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O conceito deste projeto baseia-se na força dos elementos naturais (como chuva, vento, marés) enquanto “escultores” da paisagem e principais influenciadores da dinâmica da mesma, antes da sobreposição dos interesses humanos no seu uso. No caso do espaço litoral foram estes os elementos que de forma harmoniosa e gradual criaram aos espaços dunares outrora espaços desabitados e que serviam de abrigo a variadas espécies de fauna e flora, que hoje em dia devido ao crescimento urbano concentrado destes espaços põe em risco sério a população costeira, os seus ecossistemas, habitats e a resiliência física das dunas face às tempestades e investidas do mar. Esta faixa foi progressivamente ocupada e transformada pelo homem e deixou de existir em muitas zonas costeiras a interface do espaço oceânico para o espaço continental. Esta é essencial para a dissipação da energia das ondas de forma a proteger o avanço do mar para o interior, e é neste sentido que a proposta está direcionada na procura da proteção e restituição das dunas como espaços cruciais de defesa natural da linha de costa.

As formas de intervenção no cordão dunar da área de intervenção são sobretudo técnicas de estabilização dunar conhecidas como “leves” por não prejudicarem o fluxo natural de sedimentos, por serem mais próximas de uma situação dunar de formação natural por ação das ondas e dos ventos. Para tal foi proposto um reperfilamento do cordão dunar de forma suave de crescimento gradual para o interior com geocontentores na base da duna primária de forma a protegê-la (Figura 75).

Neste caso concreto, devido à instabilidade da “duna existente” que na realidade é um aterro de grandes dimensões, tem de ser intervencionado dado o carácter anti- natural da sua morfologia. Acrescido a este fator, a ocorrência de fortes chuvadas, a gradual subida do nível das águas do mar e ainda o menor fornecimento sedimentar das costas portuguesas fez com que a base deste sistema dunar profundamente alterado ao longo dos tempos esteja em perigo eminente face à sua instabilidade atual e constitua uma ameaça para quem passeia nos passadiços face ao recuo da linha de costa. Desta forma, para a consolidação das dunas costeiras da Praia do Aterro serão usadas técnicas de consolidação da base dunar com a aplicação de geocontentores que face a eventos como tempestades impedem a remoção dos sedimentos de forma acentuada, e que após sua ocorrência é possível uma reposição do stock da parte do sistema dunar sujeito à influência das marés.

102 Figura 75 – Secção do aterro atual e o perfil proposto com as estruturas de proteção costeira, os geocontentores e os passadiços afastados da duna frontal

103 Figura 76 - Sistema dunar proposto com crescimento suave para o interior, áreas de estadia, passadiços de

madeira e ciclovia (ver anexo P10)

Com a consolidação dunar através de vegetação autóctone será possível restituir habitats perdidos e uma estabilização do cordão dunar efetiva de modo gradual em direção ao interior, o que não acontece atualmente, principalmente na área a norte da E.T.A.R. de Matosinhos. Nesta zona, a extensa área disponível está desaproveitada e é proposto um reperfilamento das dunas na faixa que apresenta uma maior erosão e com um perfil de inclinação mais acentuada (Figura 75 e Figura 76).

A proposta de uma forma geral vai de encontro à restituição do funcionamento ecossistémico do litoral e à resolução dos problemas ligados à erosão costeira que de forma séria tem ocorrido nesta área em estudo. Esta proposta encontra-se no anexo P01, onde estão descritas as diferentes áreas a intervencionar. A maioria das espécies a utilizar na recuperação são propagadas na zona de talhões ambientais, mais a sul, de forma a reduzir os custos. O enquadramento da faixa poente da refinaria de Matosinhos será feito através de um maciço arbustivo e um alinhamento de Pinus

pinaster ao longo da rua Hélder Pacheco (rua marginal) e ainda através de outro

alinhamento de Pinus pinaster na duna terciária proposta (Figura 76).

A circulação pedonal e ciclável ficará deste modo protegida (Figura 77), bem como dissimulada a refinaria de Matosinhos através da modelação proposta (anexo P02). Desta forma, a duna secundária causará uma deflexão do vento e por conseguinte cria zonas mais abrigadas de estadia.

