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Generative Design, Generative Art, Designing Ideas, Metadesign

Design da informação

Capítulo 5. Design in formação

5.1. Design faz diferença

5.1.1. Generative Design, Generative Art, Designing Ideas, Metadesign

Além dos termos Generative Design,

Generative Art, Designing Ideas e Metadesign,

poderíamos ainda empregar Morphogenetic

Design, Induction Design ou Evolutionary Design. O design gerativo - morfogenético -

surge como a representação de uma idéia enquanto código capaz de gerar uma multiplicidade de possibilidades formais, como o DNA (ácido desoxirribonucléico) na natureza. O DNA é constituído por uma longa cadeia de apenas quatro tipos de ácidos nucléicos, representados pelas letras A, T, G, C. Esse restrito alfabeto é responsável por toda informação hereditária. O objetivo do design não é imitar as formas da natureza, mas partilhar de seus processos. Hertzberger, em seu compêndio sobre arquitetura, relaciona o conceito de gramática ge(ne)rativa transformacional de Avram Noam Chomsky - que explicita o saber implícito do falante - à geração plural de formas:

[Chomsky] tomou como ponto de partida uma “gramática gerativa”, uma espécie de padrão subjacente a todas as línguas e para o qual existe uma capacidade inata. Neste sentido, línguas diferentes, tal como diferentes formas de comportamento, podem ser vistas como transformações umas das outras. De uma maneira genérica, tudo isso não parece muito distante dos “arquétipos” de Jung. Isso conduz ao sentimento de que também a criação da forma e da organização espacial de maneira análoga pode ser remetida a uma capacidade inata a todos os homens nas

mais diversas culturas poder chegar a interpretações sempre diferentes das mesmas “arquiformas” essenciais (Hertzberger, 1999: 93).

Peirce considerava a linguagem “um tipo de álgebra, e uma álgebra nada mais é do que um tipo de diagrama” (CP 3.419). Ibri também faz referência ao aspecto diagramático da gramática de Chomsky: “de fato, a recente gramática gerativa de Chomsky evidencia que a estrutura sintática profunda da linguagem é, nestes termos, um ícone de relações ou diagrama” (Ibri, 1994: 123).

O design gerativo, por sua vez, pode envolver design industrial (cf. figuras 83, 84, 85 e 86), arquitetura (cf. figuras 87, 88, 89 e 90), urbanismo (cf. figura 91), arte (cf. figura 92), música, web art, performances, inteligência artificial, comunicação, nanotecnologia etc. Pela abordagem gerativa - em qualquer instância - não temos a priori um produto real (como uma imagem, um objeto, um modelo, uma música), mas uma idéia-produto.

Trata-se da representação de uma “espécie” pronta a gerar uma incontável seqüência de eventos individuais diferentes entre si, mas provenientes de uma mesma idéia (código) identificável. No entanto, não se trata de ter um computador que cria um enorme número de formas não usuais a serem escolhidas pelo designer. A proposta não é simplesmente descobrir formas, é descobrir maneiras de propor formas capazes de resolver problemas propostos. Um projeto gerativo é um conceito (cf. http://www.generativeart.com) que trabalha com a produção de eventos únicos e não replicáveis como expressões possíveis de uma idéia-produto criada pelo projetista. Eventos

potencialmente bons (soluções de design competente), não quaisquer eventos. O projeto final tem a potencialidade de surpreender o próprio criador enquanto representação imprevisível da idéia-produto original.

O charme da Generative Art é que ela pode usar complexas estruturas de proliferação e homotetia como fractais, não agindo sobre as formas, mas agindo sobre a lógica. A experiência com fractais nos ensinou que, no reconhecimento da imagem final, a forma da qual nós partimos não conta, mas a idéia, o reconhecimento pertence aos procedimentos adotados e repetidos. A gerência da construção em progresso de um trabalho de arte, por meio de uma estrutura evolutiva, que significa a realização de uma estrutura de vida artificial capaz de criar o trabalho de arte, envolve teste, crescimento de sua complexidade e levantamento da multiplicidade de possíveis resultados como múltiplas representações de uma mesmo idéia (Soddu, 2000a).

