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2.2. POLÍTICAS PÚBLICAS AMBIENTAIS E GESTÃO AMBIENTAL

2.2.4. Gestão Ambiental Pública

As soluções propostas para os problemas ambientais não mais se resumem ao estabelecimento de padrões para emissões de poluentes, fiscalização do cumprimento de normas técnicas ou punição daqueles que poluem o meio ambiente. Embora não se possa prescindir dessas medidas, na atualidade, “a gestão passou a ser o operador conceitual através do qual se confrontam os objetivos de desenvolvimento econômico e de organização territorial, bem como aqueles relacionados à conservação da natureza ou à manutenção ou recuperação da qualidade ambiental” (MACHADO, 2003, p. 24).

A gestão ambiental pública é a ação institucional do poder público para a implementação das políticas ambientais. PHILIPPI JR e BRUNA (2004) explicam que o significado etimológico dos vocábulos “gestão” e “ambiental” tem raízes na língua latina. Assim, “gestão” originou-se de “gestioni”, que exprime o ato de gerir, cujo significado é ter gerência sobre, administrar, reger, dirigir. O vocábulo “ambiental”, por seu turno, é o adjetivo aplicado para referir-se às coisas do ambiente, tanto construído, quanto natural. As questões ambientais envolvem, portanto, diversas facetas que, conforme os autores, não podem ser tratadas de forma individualizada, uma vez que as diversas áreas que compõem o complexo ambiental estão estreitamente correlacionadas, mantendo um vínculo de relacionamento vital entre si, motivo pelo qual propostas de gestão ambiental devem ser fundamentadas numa integração físico-territorial, social, política, econômica e cultural, capaz de abranger toda essa complexidade. Daí decorre a importância do tratamento multidisciplinar e da visão sistêmica que devem orientar a gestão ambiental. Aquele exige o trabalho de profissionais de diversas áreas atuando de forma articulada e com o envolvimento da sociedade. Esta mostra as muitas inter-relações entre os ambientes

natural e construído, bem como no interior de cada um deles. Não se pode olvidar, ainda, que a gestão ambiental envolve também a saúde pública e o planejamento territorial, visto ser seu escopo último a promoção da qualidade de vida.

Gestão ambiental, portanto, segundo os autores, “é o ato de administrar, de dirigir ou reger os ecossistemas naturais e sociais em que se insere o homem, individual e socialmente, num processo de interação entre as atividades que exerce, buscando a preservação dos recursos naturais e das características essenciais do entorno, de acordo com padrões de qualidade. O objetivo último é estabelecer, recuperar ou manter o equilíbrio entre natureza e homem” (p. 700). Para que a gestão ambiental seja eficiente é necessário a existência de um conjunto de instrumentos, representados por leis, normas, decretos, regulamentos, programas destinados a solucionar as questões do ambiente. Contudo, não basta a existência desse conjunto. A gestão ambiental somente será eficaz quando esse conjunto de instrumentos se transformar em ações concretas, traduzidas em problemas resolvidos.

A gestão ou administração ambiental, conforme SÁNCHEZ (1994), pode ser discutida em nível empresarial ou de políticas de governo. Neste último caso, “são abordados os instrumentos de política que podem ser aplicados pelas diversas agências governamentais com vistas a melhorar ou prevenir a degradação da qualidade ambiental” (p. 67), tanto de comando e controle, quanto econômicos. De outro lado, são as políticas governamentais, as demandas e pressões da opinião pública, da comunidade e de consumidores, bem como as condições de mercado, que irão determinar os instrumentos e as alternativas de gerenciamento ambiental nas empresas.

Para SOUZA (2000), a gestão ambiental pode ser entendida como o conjunto de procedimentos que visam à conciliação entre desenvolvimento e qualidade ambiental, dado pela observância da capacidade de suporte do meio ambiente e das necessidades identificadas conjuntamente pela sociedade civil e pelo governo. São os instrumentos de política ambiental que estabelecem as ferramentas de ação para a gestão ambiental, estando o planejamento contido no sistema de gestão, o qual deve ser constantemente retroalimentado, a fim de que as diretrizes de gerenciamento possam ser adaptadas à nova realidade verificada, em um processo contínuo e dinâmico.

