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2.1 INFORMAÇÃO E CONTROLE

2.1.1 Funcionalismo na Ciência da Informação

2.1.1.2 Gestão da Informação

Segundo Barbosa (2008), o marco da origem do que se pode chamar de gestão da informação é materializado na publicação do livro Traité de documentation de Paul Otlet, em 1934, época em que a disciplina era conhecida como documentação. Deveras, “muito do que conhecemos modernamente por gerência de recursos informacionais tem suas origens no trabalho de Otlet” (BARBOSA, 2008, p. 6).

Além de Otlet, Vanevar Bush é outro autor que pode ser considerado precursor da gestão da informação (BARBOSA, 2008; STARCK; RADOS; SILVA, 2013). Em 1945, Bush publicou o artigo As we may think, que descreve um equipamento chamado Memex, pelo qual seria possível armazenar documentos por associações e recuperá-los com grande velocidade e flexibilidade. O Memex, apesar de nunca ser construído, pode ser, segundo Barbosa (2008, p. 6), “considerado hoje um precursor da Web e da moderna gestão eletrônica de documentos”. Portanto, a preocupação com a informação em uma abordagem gerencial é muito mais antiga do que se pensa.

Verificamos, com esses pensadores, que as questões referentes à sistematização da informação e do acesso ao conhecimento já preocupavam a sociedade no final do século XIX e início do século XX. (STARCK; RADOS; SILVA, 2013, p. 62).

Martins (2014), citando Savić (1992), Malin (2012) e Barbosa (2008), elenca fatores que podem ter contribuído para o início e consolidação da gestão da informação, os quais estão relacionados a eventos históricos sobre a explosão informacional, proliferação do papel e desenvolvimento e uso da tecnologia da informação.

[...] A explosão da informação, estendendo-se ao longo do século XX, que trouxe inúmeras mudanças à realidade cotidiana da sociedade, através do desenvolvimento de vários dispositivos e suportes; esta quantidade de informações, entretanto, além de não resolver o problema informacional traz outros em seu encalço. [...] A proliferação do papel, pois embora a explosão da informação tenha sido acompanhada de tecnologias computacionais, grande parte do volume informacional encontrava-se, nos anos 1980, em formato de papel. O autor apresentou estatísticas de modo a corroborar seu argumento e demonstrou a necessidade de organizar de forma eficiente essa pilha depapel. [...] O uso intensivo das tecnologias de informação. O autor reconheceu que “o mundo nunca mais será o mesmo depois da revolução do computador”. (SAVIĆ, 1992, apud MARTINS, 2014, p. 34).

De fato, no período compreendido entre 1945 e 1980 (pós-guerra), com a explosão informacional, industrialização da imprensa e o acesso a recursos tecnológicos, verifica-se maior preocupação em armazenar, organizar e controlar a informação. Segundo Buckland (1997) apud Starck, Rados e Silva (2013), a partir de 1950 surgiu o termo gestão da informação estendendo os conceitos da então disciplina chamada documentação. Entretanto, salientam Starck, Rados e Silva (2013) que nessa época não havia instrumental e nem pessoal capacitado para realizar eficientemente o grande volume de recursos informacionais. Porém, após a década de 1980,

[...] com o advento do computador, a consequente explosão informacional e a valorização da informação como um fator determinante para a melhoria de processos, produtos e serviços, principalmente nas organizações, sejam elas públicas ou privadas, tais preocupações se acentuaram. Novas tecnologias são criadas e o foco passa da então gestão de documentos e dados para gestão de recursos informacionais. (TARAPANOFF, 2006, apud STARCK; RADOS; SILVA, 2013, p. 62).

Malin (2003), ao citar Davenport (2002), destacou a preocupação do setor público em relação aos documentos ao longo do tempo. Destaca-se, entretanto, que o processamento de documentos seria uma administração pautada apenas na entrada e saída de papéis, sem preocupação mais estruturada acerca do gerenciamento das informações. As organizações somente começaram efetivamente a gerenciar o ciclo de vida dos documentos em meados da década 1940.

O termo gerência de recursos informacionais, tratado também como gestão da informação, foi inicialmente sugerido por Robert S. Taylor na década de 1960 (BARBOSA, 2008; STARCK; RADOS; SILVA, 2013). No entanto, ganhou notoriedade com a implantação do Paperwork Reduction Act, documento do governo americano emitido em 1980 pelo Federal Paperwork Comission. Tal legislação, além de orientar as agências do governo a realizarem ações administrativas no que tange à informação, relativas ao planejamento, gerenciamento, previsão orçamentária, organização, direcionamento, treinamento e controle associados com informação governamental.

Percebe-se que a preocupação do legislador americano foi com a informação associada e relacionada ao pessoal, recursos financeiros e tecnologia. Nesses termos, segundo Barbosa (2008), a gestão da informação é baseada em três disciplinas fundamentais: administração, computação e ciência da informação. Essas são disciplinas que necessitam de

interação e se apresentam com elevado grau de interdisciplinaridade e, por isso mesmo, devem ter caráter adaptativo e serem abertas a relacionamentos com outros campos do saber.

Tais ideias se propagaram rapidamente por diversas outras organizações e contribuiu, significativamente, para o gerenciamento informacional com a promoção de uma abordagem combinada da informação computadorizada e de registros armazenados, o reconhecimento de que a informação tem um valor econômico significativo e o tratamento da informação como recurso importante (DAVENPORT, 1998). Portanto, o conceito de GRI surge em decorrência da necessidade de melhor administrar os recursos informacionais - informações, tecnologias e as pessoas - envolvidos no ciclo da informação: geração, coleta, organização, disseminação e uso. (STARCK; RADOS; SILVA, 2013, p. 62).

