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Capítulo II – A velhice e o envelhecimento no olhar dos idosos: Autoperceção da idade

1. Conceito de (auto) perceção

1.4. Fatores que exercem um papel importante na origem das conceções pessoais

Os estereótipos (positivos ou negativos) sociais sobre o envelhecimento acarretam consequências para a identidade dos indivíduos mais velhos e para a perceção do seu próprio envelhecimento, uma vez que influenciam as conceções de envelhecimento e de idade avançada das pessoas. Os estereótipos de envelhecimento e velhice, internalizados na infância, e depois reforçados durante décadas, tornam-se autoestereótipos, que vão surtir efeitos na autoperceção do envelhecimento (Levy, et al., 2002).

Embora as crenças negativas sobre os idosos sobressaiam na cultura ocidental, isso não assegura a predominância de estereótipos negativos internalizados, nem a eventual autoperceção negativa do envelhecimento. Embora que todos estejam expostos aos mesmos estereótipos, os indivíduos tanto podem desenvolver autoperceções positivas como negativas, traduzindo assim, a variabilidade do que é internalizado (Levy, et al., 2002).

Surge a questão de saber se e como a autoperceção do envelhecimento pode ser influenciada, ou seja, existe uma maneira de fazer com que as pessoas se sintam mais jovens e mais satisfeitas com o envelhecimento concentrando a sua atenção para os aspetos positivos do envelhecimento?

Um dos meios para manipular a autoperceção do envelhecimento num ambiente experimental pode ser através da ativação de estereótipos positivos ou negativos de idade. Destacar o positivo ou depreciar os aspetos negativos do envelhecimento podem ser estratégias para influenciar positivamente a autoperceção do envelhecimento, focando a atenção das pessoas sobre os aspetos negativos do envelhecimento pode-se influenciar negativamente a sua autoperceção do envelhecimento (Kotter-Grühn, & Hess (2012).

Num estudo recente, Kotter-Grühn e Hess (2012) tentaram responder à questão precedente. A resposta a essa questão neste estudo é negativa: quando os indivíduos foram manipulados com estereótipos de idade positivos, eles não relataram idades subjetivas mais jovens e não estavam mais satisfeitos com seu envelhecimento do que antes da preparação. Pelo contrário, os adultos mais velhos com boa saúde sentiram-se mais velhos depois de serem influenciados com estereótipos etários positivos. Estes autores especularam que esse

efeito de contraste pode resultar de "comparações sociais ascendentes”: quando eles vêm imagens de adultos mais velhos felizes e lerem as descrições muito positivas da velhice, uma comparação positiva com este grupo pode colocar a perceção do seu próprio envelhecimento numa perspetiva em que já não se sentem tão jovens.

1.4.1. Fatores psicossociais

A autoperceção do envelhecimento pode estar associada a diversos fatores psicossociais, destacando-se os seguintes: comportamentos que promovam a saúde ou que a coloquem em risco; processos fisiológicos (ex: endócrinos) que favoreçam o surgimento de doenças; maneiras relacionadas com o lidar com os desafios da idade avançada; exposição diferencial aos fatores de risco ambientais (Demakakos et al., 2007; Kotter-Grühn, Kleinspehn-Ammerlahn, Gertorf & Smith, 2009).

1.4.2. A idade cronológica

A idade cronológica ou real também é um fator valorizado no modo como os idosos encaram a autoperceção de envelhecimento. O indivíduo, ao longo da vida, vai mudando de grupo etário, o mesmo não acontecendo aos grupos formados a partir do género ou etnia. Assim, os idosos estabelecem um grupo singular no qual as autoperceções envolvem atitudes para consigo mesmos, enquanto grupo etário e atitudes a respeito do seu próprio envelhecimento. Esta dimensão talvez permita compreender o facto de os idosos revelarem aspetos mais positivos em relação ao envelhecimento do que as pessoas mais novas (Chasteen, 2000). Porém, a idade subjetiva não pode ser ignorada, visto que a autoperceção positiva do envelhecimento também está relacionada com a satisfação em relação ao avanço da idade e à idade sentida pelo indivíduo (Kotter-Grühn et al., 2009).

