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2.2 A ARQUIVOLOGIA

2.2.1 Funções arquivísticas: descrição, difusão e acesso

A descrição é um “conjunto de procedimentos que leva em conta os elementos formais e de conteúdo dos documentos para elaboração de instrumentos de pesquisa” (ARQUIVO NACIONAL, 2005, p. 67).

Segundo Santos (2008, p. 180) a descrição muitas vezes é entendida como uma atividade que ocorre apenas nos arquivos permanentes, na fase permanente, no entanto, esta é uma ação que transcorre por todo o ciclo vital dos documentos, “pois tem seus elementos adequados a cada uma das fases, à unidade a qual se refere (peça, dossiê, série, etc., ou ainda, textual, imagético ou audiovisual) e às necessidades do usuário”. Para Hedlund (2014, p.41) a descrição “se inicia no processo de classificação dos documentos corrente, ao receber informações que carregará enquanto existir, e perpassa todo o ciclo vital do documento”.

A descrição também pode estar relacionada ao desenvolvimento de índices, de vocabulários controlados, a indexação no momento em que se estabelecem pontos de acesso para se recuperar os documentos ou informações.

O objetivo da descrição arquivística

é identificar e explicar o contexto e o conteúdo de documentos de arquivo a fim de promover o acesso aos mesmos. Isto é alcançado pela criação de representações precisas e adequadas e pela organização dessas representações de acordo com modelos predeterminados. Processos relacionados à descrição podem começar na ou antes da produção dos documentos e continuam durante sua vida. Esses processos permitem instituir controles intelectuais necessários para tornar confiáveis, autênticas, significativas e acessíveis descrições que serão mantidas ao longo do tempo (CIA, 2000, p. 11).

Conrado (2014, p.30.) ressalta que “descrever é realizar a representação ideológica das informações contidas nos documentos, sendo assim, uma atividade intelectual que se inicia na classificação”. Para a autora, a descrição

realizada nos arquivos permanentes é mais complexa se comparada à realizada na idade corrente, pois as finalidades na utilização dos documentos são diferentes: enquanto os documentos em fase corrente e intermediária são utilizados para fins administrativos, aqueles em fase permanente possuem características de utilização para fins sociais (CONRADO, 2014, p.30).

Neste sentido Santos (2012, p.35), entende que “a elaboração de instrumentos de pesquisa possibilita a identificação, o rastreamento, a localização, a utilização e a consulta a documentos informações neles contida, vitais para o

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processo historiográfico”. Ao mesmo passo Bellotto (2004, p.180) ressalta que esses instrumentos, são como “obras de referência que identificam, resumem e localizam, em diferentes graus e amplitudes, os fundos, as séries documentais e/ou as unidades documentais existentes em um arquivo permanente”.

Para Schellenberg (2006, p. 313), a elaboração destes instrumentos permite que o pesquisador seja independente do profissional responsável pelo arquivo, pois estes fornecem todas as informações necessárias para realizar e facilitar a sua pesquisa e uso.

Bellotto (2006) considera que a descrição é uma tarefa típica dos arquivos permanentes, não cabendo aos arquivos correntes. Para a autora, o correspondente nos arquivos correntes é o estabelecimento dos códigos de classificação que servem de referência para a recuperação da informação. No entanto, para Herredia Hererra (1987) a descrição é necessária tanto nos arquivos administrativos como nos arquivos históricos, ainda que sofra algumas alterações na prática. No mesmo entendimento, Lopes (1997) afirma que a descrição ocorre em todos os momentos do tratamento dos documentos, começando no processo de classificação, continuando na avaliação, e se aprofundando nos instrumentos de busca específicos, nos arquivos permanentes.

Em outra obra, mais recente, Lopes (2000, p.274) ressalta que a “descrição começa no processo de classificação, continua na avaliação e se aprofunda nos instrumentos de busca mais específicos” dentro de uma perspectiva de arquivística integrada, cabendo ao arquivista representar ideologicamente as informações contidas nos documentos. Essas ações, operações são de natureza intelectual e descritiva, segundo Lopes. Portanto, é difícil dizer que a descrição é separada das outras atividades de prática arquivística.

Ainda Lopes (2000, p. 275), remete a níveis descritivos e relacionados à: definição de fundos e suas subdivisões; avaliação do que é permanente, prazos de guarda e eliminação por meio das tabelas de temporalidade de documentos; o desenvolvimento de guias, inventários, repertórios, mapas de localização física, e a criação de formas de difusão do processo descritivo, ou seja, a publicação e disponibilização aos usuários. Evidentemente que a descrição culmina num instrumento de pesquisa,

Até mesmo Schellenberg, segundo Souza (2006, p. 129) fazia distinção entre as operações nos arquivos correntes e permanentes.

