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Fragmenta Alterius Redactionis Regula Non Bullate (Frag.)

O CONCEITO DE «HOMEM» NOS ESCRITOS DE SÃO FRANCISCO DE ASSIS

8. Fragmenta Alterius Redactionis Regula Non Bullate (Frag.)

Considerações preliminares

Dentro da tradição textual da RegNB, os editores e os estudiosos modernos dedica- ram particular atenção a algumas alterações na formulação do texto da RegNB, a que o editor Esser chamou Fragmenta alterius Regulae non bullatae e que o padre Paolazzi chama também de «excerpta»58.

Os «Fragmenta» têm como proveniência o Código Worcester (Wo), da biblioteca da catedral de Worcester (Inglaterra), acrescidos de uma série de citações de Hugo de Digne (=U), no seu comentário à RegNB, e com alguns relatos atribuídos à segunda vida de Cela-

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O texto latino refere-se a Frei Elias com a inicil «“H” [elie])» na EpOrd 38, EpOrd 40 e em EpOrd 47 já menciona por extenso: «fratri Helie ministro totius religionis». Em qualquer destes três versílculos da tradução portuguesa usa-se unicamente a inicial «H» para se referir ao nome «Elias “Helie”»: Scripta 218-220.

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no (=C). Carlo Paolazzi, na numeração dos versículos dos Frag. utiliza um critério próprio, diferente do adoptado pelo padre Esser.

Dadas as «objectivas divergências» entre o texto da RegNB e estes extractos, levaram o padre Esser a considerá-los como derivados de uma redacção diferente, editada como título de Fragmenta alterius Regulae non bullatae, a serem colocados entre a Regra de 1221 e a de 1223. É precisamente aí que, fisicamente, Carlo Paolazzi os coloca, na edição que nos serve de referência.

Os Frag. contêm unicamente exortações espirituais respeitantes à vida dos frades, como nos atesta o uso, tantas vezes repetido, da expressão «omnes fratres». Pelos dados da crítica interna, podemos afirmar, com o nosso editor, que a revisão redaccional se operou do texto da RegNB para o código de Worcester e não vice-versa59.

Transcrevemos seguidamente os textos dos «Fragmenta» onde se encontram os vo- cábulos em análise, sem os comentar agora; comentá-los-emos quando houver mudanças de termos em relação ao texto da RegNB.

A versão portuguesa das FFI não integra este escrito no Corpus dos escritos de São Francisco, por isso elaborámos a nossa própria tradução a partir do texto latino com o auxí- lio da versão italiana do padre C. Paolazi. Porque é uma tradução livre, ela não comporta a separação em versículos.

Começamos por transcrever os versículos do código Worcester (Wo), sendo os dois últimos textos de Hugo de Digne (=U).

O texto, sob o ponto de vista da morfologia, apresenta as características tipicamente medievais. O padre Paolazzi dá-nos indicações precisas sobre as suas opções na apresenta- ção gráfica do texto latino de Wo: os parênteses [] indicam partes escurecidas por manchas no manuscrito, em cursivo, algumas palavras legíveis integradas no texto da RegNB, são assinalados e corrigidos alguns erros evidentes60.

Todos estes textos do Fragmentos a outra Regra não Bulada contêm os termos «ho- mo, humanus, humaitas e vir» em análise nos escritos. A sua análise será feita juntamente com os textos da RegNB.

Wo [XVI, 6] 6

Unus modus, est quod non faciant lites neque con- tentiones, sed sint subditi «omni humane creature

Um modo é que não litiguem nem façam contendas, mas sejam submissos a toda a humana criatura por

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Cf. Scripta, 291. 60

89 propter Deum» (1Pert 2, 13) et confiteantur se esse

christianos.

amor de Deus (1Pe 2, 13) e confessem que são cris- tãos.

Wo [XVII, 10-12] 10

Custodiamus nos multum a sapientia huius mundi et prudentia carnis (cfr. Rom 8, 6-7); 11spiritus enim carnis vult et studet multum ad verba habenda, sed parum ad operationem, 12et querit non religionem et sanctitatem spiritus, sed vult et desiderat religionem et sanctitatem foris apparentem hominibus.

(…) Acautelemo-nos muito da sabedoria deste mun- do e da prudência da carne. O espírito da carne quer e esforça-se muito por ter palavras e não obras, e procura não a religião e a santidade do espírito, mas quer e deseja a religião e a santidade que aparecem exteriormente aos homens.

Wo [XVII, 19] 19

Et quando audimus homines malum dicere vel blasphemare Dominum, nos bene faciamus et bene- dicamus et laudemus Dominum, «qui est benedictus in saecula» (Rom 1, 25).

E quando nós ouvirmos os homens falar mal ou blasfemar contra o Senhor, façamos o bem, bendi- gamos e louvemos o Senhor, que é bendito pelos

séculos (Rm 1, 25).