Contrariamente ao que poderia ser esperado, o envelhecimento parece constituir uma experiencia positiva para grande parte das pessoas idosas (Demakakos et al., (2007); Infurna et al., 2010; Kotter-Grühn & Hess, 2012), o que contradiz a crença leiga que o envelhecimento é um processo negativo, pois conduz à velhice e à sua consequente deterioração física, mental, social e económica (Demakakos et al., 2007). Esta estabilidade da satisfação com o envelhecimento aponta para a capacidade dos idosos de se adaptarem às possíveis mudanças (negativas) relacionadas com a idade (Kotter-Grühn & Hess, 2012).

Sneed e Whitbourne (2005) e Uotinen e colaboradores (2005) sugeriram que a estabilidade na autoperceção do envelhecimento, nos idosos, são indicadores de resiliência e uma boa adaptação aos stressores físicos, psicológicos e sociais que ocorrem com o avançar da idade, assim como da importância (relativa) que podem dar às mudanças relacionadas com a idade, ou interpretar as formas como estão a lidar com estas mudanças, enquanto marcadores de crescimento psicológico pessoal (Sneed & Whitbourne, 2005).

Kotter-Grühn e colaboradores (2009) colocaram a seguinte questão: Será que os idosos mantêm uma autoperceção positiva do envelhecimento e da idade mesmo quando estão próximos da morte?

Utilizando as informações de um estudo longitudinal de 16 anos, concluíram que à medida que os indivíduos avançam na idade e se aproximam da morte, vão-se tornando menos satisfeitos com a sua idade e referem sentir-se mais velhos do que a sua idade real e a autoperceção do envelhecimento torna-se mais negativa. Os dados dos estudos de Demakakos e colegas (2007), Junqueira (2010) e Keong (2010) também sugerem que a autoperceção do envelhecimento tende a tornar-se menos adaptativa e mais negativa, com o avançar da idade. Tendencialmente, as faixas etárias mais velhas são as que mais crenças têm acerca das consequências negativas do processo de envelhecimento, assim como nas emoções negativas que este desperta (Keong, 2010).

Estes resultados sugerem que existem limites para a adaptabilidade ao envelhecimento, sendo que, em idades avançadas, e com a aproximação da morte, o indivíduo confronta-se com mudanças cada vez mais negativas e com mais perdas em diversos domínios do funcionamento físico e psicológico (Kotter-Grühn, et al., 2009; Sneed & Whitbourne, 2005).

Assim, o decréscimo na autoperceção positiva do envelhecimento poderá indicar que os processos que contribuem para uma manutenção de uma identidade positiva já não conseguem compensar, na totalidade, as perdas experienciadas noutros domínios (Kotter- Grühn, et al., 2009). De acordo com Kotter-Grühn e colegas (2009) quando os idosos sentem o declínio nas suas funções (físicas e cognitivas), poderão atribuir essas mudanças ao seu envelhecimento. Essa atribuição negativa poderá, resultar numa autoperceção menos positiva do envelhecimento, principalmente, quando a avaliação é feita através de comparações temporais entre a condição atual do idoso e a sua condição, em fases precedentes, realçando, desta forma, os aspetos negativos da mudança.

1.4.3. Fatores relativos às circunstâncias ou características individuais

Os fatores relativos às circunstâncias ou características individuais (recursos físicos e materiais, sociais, psicológicos) também podem influenciar as conceções pessoais acerca do envelhecimento.

Salientam-se como recursos físicos e materiais mais importantes, para a maioria das pessoas em idade avançada, a saúde e a solidez financeira. É do senso comum que a adaptação ao processo de envelhecimento é mais fácil quando uma pessoa está saudável e sem preocupações financeiras; os recursos sociais mais importantes relacionam-se com o facto de se ter cônjuge, filhos, família e amigos mais próximos; os recursos psicológicos mais importantes são a preservação das capacidades intelectuais e sentimentos de autoeficácia e controlo (Junqueira, 2010; Silva, 2012).

Quanto ao género, Kotter-Grühn et al., (2009) referem que os homens registam autoperceções mais positivas do envelhecimento do que as mulheres. Desta forma, podem envelhecer mais positivamente do que as mulheres, ainda que possam sentir mudanças ligadas ao envelhecimento, por exemplo na aparência física. Contudo, os resultados do estudo efetuado por Keong (2010) indicam que o género masculino e feminino não se distinguem, significativamente, relativamente à autoperceção do envelhecimento.