Essa diferenciação originou dois termos: classificação e arranjo. Isso era necessário, segundo o autor, porque os usos dados aos documentos nessas duas idades não podem ser considerados os mesmos. Então, o arquivista deveria adotar procedimentos específicos (SOUZA, 2006, p.129). A descrição arquivística, para Sodré (2010, p.28),

é o processo em que o arquivista cria representações de um determinado acervo arquivístico, explicitando o contexto e o conteúdo do acervo. É claramente uma atividade intelectual que demanda competências de interpretação de texto, conhecimento histórico acerca do produtor e de sua época, além de habilidade com a língua em que estão sendo produzidas as informações descritivas (SODRÉ, 2010, p.28).

Cé (2014, p.63) infere que a

descrição arquivística permite a sistematização do processo de acesso aos documentos através da elaboração de instrumentos de pesquisa - elo entre documento e usuário informacional. Esse procedimento arquivístico também permite o conhecimento do patrimônio documental em termos de estado de conservação, informação dos documentos, utilização dessa informação pelo usuário, por meio da representação das informações contidas nos documentos (CÉ, 2014, p.63).

Os depósitos de documentos, de arquivos, assim denominados por Bellotto (2006, p. 179), “nunca são de acesso livre, seu potencial de informações só chega ao usuário via instrumentos de pesquisa”. O volume de documentos de um arquivo atinge sua função, quando os instrumentos de pesquisa possibilitam o acesso e são difundidos entre os usuários. Portanto, para Bellotto (2006, p. 180) a partir do arranjo as tarefas que se seguem são obrigatoriamente a descrição e a disseminação, somente assim se chega a exploração dos fundos.

Os instrumentos de pesquisa podem ser genéricos e globais, no caso dos guias. Os parciais, são detalhados e específicos e se referem a parcelas do acervo, como inventários, catálogos seletivos e índices. O trabalho interno dos arquivistas gera outros instrumentos, que também orientam e norteiam o arranjo e a descrição de documentos, os quais pode-se citar, conforme Bellotto (2006, p. 180), as listagens de recolhimentos, os esquemas da evolução administrativa, organogramas, quadro gerias de fundos, grupos e séries; tabelas de temporalidade, fichários de controle de vocabulário da indexação, etc. É importante ressaltar que os instrumentos devem obedecer estruturas hierárquicas, no qual o guia é vértice.

A difusão, dentre todas as funções arquivísticas, é a responsável por projetar o arquivo para a comunidade, levando o acervo extramuros, projetando-se cultural ou socialmente. Para Blaya Perez (2008, p.28), a difusão “é a divulgação, o ato de

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tornar público, de dar a conhecer o acervo de uma instituição assim como os serviços que esta coloca à disposição de seus usuários”.

A razão de ser de um arquivo, é a comunicação de seus documentos, “é tornar disponível as informações contidas no acervo sob sua guarda” (PAES, 2002, p. 20.

Bellotto (2006) afirma que a difusão pode ocorrer sob três formas: editorial, cultural e educativa.

Para a autora, a difusão editorial é o canal de comunicação com o exterior, consiste em levar para a “comunidade, à administração e ao meio acadêmico informações sobre o conteúdo doo acervo documental, das atividades e dos programas do arquivo” (BELLOTTO, 2006, p.229).

De acordo com Bellotto (2006, p. 229), a partir das publicações é possível ao arquivo

atrair novos usuários, e fazê-los compreender o que é e o que representa. Isso porque, além dos instrumentos de pesquisa – inegável forma de possibilitar o acesso direto do pesquisador ao documento primário – um arquivo público pode produzir outros gêneros de publicações que o tornem também centro de vivência e de inter-relações culturais, tanto quanto um laboratório de pesquisa histórica. São os manuais, as edições de textos, as monografias de caráter histórico, os catálogos seletivos, as edições comemorativas (BELLOTTO, 2006, p. 229-230).

Para Blaya Perez, (2008, p. 32) as “publicações são o elo entre a informação documentada e o usuário”, são “canais de comunicação com o mundo exterior” (BLAYA PEREZ, 2008, p.32).

A difusão cultural é responsável por “lançar elementos de dentro para fora, procurando atingir um campo de abrangência cada vez mais amplo, e a que permite o retorno dessa mesma política, acenando com atrativos no recinto do arquivo” (BELLOTTO, 2006, p. 228), ligada às atividades culturais promovidas ou apoiadas pelo arquivo, museu ou centro de documentação. Estas atividades, segundo Bellotto (2006, p. 228) podem consistir em palestras, debates, lançamentos de obras e concursos sobre temas de história geral, simpósios, congressos, jornadas e reuniões, conferências, visitas guiadas, oficinas, exposições, ciclos de projeções, entre outros (BLAYA PEREZ, 2008, p. 32).