Wo [XXI, 1] 1

Hanc vel talem exhortationem vel laudem possunt omnes fratres, quantumcumque inspiraverit eis Deus annuntiare inter quoscumque homines, cum benedic- tione Dei et licentia sui ministri:…

Esta ou semelhante exortação ou louvor todos os irmãos podem anunciar a todos os homens, segundo Deus os inspire e com a bênção Deus e com a licen- ça de seu ministro: …

Wo [XXII, 1-55] 19

Et multum caveamus a malitia et subtilitate satane, qui vult, ne homo mente [virtutem Wo] suam et cor suum habeat ad Dominum Deum; 20et circuiens desideret cor hominis sub specie alicuius mercedis vel adiutorii tollere et suffocare verbum et precepta Domini a memória. Et volens cor hominis per secu- laria negotia et curas inhabitare et excecare, sicut dicit Dominus: 21«Cum immundus spiritus» et cetera

usque ibi : 24«Fiunt novissima illius hominis peiora prioribus» (Mt 12, 43-45 ; Lc 11, 26).

(…) e acautelemo-nos muito da malícia e da esperte- za de satanás que quer que o homem não tenha a sua mente e o coração no Senhor Deus, (…) ele, rodean- do, sob a aparência de alguma recompensa ou de ajuda, desejaria arrebatar o coração do homem e sufocar-lhe na memória a palavra (cf. Mc 4, 19) (…) e os preceitos do Senhor, querendo também, através dos negócios e de cuidados mundanos, obcecar o coração do homem e aí habitar, como diz o Senhor : «Quando o Espírito impuro sai de um homem…» (etc.) «…E o estado final daquele homem torna-se pior do que o primeiro» (cf. Mt 12, 43; Lc 11, 26). 27

Et semper faciamus habitaculum et mansionem (cfr. Joa 14, 23) ipsi, qui est Dominus Deus omnipo- tens, Pater et Filius et Spiritus Sanctus, qui dixit: «Vigilate itaque omni tempore orantes, ut digni habeamini fugere» omnia mala, que ventura «sunt et stare ante Filium hominis» (Lc 21, 36).

(…) e façamos sempre uma habitação e um lugar de repouso (cf. Jo 14, 23) para ele que é o Senhor Deus omnipotente, Pai e Filho e Espírito Santo (cf. Mt 28, 19) e que disse: Vigiai, pois orando em todo o tem-

po, para serdes julgados dignos de escapar dos males que hão-de vir, e de vos manter de pé diante do Filho do homem (Lc 21, 36).

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Teneamus ergo verba, doctinam, vitam et sanctum Evangelium Domini nostri jesu Christi, qui dignatus est pro nobis rogare Patrem et nobis suum nomen manifestare dicens: 42Pater, «manifestavi nomen tuum hominibus» (Joa 17, 6) et cetera usque ibi…

Guardemos, portanto, as palavras, a doutrina, a vida e o santo Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo que se dignou rogar por nós ao Pai e manifestar-nos o seu nome, dizendo: Pai, manifestei o teu nome aos homens (Jo 17, 6) etc.

Hugo de Digne (=U) [IX, 6-9]

Hoc ipse diffusius in originali Regula sic ponebat:

(…) 6

Et quando facerent eis homines verecundiam et nollent eis dare, referant inde gratias Deo, quia de verecundiis recipient magnum honorem ante tribunal Domini nostri Jesu Christi. 7Et sciant quod verecun- dia non patientibus, sed inferentibus imputatur; 8et quod eleemosyna est hereditas et iustitia, que debetur pauperibus, quam acquisivit Dominus noster Jesu Christus. 9Et fratres qui eam acquirendo laborant, magnam mercedem habebunt et faciunt lucrari et acquirere tribuentes: quia omnia, que homines relin- quunt in mundo, peribunt, sed de caritate et eleemosynis, quas fecerunt, habebunt praemium a

Isto mesmo constava de modo extenso na Primeira Regra: E quando os homens lhe causarem vergonha

e não lhe quiserem dar esmola, dêem graças a Deus por isso; porque pela vergonha receberão grande honra diante do tribunal de Nosso Senhor Jesus Cristo. E saibam que a vergonha é imputada não aos que a sofrem, mas aos que a causam; e que a esmola é herança e direito que se deve aos pobres, a qual Nosso Senhor Jesus Cristo conquistou para nós. E os irmãos que trabalham para adquiri-la terão grande recompensa e fazem lucrá-la e adquiri-la os que dão esmola, porque tudo o que os homens deixam no mundo perecerá, mas, a partir da caridade e das

90 Domino. esmolas que fizeram, terão o prémio da parte de

Senhor.

O texto que se segue de Hugo de Digne (=U) [XVI, 6-7] comparativamente a Wo [XVI, 6], omite o vocábulo [humane] e prefere a forma reduzida da conjunção «nec» a «neque».

Hugo de Digne (=U) [XVI, 6-7] 6

Unus modus, ut non faciant lites nec contentiones, sed subditi sint «omni creaturae propter Deum (1Pert 2, 13) et confiteantur se esse christianos.

Um modo é que não litiguem nem façam contendas, mas sejam submissos a toda a criatura por amor de Deus (1Pe 2, 13) e confessem que são cristãos.