uma L2 (Brown, 1994b). Segundo Brown (1994b, p. 140), os aprendizes devem “ser capazes de ‘apostar’ um pouco, de querer testar suposições sobre a língua e correr o risco de estar errados”. Para Tsui (1995), alguns fatores que podem minimizar a capacidade de correr risco são a falta de confiança dos alunos em relação à sua proficiência na língua e o receio de serem ridicularizados pelos colegas ou professores. Dessa forma, os alunos preferem permanecer em silêncio (tanto oralmente quanto na escrita) a se arriscarem a cometer erros.

1.3.4 A motivação

A motivação refere-se aos impulsos internos ou desejos em relação a um objetivo (Brown, 1994b) e pode ter como fontes a própria atividade de aprendizagem, o sucesso experimentado pelo aprendiz, traços de personalidade, recompensas etc. (Skehan, 1989; Dalacorte, 1999).

Segundo Williams e Burden (1997), um dos estudos mais significativos sobre o papel da motivação na aprendizagem de línguas é o de Gardner e Lambert (1972). Nesse estudo, os autores apresentam dois tipos de orientação: a integrativa e a instrumental. Na orientação integrativa, a motivação baseia-se em aspectos da personalidade do indivíduo que se identifica positivamente com os grupos falantes da língua-alvo, desejando compreender a cultura daqueles grupos e, até mesmo, fazer parte deles. Para Gardner (1968), é a motivação integrativa que favorece a proficiência na L2. Por sua vez, na orientação instrumental, a motivação fundamenta-se nas vantagens que o indivíduo possa vir a ter caso aprenda a língua-alvo, tais como: ascensão profissional, habilidade de ler textos escritos na língua-alvo etc.

Porém, alguns autores, como, por exemplo, Oxford e Shearin (1994), Hotho e Reimann (1998) e Dörnyei (1998), ao fazerem uma revisão sobre motivação em L2, reconhecem que existem outras possibilidades de orientações motivacionais que não somente a integrativa ou a instrumental. Por exemplo, para Oxford e Shearin (1994), fatores como o desafio intelectual e interesses por viagens não se enquadram,

necessariamente, nos dois tipos de orientação propostos por Gardner e Lambert (1972). Dörnyei (1990) adverte, ainda, que, num contexto em que a L2 é tida como língua estrangeira, os alunos, geralmente, não tiveram contato com a comunidade da língua-alvo para terem atitudes favoráveis ou contrárias a ela. Para Hotho e Reimann (1998, p. 132), “é a força motivacional e não o tipo de orientação que é relevante para a aquisição de línguas”. Em outras palavras, o que importa é que o aluno esteja motivado e não as possíveis orientações dessa motivação.

Em relação à escrita em L2, McLeod (1987) apresenta, ainda, dois tipos de motivação: a extrínseca e a intrínseca. Fatores de motivação extrínseca em relação à escrita são: agradar o professor, tirar boas notas, progredir em uma determinada carreira etc. Os fatores de motivação intrínseca são o envolvimento individual (querer parecer inteligente) e o envolvimento com a tarefa (McLeod, 1987). Segundo Scarcella e Oxford (1992), alunos bem-sucedidos têm atitudes positivas em relação à escrita em L2. Um fator que contribui para uma maior motivação em relação à escrita é a escolha dos tópicos (Scarcella e Oxford, 1992), pois os alunos se sentirão mais motivados a escrever sobre um assunto que seja do seu interesse. Ao discutir motivação, Hughey et al. (1983, citados por Scarcella e Oxford, 1992) sugerem que os professores satisfaçam as necessidades de seus alunos, reconhecendo o esforço que fizeram ao escrever. Para os autores, “o professor bem-sucedido procura por algo que seja bom em cada texto escrito pelos alunos, cumprimenta os alunos pelo sucesso e ajuda-os a satisfazer futuras necessidades de aprendizagem” (Hughey et al., 1983, p. 49).

Um outro fator que influencia as atitudes dos alunos em relação à escrita e sua motivação para a aprendizagem é o tipo de correção que recebem em seus textos escritos (Reed e Burton, 1985; Zebroski, 1994; Grabe e Kaplan, 1996). Os alunos podem ficar confusos com correções vagas ou ambíguas e, dessa forma, tornarem-se frustrados com o seu progresso na escrita. Segundo Reed e Burton (1985), uma avaliação negativa pode desmotivar os alunos a ponto de eles preferirem uma nota baixa por não terem feito uma determinada atividade a receber uma avaliação ruim de uma atividade que realizaram. Por outro lado, os alunos podem ficar positivamente motivados a explorar novas áreas de conhecimento e criatividade pessoal quando recebem correções ou comentários que sejam construtivos e apóiem o seu processo de aprendizagem (Tsui, 1995).

1.3.5 As crenças

As crenças são convicções que não são necessariamente comprovadas (McLeod, 1987). De acordo com Brown (1994a), o sucesso que os aprendizes obtêm em uma tarefa resulta, em parte, das crenças que eles têm sobre sua capacidade de realizar a tarefa. Segundo McLeod (1987), os alunos possuem muitas crenças sobre o processo da escrita que diminuem a percepção de suas próprias habilidades como escritores. Algumas dessas crenças são culturais, tais como, o bom escritor não se esforça, mas espera até a inspiração chegar; o estudo da gramática tornará o aluno um melhor escritor etc. Eles têm também crenças sobre si mesmos como escritores. Ainda, segundo o autor, alguns alunos percebem o seu sucesso ou fracasso na escrita como algo controlado por forças externas, tais como a sorte ou o professor, enquanto outros vêem os mesmos resultados como decorrentes de suas próprias capacidades.

Neste capítulo, plantei as sementes sobre o ensino da escrita em L2, bem como sobre as diversas formas de corrigir os erros escritos. No próximo capítulo, apresentarei os pressupostos fundamentais da teoria sociocultural e da aprendizagem colaborativa, que ajudam a germinar uma melhor compreensão da atividade de correção com os pares – foco deste trabalho.

C

APÍTULO

2

E

AS SEMENTES GERMINAM

:

A TEORIA SOCIOCULTURAL

E A APRENDIZAGEM COLABORATIVA

Success [in language learning] depends [...] on what goes on inside and between people in the classroom.26

Stevick (1980, p. 4)

Este capítulo, com duas subdivisões, tem como objetivo apresentar o referencial teórico que propicia uma melhor compreensão do processo de correção com os pares. Primeiramente, apresento os pressupostos fundamentais da teoria sociocultural. Posteriormente, apresento algumas considerações sobre a importância da interação em sala de aula e sobre a aprendizagem colaborativa.