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2. ENQUADRAMENTO

2.4 FORMAÇÃO DUNAR E SUA VEGETAÇÃO NO NORTE DE PORTUGAL

PORTUGAL

As zonas costeiras integram ecossistemas únicos resultado de uma evolução longa de vários milhões de anos (Dias, 2005). Os sistemas dunares são sistemas dinâmicos da paisagem que dependem diretamente da influência do mar e dos ventos (Sousa, 2010). As marés fornecem a estes sistemas sedimentos essenciais ao crescimento das dunas e o vento transporta-os para o interior até estes serem aprisionados geralmente por plantas, o que torna estas formações altamente móveis e sensíveis face a alterações do coberto vegetal (Carter, 1990). A duna é o nome dado à elevação ou “monte” dinâmico conformado principalmente por ação do vento e é formada geralmente através de um obstáculo (pedra ou planta por exemplo) que cria uma zona de acumulação de areias protegida dos ventos de sotavento e aí começa o processo da sua formação da duna que continuamente, caso o vento dominante continue na mesma direção, faz com que a ela se estenda para o interior com uma face mais suave do lado de onde sopra o vento, o barlavento, e outra mais inclinada no lado protegido do vento no sotavento (Carter,1990).

Obstáculos como restos orgânicos, conchas e vegetação de variados tamanhos causam atrito à passagem do ar e reduzem a velocidade do vento (Santos, 2010) e por essa razão criam zonas de acumulação de sedimentos que ficam desta forma, mais protegidas (Figura 6). Figura 6 - Esquema do processo de sedimentação

25 Os ecossistemas marinhos segundo Ley et al.

(2007) subdividem-se em várias zonas (Figura 7). Estas são a zona limite superior da maré, duna embrionária, duna primária, espaço interdunar, duna secundária e por fim duna terciária.

O limite superior da maré é a área onde se acumulam os detritos e matéria orgânica trazida pelo mar que fica temporariamente estabilizada com Cakile maritima (eruca-marítima – Figura 8),

Salsola kali (barrilha-espinhosa ou barrilheira

Figura 9) e Euphorbia peplis (maleteira-das-areias – Figura 10), até as areias se tornarem novamente móveis, por as espécies serem anuais, e poder também surgir a espécie perene Polygonum

maritimum (polígono marítimo – Figura 11) (Sousa,

2010). As espécies Cakile marítima e Salsola kali que normalmente surgem associadas a descargas oceânicas de galgamentos marítimos ou na foz de pequenos ribeiros pouco contribuem para o degrau de praia (ou duna embrionária) por surgirem sazonalmente (Gomes, 2002).

Figura 7 - Esquema das várias zonas que compõem um ecossistema marinho segundo Ley et al (2007)

Figura 8 - Exemplar de Cakile marítima (Fonte: Imagens Google)

Figura 9 - Exemplar de Salsola kali (Fonte: Imagens Google)

Figura 10 - Exemplar de Euphorbia peplis (Fonte: Imagens google)

26 Logo na zona de praia mais sujeita à influência

das marés, surge a duna embrionária ou degrau de praia, onde se encontram comunidades vegetais altamente resistentes à submersão, aos ares salgados e húmidos (salsugem) e à instabilidade dos solos. A espécie perene Elymus farctus (feno- das-areias – Figura 12) por ter um crescimento muito rápido e por ter a capacidade de se extender rapidamente através de rizomas e longas raízes que fixam as areias é fundamental na fixação da face mais virada para o mar (Gomes, 2002). É através das pequenas formações de areia propiciadas por esta espécie gramínea que são formados diferentes ambientes sujeitos ou protegidos ao transporte eólico e às brisas marinhas o que faz com que se desenvolva uma comunidade vegetal mais rica que se vai adaptando progressivamente ao longo do crescimento para o interior (Rebêlo, 2004) e surge por vezes em povoamentos extensos e monoespecíficos (Sousa, 2010).Devido ao facto da espécie Elymus farctus se desenvolver na zona da praia coincidente com a área dos banhistas muitas vezes acaba por ser diminuída ou mesmo dizimada em praias de alto valor recreativo (Gomes, 2002; Sousa, 2010). Locais com maior teor de humidade no solo podem ainda permitir o desenvolvimento da planta carnuda Honckenya peploides (sapinho-da- praia – Figura 13) que é normalmente a espécie indicada nesta primeira formação da duna quando há água doce nas imediações (Gomes, 2002). Pela sua alta tolerância ao sal, capacidadede tolerar o soterramento constante e possibilidade de crescer de forma vertical (Rebêlo, 2004), associada à potencialidade de submersão pelas águas do mar nestas zonas,

Figura 11 - Exemplar de Polygonum maritimum (Fonte: Imagens Google)

Figura 12 - Exemplo de povoamento de Elymus farctus (Fonte: Imagens Google)

Figura 13 - Exemplar de Honckenya peploides (Fonte: Imagens Google)

Figura 14 - Exemplar de Otanthus maritimus (Fonte: Imagens Google)

Figura 15 - Exemplar de Calistegia soldanela (Fonte: Imagens Google)

27 apenas E. farctus uma vez adaptada a estas

condições e com um crescimento vertical muito rápido, sobrevive e permite a formação de uma elevação ao longo de vários anos (Gomes, 2002). Como plantas pioneiras de acumulação da areia das praias, as do género Elymus constituem um elemento chave para a formação das dunas frontais já mais estabilizadas para o interior (Rebêlo, 2004). Após uma estabilização de 3 a 4 anos começam a desenvolver-se outras espécies como Otanthus

maritimus (cordeirinho-das-praias – Figura 14), Calistegia soldanela (couve-marinha / soldanela

Figura 15) e Euphorbia paralias (morganheira-das- praias – Figura 16) que favorecem o aumento do volume da duna e na sua estabilização progressiva, criando-se assim uma chamada duna embrionária de grande estabilidade, caso não haja mudanças significativas naturais ou antrópicas no local como fortes tempestades ou pisoteio intenso (Gomes, 2002). A espécie Eryngium maritimum (cardo marítimo - Figura 17) também é uma espécie comum em dunas embrionárias estabilizadas e duna primária.

