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IV. Apresentação e análise dos resultados

4.1. Triangulação: doente-mãe-cuidadores

4.1.3. Formação do cuidador

Relativamente a este parâmetro, o objetivo que tínhamos definido à priori foi “Averiguar a formação do cuidador de uma criança com cancro no que se relaciona com a tarefa que executa” e enquanto mediador tinha de “Desenvolver competências de autorregulação do desenvolvimento pessoal e profissional”. Esta prática de intervenção podia ser feita de forma a “Promover e incentivar o autocuidado dos cuidadores, preservando as suas decisões e escolhas individuais”, a “Promover o reencontro pessoal e a autoestima dos cuidadores enquanto seres humanos” e também para “Proporcionar novas aprendizagens inerentes à tarefa de cuidar e aos desafios que se colocam no ato de cuidar”.

Nestes objetivos, a categorias que abri foi A Formação do cuidador que incluía as subcategorias “Cuidar do cuidador”, “A autoestima” e “A troca de experiências com outros cuidadores”.

O bem-estar psicológico dos familiares tem influência na sua capacidade de prestar cuidados ao doente e contribui de forma decisiva para a recuperação do doente e, portanto, a implementação de estratégias de intervenção e suporte psicológico para o doente e seus familiares é fundamental na perspetiva de uma assistência integral e de qualidade.

Desempenhar a tarefa de cuidador, requer este possua aprendizagens relacionadas com a doença que cuida, mas também que consiga adquirir novas competências de forma a que se possa sentir orientado para lidar com a doença, mas também que consiga ter a perceção da importância de cuidar de si próprio (Tabela 7).

Tabela 7 - Evidências da subcategoria A Formação do cuidador: Cuidar do cuidador Diário de minha mãe (Dm) Diários de bordo (Db)

“(...) depois a enfermeira chefe perguntou-me quais eram as nossas dúvidas, e eu disse que eram todas. Ela disse-me para não ficar assim, porque a leucemia da minha filha não era das piores, e que se eu fosse uma mãe que ia estar sempre em baixo como ia ser quando a minha menina ficasse sem o cabelo (...)” (Dm, p.5). “Eu disse à enfermeira L. que não ia jantar porque tinha medo que ela reagisse mal, porque ainda faltavam 30 minutos para acabar. A enfermeira disse para eu ir, que ela via a menina. Quando eu cheguei de jantar às 18h50 dei com a Dra. T. a sair do quarto, ela disse-me que ela reagiu mal ao antibiótico e eu disse que se soubesse não ia jantar (...) fiquei assustada e triste por deixar a minha menina, nesse instante veio a Dra. L. e a Dra. T. tranquilizar-me, a dizer que é muito normal acontecer isto e que a menina não estava em risco da vida, foi uma reação normal ao antibiótico como se reagisse mal a outra coisa” (Dm p.16).

As necessidades do cuidador passam então por cuidar de si próprio, saber lidar com expectativas e angústias, ser capaz de identificar sinais de mudança, ser capaz de se adaptar em termos emocionais, relacionais e de representações cognitivas, estar informado e saber onde e como pedir ajuda.

Através da Tabela 8, é comum verificar entre os cuidadores, que existe uma manifestação de vários sentimentos que podem estar inteiramente ligados à sensação de impotência que estes sentem no decorrer do desempenho da sua tarefa. Esta multiplicidade de sentimentos desencadeia no cuidador sentimento de baixo autoestima, em que dificilmente este consegue ter condições de exercer alguma mudança.

Tabela 8 - Evidências da subcategoria A Formação do cuidador: Autoestima Diário de minha mãe (Dm) Diários de bordo (Db)

“Já viu como estou? Nem vontade tenho de me arranjar. Todos os dias ando aqui para a frente e para trás com fato de treino, não há vaidades mesmo” (Db 5, p. 124).

“De um momento para o outro o que era importante deixou de o ser, pensar na cor das unhas ou da roupa a usar no dia a seguir passaram a ser questões minimalistas quando comparadas à gravidade da doença da minha filha que me assombra o presente e compromete o futuro” (Db 5, p.124).

Os cuidadores sentem muita necessidade de desabafar e conversas, e conforme o tempo vai passando, vão sentindo mais à vontade para o fazer com outros pais/cuidadores e profissionais da área (Tabela 9). O contacto com outros pais que, estando em fases mais avanças do tratamento oncológico, transmitem a imagem do que muito provavelmente vai acontecer com o seu filho.

Tabela 9- Evidências da subcategoria A Formação do cuidador: Troca de experiências com outros pais/cuidadores

Diário de minha mãe (Dm) Diários de bordo (Db)

“A enfermeira chefe veio também à sala e viu que eu estava muito triste e disse-me para eu ter muita calma e paciência. Virou-se para a mãe da menina que ia embora e disse: “Diga lá mãe, como estava o seu menino?” e ela disse que já há um mês que estava no isolamento, e não havia maneira dos valores subirem e perguntou-me o que tinha a minha menina, eu disse-lhe leucemia e ela quis saber qual delas. Eu disse que se não estava em erro era mieloblástica, ela disse que era a mesma do seu filho e que ao principio tambémestava sempre assim, mas depois mentalizou-se que era para o bem do filho e que não podia ficar triste (...)” (Dm, p.4).

“Eu sei, eu sei que não é bom estar assim, até mesmo para a menina, mas custa. Tenho de ir algumas vezes com outros pais lá fora apanhar ar, e dar uma volta, porque olho para a J. e começo- me a lembrar das coisas. O que ela está a passar não é nada fácil, e os pais deviam estar ao lado dela.” (Db 4, p.120)

“Partilhei experiências com outros pais com problemas de saúde variados e complicados (um mundo que só conhece quem por elas passa), mas a verdade das verdades é que nunca conheci pessoas com tanta força de acreditar como nesta fase da minha vida”. Questionei: “Acha que as pessoas que por aqui passam ganham outra força? Ou acreditam de forma diferente?” “Claro que sim, nem podia ser de outra forma. Somos testados a todas as horas, sem que nada faça prever, mas queremos sempre continuar. Nunca baixamos os braços, e acreditamos. Acreditamos que os nossos filhos vão recuperar. Eu acredito” respondeu-me a mãe” (Db 8, p.134)

“Tem sido importante comunicar com outras pessoas, partilhar os nossos anseios, temores e expectativas com os pais de outros meninos e meninas. Aqui na casa temos essa possibilidade, já nos cruzamos com outras famílias e isso é bom” (Db 12, p.146)