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A investigação no âmbito do Ministério Público é desenvolvida sob duas vertentes. A primeira vinculada ao ilícito civil, que é desenvolvida por meio do inquérito civil público ou de procedimento preparatório. A outra vertente está relacionada ao fato criminoso, apurado através do inquérito policial, quando requisitado a autoridade policial, ou via procedimento investigatório criminal – investigação realizada diretamente pelo órgão ministerial (Júnior, 2011, p. 63).

Silvestre (2010, p. 49), compartilha do mesmo entendimento supracitado informando que, na seara do Ministério Público, as investigações cíveis são as relacionadas aos direitos difusos, coletivos ou de grupos hipossuficientes, utilizando- se do inquérito civil. Já as investigações criminais são aquelas cujo objeto será um fato criminoso, sendo perpetrada nos autos de um procedimento investigatório criminal.

Como já mencionado, existe uma discussão ainda acirrada, porém em processo de pacificação relacionada ao poder de investigação criminal exercido diretamente pelo Ministério Público. Esta celeuma foi recentemente discutida e bastante difundida nos meios de comunicação, por meio de votação, através da proposta de emenda à Constituição (PEC) nº 37, do Deputado Lourival Mendes, do PT do B do Maranhão. Esta proposta tinha como pleito diminuir ou erradicar o poder de investigação do Ministério Público e de outros órgãos.

A questão se divide em duas correntes, a primeira que defende o exercício exclusivo da investigação criminal por parte da polícia judiciária. Teoria esta fundamentada no óbice constitucional do Ministério Público na realização deste tipo de atividade. A obra de Fernandes (2010), clara defensora desta primeira corrente, busca esclarecer esta temática, debatendo, como objetivo principal, a investigação criminal praticada pelo MP. A segunda corrente defende que o órgão ministerial possui amparo legal para realizar investigações criminais de forma direta.

Gavronski e Mendonça (2013, p. 135) adentram nesta discussão em defesa da segunda corrente, apresentando suas fundamentações teóricas. Os autores iniciam suas argumentações explicando a teoria dos poderes implícitos,

conforme citação abaixo, bem como apresentam um exemplo do reconhecimento da Suprema Corte brasileira para esta teoria:

Inicialmente, a Constituição Federal concede o poder para o MP ―promover privativamente, a ação penal pública‖ (art. 129, inc. I) e ―expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos para instruí-los, na forma da lei complementar respectiva‖ (art. 129, inc. VI). Como é o titular da ação penal deve possuir sempre meios para que possa exercer referido poder. De nada adiantaria conceder um poder constitucional se não houvesse meios para efetivá-lo e concretizá-lo. Seria pueril imaginar que o Poder Constituinte tivesse dado tais poderes ao MP sem conceder-lhe meios para que pudesse exercitá-lo. Justamente por isto, da teoria dos poderes implícitos – já reconhecida pela Suprema Corte brasileira em diversas oportunidades – deflui que sempre que a Constituição concede um poder, deve-se entender abrangidos todos os poderes necessários para o exercício daquele poder. Conforme asseverou o Ministro Celso de Mello, a outorga de poderes explícitos ao MP pelo art. 129 da CF ―supõe que se reconheça, ainda que por implicitude, aos membros dessa instituição, a titularidade dos meios destinados a viabilizar a adoção de medidas vocacionadas a conferir real efetividade às suas atribuições, permitindo, assim, que se confira efetividade aos fins constitucionalmente reconhecidos ao Ministério Público‖. (GAVRONSKI e MENDONÇA, 2013, p. 136).

Os autores ainda rebatem o argumento da exclusividade da investigação criminal por parte da polícia judiciária, empregado pela primeira corrente, previsto na carta política de 1988, afirmando que há um equívoco originado pela interpretação literal do texto constitucional. Vejamos o que está previsto no inciso IV, do § 1º, do artigo 144 da Constituição Federal de 1988, que trata sobre a segurança pública do país: ―A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se a: [...] IV – exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União‖.

