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2 LEITURAS EXPLORATÓRIAS

2.1 GÊNESE DAS CIDADES E EVOLUÇÃO DA HUMANIDADE

2.1.1 Gênese das Cidades

Há aproximadamente 10.000 anos, o ser humano tornou-se sedentário, em razão do aprendizado da atividade agrícola. O domínio do cultivo da terra e o uso do arado viabilizaram a superação do nomadismo. A Revolução Agrícola ensejou a fixação do homem a terra, com radical modificação no que concerne às estruturas sociais, políticas e econômicas. Benevolo (2003, p. 16) destaca que

o ambiente das sociedades neolíticas não é apenas um abrigo da natureza, mas um fragmento de natureza transformado segundo um projeto humano: compreende os terrenos cultivados para produzir, e não apenas para apropriar-se do alimento; os abrigos dos homens e dos animais domésticos; os depósitos de alimento produzido para uma estação inteira ou para um período mais longo; os utensílios para o cultivo, a criação, a defesa, a ornamentação e o culto.

Além de aprenderem a produzir alimentos, cultivando plantas e domesticando animais, os homens organizaram as primeiras aldeias, próximas do seu local de trabalho. “Foi no Crescente Fértil, com seu clima favorável, que se originaram, há cerca de 10.000 anos, os primeiros assentamentos humanos e os primórdios da agricultura e da criação de animais domésticos” (LEICK, 2003, p. 14). O Crescente Fértil é uma extensão de terras, ao norte da

Bagdá de hoje, que vai desde a costa mediterrânea até o Iraque setentrional e se beneficia do regime de chuvas gerado pela cadeia montanhosa que se estende ao longo da costa síria. “Só depois que o homem aprendeu a adaptar-se ao seu meio ambiente, sobretudo através do controle dos cursos de água por meio de canais e diques, é que se tornou possível tirar proveito do potencial econômico inerente às planícies meridionais. Só então as primeiras comunidades em grande escala começaram a desenvolver-se, nas quais as pessoas passaram a lucrar com um sistema que ultrapassava os limites da mera subsistência, com o objetivo de produzir um excedente, diversificar suas atividades culturais e viver em número cada vez maior numa nova forma de comunidade coletiva: a cidade.” (LEICK, 2003, p. 14). Conforme Benévolo (2003, p. 23), “a cidade, local aparelhado, diferenciado e ao mesmo tempo privilegiado, sede da autoridade, nasce da aldeia, mas não é apenas uma aldeia que cresceu”. Ela se forma há aproximadamente 7.000 anos, quando tem início a “revolução urbana”, no “vasto território quase plano, em forma de meia lua, entre os desertos da África e da Arábia e os montes que os encerram ao norte, do Mediterrâneo ao Golfo Pérsico” (BENEVOLO, 2003, p. 26). Como a disponibilidade de água constitui um requisito para o cultivo, “a planície é cultivável somente onde passa ou pode ser conduzida a água de um rio ou de uma nascente”. Na região cresciam “em estado selvagem, diversas plantas frutíferas: oliveira, tamareira, videira, figueira”. Além de fertilizarem o solo e viabilizarem a irrigação, os rios, assim como os mares e o terreno aberto, favoreciam as “trocas de mercadorias e de notícias; os céus, quase sempre serenos, permitem ver, à noite, os movimentos regulares dos astros e facilitam a medição do tempo”. Em tal ambiente, ao longo dos rios Tigre e Eufrates, na Mesopotâmia, e do Nilo, no Egito, algumas sociedades neolíticas que já conheciam os cereais cultiváveis, o carro puxado pelos bois, o burro de carga, as embarcações a remo ou a vela, e os metais, desenvolveram a capacidade de, “com um trabalho organizado em comum”, produzir “recursos muito mais abundantes”. O estabelecimento das primeiras cidades, ao longo dos rios mencionados, apresentou algumas características comuns:

a) especialização funcional, incumbindo-se os habitantes do campo de produzirem alimentos para si e para os habitantes da cidade, e os moradores da cidade do exercício de funções especializadas relacionadas com o culto, a segurança, o governo, a saúde e o fabrico de objetos de metais, madeira e têxteis;

b) complementaridade, ensejando-se o aumento da produção agrícola pela utilização dos serviços e instrumentos produzidos na cidade;

c) dominação do campo pela cidade;