A difusão educativa refere-se a “programas educativos desenvolvidos nos arquivos ou com a participação deles” (BLAYA PEREZ, 2008, p.29), podendo se valer de diversos recursos, como visitas guiadas, exposições de documentos,

publicações, métodos audiovisuais, realização de concursos. A difusão educativa promove o desenvolvimento de laços entre os arquivos e a educação, o reconhecimento desse valor é o que evidencia seu potencial de fonte informacional (BELLOTTO, 2006, p. 230).

Neste sentido, Jardim (1999) em seu artigo, “O acesso à informação arquivística no Brasil: problemas de acessibilidade e disseminação”, afirma que a “satisfação das necessidades dos usuários de arquivos é uma variável fundamental de qualquer serviço de informação. O autor infere que a crescente aplicação e ampliação das tecnologias da informação, a internet por exemplo, amplia as novas possibilidades de usos da informação, de acesso e a manifestação de espaços virtuais.

O usuário de arquivos, segundo Kurtz (1990), para a satisfação de suas necessidades requer rapidez e precisão na busca da informação, configurando novas demandas de atendimento. Com isso, os arquivistas e usuários passam a vivenciar a virtualização das relações, através dos serviços oferecidos pela internet, as novas tecnologias estão sendo utilizadas para auxiliar no atendimento à distância, agilização, reprodução e difusão. Disponibilizando assim a informação para um maior número de pessoas ao mesmo tempo, de forma rápida e a custos reduzidos (BLAYA PEREZ, 2008, p. 29).

A utilização da tecnologia da informação, não se restringe apenas equipamentos de hardware e software, ou comunicação de dados, é uma realidade na sociedade. Percebe-se sua utilização para o trabalho, lazer, aprendizado e difusão social das informações. A rede mundial de computadores (World Wide Web, ou internet) passou a ser um meio privilegiado de divulgação, e construir e manter

websites tornou-se imprescindível para as instituições de arquivo. Um exemplo de

divulgação na internet acontecendo em larga escala, é a publicação dos produtos das descrições arquivísticas e os representantes digitais dos documentos.

Segundo Flores e Hedlund (2014, p.88)5,

essa nova geração de instrumentos de pesquisa eletrônicos disponibilizados em sistemas que armazenam informações de forma estruturada e dinâmica, quando bem elaborados possibilitam ao usuário do arquivo usufruir diversas funcionalidades que facilitam e incrementam sua pesquisa, especialmente no que se refere às possibilidades de recuperação da informação (FLORES, HEDLUND, 2014, p. 88).

5 Disponível em:< http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/informacao/article/viewFile/14892/pdf_33>.

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O artigo de Ricardo Sodré de Andrade e Rubens R. G. da Silva, intitulado Uma nova geração de instrumentos arquivísticos de referência: a publicação dos produtos das descrições arquivísticas em meio eletrônico, aborda a chamada nova geração de instrumentos arquivísticos de referência (next generation finding aids). Evidencia a uma nova realidade dos arquivos, a da disponibilização dos representantes arquivísticos digitais na web, o fenômeno responsável por alterar a experiência que o usuário tinha com os arquivos, e mostra o grau de interatividade e acesso com os documentos e com as instituições. Trazendo reflexos acerca dos instrumentos arquivísticos de referência tradicionais (o guia, inventário, catálogo, catalogo seletivo, índices e edição de fontes, (Bellotto, 2004), hoje tomando outras formas, evoluindo, melhorando. E com a internet, segundo Sodré6 (p.8,) “os arquivistas encontraram novas oportunidades para prover acesso remoto aos usuários dos seus serviços”.

A plataforma de acesso ICA-AtoM (AtoM), é o acrônimo para International

Council Archives – Access to Memory. O objetivo desse projeto, é dotar a

comunidade arquivística internacional de um

software de formato aberto que permita descrever os arquivos em conformidade com as normas do ICA (ISAD, ISAAR, ISDIAH, ISDF) e possibilitar a disponibilização online do acervo das instituições arquivísticas. Várias instituições ao redor do mundo já estão colaborando com o projeto, inclusive importantes instituições brasileiras (PAVEZI, 2013, p. 4).

Nesse sentido, o projeto ICA-AtoM trouxe vários benefícios à comunidade arquivística, entre eles pode-se citar, que é uma ferramenta gratuita, baseada em normas internacionais de descrição arquivística, é um software livre com código fonte aberto, permite inserir o representante digital do documento que está sendo descrito e permite o acesso extra muros à comunidade e aos pesquisadores de forma gratuita e online. O ICA-AtoM trouxe ao usuário a difusão e o acesso a um clique do mouse, independente do espaço e local, via acesso web.