Esta situação, acompanhada duma fixação dunar efetiva, por plantas pioneiras no degrau de praia, cria as condições de desenvolvimento às plantas sucessoras e permite que se forme um perfil estabilizado virado para o mar e outro do sotavento que atinge o chamado ângulo de repouso geralmente de 30-34˚, num processo contínuo de arrastamento de areia para o cume da duna que, por força da gravidade e instabilidade, tende a alcançar o ângulo de repouso ideal, dependendo da granolometria e restantes caraterísticas do material

Figura 16 - Exemplar de Euphorbia paralias (Fonte: Imagens google)

Figura 17 - Exemplar de Eryngium maritimum (Fonte: Imagens Google)

Figura 18 - Exemplo de erosão pronuciada em corte de deflação eólica

(Fonte: Imagens Google)

Figura 19 - Exemplo de hummocky dunes (Fonte: Imagens Google)

Figura 20 - Exemplar de Amophila arenaria (Fonte: Imagens Google)

28 (USGS, 2004). A estabilização deste primeiro

estádio de desenvolvimento, a duna primária ou frontal é desempenhada pela essencialmente pela gramínea pioneira Amophila arenaria (Figura 20). O uso intensivo da praia pelo Homem e o trânsito de veículos, motorizados ou não, destroem a vegetação fixada, o aumento do nível das águas do mar, bem como os desequilíbrios no trânsito sedimentar criado pelas obras de engenharia costeira transformam uma parte da duna estabilizada numa zona altamente propícia à erosão mais vulnerável às investidas do mar (Gomes, 2002), assim como os animais, eventos de chuva intensa e tempestades (Gomes, 2002; USGS, 2004). Os fatores humanos associados a obras de engenharia costeira, como os esporões, acabam por dizimar o primeiro obstáculo que o mar tem em relação ao seu avanço para o interior, os sistemas dunares (Dias, 1993). A formação e preservação das primeiras dunas, as paleodunas, torna-se essencial e, quando destruídas criam os chamados corredores de deflação eólica ou cortes eólicos (blowouts – Figura 18) que alastram a erosão pelas dunas e através desses canais de vento (Gomes, 2002). Segundo o autor, no caso do aparecimento destes corredores, as dunas tornam- se móveis e progressivamente ficam apenas pequenos montículos residuais (hummocky dunes – Figura 19), segurados potencialmente por uma planta, a Amophila arenaria (estorno) que, quando a exposição das raízes já é muito acentuada, não sobrevive.

Logo após a duna primária e próximos estádios de desenvolvimento, caso existam, surge o espaço interdunar onde são criadas as condições ideais

Figura 21 - Exemplar de Artemisia crithmifolia (Fonte: Imagens Google)

Figura 22 - Exemplar de Helichrysum picardii (Fonte: Imagens Google)

Figura 23 - Exemplar de Medicago marina (Fonte: Imagens Google)

Figura 24 – Exemplar de Anagalis monelli (Fonte: Imagens Google)

Figura 25 - Exemplar de Malcomia littorea (Fonte: Imagens Google)

29 para o desenvolvimento da vegetação pelo abrigo dos ventos fortes e salsugem o que permite uma cobertura quase total de espécies vegetais (Ley et

al., 2007) e com uma grande diversidade florística

(Sousa, 2010). Para lá da duna primária ou frontal, onde as condições são mais favoráveis, há uma maior secura e assim vingam espécies anuais como

Artemisia crithmifolia (madorneira / erva- lombrigueira – Figura 21) e Helichrysum picardii (perpétua-das-areias – Figura 22) essencialmente e outras como Medicago marina (luzerna-das-areias – Figura 23), Anagalis monelli (morrião azul / morrião- das-areias – Figura 24), Malcomia littorea (goivo-de- praia – Figura 25), Corynephorus canescens (erva- pinchoneira – Figura 26) e Vulpia alopecurus (Figura 27) numa comunidade vegetal mais complexa (Gomes, 2002); aí surge a duna secundária, com um ambiente bem mais abrigado e seco, pelo afastamento do mar e proteção pela duna embrionária e sobretudo a frontal.

A ação humana tem acelerado a destruição de parte do cordão dunar para lá da duna frontal sobretudo e em muitos casos sobre a própria duna primária, com o crescimento urbano, as vias de acesso às praias, a transformação de solos dunares em espaços agrícolas ou mesmo frentes urbanas de habitação muito próximas do mar. A atração humana por estas áreas costeiras, obrigou à intensificação das obras de engenharia costeira, processo um pouco generalizado por toda a costa portuguesa. A elevada importância da preservação dos ecossistemas dunares portugueses é devida ao facto destes apresentarem uma diversidade florística singular, face ao contexto europeu (Sousa, 2010).