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Os autores dos livros analisados neste artigo, ao falarem de suas trajetórias, também recorrem à figura do modernizador que promove diversas inovações. No livro de Pimenta (1986), o Vovô Pedro é ele mesmo a figura do desbravador. Em registro feito em 1947, escreve:

Comecei a vida no campo como vaqueiro, pegando boi e amansando cavalos bravos. Agricultura também fazia parte do meu dia-a-dia e nessa época enfrentei comércio de algodão, vendendo-o em Campina Grande. Foi graças ao meu trabalho honesto e honrado que adquiri diversas propriedades. (PIMENTA, 1986, p.19)

Em outras passagens, falando das secas, afirma:

A seca estava sempre presente na história do Curimataú e vi de perto a que assolou o ano de 1904 e ainda há tristeza em meu coração, quando me recordo de homens, mulheres e crianças comendo xique-xique para sobreviver. Cenas horríveis, presenciei naquela época! (PIMENTA, 1986, p.20)

Enfrentei grandes secas, dificuldades de toda ordem. Tudo era difícil, mas venci e aqui estou contando a estória de noventa anos de vida. (...) Tinha prática de vaqueiro, rastejava bem, sabia arrebanhar o gado, laçava, ferrava, castrava, os animais e corria e montava bem. Tive uma vida profícua! Fui vaqueiro, zelador de cemitério, comerciante, criador de gado, gerente da Cooperativa Agropecuária de Cuité, 1º suplente de juiz de direito, presidente do PSD, vereador e prefeito. (PIMENTA, 1986, p.21)

Afirma-se como homem que venceu as dificuldades, posto que elabora a partir de sua experiência como fazendeiro, defendendo, assim, que apesar de uma vida sofrida tudo naquele lugar era paz, tranquilidade. As suas memórias o levam a romantizar o passado:

Meu ideal sempre foi falar a verdade, criar vacas e respeitar todas as classes. Esse foi o meu lema de vida e que ainda rege o meu destino. (PIMENTA, 1986, p.22)

O homem reveste de imensa coragem para enfrentar as dificuldades que surgem a cada passo consegue vencê-las, porque esse tipo de homem vive sempre preparado para a luta. Embora inculto, aprende com a terra a melhor maneira de aproveitá-la. (PIMENTA, 1986, p.23)

Distante dos grandes centros, tudo era difícil para os habitantes do Curimataú da minha época. Os meios de comunicação eram remotos. Não havia estradas e o transporte de que se dispunha era o carro-de-boi ou um lombo de cavalo. (...) Vida sofrida, é verdade, mas como sinto saudades do campo! Tudo ali era paz, suavidade, um eterno convite à tranquilidade! E que ventura cavalgar pelos campos. (PIMENTA, 1986, p.24)

Junto com alguns companheiros, levei para Lagoa de Santo Antônio, mais de 200 (duzentas) vacas paridas. O que nos movia não era a necessidade financeira, mas a novidade e o desejo de desfrutarmos juntos aqueles momentos de prazer, comendo pamonha com queijo e mel, pelo caminho. Saúde e mocidade fazem a riqueza! (PIMENTA, 1986, p.26)

1934 – Fundei, junto com Marcelino Fialho, uma Escola Particular em Malhada da Cruz (...) (PIMENTA, 1986, p.27)

1939 – Fui sempre apaixonado por Vaquejadas. Estava sempre presente onde houvesse uma e hoje recebi uma carta de Cuité, pedindo-me vinte touros para uma corrida organizada por Pedro Ferreira, Acúcio Galvino e Joaquim Salusto de Farias. Atendi-os imediatamente. 1936 – Próxima à minha casa, em Fazenda Velha havia uma Capela, cujo Padroeiro era São João Batista, festejado com amor e carinho. Demoli-a e construí-a num povoado em Malhada da Cruz, onde passei a residi. As festas de São João que introduzi ficaram mais concorridas porque introduzi vaquejadas, forrós muito animados, quadrilhas, cirandas, bois-de-reis, joão-redondo. Nessas ocasiões recebíamos importantes visitas, como o Curandeiro Joaquim André, do município de Santa Cruz no Rio Grande do Norte, o Presidente Epitácio Pessoa, Padre Cícero do Juazeiro e Antônio Silvino – o Terror dos Sertões. (PIMENTA, 1986, p.28)

