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PARTE II – HIDROPOLÍTICA INTERNACIONAL

Capítulo 3 – Prenúncios da crise hidroambiental

3.3 Fontes de impacto hidroambiental

As áreas urbanas geram um diverso número de impactos ambientais que terminam por poluir sistemas hídricos, o ar e o solo, em função das atividades industriais que aí se concentram e do alto índice de resíduos produzidos. Foi tratado que a drenagem de extensas áreas úmidas para construir moradias, embora sendo necessárias para atender à população urbana em expansão, causa sérios impactos ecológicos ao acabar com os lagos e pântanos naturais, via transformação do terreno. Por outro lado, esta é uma das causas que tem contribuído às modificações do ciclo hídrico e do clima, afetando primordialmente às águas superficiais.

Outro impacto das áreas urbanas provém da exploração de pedreiras e escavações para obtenção de brita, areia e materiais de construção em larga escala. Em algumas regiões, o desflorestamento para atender à demanda de combustível nas cidades é um impacto também frequente (Instituto de Observação da Terra 2004). A utilização de biomassa como combustível, causa da poluição atmosférica, polui também os corpos hídricos superficiais e subterrâneos e à água atmosférica (vapor de água) de forma transfronteiriça.

A poluição do ar, devido ao uso constante de fontes não renováveis de energia, tanto nas cidades quanto nas áreas rurais, contribui para a deterioração das águas. Acarreta, pela acumulação de gases poluentes na atmosfera, de difícil dispersão (como o ozônio, dióxido de carbono, metano, óxido nitroso e monóxido de carbono, o conhecido efeito estufa102, responsável pelo aquecimento global e as modificações climáticas).

102

Este fenômeno ocorre porque os gases poluentes absorvem grande parte da radiação infra-vermelha emitida pela Terra, dificultando a dispersão do calor. A devastação florestal, nesse contexto, é um fator que contribui para a concentração do calor na terra, somando-se às variáveis que acentuam o efeito estufa. Este fenômeno estimula o aumento de temperaturas conduzindo ao aquecimento global e às modificações climáticas.

91 Assim como o efeito estufa, a denominada chuva ácida se deriva também da combustão de gases poluentes presentes na atmosfera que emitem resíduos como o enxofre103 - impureza frequente nos combustíveis fósseis, principalmente no carvão mineral e no petróleo. Esse processo ocorre quando a água, em forma de gotas de chuva ou de neve, reage com os ácidos nítrico e sulfúrico, afetando o PH da água104. Um dos efeitos dessa alteração química é a sua incidência na reprodução da fauna animal quando a precipitação alcança os rios, lagos, mares e oceanos. Do mesmo modo, quando as gotas de chuva ácida atingem o solo impedem o crescimento vegetal, sendo um fator determinante nos processos de desertificação. Assim, tanto nos ecossistemas aquáticos como nos terrestres, a chuva ácida inibe a vida dos ecossistemas dependentes da chuva.

A poluição atmosférica - de cidades e áreas urbanas - termina por afetar desse modo à população, seja pelos impactos diretos sobre a vegetação, a água ou o solo (em sua relação direta com a produção de alimentos), ou pelos efeitos na saúde da população pela falta de qualidade do ar, da água e mesmo dos solos. A chuva ácida e o efeito estufa são consequências derivadas da utilização da biomassa. A grande concentração de carros e indústrias nas cidades, que utilizam materiais fósseis como combustível, é a maior fonte fornecedora das emissões urbanas de gases de efeito estufa em todo o mundo. Enfim, todos esses impactos conseguem se difundir a distâncias consideráveis e ultrapassar limites nacionais.

O aumento das áreas produtivas tem-se convertido em fator que estimula o efeito estufa, dado o uso intensivo de fertilizantes e defensivos na agricultura, agentes esses reconhecidamente causadores de emissão de metano quando penetram no solo. Por outro lado, as cidades, freqüentemente próximas às regiões de produção agrícola, podem vir a sofrer de tais efeitos contaminantes, que comprometem a qualidade da água oferecida à população, do que as cidades estão ficando cada vez mais próximas a áreas rurais.

