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3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

No documento UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE (páginas 72-78)

nacionais Brasília: MEC/SEF, 1997 Disponível em: Acesso em: 30 maio

3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Há muitos estudos relacionados ao corpo. Em nossa pesquisa, encontramos um livro de João Paulo Medina (2007), que trata sobre o assunto. Nele, percebemos que “o corpo é o próprio homem e como tal não pode ser somente objeto, mas sim o sujeito, o produtor e o criador da história”. Assim, reconhecemos que o nosso corpo carrega a nossa própria história, como cada alunos, em seus corpos, carregam as histórias deles, estabelecendo relações com o mundo, estejam esses corpos marcados ou não.

É preciso lembrar que frente a realidade de cada um, existe um opressor e um oprimido; contudo esse corpo oprimido pode se transformar num agente histórico de transformação social para a renovação de si mesmo. Por isso, é fundamental falar do corpo.

Num conceito mais humanizado de corpo, temos que o corpo é o sinal da alma; é instrumento do espírito. E é a partir desse dualismo alma-espírito, conforme Medina (2007, p. 49), que a nossa civilização se faz e se impregna de divisões. Assim, o corpo tem os modos de ser e existir no mundo, o que queremos dizer é que somos seres históricos e carregamos as nossas histórias e memórias corporais.

Ressalte-se, então, que cada um é marcado pelo seu próprio trajeto frente a humanidade e a vida, enquanto ser cultural e produto de uma evolução biológica, histórica e humana. Esse corpo, por sua vez, também passa por momentos de

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opressão, nesse caso, o corpo passa a ser oprimido, mas também está sempre em busca da sua libertação.

Em “Sexualidade, libertação e fé”, temos que “a primeira maneira de sermos do mundo, é ser corpo”. Por isso, “nosso corpo existe para a relação”, não para a opressão e quando isso acontece, isso nos marca por toda a nossa vida. O corpo oprimido guarda em si o sofrimento e o peso da rejeição, o que pode conduzir à frustração e ao desespero.

Mas, o caminho da aceitação abre portas para uma realidade nova, e isso pode começar ou se desenvolver através da arte. E o grande desafio é depreender sentido à própria vida, a qual nos faz ser aquilo que se opõe aquilo que os outros querem que sejamos. Isso é existir no nosso mais profundo do ser. É ser aquilo que nos conduz à vida e não à morte que nos impede de ser o que realmente somos com a energia vital que nos habita.

Nesse sentido, Melo (1998) aponta que

Torna-se premente a necessidade de despertarmos nos nossos alunos a ideia de que somos um corpo, para o qual sua compreensão imediata mostrará que nossas relações são estabelecidas com ele. O corpo é sempre o referencial nas relações com o mundo que nos rodeia, desde o nascimento, mostrando-se como prova cabal da nossa presença. E não há como negarmos tamanha prova de existência (MELO, 1998, p. 79).

E é para existimos no mundo que fazemos arte, resistindo às opressões e enfrentando nossos medos no ato de representar numa abordagem transformadora para o Ensino de Arte, que já nos anos 1960, questionava a expressão artística do aluno, procurando definir a contribuição específica da arte para a educação do ser humano (BRASIL, 1977, p. 23), abrindo novas perspectiva para a compreensão de ser no mundo e para o mundo através do ensino de arte.

E é pelo conhecimento da arte que o aluno tem uma compreensão do mundo na qual a dimensão poética se faz presente, posto que “a arte ensina que é possível transformar continuamente a existência, que é preciso mudar referências a cada momento”. (BRASIL, 1977), tendo a flexibilidade como condição para aprender a aprender Arte, onde o aluno toma consciência do seu corpo para então atuar e então, na representação, mostrar a sua verdade. Conforme Génoun (2004, p.61),

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“esta palavra é compreendida como o conjunto das aparências que podem servir para enganar os espectadores”.

Nessa perspectiva, Viola (2013) trata dos jogos teatrais, os quais são

Frequentemente usados tanto no contexto da educação como no treinamento de atores. Ao praticar, os jogadores desenvolvem liberdade pessoal dentro das regras estabelecidas e habilidades pessoais necessárias para jogar o jogo e irão internalizar essas habilidades e essa liberdade ou espontaneidade. Os jogos são baseados em problemas a serem solucionados.” (VIOLA, 2013, p. 12).