Os procedimentos são ativados pelo código (não uma seqüência de formas pré-definidas, mas uma série de procedimentos gerativos) para emular a evolução do design como um sistema dinâmico. “Formas são resultados, não ponto de partida” (Watanabe, 2002: 09). A lógica que guia os códigos gerativos é a emulação dos procedimentos subjetivos, que normalmente norteiam a práxis do design. “Os designers começam propondo as regras do jogo e então eles jogam o jogo junto com outros interessados” (Oosterhuis, 2003: 16). Conclusão: “o design é a fórmula, jogar o jogo significa estabelecer os parâmetros”

(Oosterhuis, 2003: 76). “A idéia é um metaprojeto subjetivo” (Soddu e Colabella, 1997b), metadesign, registro de seu próprio processo. Todo projeto morfogenético é um

metadesign, não porque otimiza a organização,

mas porque é um sistema que pode gerar inúmeras possibilidades paralelas de criação (Soddu, 1993). O metadesign controla a evolução dos procedimentos para definir a complexidade dos sistemas gerados. Designing

Ideas: idéia como código de transformação, com

a capacidade de implementar a identidade e a singularidade de cada evento individual dele decorrente. “O designer não escolhe formas, opera transformações” (Soddu, 2000b). O arquiteto italiano Celestino Soddu, diretor do

Generative Design Lab da Universidade

Politécnica de Milão, acredita que a abordagem morfogenética pode gerar metaprojetos que são realmente novos produtos de design. São idéias-produto capazes de gerar virtualmente uma seqüência ilimitada de produtos. Uma idéia- produto pode, potencialmente, dar origem a inúmeros modelos a serem produzidos (ver http://www.soddu.it). O princípio dos softwares desenvolvidos para a geração de diferentes modelos - a partir de um algoritmo inicial - está calcado num sistema com paradigma auto- organizativo que mantém o senso durante o período de simulação dos modelos. A lógica é fractal: cada decisão do software dispara um ciclo e cada ciclo contém outro ciclo interno e assim sucessivamente.

A estrutura de cada ciclo, como em objetos fractais, é sempre a mesma. As diferenças e a imprevisibilidade nascem da ressonância com os outros ciclos, a partir do momento de ativação e de cada diferente fluxo de

informação. Cada ciclo representa a estrutura completa na simulação das escolhas decisivas. Isso opera a transformação de respostas em possíveis formas (Soddu, 1999).

Os códigos gerativos são a real estrutura da idéia, bem como a língua é a estrutura por excelência do pensamento (Hertzberger, 1999: 92). Cada algoritmo define como a transformação do input em output vai ocorrer. Os possíveis resultados, evidentemente, mantêm-se conectados ao evento inicial, mas não se trata de um banco de dados de soluções pré-formatadas. As matrizes formais geradoras, que são formas abstratas capazes de dar corpo a uma série de performances do software, não se caracterizam como um banco de dados. São extemporaneamente geradas pelos ciclos indissociáveis por meio do conjunto de dispositivos simultâneos dentro de distintos parâmetros: geometria, dimensão, complexidade, material etc. Ao final de cada ciclo temos: um aumento de complexidade e a produção de novas necessidades formais. Os algoritmos funcionam como um repertório de procedimentos variáveis. Na Itália, Celestino Soddu e Enrica Colabella utilizam os softwares

Argenia e Basílica (da autoria de Soddu) e na

Alemanha, Hans Dehlinger e Markus Schein, do

Generative Design Lab_Kassel, utilizam o software Rhinocerus (Visual Basic Script Edition), além do software experimental Liegengenerator (da autoria de Schein). Liegengenerator gera uma variação de

simplificados modelos digitais e também possibilita a execução de prototipagem rápida. Nos EUA, destaca-se o uso do software FormZ, desenvolvido por Christos Yessios, cuja

característica primordial é a modelagem direta em 3D. Com o auxílio do arquiteto Peter Eisenman, Yessios desenvolveu algoritmos gerativos, incorporando ao software performances de processos gerativos (Serraino, 2002: 38). No Japão, Makoto Watanabe leva à frente o Induction Cities (cf. figura 91), cujo método é a indução de resultados segundo condições estabelecidas a priori. Sobre esse projeto de desenvolvimento urbano, Watanabe considera que “ele poderia ser chamado

Induction Design. Poderia também ser chamado Generative Design, já que nasce de condições,

ou Evolutionary Design, por ter a característica de que os resultados progridem por meio de gerações” (Watanabe, 2002: 10). Os softwares gerativos utilizados são Web Frame e Wind

Wings. Na Holanda, no entanto, Sophia Vyzoviti

e Hans Cornelissen - Studio D10: Het Lab -

Proeftuin voor Ontwerpen em Nieuwe Theorieën, da Universidade de Tecnologia de

Delft -, trabalham com o processo morfogenético de projeto inicialmente por meio de dobras e desdobras apenas em papel. “É a operação de dobrar que gera a forma” (Eisenman, 1999: 21). No processo de design gerativo pela dobra, o objetivo é desenvolver diagramas espaciais, estruturais e organizacionais a partir dos quais possam emergir protótipos (cf. figuras 93 e 94).