A cidade, centro maior desta evolução, não só é maior do que a aldeia, mas se transforma com uma velocidade muito superior. Ela assinala o tempo da nova história civil: as lentas transformações do campo (onde é produzido o excedente) documentam as mudanças mais raras da estrutura econômica; as rápidas transformações da cidade (onde é distribuído o excedente) mostram, ao contrário, as mudanças muito mais profundas da composição e das

atividades da classe dominante, que influem sobre toda a sociedade. Tem

início a aventura da “civilização”, que corrige continuamente as suas formas provisórias [...] Começa, assim, a espiral da nova economia: o aumento da produção agrícola, a concentração do excedente nas cidades e ainda o aumento da população e de produtos garantido pelo domínio técnico e militar da cidade sobre o campo (BENEVOLO, 2003, p. 26 – inseri destaques em negrito).

O território hoje ocupado pelo Iraque corresponde ao que os antigos gregos chamavam de Mesopotâmia, palavra que significa “entre rios”. A região está situada entre os rios Tigre e Eufrates. Nessa região surgiram as primeiras formas de vida e organização social em moradias agrupadas, as cidades da Mesopotâmia: Eridu, Uruque, Churupaque, Acad, Ur, Nipur, Sippar, Assur, Nínive e Babilônia. Dos jardins suspensos da Babilônia não restaram vestígios. Apesar disso, ainda hoje são considerados uma das sete maravilhas do mundo. Leick (2003) destaca a forte presença de mulheres nas atividades comerciais e refere a prática do divórcio em uma civilização que existiu há mais ou menos 10.000 anos.

Até meados do III milênio antes de Cristo as cidades da Mesopotâmia formam Estados independentes que lutam entre si para ampliarem o domínio da planície irrigada pelos rios Tigre e Eufrates. Tais conflitos limitam o desenvolvimento econômico e persistem “até que o chefe de uma cidade adquire tal poder que impõe seu domínio sobre toda a região” (BENEVOLO, 2003, p. 32). O primeiro império estável, que perdura por cem anos, por volta de 2.500 a.C., é formado por Sargão de Acad. Tal feito é repetido posteriormente, pelos reis sumérios de Ur, por Hamurabi da Babilônia, e por parte de reis assírios e persas. Em decorrência, fundam-se novas cidades residenciais, nas quais o palácio do rei passa a constituir a estrutura dominante, ao invés do templo. Benévolo (2003, p. 32) destaca Nínive e Babilônia como cidades que se tornaram capitais de império, passando a concentrar “não só o poder político, mas também os tráficos comerciais e o instrumental de um mundo muito maior”. Tratam-se, de acordo com o autor, das primeiras “supercidades”, “metrópoles de dimensões comparáveis às modernas, que durante muito tempo permaneceram como símbolos e protótipos de toda grande concentração humana, com seus méritos e seus defeitos”.

Em relação às primeiras cidades egípcias, Benevolo (2003, p. 40) informa que “a documentação arqueológica revela a civilização egípcia já plenamente formada depois da unificação do país, no final do IV milênio a.C.”:

Os documentos encontrados nas primeiras tumbas reais explicam que o soberano no poder conquistou as aldeias precedentes e absorveu os poderes mágicos das divindades locais. Não é ele o representante de deus, como os governantes sumérios, mas ele mesmo um deus, que garante a fecundidade da terra e especialmente a inundação do Nilo que ocorre com regularidade num período determinado do ano. Assim o faraó tem o domínio preeminente sobre o país inteiro, e recebe um excedente de produtos bem maior que o dos sacerdotes asiáticos. Com estes recursos, ele constrói as obras públicas, as cidades, os templos dos deuses locais e nacionais, mas sobretudo sua tumba monumental, que simboliza a sua sobrevivência além da morte e garante, com a conservação do seu corpo, a continuação de seu poder em proveito da comunidade.