Contudo, atuar requer presença. E todos devem estar presentes no momento de atuar. (VIOLA, 2013). A presença, portanto, é um ato intuitivo e deve estar livres de opiniões, atitudes, preconceitos e julgamentos. É também estar aberto aos parceiros de jogo, produz uma força de vida, um fluxo, uma regeneração para todos os participantes. (VIOLA, 2013).

É importante que aquele que atua sinta o seu corpo, realizando movimentos em diversas direções dentro de um espaço-tempo, de forma a tornar-se autoconsciente da descoberta dos atravessamentos experimentados no trabalho realizado corporalmente, buscando um caminho de conscientização corporal e a partir daí, gerar um estado de alerta e prontidão, com o objetivo de agenciar a transformação da realidade para o processo criativo na atuação (QUEIROZ, 2011), considerando a memória corporal de cada um.

Klauss Vianna falava de uma memória corporal, pois percebia que o corpo e a mente estão unidos nos processos de memória. O mesmo acontece com a questão da consciência. Ele fazia referência a uma consciência corporal, porque era a maneira que encontrava para expressar a indissolubilidade da relação corpo- consciência, corpo-mente. (NEVES, 2008).

Diz-se do seu trabalho que é uma técnica de consciência corporal ou de educação somática, porém estas expressões não são do próprio Klauss. Ele nunca nomeou o que fazia; nem mesmo a expressão “Técnica Klauss Vianna” não é sua.” (NEVES, 2008, p. 77).

No teatro, alguma coisa acontece num determinado momento e espaço; alguma coisa que se move ou que se diz, e se transforma e, ao se transformar, modifica o ambiente, (AMARAL, 1996), como também pode modificar a vida da pessoa que atua. Conforme Amaral (1996) é uma emoção estética que se comunica

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entre um indivíduo e outros ao seu redor, através de determinadas atitudes, palavras e ações. E para agir, é necessário deixar-se envolver na atuação, explorando, antes de tudo, o imaginário.

Atuar é sempre uma experiência comum e deve vir ao encontro de um anseio coletivo, e isso deve ser buscado em sala de aula, o que pressupõe um ato que se modifica na medida em que um personagem se coloca no lugar da própria pessoa, e as suas atitudes não são mais habituais. (AMARAL, 1996). É quando o sujeito deixa de ser simplesmente o que é, para representar algo além de si mesmo, passando a revelar sua realidade no fenômeno teatral.

É um sair de si e entrar no personagem, que se transforma, provoca modificações ao seu redor, e modifica o seu ambiente, apresentando outra realidade através de novos conceitos, fatos e mostrando avida para além das aparências, sem esquecer da sua essência. O importante é, na representação, se assumir como verdadeiramente é e acolher-se como um ser que merece respeito e viver livremente longe de qualquer preconceito. Na nossa proposta pedagógica, o teatro é parte da vida cotidiana, é parte da vivência diária e dele todos participam. (AMARAL, 1996).

O teatro, para Grotowski, é sagrado e os seus atores são como monges. A disciplina que se exige deles é monástica. Nesta realidade, o ator cria a partir dele mesmo. E é no seu próprio corpo que deve encontrar fontes de energia para atuar, (AMARAL, 1996), reconhecendo suas marcas, para então, ressignificá-las, e é isso que acontece na preparação dos corpos para atuação na nossa proposta pedagógica, o que faz com que os estudantes trabalhem arduamente no reconhecimento de si mesmo.

O cotidiano é algo essencial no teatro, defende a vida simples como algo primordial. É também uma forma de resistência à violência vivida em casa, na família, na escoa. O ator aqui é sua essência e sua essência é assumir quem verdadeiramente é no ato de representar como forma de resistência.

O teatro é o sentir, o agir, o pensar e é uma ação que se potencializa na escola, pois o aluno se apropria do conteúdo vivenciado em sala de aula e assim, passa a uma reflexão profunda do ser. (SALLES, 2007). O importante é valorizar o processo de criação e garantir que ele aconteça com tranquilidade para que o aluno se sinta seguro na realização do seu trabalho na ação teatral.

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Em nosso processo de ensino aprendizagem, também interagimos com a abordagem do “Teatro do Oprimido”, de Boal, que teve como propósito discutir as várias formas de opressão, favorecendo pessoas exploradas e oprimidas, influenciando a vida de cada um, em busca da liberdade e para uma transformação social.