O processo morfogenético é “uma seqüência de transformações que afeta o design do objeto. Considerando esse como um desenvolvimento aberto e dinâmico, no qual o design evolui com alternados períodos de desequilíbrio, nós podemos apreciar a função de dobrar como um design gerador por fases de transição, isto é, limiar crítico no qual transformações qualitativas ocorrem” (Vyzoviti, 2003: 08).

Em Generative Design, cada modelo é distinto, mas pertence a um mesmo código genético, a uma mesma idéia genética, gerativa.

Generative Design é o design de um processo

evolutivo capaz de gerar uma seqüência de eventos imprevisíveis.

Figura 83: Aplicabilidade no design industrial → cadeiras de Celestino Soddu geradas pelo software Argenia.

Fonte: http://www.celestinosoddu.com/.

Figura 84: Aplicabilidade no design industrial → anéis de Celestino Soddu gerados pelo software Argenia.

Fonte: http://www.celestinosoddu.com/.

Figura 85: Aplicabilidade no design industrial → luminárias de Hans Dehlinger e Celestino Soddu gerados pelo software

Argenia.

Fonte: http://www.generativedesign.com/lamps/lamps1.htm.

Figura 86: Aplicabilidade no design industrial → cafeteiras de Celestino Soddu geradas pelo software Argenia.

Figura 87: Aplicabilidade na arquitetura → castelos de Celestino Soddu gerados pelo software Basílica. Fonte: http://www.generativedesign.com/rp/RP_arch.htm.

Figura 88: Aplicabilidade na arquitetura → castelos de Enrica Colabella e Celestino Soddu gerados pelo software Argenia. Fonte: http://www.generativedesign.com/argenia3.htm#.

Figura 89: Aplicabilidade na arquitetura → Shangai - identidade em progresso: antes e depois da construção arquitetônica de Celestino Soddu, gerada pelo software Argenia.

Fonte: http://www.celestinosoddu.com/.

Figura 90: Aplicabilidade na arquitetura → diagramas gerativos de Peter Eisenman para o concurso Virtual House,

New York, EUA, 1997.

Fonte: http://architettura.supereva.com/inabit/20000728/ index_en.htm.

Figura 91: Aplicabilidade no urbanismo → Induction Cities, de Makoto Watanabe, design urbano gerado pelos softwares

Web Frame e Wind Wings.

Fonte: http://www.makoto-architect.com/idc2000/index2.htm.

Figura 92: Aplicabilidade nas artes → retratos de Picasso por Celestino Soddu, gerados pelo software Argenia -

Generative Art.

Figura 93: Generative Design pelo processo de dobra- desdobra em papel, Studio D10, Holanda.

Fonte: Vyzoviti, 2003: 79.

Figura 94: Generative Design pelo processo de dobra- desdobra em papel, Studio D10, Holanda.

Fonte: Vyzoviti, 2003: 24.

5.1.2. Ad continuum

A Revolução Industrial (1750) proporcionou avanços e conquistas científicas, tecnológicas e sociais com uma rapidez nunca vista até então. Essas conquistas modificaram e continuam alterando os meios e modos de produção, transformando a relação entre produtores e consumidores através dos tempos. Cabe ao design mediar essa relação se valendo do desenvolvimento tecnológico produtivo e, também, das transformações da sociedade. No período pré-industrial, cada objeto era único, irrepetível e fortemente conectado à identidade

de seu artesão. Esse vínculo, juntamente com a singularidade e irreprodutibilidade do objeto, investia-o de uma qualidade que estava além de seu valor intrínseco. Para o objeto, as conseqüências eram uma extremamente lenta obsolescência em relação a todas as suas funções, inclusive a função estética.

Com a industrialização, entretanto, acirrou- se a valorização da troca, interessando ao consumidor, primordialmente, o uso e ao produtor, a valorização da troca. Inicialmente, a população valorizava o uso, mas a massificação da produção aliada aos interesses da indústria impuseram a troca através de mudanças superficiais que os produtos passaram a sofrer visando a persuadir o consumidor. Objetos produzidos em linha de produção de massa eram idênticos e produzidos aos milhares e isso era sinal de qualidade. Essa substituição da valorização do uso pela troca gerou a chamada obsolescência programada, através da qual o consumo passou a ser mais rápido, explorando a forma a fim de estimular a venda (Styling). Ao se incorporar a mudança como variável, a moda (grife, embalagem, visual) veio prevalecer em detrimento dos valores anteriores, substituindo- se o valor da troca pelo valor da posse.