Figura 77 – Zona interdunar, onde passam dois passadiços, um para circulação pedonal e outro destinado à circulação ciclável com áreas

104 Será criada uma ligação em passadiço de madeira pintado complementar ao passadiço de madeira (Figura 78) que faz a ligação da marginal de Leça da Palmeira (a sul da área de estudo) que é pedonal e ciclável, com a ciclovia da Praia da Cabo do Mundo (a norte da área de estudo). Esta ciclovia foi proposta devido ao conflito atual de usos no passadiço onde ciclistas e pessoas utilizam o mesmo percurso, o que dificulta a circulação. A inclusão desta ciclovia onde os ciclistas possam circular de forma fluida é essencial no espaço litoral de forma a incentivar o uso de meios de transporte não poluentes e a de permitir, de forma segura, a prática desportiva.

Para a zona livre de recreio está prevista uma área ampla que permitirá um variado número de atividades e uma zona de manutenção dotada de equipamentos com possibilidade de serem usados por utilizadores das várias faixas etárias. Estes tipos de equipamentos estão exemplificados na Figura 79. Para o prado proposto para a zona livre de recreio foi escolhida uma sementeira com uma mistura variada de espécies autóctones marítimas. Assim potenciar-se-á a biodiversidade de todo o cordão dunar com disseminação das sementes. Destina-se apenas a da zona de manutenção a ter para um corte regular do coberto vegetal por forma a criar maior interesse na zona norte de intervenção. As espécies escolhidas foram sobretudo as seguintes: Armeria maritima,

Medicago marina, Silene maritima, Cachrys sicula, Eryngium maritimum, Calluna

Figura 78 – Vista sobre o passadiço existente com a ciclovia proposta na faixa enixistente e enquadramento da E.T.A.R. de Matosinhos

Figura 79 – Zona superior do aterro com equipamentos de manutenção com vista sobre o mar e alguns Meterosiderus exselsea para proporcionar

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vulgaris, Corynephorus canescens, Halimium halimifolium, Asteriscus maritimus, Sedum sediforme, Corema album, Limonium algarvense, Malcomia littorea, Limonium sinuatum e Anthemis maritima. Foi escolhida esta mistura de plantas litorais rasteiras

de forma a potenciar a sua dispersão pelos diferentes locais, sobretudo duna secundária e terciária de forma a criar um ecossistema estável e variado capaz de resistir às condições climatéricas adversas devido às alterações climaticas atuais e ainda a distúrbios ambientais numa área densamente contruida e de carácter industrial.

Em relação às linhas de água (Figura 80), para as ribeiras existentes, foi prevista uma limpeza da vegetação invasora e uma consolidação das margens de 3 m para cada lado através de vegetação ripícola autóctone com faschinas de Salix repens

“arenaria” e Juncus maritimus. A escolha incidiu nestas duas espécies por serem típicas do litoral, pela facilidade de serem obtidas, propagadas e pelo bom desenvolvimento radicular, essencial a uma boa estabilização das margens. Foi proposta uma sementeira associada às fascinas com Armeria maritima e Atriplex

halimus para auxiliar a fixação das margens (Figura 81). Após esta primeira faixa de

estabilização das margens foi previsto um prado numa faixa de 7 m para cada lado que para além de contar com as espécies como a Festuca arundinacea e Lolium

multiflorum adaptadas às condições costeiras, terá também a espécie gramínea Armeria maritima pela sua floração singular e a leguminosa Medicago marina

essencial para a manutenção da fertilidade do prado, o que permitirá usufruir parcialmente do espaço ribeirinho e da sua frescura com uma ampla variedade de espécies indígenas (ver anexo P07).

Figura 80 – Ribeira da Guarda com as margens consolidadas através de fascinas, e zonas de estadia, com a remoção total da vegetação invasora e a criação de margens de proteção à ribeira de 10 m para cada lado (ver anexo P09)

106 Figura 81 – Cortes do tipo de técnicas a utilizar, espécies das fachinas a aplicar na consolidação das margens e sementeiras associadas às duas ribeiras presentes na área em estudo

107 A modelação do terreno proposta, para além de proporcionar uma circulação mais agradável pela marginal em estudo, pela ocultação da refinaria, permite uma ligação direta com a praia seguinte, a Praia do Cabo do Mundo com percursos suaves, tanto a pé como de bicicleta com múltiplos percursos acessíveis à praia sobretudo pela sua inclinação máxima de 5%. A descida gradual do aterro em direção à saída da água pluvial que desagua no mar, foi pensada de forma a permitir uma drenagem através dum canal criado para o efeito, que desta forma não libertará a água ao longo do aterro, parte da sua destruição atual (ver anexo A02).