Ao discorrer sobre a “cidade livre na Grécia”, Benevolo (2003, p. 75) destaca que na Idade do Bronze a região onde hoje se situa a Grécia permaneceu na periferia do mundo civil. O relevo montanhoso e desigual não favorecia o desenvolvimento de um grande Estado. Havia inúmeros pequenos principados independentes que dominavam pequenos territórios abertos para o mar. Dedicavam-se ao comércio marítimo. Com o colapso da economia do bronze e invasões dos bárbaros, ao norte, tais cidades regrediram por alguns séculos. “O desenvolvimento subseqüente tira proveito das inovações típicas da nova economia: o ferro, o alfabeto, a moeda cunhada; a posição geográfica favorável ao tráfico marítimo e a falta de instituições provenientes da Idade do Bronze permitem desenvolver as possibilidades destes instrumentos numa direção original”. Ocorre a transformação da “cidade principesca” na

polis aristocrática ou democrática”. A “economia hierárquica tradicional” transmuta-se em

uma “nova economia monetária” que se estende, após o século IV a.C., para toda a bacia oriental do Mediterrâneo. Forma-se, então, uma nova cultura, “que ainda hoje permanece como base da nossa tradição intelectual”. A polis, cidade-Estado, origina-se em uma colina onde se refugiam os campesinos para defender-se dos ataques de inimigos. Após, o povoado passa a compreender a planície vizinha, em regra fortificada por um cinturão de muros. Na cidade alta (acrópole), último refúgio para fins de defesa, são construídos os templos dos deuses; na cidade baixa (astu) desenvolvem-se o comércio e as relações civis. Entretanto, “ambas são partes de um mesmo organismo, pois a comunidade citadina funciona como um todo único, qualquer que seja seu regime político”. Há, nas cidades-Estado gregas a preocupação com a população quantitativamente ideal: deve ser numerosa o suficiente para formar um exército, mas limitada de forma a permitir aos cidadãos conhecerem-se entre si, escolherem os magistrados e funcionarem em assembléia. Os teóricos consideravam 10.000 o número de habitantes ideal para uma grande cidade, excluídos os escravos e os estrangeiros. Para evitar a superação do número adequado, organizavam-se expedições que se deslocavam para formar outras cidades, em áreas distantes. Esparta, ao tempo das Guerras Persas, contava

com 8.000 habitantes. “Atenas no tempo de Péricles tem cerca de 40.000 habitantes, e somente outras três cidades, Siracusa, Agrigente e Argos superam os 20.000” (BENEVOLO, 2003, p. 76). Diferentemente dos bárbaros do Oriente, os gregos, conforme Benevolo (2003, p. 77), “têm consciência de sua comum civilização, porém não aspiram à unificação política, porque sua superioridade depende justamente do conceito da polis, onde se realiza a liberdade coletiva do corpo social”. A palavra pátria, herdada dos gregos, representava a “habitação comum dos descendentes de um mesmo chefe de família, de um mesmo pai”:

O patriotismo é um sentimento tão intenso porque seu objeto é limitado e concreto: um pequeno território, nas encostas de uma montanha, atravessado por um riacho, escavado por alguma baía. De todos os lados, a poucos quilômetros de distância, uma elevação do terreno serve de limite. Basta subir à acrópole para abarcá-lo por inteiro com um olhar. É a terra sagrada da pátria: o recinto da família, as tumbas dos antepassados, os campos cujos proprietários a todos se conhecem, a montanha onde se vai cortar lenha, se levar os rebanhos a pastar ou se apanhar o mel, os templos onde se assiste aos sacrifícios, a acrópole aonde se vai em procissão [...] (G. Glotz, Introdução a Cidade Grega, 1928, tradução italiana, Turim, 1955, parágrafo III, em BENEVOLO, 2003, p. 77-78).

Le Goff (1988, p. 25), ao confrontar a cidade contemporânea com a cidade medieval e com a cidade antiga, afirma que a contemporânea está mais próxima da medieval do que esta da antiga. Na Idade Média o poder econômico e o poder político concentram-se no castelo, a partir do qual se exerce o domínio sobre a sociedade camponesa. A partir dos séculos X e XI ocorre um grande período de urbanização. O desenvolvimento urbano ocorre a partir de um núcleo, dominado “ou por um senhor eclesiástico, o bispo, em geral, nas cidades episcopais, ou por um senhor leigo, sobretudo um conde, desde a época carolíngia. Eles governam a partir de seu palácio episcopal ou de seu castelo” (LE GOFF, 1998, p. 17). Em torno do palácio ou do castelo formam-se dois tipos de territórios: a cidade propriamente dita, “cingida em torno deles e entremeada de campos”, e os burgos da periferia.

