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Financiamento de campanhas eleitorais e de partidos políticos

5 CONSIDERAÇÕES SOBRE A REGULAMENTAÇÃO DO LOBBY NO BRASIL.

5.1 Situação do lobby no Brasil atual em face do ordenamento jurídico

5.1.1 Financiamento de campanhas eleitorais e de partidos políticos

Outras leis importantes tangenciam a questão do lobby, como por exemplo aquelas que regem o financiamento das campanhas eleitorais e dos partidos políticos. Este é um tema afim ao lobby porquanto o financiamento eleitoral pode ser um instrumento para garantir ao financiador poder de influência sobre o agente eventualmente político eleito. A Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 4.650, movida pela Ordem dos Advogados do Brasil, que deseja ver declarados inconstitucionais os dispositivos que permitem e regulamentam as doações efetuadas por pessoas jurídicas naqueles casos trouxe a tona a discussão sobre como evitar o abuso do poder econômico nessa seara.

Ainda que tratar desse tema não seja o escopo deste trabalho, em nosso ponto de vista a doação a campanhas eleitorais e partidos políticos se assemelha à prática do lobby em alguns aspectos: está relacionada à liberdade de expressão e de associação, afinal a força dos partidos políticos está relacionada à sua capacidade de difundir suas ideias, “o que, evidentemente, pressupõe a disponibilidade de recursos financeiros expressivos”, conforme salientou o Ministro

Teori ZAVASCKI em seu voto-vista76 (p. 2). A limitação dos recursos, bem como sua distribuição proporcional à representatividade dos partidos nas casas legislativas, no case de um financiamento preponderante ou exclusivamente público pode, na melhor das hipóteses, servir como barreira ao ingresso de novos partidos, candidatos e ideias na discussão política, ou, na pior, levar esse tipo de contribuição para a ilegalidade, seja pela assunção do risco de efetuar uma doação a despeito do impedimento legal, seja pela sua dissimulação em doações efetuadas por pessoas físicas usadas como “laranjas”. Ademais, o argumento suscitado pela OAB de que “pessoa jurídica não é povo e não exerce cidadania” resume a cidadania à capacidade para votar e ser votado, e desconsidera o fato de que as empresas e organizações também são – como as pessoas naturais – destinatárias de direitos e deveres segundo a ordem jurídica pátria, desempenham papel de agentes econômicos produtores de bens e serviços – alguns indispensáveis na atualidade –, geradores de empregos e de riquezas, e têm interesses que podem divergir daqueles das pessoas que para elas trabalham. Ainda conforme o voto-vista de ZAVASCKI (p. 3-4):

Não há dúvida que, nesse contexto, é de importância fundamental o estabelecimento de um adequado marco normativo. Mas, somente ele não é suficiente para coibir as más relações entre politica e dinheiro. Há, sobretudo, a questão da conduta. É preciso que as normas sejam efetivamente cumpridas e a punição seja efetivamente aplicada, se for o caso. Talvez aqui, mais do que na precariedade do marco normativo, esteja a fonte principal dos abusos do poder econômico e da corrupção politica: no desrespeito das normas e na impunidade dos responsáveis.

[...]

Portanto, a primeira realidade que se deve ter presente é que o financiamento de partidos e de campanhas eleitorais é contingencia ineliminável em nosso sistema democrático e que, para evitar que ele produza, ou continue produzindo, efeitos negativos indesejáveis e perversos, não há formulas simples, nem soluções prontas. Trata-se, ao contrário, de questão tormentosa, no plano social e politico em primeiro lugar e no plano jurídico como consequência.

Assim como no caso do lobby, o primeiro passo para se estabelecer um financiamento de campanhas e de partidos políticos sadio é ter uma legislação clara a respeito da matéria, que imponha transparência quanto às informações sobre quem doa, quem recebe e qual o montante dos recursos – independentemente da adoção de um sistema de financiamento exclusivamente público, privado ou misto. !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

76

A íntegra do voto do Ministro Teori Zavascki está disponível no seguinte link: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/ADI4650TZ.pdf>. Acesso em 11 de maio de 2014.

Todavia, é preciso ir além da própria norma e implementar estratégias de conscientização, monitoramento, coerção e sanção às condutas indesejadas. Mais uma vez recorremos a ZAVASCKI (p. 8):

Na verdade, olhada a questão pelo prisma do interesse que move os doadores, o fator decisivo para aferir a legitimidade acaba se transferindo, mais uma vez, do marco normativo para o marco comportamental: tanto as doações de pessoas jurídicas, quanto às de pessoas naturais serão incompatíveis com a Constituição se abusivas. As más práticas, os excessos, a corrupção política, não podem ser simplesmente debitadas às contribuições feitas nos limites autorizados por lei, mas àquelas provindas da ilegalidade. Em outras palavras: é preciso ter cuidado para não atribuir a inconstitucionalidade das normas ao seu sistemático descumprimento. [...]

A solução, consequentemente, não é eliminar a norma, mas estabelecer e aplicar mecanismos de controle e de sanções que imponham a sua efetiva observância.

Mesmo que a fiscalização dessas doações fique por conta de watchdogs institucionalmente incumbidos de fazê-lo (Justiça Eleitoral, Tribunais de Contas, etc.), é importante que os cidadãos, associações civis, empresas, organizações e a imprensa também tenham acesso aos dados declarados, e por outro lado, denunciem as práticas ilícitas das quais tenham conhecimento. Isso passa por um processo de conscientização dos envolvidos (nos moldes do operado pelo Comissário de Lobby do Québec, acima referido). Afinal, cabe a todo e qualquer membro da sociedade vigiar os vigias, pois um controle total das condutas por parte do Estado é não apenas impossível, mas também indesejado, pois certamente operaria tantas restrições à liberdade individual que os benefícios pretendidos seriam aniquilados.

A despeito de nossa posição, que vai ao encontro do voto do Min. ZAVASCKI, a maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal já votou pela declaração da inconstitucionalidade dos dispositivos legais que atualmente permitem a doação para campanhas eleitorais e partidos políticos por parte de pessoas jurídicas, argumentando que as elites econômicas ditam, assim, as decisões políticas, restando ferido o princípio da igualdade (vide voto do Ministro Marco Aurélio77). Embora quatro ministros ainda não tenham apresentado seus votos, a tendência é de um acórdão que dê provimento aos pedidos.

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A íntegra do voto do Ministro Marco Aurélio está disponível no seguinte link: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/ADI4650MA.pdf>. Acesso em 11 de maio de 2014.