O planejamento integra a gestão ambiental que, por sua vez, alimenta as várias etapas daquele, sendo um processo que permite identificar, compreender e classificar situações e problemas, selecionar e implementar ações em prol da otimização e solução destes, assim como o cumprimento de metas. Envolve, ainda, o monitoramento e avaliação das decisões tomadas e ações implementadas, permitindo a adoção das modificações necessárias ao sucesso do planejamento, a fim de que sejam obtidos os resultados esperados (PHILIPPI JR et. al., 2004).

O planejamento, afirma SACHS (2000) é “uma ferramenta indispensável para projetar e promover estratégias de desenvolvimento sustentável” (p. 56).

A gestão ambiental pública, segundo MERICO (2001), depende de três elementos fundamentais para sua existência e eficácia. Em primeiro lugar, um arcabouço jurídico/legal em nível federal, estadual ou municipal, que possibilite o desenvolvimento de ações que conduzam à sustentabilidade. Em segundo lugar, uma estrutura administrativa adequada para a aplicação desse arcabouço jurídico/legal, capaz de motivar a sociedade a adotar padrões de produção, consumo e comportamentos mais sustentáveis. E, por último, são necessários programas e projetos que interfiram na sociedade e na atividade econômica, criando condições para sua evolução.

BARBIERI (2006) conceitua gestão ambiental como “as diretrizes e as atividades administrativas e operacionais, tais como planejamento, direção, controle, alocação de recursos e outras, realizadas com o objetivo de obter efeitos positivos sobre o meio ambiente, quer reduzindo ou eliminando os danos ou problemas causados pelas ações humanas, quer evitando que eles surjam” (p. 19-20). Para esse autor, qualquer proposta de gestão ambiental deve incluir, no mínimo, três dimensões: a dimensão espacial, a dimensão temática e a dimensão institucional. A primeira diz respeito à área na qual as ações de gestão serão aplicadas e se espera que tenham eficácia, que podem ir desde a dimensão global até a dimensão local, setorial, empresarial, etc. A segunda delimita as questões ambientais às quais as ações de gestão se destinam, tais como ar, águas, solo, fauna e flora, etc. A terceira dimensão se refere aos agentes que tomaram as iniciativas de gestão: governo, sociedade civil, empresa, instituição multilateral, etc. A essas dimensões, acrescenta a dimensão filosófica, que diz respeito à visão de mundo e da relação entre o ser humano e a

natureza que estão na base do gerenciamento ambiental adotado, questões que encontram variados posicionamentos, destacando-se duas grandes vertentes situadas em pólos extremos (as posições antropocêntricas extremadas e as posições ecocêntricas extremadas), com situações intermediárias em diferentes gradações, dentre as quais se encontram as abordagens sócio-ambientais, que embora reconheçam o valor intrínseco da natureza, admitem sua utilização para atender às necessidades humanas presentes e futuras, buscando sistemas de produção e consumo sustentáveis, ou seja, que atendam as necessidades humanas respeitando as limitações do meio ambiente, conforme já foi discutido no item que trata das diferentes abordagens conceituais de desenvolvimento sustentável.

Uma abordagem de gestão ambiental mencionada por SACHS (2000) diz respeito à conservação da biodiversidade pelo denominado “ecodesenvolvimento”, definido por uma estratégia de conservação de áreas protegidas, diante de pressões insustentáveis decorrentes das necessidades e atividades dos povos que vivem nelas ou no seu entorno. Essa estratégia requer “o planejamento local e participativo, no nível micro, das autoridades locais, comunidades e associações de cidadãos envolvidas na proteção da área”, visando a melhoria do nível de vida dos povos, pela identificação, criação e desenvolvimento de alternativas sustentáveis de uso dos recursos naturais e geração de renda, de maneira negociada e participativa (p. 73). No entanto, embora a criação de áreas protegidas faça parte da gestão ambiental territorial adequada, adverte o autor que a multiplicação de reservas não atingirá sua finalidade caso não sejam propiciados os meios necessários para a sua proteção efetiva.