Esta alteração da morfologia para além de ser essencial para a estabilização dunar da faixa em estudo permitirá ainda melhorar a relação de escala da área de praia com o espaço dunar criado e assim melhorar a segurança da praia e dar a impressão que esta apresenta uma maior largura, facto que não acontece atualmente por a praia ser praticamente toda escondida por quem circula pelo litoral devido ao aterro de grandes dimensões.

Foi proposto um canal (Figura 82) de 2 m de largura e 1 m de

profundidade em

substituição do atual com 1 x 1m, cuja base será consolidada com as fascinas utilizadas nos ribeiros e as margens com as espécies utilizadas na Ribeira da Guarda. Este possuirá pequenos açudes ao longo do seu percurso que diminuirão a velocidade de escorrimento da água e consequentemente o poder erosivo.

As espécies a utilizar, tanto arbustivas como arbóreas, foram escolhidas não só pela sua capacidade de melhor enquadrar os elementos dissonantes da paisagem, em destaque para a refinaria, mas também por serem particularmente aptos para captar os poluentes atmosféricos considerados mais nefastos à saúde pública local, os compostos orgânicos voláteis pela espécie Nerium oleander e Chamareops humilis e as partículas pela espécie Pinus pinaster (Figura 83).

108 Figura 83 – O enquadramento paisagístico ao longo de toda a marginal a poente da refinaria é feito através de uma faixa arbustiva de dois alinhamentos de Nerium Oleander e um de Chamareops humilis na base, de forma a dissimular a base da refinaria e com um alinhamento de Pinus pinaster para a parte aérea da refinaria

109 Figura 84 – Vista aérea sobre as zonas com talhões para ações de educação ambiental para proteção da erosão costeira e requalificação das ribeiras litorais, moinho para visita, área de enquadramento à capela da Boa Nova e nova localização do bar azul e instalações para as ações de promoção cultural e ambiental (ver anexo P09) Quanto à área a sul está prevista pela câmara municipal de Matosinhos uma demolição do bar azul e a recolocação noutra área em frente que não entre em conflito com a entrada da Praia Azul e ainda o património arquitetónico de referência classificado como Monumento Nacional, o Salão de Chá da Boa Nova e a Capela da Boa Nova. Desta forma propôs-se a implantação do novo bar esplanada numa zona com vistas para o mar envolvida com talhões plantados com vegetação dunar, essencial à consolidação da linha de costa onde serão inseridos projetos de educação ambiental ligados à proteção costeira face à erosão e fomentadores da biodiversidade (Figura 84). As espécies escolhidas para estes talhões foram a Ammophila arenaria,

Otanthus maritimus, Euphorbia paralias e Helychrysum picardii por serem espécies

com alto poder radicular e de fixação da areia, por serem de fácil multiplicação e pelo seu valor ornamental, para além de apresentarem uma ampla distribuição nos diferentes estádios de desenvolvimento dunar no norte de Portugal. Nestes projetos podem ainda ser envolvidas escolas e outras entidades como forma de consciencializar a população para o tema da erosão costeira e da importância dos sistemas dunares com proteção física do espaço costeiro e como abrigo de várias espécies animais. Assim será possível um envolvimento de parte da sociedade em ações de recuperação ambiental de grande interesse para o espaço costeiro nacional aliado a uma maior sensibilização e interesse ambiental. Estes talhões previstos na proposta surgiram no decorrer do estudo da história de Leça da Palmeira pois as suas origens remontam para um povoamento que subsistia do cereal onde os campos agrícolas eram abundantes e sua principal fonte de subsistência. Outrora, os moinhos surgiam como elementos fundamentais na moagem cerealífera e atualmente será requalificado um no local. Por ser um elemento com tanto significado e mesmo detentor duma identidade tradicional tão rica, perdida fruto da evolução da sociedade, foi proposta uma recuperação de parte da história de Leça da Palmeira, para ser usado como elemento cultural de visita e de aprendizagem das técnicas tradicionais

110 de moagem, que desta forma ganhará vida numa componente prática e constituirá mais um ponto de interesse.

