• Nenhum resultado encontrado

A FORÇA NORMATIVA DA CONSTITUIÇÃO E MANUTENÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS

de contingências decorrentes de saúde, invalidez, velhice, desemprego, morte e proteção à

4. A FORÇA NORMATIVA DA CONSTITUIÇÃO E MANUTENÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS

A salvaguarda da Constituição é o primeiro dever de cidadania, sendo a Carta Magna a essência de legitimidade (BONAVIDES, 2006). Onde não há constituição não há, também, direitos fundamentais (CANOTILHO, 2003). Essas considerações são fundamentais para garantir a aplicabilidade concreta da Constituição como proposta de legitimação de direitos, independentemente dos interesses particulares que a circundam.

Assumindo o dever de resguardar a dignidade de seus tutelados, o Estado não pode abrir mão desse mister, devendo cumprir, mais do que qualquer outra pessoa ou instituição, o seu dever, com a presteza que lhe deveria ser peculiar. As obrigações assumidas por meio de uma Carta Constitucional devem ser cumpridas da maneira mais ampla e escorreita possíveis, pois, como alhures se deixou antever, refletem os interesses da nação.

Nesse ponto, proclamando que são direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, o Estado assume a função de garantir a efetividade dessas proclamações, e também de impedir que as mesmas não venham a serem exercitadas, por influência de interesses diversos.

Essa noção deveria ser elementar em todo cidadão brasileiro, principalmente para a valorização do Estado por parte da sociedade, pois o cumprimento de deveres por parte do Estado não decorre de uma mera liberalidade, mas de responsabilidades assumidas por este quando da emanação de sua Carta Diretriz.

A Constituição da República Federativa do Brasil possui conteúdo material, que deve ser perseguido a todo o momento, e, conseqüentemente, alcançado em seu êxito, para que esse Estado consiga firmar-se no plano interno e no plano internacional:

Mais do que procedimentos, a Constituição instituidora do Estado Democrático de Direito apresenta, a partir de uma revolução copernicana do Direito Constitucional, a determinação da realização substantiva dos direitos sociais, de cidadania e aqueles relacionados diretamente à terceira dimensão de direitos. (STRECK, 2004, p. 87)

A Lei Maior não é uma amiga conselheira, mas sim “ditadora” dos deveres do Estado, que devem desaguar nos direitos da sociedade. A Constituição se propõe a, efetivamente, constituir os direitos nela protegidos, não apenas declarando-os formalmente.

É claro que, para que obtenha êxito, a Constituição de um Estado necessariamente há de estar conectada à realidade na qual foi proposta. Isso de maneira alguma quer dizer que a Constituição deva reduzir-se a uma mera comentadora da realidade. Pelo contrário, a Constituição é elemento de coercibilidade para a efetivação das pretensões da sociedade, estabelecidas em um determinado contexto, que não podem ser abandonadas “ao sabor do vento”. Entre a norma e a realidade deve haver uma relação de coordenação. (HESSE, 1991).

A vontade da Constituição (HESSE, 1991) reside exatamente no respeito às suas proposições, sem limitações ocorrentes ao talante das relações dominantes de poder.

A Constituição Federal, ao proclamar direitos sociais, busca força em seus próprios preceitos para determinar a realização de seus ditames, influenciando a realidade (sociedade) positivamente, para o cumprimento dos seus desideratos. “A norma constitucional não tem existência autônoma em face da realidade. A sua essência reside na sua vigência, ou seja, a situação por ela regulada pretende ser concretizada na realidade” (HESSE, 1991, p. 14). Em outras palavras: “A força condicionante da realidade e a normatividade da Constituição podem ser diferenciadas, elas não podem, todavia, ser definitivamente separadas ou confundidas” (HESSE, 1991, p. 15).

Conforme aduz Hesse:

Embora a Constituição não possa, por si só, realizar nada, ela pode impor tarefas. A Constituição transforma-se em força ativa se essas tarefas [normas programáticas (CANOTILHO, 1997)] forem efetivamente

realizadas, e existir a disposição de orientar a própria conduta segundo a ordem nela estabelecida, se, a despeito de todos os questionamentos e reservas provenientes dos juízos de conveniência, se poder identificar a vontade de concretizar essa ordem (HESSE, 1991, p. 19).

O desafio, então, é determinar como a Constituição poderá impor tarefas; nas palavras de Hesse, como a Norma Máxima poderá impor a sua

vontade. Isso depende da normatividade que o texto constitucional alcança em

determinado contexto, a partir da consciência acerca de determinados fatores, devidamente explícitos por Hesse:

a) valor de uma ordem normativa inquebrável;

b) compreensão de que essa ordem constituída é mais do que uma ordem legitimada pelos fatos;

c) compreensão de que essa ordem não logra ser eficaz sem o concurso da vontade humana.

É necessário, portanto, que a sociedade tenha plena consciência dos valores constitucionais, a fim de que a ordem instituída pela Lei Maior seja inquebrável e defendida por todos.

Faz-se imperioso, por outro lado, que essa ordem seja compreendida dentro de um contexto fático, no qual as expectativas da sociedade,

proclamadas no texto constitucional, não sejam abandonadas por influências que contrariem os termos da Lei Maior.

Portanto, se o direito à previdência foi constitucionalizado como um direito fundamental, esse status reflete a vontade política da sociedade em determinado momento, que traduzida na Carta Política, deve ser defendida pelo Estado e pela sociedade.

Dada a substância dos deveres assumidos pelo Estado por meio da Constituição de 1988, o Brasil encontra-se diante de um ponto de não-retorno (STRECK, 2004) no que pertine à implementação dos direitos sociais. Não há como se pensar em uma volta às bases do Estado Mínimo.

O Estado precisa intervir positivamente, a fim de que se garantam direitos elementares. Falar em liberdade substancial, no Brasil, é falar em garantia de dignidade, que ainda está distante de milhares de brasileiros. Não se pode olvidar que essa atuação social do Estado deve ser acompanhada de uma atuação econômica e política capaz de garantir ao cidadão meios, de por si só, buscar a liberdade. Mas diante da realidade brasileira, o cidadão nacional

ainda está distante de possuir esses elementos básicos (educação, saúde, renda) para buscar a liberdade sem o auxílio do Estado.

É nessa medida que o direito à previdência, encarado como direito fundamental de caráter social, ganha uma importância impar, não apenas em termos de garantia da dignidade humana, conforme se asseverou anteriormente, mas também no aspecto científico, vez que o ramo do direito que objetiva estudá-lo pedagogicamente – o Direito Previdenciário – galga uma autonomia científica capaz de superar a velha ligação com o Direito Tributário e o Direito Civil.