Outro impacto é produzido pela crescente urbanização e impermeabilização de solos, que impede a infiltração de água da chuva e, portanto, a recarga de águas subterrâneas. As águas aquíferas constituem uma fonte importante de abastecimento em muitas cidades no mundo, sendo que em algumas localidades estas são uma significativa fonte de água potável. O documento da Organização Planeta Terra (2007-2009) informa que ―em muitos locais, a

103 Os óxidos ácidos formados reagem com a água para formar ácido sulfúrico (H

2SO4) podendo também formar ácido sulfuroso (H2SO3).

104 Na chuva ácida o PH é inferior a 4,5 unidades, quando a acidez da chuva normal é próxima de 5,6 unidades. A precipitação ácida ocorre quando a concentração de dióxido de enxofre (SO2) e óxidos de azoto (NO, NO2, N2O5) são suficientes para reagir com a água suspensa no ar (as nuvens).

92 maior parte da água potável é de origem subterrânea 80% na Europa e na Rússia e ainda mais no caso do Norte de África e no Médio Oriente‖105

.

No mesmo sentido, Foster (1999:9), salientando a importância que as águas subterrâneas desempenham no abastecimento público na América Latina e o Caribe, destacou que em pelo menos três grandes centros urbanos – a cidade de México, Lima, Manaus e Havana – ―as águas subterrâneas participam da maior parte do suprimento municipal‖.

Igualmente destacou que, em outras localidades, incluindo Buenos Aires, Santiago de Chile, San Juan de Costa Rica, San Salvador, Manágua, Santo Domingo e Guatemala, ―este recurso representa uma importante fonte de abastecimento e tem-se prestado ao atendimento de zonas rurais, dada sua confiabilidade e baixos custos. Alertando que o provimento rural da Costa Rica, El Salvador e Guianas supera 90%. Embora sem dados oficiais, é possível inferir que a maior parte das cidades amazônicas se abastecem dessa fonte de águas. Igualmente, nas áreas rurais amazônicas, devido à falta de infraestruturas para levar água encanada às casas. A associação da qualidade da água subterrânea e as vantagens econômicas da sua extração elevam notavelmente seu consumo tanto em áreas urbanas quanto rurais.

De forma global, a sobre exploração aquífera, em muitas áreas – especialmente costeiras – está associada ao desabamento de áreas construídas. Isto porque o espaço que ocupava a água extraída do subsolo não alcança a preencher-se com a recarga aquífera, deixando o espaço vazio. Por outro lado, a urbanização em zonas costeiras muitas vezes causa a destruição de ecossistemas sensíveis, podendo, também, alterar a hidrologia costeira e as suas características naturais, como manguezais, recifes e praias, que servem como barreiras contra a erosão e que formam importantes habitats naturais (Instituto de Observação da Terra 2008:269).

A interconexão das águas, como explicado anteriormente, junto ao fenômeno de expansão e extensão agrícola e a proximidade das cidades às áreas agro-industriais são condições que incidem na deterioração da qualidade das águas superficiais e subterrâneas consumidas nas cidades. Por outro lado, o lançamento de efluentes não tratados e o crescente volume dos resíduos resultantes das diversas atividades humanas têm se convertido num crescente problema de grande impacto para os corpos hídricos e para a saúde da população, em particular das grandes metrópoles.

105 Ver documento Água Subterrânea Reservatório para um Planeta com sede. Disponível em: www.yearofplanetearth.org/content/brochura2_web.pdf -

93 Em suma, além dos já relatados impactos ocasionados, direta e indiretamente, pela urbanização nas fontes de água, cada vez mais a demanda de água cresce nas cidades, o que já prefigura um panorama no mínimo assustador.