Na atual localização do bar azul e seu estacionamento foi proposta uma zona de recepção à praia com bancos e mesas para criar um espaço onde as pessoas poderão fazer as suas refeições e ainda descansar num espaço com alguma sombra. O espaço de estacionamento foi substituído por uma zona de recepção exclusivamente pedonal vocacionada tanto como zona de receção do Salão de Chá e Capela da Boa Nova, como área de lazer e de fixação. Para esse local propôs-se algumas mesas que têm um mecanismo de fixação de guarda-sois assim como alguns bancos no local, de forma a proporcionar um livre uso e um maior conforto aos utilizadores do espaço. A escolha das palmeiras Trachycarpus fortunei para este espaço incidiu no fato do topónimo “Leça da Palmeira”, de acordo com uma das fontes recolhidas estar associado aos peregrinos que vinham da Terra Santa, os “palmeiros” que desaguavam no rio Leça, e desta forma permanecem na paisagem como elemento simbólico e de interesse junto à Capela e Salão de Chá da Boa Nova (Figura 85).

Na zona superior do aterro, na zona central a norte, foi proposta uma zona de receção à zona mais alta das dunas terciárias com espaços de sombra sentados virados para prado marítimo/ mar, rodeada por várias árvores da espécie

Metrosideros excelsa (Figura 86). Para a construção do interior dos bancos foi prevista

a utilização de uma argamassa à base de cimento e de fragmentos de granito e telhas, Figura 85 – Zona de enquadramento à capela da Boa Nova com zonas de

estadia e merenda de apoio à praia Azul e zona de educação ambiental (ver anexo P09)

111 de forma a reciclar parte do material proveniente das limpezas de entulho dos solos previsto em plano (ver anexo P03).

O projeto foi pensado de ser realizado de forma faseada, pelo enorme volume de entulho presente no local e altamente condicionador das consequentes plantações, mas também pela possibilidade de o solo conter contaminações como já foi anteriormente descrito. Portanto, numa primeira fase é averiguada a existência ou não de zonas contaminadas através de análises a diferentes áreas selecionadas (anexo P03), e feita uma limpeza geral do entulho presente por toda a área em que parte será reutilizado. Caso se verifique alguma contaminação é utilizada a técnica “landfarming” que consiste em revolver os solos altamente compactados locais para promover a degradação microbiana até os níveis descerem para valores aceitáveis, e caso não se verifique qualquer contaminação ou após esta atingir níveis aceitáveis poderá efetuar- se a incorporação de algas de acordo com o estipulado (anexo P03). Estas servirão para melhorar as condições edáficas, essenciais a uma estabilização dunar efetiva visto o fraco desenvolvimento vegetativo de plantas autóctones observado por toda a área. Nesta primeira fase também é necessária a implementação da base da estrutura de geocontentores de proteção costeira proposta, dado o estado de degradação crescente da linha de costa da área tratada no presente projeto. Na segunda fase pensou-se implantar o restante projeto que deverá ser começado pela zona a sul com os talhões ambientais, por serem o elemento chave dinamizador de todo o processo de recuperação do cordão dunar aliado a uma interação e auxílio pela população no processo, sobretudo as escolas.

Junto à zona do campo de futebol da Aldeia Nova é proposta uma melhoria do enquadramento do local em relação à refinaria e nesse sentido foram propostas algumas plantações com Metrosideros excelsea e umas bancadas inseridas no cimo do talude virado para o campo por forma a permitir às pessoas assistirem aos jogos em espaços sentados com sombras e com boa visibilidade (Figura 87).

Figura 87 – Bancadas inseridas no talude virado para o campo de futebol do clube desportivo da Aldeia Nova com vegetação autóctone variada de enquadramento à refinaria

112 A vegetação escolhida para galeria ripícola foi pensada de forma a não tapar a visibilidade para o campo de futebol. Para a Ribeira da Guarda é proposto um prado para as margens com Armeria maritima e Medicago marina para além das epécies anunciadas atrás e de acordo com P07 e P08.

Apesar dos elementos intrusivos e degradadores da qualidade da paisagem no geral, as mais valias paisagísticas e patrimoniais com os afloramentos rochosos, o Farol da Boa Nova (primeiro farol elétrico do país), Salão de Chá da Boa Nova (uma das primeiras obras do arquiteto Siza Vieira) e a Capela da Boa Nova podem ser avistados ao longo do passadiço numa zona alta e propícia ao deleite da paisagem (Figura 88).

Figura 88 – Zona escolhida para miradouro pelas vistas abrangentes sobre o património construído e natural, junto a parte da Ribeira da Boa Nova recuperada junto ao mar (ver anexo P09)

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