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Formação de Professores: Algumas Reflexões Teóricas

Esse escrito visa lançar questões que possibilitem a reflexão a cerca do ato de ensinar, enquanto um fazer que envolve diversos sujeitos. Nesse sentido, cabe aqui pensar no papel do professor nesse ensejo, bem como nos movimentos advindos deste que acabam por influenciar diretamente no processo de aprendizagem dos alunos. Refletir sobre a escola requer que alguns aspectos que norteiam essa instituição sejam propostos, uma vez que o que se pretende é avançar enquanto teoria e prática, não recaindo em ideias já estabelecidas e calcificadas. Acredita-se que a psicanálise pode oferecer subsídios para que se pense em alguns aspectos no âmbito educacional, em que o acento recaia sobre as relações e, com isso, sobre os sujeitos.

Ferry (2004) propõe através de uma perspectiva psico- sociológica que todo aspecto que se refira à formação se depara com uma articulação entre a trajetória pessoal do professor e as exigências institucionais da formação profissional. Desse modo, entram em cena questões concernentes ao sujeito, a saber, o que significa ser docente, o que diz do seu desejo de ensinar, a imagem que o professor possui, a sua relação com os alunos, colegas e consigo mesmo, etc. Não cabe nesse ensejo, portanto, aspectos que se restrinjam a implementação de programas e conteúdos de aprendizagem, ainda que estes sejam indispensáveis para formação, visto que se configuram como suportes e condições para que essa aconteça.

Somando-se a isso, Ferry (2004) assinala que formação é algo que tem relação com a forma. Formar-se implica na aquisição de uma determinada forma de atuar, forma de refletir, forma de aperfeiçoar. Nesse sentido, a formação é uma ideia diametralmente oposta à noção de ensino-aprendizagem, ainda que esta última possa estar imbricada no processo formativo. Portanto, a formação alude a um processo dinâmico em que se consiste em encontrar formas para que seja possível cumprir

com certas atividades no exercício de um oficio, ou seja, para que haja condições de se exercer uma prática profissional, onde se pressupõe conhecimentos, habilidades, representação do trabalho a ser realizados, da profissão exercida, etc.

Essa dinâmica de formação consiste em um desenvolvimento do sujeito, no qual será orientado de acordo com os seus objetivos buscados, bem como com a posição que ocupa. Assim sendo, Ferry (2004) sublinha que uma formação não é algo que se receba do outro; ninguém forma ninguém, pois pensar em formador/formado implica em uma posição ativa e outra passiva: É o próprio sujeito que se forma enquanto tal, ainda que o faça, através de mediações, isto é, formadores (mediadores humanos), leituras, circunstâncias, relações com os outros, etc.

Dito isso, Ferry (2004) destaca três condições para a realização de um trabalho de formação sobre si mesmo, a saber, condições de lugar, de tempo e de relação com a realidade. Ou seja, é necessário de um tempo, de um espaço para que seja possível refletir (tanto no sentido de fazer reflexão, como no de se fazer reflexo) e compreender acerca dos percursos e das possibilidades do docente. Além disso, há que se desprender da realidade para poder representá-la, pois “quando se está em um lugar ou em uma ação de formação se trabalha sobre as representações” (FERRY, s.p.).

Posta essas considerações, a formação de indivíduos precisa ser pensada a partir de um processo contínuo e sob uma perspectiva integral. Entram em cena as possibilidades e inclinações do sujeito, movidas pelo seu desejo, atravessado pela realidade. Desse modo, há uma impossibilidade em manter um modelo unitário de formação onde haja uma ideia linear e homogênea, acrescenta Larrosa (1998). O processo formativo, segundo o autor, refere-se justamente a um trajeto não normatizado, no qual a apreensão do mundo se faz a partir da dissolução dos modelos já estabelecidos e fixados.

Nessa direção, Pereira (1996) defende que o que está em questão na formação de professores não são as habilidades, as competências ou os saberes, mas como se chegou a ser o que se é. Esse apontamento refere-se ao que o autor chamou de “professoralidade”, em que o foco recai sobre esses movimentos de subjetivação do docente, chave para se pensar sobre a formação de professores:

Entendendo a professoralidade como uma marca, um estado singular, um efeito produzido no (e pelo) sujeito (Pereira, 1996), somos levados a entender que os movimentos de constituição de si (a estética) produzem num mesmo lance o sujeito e o professor. O sujeito se professoraliza e se subjetiva ao mesmo tempo. E, ao se professoralizar, contribui para a subjetivação de outros sujeitos (PEREIRA, 2010, p. 10).

Além disso, Pereira (2010) destaca a importância do constante questionamento que o professor necessita fazer acerca do seu processo de formação (professoralização), bem como do processo de subjetivação, porque o autor acredita que essa é uma via potente para que esses processos sejam infindáveis. Ou seja, que os professores se coloquem na posição não tanto de buscar as respostas, mas no modo como lidam com essas e como manejam as perguntas e os efeitos que essas produzem:

Colocar em questão processos e modos de subjetivação e professoralização, seus contextos, suas circunstâncias, as formas de racionalidade que neles operam, os projetos que deles emergem, os efeitos produzidos, tudo ajuda a renovar constantemente os valores que entram em cada composição (PEREIRA, 2010, p. 64, 65).

Mendes (2005) postula que no ato de educar há uma contínua reconstituição, reorganização e transformação da vida, onde está imbricada, com isso, a reflexão permanente. Esta última, não se dando no vazio, isto é, não propondo que

o professor possa tomar certa distância de si, sem, contudo, desprender-se de si, possibilita que o sujeito se depare com suas limitações e avanços. Assumindo esse lugar de reflexão de sua própria formação, fica viável ao professor que a sua ação seja reinventada de modo constante “conferindo sentido humano e ético ao ato de ensinar” (HAGE, 2011, p. 9).

Trata-se, desse modo, de uma permanente construção, de uma história de invenção constante por parte do professor frente ao seu fazer. O profissional precisa experimentar-se ora na posição de agente, ora na posição de agido, caracterizando-se ele mesmo como palco de experimentação. Em meio a essa vivência de professoralização é possível ao sujeito avançar frente as suas questões subjetivas, uma vez que esse processo o convoca a extrair marcas, signos e traços, gerando o permanente conhecimento de si (PEREIRA, 2008).