1944 - Vivi sempre preocupado com os problemas da minha terra, tentando solucioná-los ou, pelo menos, diminui-los e hoje fico feliz inaugurando a Rodagem que liga Araruna a Santa Cruz, no Rio Grande do Norte e a estrada de Cuité à Japi e à Araruna. (PIMENTA, 1986, p.30)

26.01.44 – Construí a Barragem Boqueirão do Japi. (PIMENTA, 1986, p.31) 10.11.47 – Numa retrospectiva, vejo que nada desconheço dos serviços do campo, pois de tudo fiz um pouco. Fui veterinário, vaqueiro, tropeiro. Tratei muito gado com xique-xique. Cavei a cacimba do Caboclo, em Malhada da Cruz. Curei bicheira com abelha do mato, tangi tropas de jumentos, carregando algodão para descaroçar em Japi, tendo cuidado de trazer a semente para nova plantação. Guardei cereais em paiol de areia. (PIMENTA, 1986, p.40)

02.03.49 - Fiz doação da Capela de S. João Batista para a Diocese da Paraíba (...). (PIMENTA, 1986, p.41)

10.10.70 – Meu cadastro consta da propriedade Jardim, no município de Cuité – PB. Crio gado, cabras, ovelhas, cavalos e burros. Tenho açudes,

cultivo algodão, agave, coqueiros, cana de açúcar e palma. Resido na Praça Barão do Rio Branco, nº 31. (PIMENTA, 1986, p.72)

Araújo (2008) também narra como os primeiros Henriques ocuparam as terras localizadas nas sesmarias de PUCUHY:

É forçoso admitir que, em nenhum documento oficial, partindo da Província da Paraíba, existe referência a determinada família como fundadora do Município de Picuí. No ano de 1704, a senhora Isabel Arruda da Câmara, Antônio Mendonça Machado, Pedro Vasconcelos e Antônio de Carvalho, requereram e obtiveram êxito, na liberação por parte do governo da província da Paraíba, de terras localizadas nas sesmarias PUCUHY, limites com Seridó. Daí em diante, outras famílias, dentre elas, as de JOAQUIM JOSÉ DA COSTA, LAZARO JOSÉ ESTRELA, MAXIMIANO JOSÉ DA COSTA E JOSÉ JOAQUIM DA COSTA, em 1824, obtiveram a liberação de extensa faixa de terras (...). Daí começa, de maneira altaneira, altruística, a verdadeira história da família HENRIQUES no Curimataú da Paraíba. (ARAÚJO, 2008, p. 04)

No livro “Nós Dois”, Furtado (2004) a figura do modernizador cabe a seu marido:

Durante anos Cláudio foi comerciante de estivas, primeiramente na cidade de Araruna e continuou aqui chegou, no início de 1946, permanecendo até 1965, mais ou menos. (...) Em 1954 resolveu investir no plantio do sisal e tratou logo de comprar terras. A primeira foi o Barro Branco, seguindo-se a Lagoa da Caraibeira, Sítio Novo e mais tarde o Pontal, ficavam próximas umas das outras e pertenciam aos municípios de Picuí e Nova Floresta. (...) Depois comprou as fazendas Alegre e Fortuna, em 1960 e 1964, respectivamente, esta última foi negociada toda com o sisal que as outras produziam. Ampliou para trezentos hectares o plantio de sisal e chegou a ser o maior produtor do município na época que o mesmo era valorizado. (...) Nas fazendas apostou na pecuária, com muito êxito, o seu rebanho atingiu quase mil reses. Como também fez grande safras de algodão (...). (FURTADO, 2004, p. 36)

Furtado (2004) também narra sua infância como uma vida simples e feliz, mas afirma, contraditoriamente, que era acompanhada por uma cuidadora e que sua família tinha seus próprios carregadores de água. E informa: o segundo rádio da cidade foi comprado por seu pai.

O segundo rádio que chegou em Cuité foi papai que comprou, pense! Como ficamos “importantes”, abrimos bem as janelas para que as pessoas percebessem e ficassem sabendo da novidade. “Um rádio em casa era muita coisa”! ... (FURTADO, 2004. p. 14)

Pimenta (1986), Araújo (2008) e Furtado (2004), atores de diferentes redes, usam os mesmos marcadores de diferença, construindo fronteiras sociais e simbólicas. Segundo

Labache e Saint Martin (2008, p. 334-335), “as fronteiras delimitam os contornos de categorias sociais (a participação desigual dos indivíduos na vida social) e, por outro, abrem espaços de troca e de encontro para que as classes se comuniquem entre si”.