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4. FINANÇAS SOLIDÁRIAS: ENTRE A COMPLEMENTARIEDADE E A CONSTRUÇÃO DE ALTERNATIVAS

4.3 AS ALTERNATIVAS DAS FINANÇAS SOLIDÁRIAS

4.3.4 FUNDOS SOLIDÁRIOS

Segundo Santos Filho (2012), Fundo Rotativo Solidário (FRS) é uma metodologia de apoio financeiro e pedagógico às atividades produtivas de caráter associativo, mediante compromissos devolutivos voluntários, gerenciados por organizações sem fins lucrativos, considerando formas flexíveis de retorno monetário ou de equivalência por produto ou serviços, dirigidos para o atendimento de comunidades ou grupos comunitários que adotem princípios de participação e convivência solidária.

Os FRS resgatam práticas históricas de mutirões e colaboração entre vizinhos, e se constituem para atender necessidades locais percebidas pela comunidade e que não foram solucionadas no marco das ações governamentais e nem mercantis. Nos idos da década de 1980, entidades não governamentais vinculadas à Igreja Católica financiaram, inicialmente com recursos da cooperação internacional, projetos alternativos comunitários (PACs) como estratégia emancipatória de geração de renda e convivência com as condições do semiárido nordestino. Para multiplicar o alcance dos PACs, as comunidades eram estimuladas a realizar devolução voluntária dos recursos por parte das famílias beneficiadas, com a finalidade de constituir FRSs, ou por meio do repasse de produtos ou crias dos animais recebidos para outras famílias.

Dentro de uma lógica de Finanças Solidárias, os FRS cumprem o papel de oferecer o capital inicial para o fomento de novos empreendimentos solidários ou a melhoria na infraestrutura produtiva da comunidade ou dos produtores. Pode-se dizer que um papel importante do FRS é oferecer “capital de risco”. Como os FRS trabalham com o público que

não tem acesso a outras fontes de financiamento e em territórios excluídos do mercado financeiro, dependem de aportes de capital não reembolsável, na sua etapa inicial de organização, até que as contribuições dos participantes cheguem a um volume suficiente para atender a demanda por novos desembolsos.

A prática do FRS vai além de um instrumento financeiro, já que este se entende como organização coletiva dos produtores para promover o desenvolvimento sustentável e solidário da sua comunidade/seu território. Para tanto, os FRS promovem atividades de formação e capacitação, acompanhamento técnico, organização associativa, apoio à comercialização e incidência sobre políticas públicas, além de gerir seu patrimônio coletivo. Essas atividades dependem da presença de equipes de agentes/educadores populares para dar assistência técnica.

Os Fundos Rotativos Solidários podem ser entendidos conforme a seguinte tipologia formulada pelo mapeamento dos FRS, realizado em 2012 pela Caritas Brasileira. São basicamente duas modalidades: os fundos de fomento e os fundos rotativos solidários.

a) os Fundos de Fomento são constituídos por recursos captados de doações da sociedade, da cooperação internacional ou de convênios e patrocínios públicos ou privados. Os recursos desses fundos são repassados para fomentar projetos produtivos e sociais da sociedade civil, da comunidade, de iniciativas de economia solidária, fundos rotativos solidários ou projetos de luta por direitos. Tais recursos são reembolsáveis para o Fundo de Fomento, como o Fundo Nacional de Solidariedade da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB/Cáritas), Coordenação Ecumênica de Serviços (CESE) e os Programas de Apoio a Projetos Produtivos Solidários do Banco do Nordeste (PAPPS/BNB), estão entre os principais.

b) os Fundos Rotativos Solidários são constituídos por recursos captados dos membros/sócios/participantes, sendo os contribuintes e usuários as mesmas pessoas. As duas modalidades mais comuns de constituição são: primeiro, a partir de uma injeção de capital externo, oriundo de um Fundo de Fomento repassado para o FRS; e, segundo, a partir de contribuições dos participantes, da comunidade (poupança coletiva). Os FRS utilizam os recursos para investir em projetos produtivos, empreendimentos de economia solidária, infraestrutura comunitária ou familiar, selecionados pelos participantes ou pela entidade gestora do FRS. Os recursos que financiam tais projetos são devolvidos integralmente; em ocasiões específicas, podem ser devolvidos parcialmente. São exemplos de FRS comunitários os casos desenvolvidos pela Articulação Nacional do Semiárido e pela Pastoral da Criança. Ainda destacam-se os casos de FRS não-monetário, como as casas de sementes, repasse de

animais e formas em que a devolução são realizadas com produtos e/ou serviços.

O mapeamento dos FRS também levantou informações acerca da dimensão dos FRS na região nordeste do Brasil e constatou a existência de 341 fundos rotativos solidários, atuando em 404 municípios. Até o ano de referência da pesquisa (2012), os FRS financiaram 4.097 empreendimentos produtivos, envolvendo 22.072 pessoas, sendo que 86% dos empreendimentos financiados atuam na agricultura familiar. A pesquisa destaca que os principais resultados alcançados referem-se ao acesso a água (construção de cisternas de placa, barragens e outras estruturas de captação e armazenamento de água, bem como sistemas de irrigação de hortas e plantações em quintais ou nas comunidades), segurança alimentar (sementes, hortas e quintais produtivos, criação de pequenos animais para consumo de carne e leite), geração de renda (renda oriunda de atividade produtiva financiada, inserção em políticas públicas de comercialização), organização social e cidadania (fortalecimento das associações, formação para captação de outros recursos e projetos, protagonismo da mulher, incidência sobre políticas públicas), e convivência com o semiárido/agroecologia (tecnologias de captação e uso da água, sementes, ração animal, recuperação de terras e nascentes, redução do êxodo rural) (MAPEAMENTO DOS FRS, 2012).

No capítulo seguinte, será apresentada a modalidade dos Bancos Comunitários de Desenvolvimento de forma abrangente, pois constitui o objeto do presente trabalho, como parte de uma dinâmica singular de Finanças Solidárias.

5. BANCOS COMUNITÁRIOS DE DESENVOLVIMENTO: CONCEITO,