A partir do século XII as cidades medievais evoluem pela fusão do núcleo primitivo da cidade e de um ou dois burgos importantes. “A cidade vai, portanto, lançar seu poder sobre certa extensão em volta, na qual exercerá direitos mediante coleta de taxas: é isso que se chamará de subúrbio” (LE GOFF, 1998, p. 17). No ano de 1300 mais de 80% da população do Ocidente ainda residia na área rural, figurando Paris, com menos de 200.000 habitantes, como a maior aglomeração urbana. A cidade da Idade Média é assim descrita por Le Goff (1988, p. 25):

A cidade da Idade Média é uma sociedade abundante, concentrada em um pequeno espaço, um lugar de produção e de trocas em que se mesclam o artesanato e o comércio alimentados por uma economia monetária. É também o cadinho de um novo sistema de valores nascido da prática laboriosa e criadora do trabalho, do gosto pelo negócio e pelo dinheiro. É assim que se delineiam, ao mesmo tempo, um ideal de igualdade e uma divisão social da cidade, na qual os judeus são as primeiras vítimas. Mas a cidade concentra também os prazeres, os da festa, os dos diálogos na rua, nas tabernas, nas escolas, nas igrejas e mesmo nos cemitérios. Uma concentração de criatividade de que é testemunha a jovem universidade que adquire rapidamente poder e prestígio, na falta de uma plena autonomia.

O movimento comunal, prenúncio das atuais municipalidades, origina-se das aspirações dos mercadores e dos artesãos por liberdade econômica e “pela liberdade pura e simples”. Retira-se o poder dos senhores, transferindo-o para os burgueses. Passa-se da família ampliada para a família nuclear. Entretanto, “os grandes burgueses concebem um governo à imagem de seus clãs familiares. O ‘bom governo’ tende a imitar o modelo do príncipe justo, num espaço mais restrito no qual se podem diversificar as experiências políticas” (LE GOFF, 1988, p. 95). A relação entre a Igreja e a cidade passa a ser de respeito recíproco. Sobre as revoltas urbanas, Le Goff (1988, p. 95) refere:

A injustiça, mais do que a corrupção, ao contrário de hoje, gera a indignação dos pobres e dos reformadores. As revoltas urbanas insurgem-se contra a tendência despótica do príncipe, coletor de impostos, e contra a dominação de algumas famílias que rompem o primitivo contrato comunal de igualdade.

Analisando a situação contemporânea das cidades, Benevolo (2003, p. 657) destaca a relevância da abordagem científica sobre os ambientes construídos, enfatizando que a cultura científica é indispensável ao desenvolvimento da sociedade moderna. Afirma, porém, que os problemas inerentes às cidades modernas têm sido subtraídos à análise científica, a fim de conservar o equilíbrio dos interesses imobiliários estabelecido no século XX, enquanto fonte de privilégios para determinadas categorias econômicas e instrumento de poder para as classes dominantes. Sustenta que nenhum regime político conseguiu renunciar por completo a este instrumento.

A partir do término da Primeira Guerra Mundial, os planos reguladores do uso do solo urbano passam a distinguir as zonas residenciais, as zonas para serviços e as zonas industriais. Busca-se conferir à cidade uma organização mais racional, reduzindo os inconvenientes da mistura de tais funções na cidade tradicional. Isto é feito, sustenta Benévolo (2003, p. 657), sem alterar a “primazia das funções terciárias (comércio e escritórios)”, que produz como conseqüências: “o aumento da densidade da periferia para o centro, o sacrifício da residência, o congestionamento do tráfego, etc.”. Na “cidade burguesa”, “as administrações públicas

constroem as ‘casas populares’ para corrigir o mercado privado que não oferece casas baratas para as classes mais pobres”:

A divisão das duas cidades é produzida por uma política de construção que declara abusivos as moradias e os bairros construídos espontaneamente pelos habitantes, e realiza, ao contrário, grandes conjuntos de moradias industrializadas, do tipo ‘moderno’ convencional. Deste modo renuncia-se a utilizar o trabalho espontâneo dos interessados, e oferecem-se, ao contrário, moradias por demais caras para a maioria da população, em quantidade absolutamente insuficiente à necessidade, mas assimiláveis às dos ricos e integráveis na cidade feita para elas: estas moradias serão ocupadas pelos empregados, pelos operários sindicalizados e por aqueles que dispõem de uma recomendação. Ao mesmo tempo, aceita-se que as moradias e os bairros espontâneos tornem-se incômodos e insalubres além do limite, porque sua existência não é reconhecida oficialmente; depois, se corrigem as falhas mais evidentes, neles introduzindo os serviços públicos mais urgentes: os encanamentos de água, as instalações elétricas, as escolas, os postos de polícia, e alguns trechos de ruas para carros, para passar as ambulâncias e viaturas policiais. Estes equipamentos são a cópia reduzida dos bairros modernos, e servem para tornar definitiva a coexistência dos dois estabelecimentos: protegem o resto da cidade dos perigos do contato com os bairros espontâneos, e confirmam o caráter dependente destes últimos. [...] Portanto, a divisão das duas cidades se torna um instrumento de discriminação e de domínio, indispensável à estabilidade do sistema social. (BENEVOLO, 2003, p. 725-726).

Benevolo (2003, p. 725) aponta como problema dominante no mundo inteiro a formação da cidade irregular ao lado da regular. Mesmo os países europeus e os Estados Unidos, com maior grau de desenvolvimento, apresentam em determinado grau este problema. O autor exemplifica com a situação de Roma, onde cerca de 800.000 pessoas vivem em moradias construídas sem licença para construção, formando uma cidade separada do resto, embora com casas “menos pitorescas que as asiáticas e sul-americanas”. O crescimento econômico, ao invés de solucionar o problema, pode agravá-lo, em razão da desigual distribuição da renda, acelerando a separação entre áreas habitacionais regulares e irregulares: “os bairros de barracos são mais numerosos nos países produtores de petróleo, e existem também no Kuwait, que tem a renda individual mais alta do mundo inteiro”. Com base nos dados sintetizados a seguir, observa-se que a favelização cresce em ritmo mais acelerado do que a urbanização e esta se expande mais rapidamente do que o crescimento demográfico total. “Assim, num futuro próximo, a maioria da população mundial estará alojada nos conjuntos habitacionais irregulares”:

População mundial Tempo necessário para duplicar

População total: Dobra a cada 30 anos

População urbana: Dobra a cada 15 anos

População urbana “marginal”: Dobra a cada 7,5 anos

Figura 8 Comparativo do ritmo de crescimento da população total, urbana e urbana “marginal”

Fonte: Elaborado pelo autor, utilizando dados contidos em Benevolo, 2003, p. 725.

A dramaticidade da situação faz com que Benevolo (2003, p. 726) aponte dois caminhos alternativos para a arquitetura moderna: “a pesquisa da arquitetura, como toda a pesquisa científica atual, pode tornar-se um verdadeiro serviço para todos, ou cultivar a miragem de um ambiente cada vez ‘melhor’, reservado a uma fração cada vez menor da população mundial”. Tal dilema se coloca igualmente para os formuladores de políticas públicas para os gestores públicos. A reiteração de eventos como os ocorridos no final de 2006 e no início de 2007 no Rio de Janeiro e em São Paulo, ateando-se fogo em ônibus com passageiros dentro e promovendo-se ataques sincronizados a órgãos incumbidos da defesa da ordem, podem estar a indicar que o Brasil se aproxima do limite da possibilidade de convívio relativamente pacífico entre a classe dominante, que tem acesso ao saber e à tecnologia, e à grande massa de marginalizados, desempregados ou subempregados, moradores das habitações irregulares, que predominam nas regiões metropolitanas e, inclusive, em Torres. No município em que se desenvolve a pesquisa tem visibilidade as edificações de luxo, de propriedade de veranistas mais abastados, situadas especialmente na Praia Grande e na Praia da Cal e, em regra, ocupadas apenas durante o veraneio. Entretanto, são muito numerosas as sub-habitações e as casas precárias existentes nos bairros Arroio, São Francisco, Curtume e outros, onde vive parcela significativa da população fixa do município, incluindo desempregados e sub-empregados, com baixo nível de renda e de

A síntese sobre a gênese das cidades e o apontamento dos dilemas com que se defronta a gestão dos governos locais, procurando administrar a cidade “marginal” de forma a preservar as condições de reprodução ampliada do capital no interesse dos habitantes da cidade “regular”, estiveram presentes em alguns dos ciclos de desequilibração reflexão coletiva → equilibração majorante propostos aos Gestores de Torres, na pesquisa.