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155 firmado pelo presidente Geisel Esse decreto estabeleceu linhas específicas de financiamen-

No documento Livro bioetanol da cana de açucar (páginas 155-157)

Bioetanol de cana-de-açúcar no Brasil

155 firmado pelo presidente Geisel Esse decreto estabeleceu linhas específicas de financiamen-

to, formalizou a criação da Comissão Nacional do Álcool (CNA), responsável pela gestão do programa, e determinou uma paridade de preço entre o bioetanol e o açúcar cristal standard, estimulando a produção desse biocombustível, até então um subproduto menos valorizado. Nesse contexto, foram estabelecidas como metas de produção 3 bilhões de litros de bioeta- nol, para 1980, e 10,7 bilhões de litros, para 1985. Foram também implementados diversos incentivos para expandir a produção e o uso de bioetanol combustível, inicialmente incre- mentando-se a adição de bioetanol anidro à gasolina. Nos primeiros anos da implementação do Proálcool, foi decisiva a atuação do ministro da Indústria e Comércio, Severo Gomes, que contou com o secretário de Tecnologia Industrial, José Walter Bautista Vidal, para a for- matação inicial do programa, e posteriormente, em sua fase de maior expansão a partir de 1979, com o ministro João Camilo Pena, que se mostraram comprometidos com o bioetanol combustível e criaram as bases para sua consolidação. Como uma mensagem dessa geração de pioneiros, o livro Energia da biomassa – Alavanca de uma nova política industrial aponta a necessidade de transcender os sistemas energéticos convencionais para a “civilização da fotossíntese” [Guimarães et al. (1986)].

Com um marco legal decididamente favorável ao bioetanol, sua produção se ampliou de modo significativo. Entre 1975 e 1979, a produção de bioetanol (anidro e hidratado) passou

de 580 mil m3 para 3.676 mil m3, superando em 15% a meta estabelecida para aquele ano.

Com o recrudescimento da crise do petróleo, em 1979, quando seus preços sofreram nova elevação, o Proálcool foi intensificado, estimulando-se o uso de bioetanol hidratado em mo- tores adaptados ou especificamente produzidos para o emprego desse biocombustível. Nessa época, a dependência de petróleo importado no Brasil era da ordem de 85%, significando 32% do total das importações brasileiras, com impactos ainda mais graves sobre a economia nacional, o que justificava a meta ambiciosa de produzir 10,7 bilhões de litros de bioetanol em 1985. Com esse objetivo, mediante o Decreto 83.700, de 1979, o governo federal refor- çou o suporte à produção alcooleira com a criação do Conselho Nacional do Álcool (CNAL), ao qual coube a condução geral do Proálcool, e da Comissão Executiva Nacional do Álcool (Cenal), responsável pela implementação do programa [CGEE (2007a)]. Em tais condições, a produção de bioetanol atingiu 11,7 bilhões de litros em 1985, excedendo em 8% a meta inicialmente pretendida.

Em síntese, o conjunto de incentivos adotados pelo Proálcool nessa época, que se mostrou efetivamente capaz de motivar os agentes econômicos, incluía: a) definição de níveis mínimos mais altos no teor de bioetanol anidro na gasolina, que foram, progressivamente, elevados até atingirem 25%; b) garantia de um preço ao consumidor para o bioetanol hidratado menor do que o preço da gasolina (nessa época, os preços dos combustíveis, ao longo de toda a cadeia produtiva, eram determinados pelo governo federal); c) garantia de remuneração compe- titiva para o produtor de bioetanol, mesmo frente a preços internacionais mais atrativos para o açúcar do que para o bioetanol (subsídio de competitividade); d) abertura de linhas de crédito com empréstimos em condições favoráveis para os usineiros incrementarem sua capacidade de produção; e) redução dos impostos (na venda de carros novos e no licencia-

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mento anual) para os veículos a bioetanol hidratado; f) estabelecimento da obrigatoriedade de venda de bioetanol hidratado nos postos; e g) manutenção de estoques estratégicos para assegurar o abastecimento na entressafra.

Durante 1985, ocorreu uma reviravolta no cenário, com o início da redução dos preços do petró- leo e a recuperação dos preços do açúcar, desmotivando a produção de bioetanol e engendrando

um quadro de dificuldadesque encerrou a fase de expansão do Proálcool. Em 1986, o governo

federal reviu as políticas de fomento, o que reduziu a rentabilidade média da agroindústria cana- vieira e estimulou ainda mais o uso da matéria-prima disponível para a fabricação de açúcar para exportação. Como um resultado eloqüente da desatenção governamental para com o bioetanol e da ausência de políticas específicas para esse biocombustível, em 1989 os consumidores de bioetanol passaram a enfrentar descontinuidades na oferta de produto. Os mecanismos de for- mação de estoques de segurança não funcionaram e foram necessárias medidas emergenciais, como a redução do teor de bioetanol na gasolina, a importação de bioetanol e o uso de mesclas de gasolina com metanol como substituto de bioetanol.

Uma conseqüência duradoura dessa crise de abastecimento – justamente de um produto nacional e sobre o qual a propaganda dizia que “pode usar que não vai faltar” – foi a per- da da confiança do consumidor brasileiro, que levou, inevitavelmente, à queda das vendas dos carros a bioetanol puro. Assim, após terem significado 85% do total de veículos novos comercializados em 1985, as vendas de veículos a bioetanol encerraram a década com uma participação de apenas 11,4% em 1990 [Scandiffio (2005)]. Somente a partir de meados de 2003, com o lançamento dos veículos flexíveis, o consumo de bioetanol hidratado voltou a crescer de modo expressivo.

É interessante observar que, mesmo nessa época de aparente indefinição sobre o futuro do bioetanol, estudos independentes sugeriam a necessidade de manter o programa em ope- ração. Propunha-se ajustar sua taxa de crescimento ao novo contexto, mas assegurando a continuidade do programa, não somente pelos benefícios ambientais e sociais associados, como também pelos ganhos de produtividade em curso, que faziam o bioetanol competitivo frente ao petróleo a US$ 30 o barril [Serôa da Motta e Ferreira (1988)].

Até o início dos anos 1990, as características estruturais básicas da agroindústria sucroalcoo- leira no Brasil, resultantes de décadas de rígido controle estatal, eram uma produção agrícola e industrial sob controle das usinas, heterogeneidade produtiva (especialmente na produção da cana), reduzido aproveitamento de subprodutos e competitividade fundamentada, em grande medida, nos baixos salários e na produção extensiva. As diferenças técnicas eram significativas entre as unidades produtivas das regiões Norte-Nordeste e Centro-Sul e, mesmo dentro das regiões, existiam diferenças acentuadas de produtividade e escala de produção [CGEE (2007a)].

No bojo de mudanças administrativas implantadas no começo dos anos 1990, que revisaram o papel do Estado na economia nacional, o governo brasileiro desencadeou o processo de

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