Gavronski e Mendonça (2013, p. 137), utilizando-se dos ensinamentos de Bruno Calabrich, expõe uma distinção prescrita no próprio texto constitucional, entre atividade de investigação e atividade de polícia judiciária, evidenciando que a exclusividade prevista no inciso I, do § 1º, do art.144 do pacto fundamental, está relacionada apenas as funções de polícia judiciária e não possui qualquer ligação com as infrações penais:

Realmente, o que o texto constitucional confere é legitimidade para a Polícia Federal exercer atividades de polícia judiciária. [...] Isto porque, enquanto o art. 144, § 1º, inc. IV, fala que compete à Polícia Federal ―exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União‖, outros dispositivos demonstram que função de polícia judiciária não se confunde com função de apurar infrações penais. Isto se extrai do inc. I do mesmo § 1º do art. 144

da CF, que afirma que incumbe à Polícia Federal ―apurar infrações penais‖ – que nada mais é do que investigar – e nesse caso sem atribuir-lhe o caráter de exclusividade, abordando em inciso diverso a função de polícia judiciária da União – essa sim, de exclusividade da Polícia Federal. E, conforme lembra ainda Bruno Calabrich, para afastar qualquer dúvida quanto à distinção entre funções investigatórias e de polícia judiciária, o § 4º do mesmo art. 144 da CF é expresso: ―às polícia civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares‖ (grifamos). ―Neste parágrafo, como é fácil verificar, além de se apartar cada uma das funções, nada há de referência à exclusividade para apuração de infrações penais, da mesma forma com que foi redigido o inc. I do § 1º‖.

Para ratificar os apontamentos destacados os autores ainda citam um julgamento de 27 de outubro de 2009, cujo relator, Ministro Celso de Melo, assevera que:

[...] a cláusula de exclusividade inscrita no art. 144, § 1º, inciso IV, da Constituição da República – que não inibe a atividade de investigação criminal do Ministério Público – tem por única finalidade conferir à Polícia Federal, dentre os diversos organismos policiais que compõem o aparato repressivo da União Federal (Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, e Polícia Ferroviária Federal), primazia investigatória na apuração dos crimes previstos no próprio texto da Lei Fundamental ou, ainda, em tratados e convenções internacionais. – Incumbe, à Polícia Civil dos Estados membros e do Distrito Federal, ressalvada a competência da União Federal e executada a apuração dos crimes militares, a função de proceder à investigação dos ilícitos penais (crimes e contravenções), sem prejuízo do poder investigatório de que dispõe, como atividade subsidiária, o Ministério Público. (GAVRONSKI e MENDONÇA, 2013, p. 137).

Outro ponto de destaque que auxilia a comprovação de que não há exclusividade da polícia para execução de investigações, refere-se ao fato de haver este tipo de atividade em outros órgãos, como, por exemplo, o COAF, a Receita Federal, o Banco Central, a Controladoria Geral da União, a Previdência Social, a Controladorias Estaduais, o IBAMA, dentre outros. (SANTIN, 2013, apud GAVRONSKI e MENDONÇA, 2013, p. 138).

Todavia após a rejeição da PEC nº 37, aparentemente a questão começa a ser pacificada, basta ver as recentes decisões do STF sobre esta temática. Como exemplo, podemos citar uma decisão colhida do sítio do próprio Supremo Tribunal Federal, divulgada no dia 09 de agosto de 2013, onde o título da matéria relata que a ministra Rosa Weber negou liminar em habeas corpus que contestava o poder de investigação criminal do Ministério Público.

Embora ainda não haja decisão definitiva pelo STF, existe uma tendência por parte da maioria dos ministros, em razão de diversos precedentes, prevendo a possibilidade de investigação direta por parte do MP, particularmente nos casos onde há desinteresse ou incapacidade por parte da polícia. Já no caso do STJ, este entendimento já é concretizado e se encontra pacificado (GAVRONSKI e MENDONÇA, 2013, p. 140).

Assim, de uma forma bem resumida, uma vez que este assunto é pauta de estudos e obras bem mais profundas, acreditamos ter conseguido debater a questão do poder investigatório deferido ao Ministério Público. Passaremos a tratar agora sobre a estrutura e atuação, dentro dos órgãos ministeriais, destinados ao desempenho da atividade de investigação criminal.