O design agora representa um estímulo para a sagacidade do usuário e para sua habilidade de saber comprar, pois o consumidor está ansioso para se salvar das crises econômicas. Com isso, a posse é superada pela seleção que, por sua vez, reinventa um novo valor do uso: a função do produto passa a ser a de informar sobre tecnologias, materiais, outros comportamentos, outra ideologia a usuários com capacidade de processar essas informações. No momento pós-industrial em que vivemos, a tecnologia de manufatura digital permite-nos

realizar, pelo mesmo custo operacional, tanto objetos únicos quanto repetidos. A diferença está na mudança dos comandos de programação dos equipamentos de produção. A produção de objetos únicos resgata a obsolescência lenta característica dos idos pré- industriais.

Após 200 anos da velha era industrial de objetos necessariamente clonados, o objeto único tornou-se uma resposta essencial à negligenciada necessidade humana de viver num mundo no qual cada objeto artificial espelha a unicidade e irrepetibilidade de cada pessoa. Numa época marcada por repetidas tentativas de clonagem de seres naturais, o design retorna, em campos de tecnologia avançada como os sistemas dinâmicos não lineares, à noção de vida artificial e inteligência artificial, à estética e ao prazer ético da redescoberta dos processos e características da natureza (Soddu, 2003).

O trabalho de desenvolvimento de formas possíveis apenas mediante o uso de computadores - como no Generative Design - abre a possibilidade de experiências criativas antes impensáveis sem as ferramentas

computadorizadas. Exemplo de referência, o museu Guggenheim em Bilbao, Espanha, é projeto precursor no uso de soluções digitais (software Catia) sem as quais o projeto não poderia ser concebido. Sobre esse projeto de Frank Gehry (cf. figuras 95 e 96), Lindsey considera que “teria sido um prédio diferente sem o uso de ferramentas digitais. Talvez fosse um não tão rápido, que não se movesse e que não mudasse” (2001: 49). Somente a precisão na geração de coordenadas, característica do

Catia, é que viabilizou o projeto de todas as

curvaturas pensadas por Gehry. Se nos primórdios da computação essas ferramentas pareciam colaborar para a extinção da criatividade humana, atualmente elas nos permitem ampliá-la. Generartive Design “inicia uma nova era no design e na produção industrial: o desafio de uma nova naturalidade do objeto industrial como um evento único e irrepetível, espelho da unicidade e irrepetibilidade do homem e da natureza” (Soddu, 2003). O desenvolvimento de formas imprevisíveis contribui para a expansão da criatividade humana. O computador é apenas a ferramenta que viabiliza a criação.

Consideramos que o Generative Design pode ser também entendido como o resultado da relação entre o sujeito-eu e o sujeito-on

Figura 95: Museu Guggenheim Bilbao, Espanha, 1991-97, desenvolvido com o software Catia. Fonte: http://www.greatbuildings.com/buildings/Guggenheim_Bilbao.html.

Figura 96: Museu Guggenheim Bilbao, Espanha, 1991-97, desenvolvido com o software Catia. Fonte: http://www.bm30.es/homegug_uk.html.

(partilhado) no sentido atribuído por Couchot (1998: 05-13). O conceito de sujeito-on de Couchot vem de Merleau-Ponty: sujeito interfaceado, conectado, cuja percepção se dá sempre de modo impessoal, despersonalizado (Laurentiz, 1999: 122-7). No Generative Design, sob essa perspectiva, o input (enquanto algoritmo programado por alguém) estaria no âmbito do sujeito-eu, enquanto a replicação dos algoritmos pela máquina (output) estaria na esfera do sujeito-on. Design num mundo partilhado entre o ser e seu Umwelt (mundo à volta). Os objetos gerados são signos dispostos ao constante devir de interpretantes gerados ad

infinitum. São fruto das semioses de quem os

cria e de quem (ou o que) lhes atribui significação, num diálogo contínuo de estímulos, senso e sensibilidade. Um continuum entre mente e matéria, interioridade e exterioridade, no sentido mesmo do sinequismo (doutrina da continuidade) em Peirce.

Um dos prováveis papéis do design - material e imaterial simultaneamente - é tornar o mundo à volta (Umwelt) possível para o mundo

do ser (Selbstwelt). Sujeito-on + sujeito-eu. É o ponto de contato, a convergência da alteridade dos mundos. É um modo de partilhar o mundo (Mitwelt) (Escudero, 2001: 203-21 e Gregory, 2003: 30-5). Nesse panorama, poderíamos localizar o design no meio, como meio, mediação entre Umwelt (o mundo objetivo das coisas) e Selbstwelt (o mundo subjetivo das vivências interiores individuais), como Mitwelt (o mundo social compartilhado intersubjetivamente com as outras pessoas). O design parece transformar o Umwelt em Mitwelt denotando

Selbstwelt. Coloca o homem em contato com as

coisas e as pessoas do mundo. Esse é caráter mediativo, terceiro em Peirce, do design.

Morfologias