De caráter multidisciplinar, a gestão ambiental envolve um conjunto de princípios, diretrizes e estratégias de ações e procedimentos estabelecidos pelos agentes socioeconômicos públicos e privados, tendo como objetivo administrar e coordenar a complexidade de fenômenos ecológicos que interagem com os processos humanos social, econômico e cultural, visando manter o fluxo dinâmico evolutivo dos sistemas naturais, assim como utilizar os efeitos benéficos dessa evolução para o desenvolvimento da cultura humana em bases sustentáveis (PHILIPPI JR e BRUNA, 2004).

Da visão dos diversos autores citados, pode-se extrair que uma gestão ambiental pública eficiente e eficaz não pode prescindir da existência de uma política ambiental que traga no seu contexto a visão holística e o tratamento multidisciplinar das questões ambientais, com ampla participação e envolvimento de toda a sociedade na sua elaboração e execução, desde a fase de planejamento até a efetivação de ações concretas. A gestão deve, ainda, ser flexível, apresentando possibilidade de revisão e readequação periódicas face ao dinamismo dos sistemas natural e social, o quê somente será possível caso haja monitoramento e avaliação contínuos, por meio de indicadores adequados.

O modelo de gestão ambiental adotado pelo Brasil, entretanto, importado dos Estados Unidos e de outros países de alta renda, baseia-se principalmente na regulamentação ambiental de comando e controle, apresentando diversos problemas, alguns dos quais foram apontados no documento denominado de “Agenda Ambiental Marrom”, que trata da gestão dos problemas da poluição no nosso país, elaborado pelo Banco Mundial, em 1998. Esse documento menciona, como problemas comuns do atual sistema de gestão: “a) falta de prioridade para os problemas e intervenções; b) recursos e instrumentos ultrapassados de comando e controle; c) falta de integração das considerações ambientais às políticas de planejamento setorial; d) implementação e fiscalização ineficazes; e e) dependência excessiva de financiamento governamental” (BANCO MUNDIAL, 1998, v. 1, p. 18).

O documento aponta, também, dentre as principais causas desses problemas, a falta de informações adequadas e sistematizadas que possam orientar o estabelecimento de prioridades, bem como a capacidade limitada de análise, fatores que acabam não trazendo os resultados desejados. A cooperação limitada entre os interessados - setor privado, comunidades afetadas, ONGs, comunidade científica e governo - aliada à falta de integração entre municipalidades, estados e o governo federal, bem como entre os diversos setores de cada um destes, com a incorporação de considerações ambientais na seleção entre alternativas de investimento e de política, também são problemas comuns. A pouca capacidade de implementação de uma gestão adequada é conseqüência, ainda, da existência de instituições ambientais fracas - quase sempre vistas como obstáculos custosos para as políticas de outros setores - as quais recebem poucos incentivos, recursos insuficientes e não têm o

apoio político necessário para a fiscalização efetiva, fatos que acabam levando esses órgãos a deixarem de cumprir funções básicas, tais como a geração de informações ambientais críticas e a participação efetiva nos processos de planejamento e formulação de decisões. A geração de informações sólidas sobre a qualidade do meio ambiente, as fontes de emissões, os impactos da poluição - inclusive sobre a saúde pública - os custos de controle alternativos, dentre outros aspectos, aliás, são apontados pelo documento como a base para a formulação racional de política ambiental, bem como para uma gestão eficiente e eficaz, com a obtenção de resultados concretos.

A Agenda Ambiental Marrom propõe, como instrumentos modernos de gestão da poluição, além da geração de informações adequadas - que deve ser prioridade dos órgãos ambientais - o estabelecimento participativo de metas dinâmicas de qualidade ambiental por meio do desenvolvimento de planos de ação ambiental nos níveis nacional, metropolitano e municipal; a modernização do processo de licenciamento; e a introdução de instrumentos e conceitos econômicos no processo de licenciamento e nos sistemas de bacias hidrográficas, com a integração da gestão ambiental no contexto da gestão de recursos hídricos (BANCO MUNDIAL, 1998).

O conceito de gestão ambiental pública como a ação do Poder Público, com ampla participação da sociedade, para a implementação das políticas públicas ambientais - aqui incluídas não apenas aquelas voltadas para a proteção do meio ambiente natural, como também do construído ou artificial e do cultural - tendo como finalidade última a promoção da qualidade de vida, será utilizado como referencial teórico deste trabalho, por melhor se harmonizar com os objetivos do desenvolvimento sustentável.