Segundo Boal (2009): “[...] o teatro é transformação, movimento e não simples apresentação do que existe. É tornar-se e não ser”. Sua discussão visa o ser humano em estado de opressão, porém, não deve continuar sendo vítima dessa situação, mas reagir para viver plenamente no melhor de si.

O teatro do oprimido parte do princípio de que a linguagem teatral é a linguagem humana utilizada cotidianamente, criando condições para que a pessoa que sofre opressão amplie as suas possibilidades de expressão como forma de denúncia da situação vivida, ajudando-o a se libertar de tal condição.

Aqui o espectador se torna um sujeito atuante, podendo transformar a ação dramática que lhe é apresentada, de forma que ele mesmo passe a ser protagonista e transformador da ação dramática como reflexão da sua própria vida e é isso que deve acontecer com os estudantes do CENEP na sua ação e atuação teatral.

O espectador ensaia sua própria evolução e revolução não determinando os papéis aos personagens, ele tem consciência da autonomia diante dos fatos que acontecem em seu cotidiano, o que possibilita uma liberdade de ação para que todos também se tornem “espect-atores”. O Teatro do Oprimido em sua poética se apresenta esquematizado com uma estrutura organizada em diferentes formas/técnicas de ações dramáticas, pois para Boal o teatro é ação.

E como forma de ação, temos o “Teatro-Jornal” em que qualquer notícia, conforme Boal (Ano), seja de jornal ou qualquer outro material, sem propósito dramático, tem a possibilidade de se transformar em cenas ou ações teatrais através de uma leitura simples, cruzada, complementar e com ritmo.

O Teatro Imagem, por sua vez, intenciona ensaiar transformações da realidade por meio do uso da imagem corporal. O ator nesse jogo é quem decide um tema problema que será tratado na cena, podendo ser um fato do contexto local ou global, desde que o assunto escolhido possua significado para a maioria do grupo.

Na sequência, atores se colocam em posições cênicas, interagindo com o espaço como se fossem massas moldáveis, com a finalidade de transforma esses

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corpos em estátuas, tentando representar imageticamente a situação em questão. O silêncio total é fundamental para o acontecimento da cena. Após o quadro vivo construído, os espect-atores são convidados a transformarem com suas modificações as imagens problema para uma situação ideal. Finalizando, é criada imagens de transição entre o problema e a solução.

O “Teatro-fotonovela” apresenta uma forma de desmistificação da Fotonovela, por ser uma literatura direcionada as classes mais baixas da população, isto antes da popularização da TV, e por veicular uma ideologia própria das classes dominantes.

Na prática é fazer a leitura de uma fotonovela, sem que os atores saibam que se trata de um folhetim fotografado, enquanto esses atores vão interpretando a história que está sendo lida, partindo para refletir sobre as ações que foram produzidas pelos atores e as que estão publicadas paralelamente às falas, com isto, é comum perceber distorções, pela minoria que produz essas fotonovelas, em relação a real situação dos sujeitos mencionados pela história.

Outra possibilidade de ação dramática dentro do arsenal do Teatro do Oprimido é o “Teatro Invisível”, cuja proposta é a representação de uma cena diante de pessoas que não sabem que estão sendo espectadoras da ação dramática, e precisa acontecer num ambiente diferente do teatral, nas no cotidiano das pessoas. Para esta forma de apresentação é preciso a preparação de um roteiro de improvisação, onde é possível ensaiar a possível interferência do espectador no ato estético coletivo.

Cabe aos atores prolongarem a discussão dos espectadores a respeito do tema abordado na cena, de forma que outros “atores anônimos” se insiram no contexto e reafirmem a veracidade da ação para o espectador, que neste momento passa a ser protagonista da ação teatral proposta. Logo, é imprescindível o caráter invisível dos atores para que os espec-atores atuem com liberdade.

O Teatro-Fórum foi a técnica experimentada pelos estudantes na pesquisa, na qual os atores representem e exponham um problema social, numa sequência em que os mesmos interajam com a cena propondo soluções variadas para o problema apresentado.

Essa técnica teatral possibilita, em sua construção e desenvolvimento, a quebra da repressão, que “consiste em ouvir o relato de um participante, no qual, o

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protagonista, não foi capaz de opor-se a opressão vivenciada”. (BOAL, 2009, p. 208), e é isso que acontece nas representações ocorridas em sala de aula, em que os estudantes relatam o que sofrem no cotidiano, na escola e em sua vida, contribuindo também para que eles resistam nas mais diversas situações de opressão.

No documento UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE (páginas 72-78)

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