Dantas (2007), citando Cronin Parsons et al. (1993), salienta que os termos gestão da informação, gerenciamento da informação e gestão de recursos informacionais costumam ser tratados como sinônimos por alguns autores. Nesse sentido, a gestão da informação deve incluir, em níveis estratégicos e operacionais, os mecanismos de obtenção e utilização de recursos tecnológicos, financeiros, materiais e físicos para o gerenciamento da informação, que deve ser disponibilizada como insumo útil para indivíduos, grupos e organizações (PONJUÁN DANTE, 1998, apud MARCHIORI, 2002).

A gestão da informação envolve elementos como planejamento, comunicação, gerência da informação, indicadores, monitoramento, controle, gerência de recursos humanos e financeiros, considerando-se o contexto organizacional, a legislação aplicada e as práticas do ponto de vista ético e de conduta. Destaca-se, porém, a importância das pessoas no processo de gestão da informação, as quais necessitam, buscam e usam a informação. Assim,

[...] a gestão da informação tem, por princípio, enfocar o indivíduo (grupos ou instituições) e suas “situações-problema” no âmbito de diferentes fluxos de informação, os quais necessitam de soluções criativas e custo/efetivas. (MARCHIORI, 2002, p. 75).

Não é foco desta pesquisa o aprofundamento sobre a usabilidade de informação pelo usuário, o qual também pode ser aqui chamado de cliente da informação. Contudo, os estudos de necessidades e uso da informação ajudam a entender o ambiente onde a informação deve ser gerenciada.

Os estudos de como as pessoas buscam e usam a informação, segundo Choo (2003), têm uma orientação para o usuário a partir da década de 1970, na qual a informação é uma construção subjetiva criada dentro da sua mente. Essa visão não despreza o fato de que um documento ou registro possa ser definido ou representado em referência a algo ou a algum

assunto, mas acrescenta que o usuário agrega significado a esses conteúdos objetivos, que Choo (2003) denomina envelope interpretativo, e que o usuário atribui valor e utilidade à informação a partir da junção do conteúdo e da interpretação.

Portanto, o valor da informação reside no relacionamento que o usuário constrói entre si mesmo e determinada informação. Assim, a informação só é útil quando o usuário infunde-lhe significado, e a mesma informação objetiva pode receber diferentes significados subjetivos de diferentes indivíduos. Enquanto a pesquisa orientada para sistemas observa o que acontece no ambiente externo para o indivíduo em termos de instrumentos, serviços e práticas, a pesquisa orientada para o usuário examina as preferências e necessidades cognitivas e psicológicas do indivíduo, e como elas afetam a busca e os padrões de comunicação da informação. (CHOO, 2003, p.70).

Segundo Gasque e Costa (2010), Lipetz (1970) realizou as revisões acerca de estudos do cliente da informação da década de 1970 e trouxe a novidade de que os estudos de necessidades e usos da informação podiam ser transpostos para outras situações. Lipetz (1970) subdividiu sua pesquisa, de acordo com a proposta de Paisley (1968), em subsistemas nos quais os cientistas e tecnólogos pudessem ser identificados e concluiu que os estudos sobre o uso da informação estavam em fase inicial. Com isso, sugeriu que eram insuficientes as condições para o esboço de uma teoria de um sistema de informação ideal que abarcasse todas as situações de necessidades informacionais porque mais dados eram necessários para explicar o fenômeno da usabilidade informacional.

Em 1972, Lin e Garvey fizeram a revisão sobre necessidades e usos de informação na ciência e na tecnologia, referentes ao ano de 1971, constatando que tais estudos eram uma tendência internacional. Gasque e Costa (2010) salientam que uma das características da pesquisa Lin e Garvey foi a de segregar em funções as fases de necessidades, de busca, de transferência e de uso da informação em comunicação científica.

O trabalho de Martyn, de 1974, iniciou a oitava revisão do Arist (Annual Review of Information Science and Technology) e analisou as publicações de 1972 e 1973. Gasque e Costa (2010) destacam esse trabalho e afirmam que Martyn passou a reconhecer a complexidade e a singularidade dos processos de necessidade, busca e uso de informação, observando que a metodologia utilizada para o entendimento desses fenômenos era insuficiente, bem como era difícil e complexo prover todas as informações necessárias em todas as circunstâncias. Nesse sentido, eram necessários estudos que não estivessem voltados somente para os sistemas de informação, mas também para ampliar a compreensão dos

usuários e de suas necessidades, focar a interação das ideias e o interrelacionamento de pessoas.

São sete as características identificadas no paradigma tradicional. A primeira, a objetividade, em que a informação é entendida como algo com significado constante, correspondendo, de forma absoluta, à realidade. A segunda, o mecanicismo, cujo foco é sobre o sistema, não percebendo o usuário como indivíduo com objetivos, autocontrole e capacidade para tomar decisões. A terceira, a passividade dos usuários, sustentada na ideia de que são receptáculos passivos de informação objetiva, com a tarefa de receber em mãos pacotes de informações. A quarta, a transsituacionalidade, em que se tenta predizer o comportamento dos usuários por meio de estatísticas e modelos que poderiam ser aplicados em várias situações. A quinta, a visão atomística da experiência, centrada na interação entre os usuários e os sistemas de informação. A sexta, a concepção comportamental em que se privilegia o comportamento externo, como contatos com fontes e usos de sistemas. A última, o caos, fundamentado na crença de que as pesquisas produzem observações sistemáticas e padrões de comportamento para os sistemas de informação. (GASQUE; COSTA, 2010, p.27).

Surge, então, a necessidade de uma orientação das pesquisas que examinasse como a informação flui por sistemas e estruturas sociais e organizacionais dos quais os usuários fazem parte, mais centrados no acesso, partilha e uso de informações. Isso aponta mudanças para abordagens que buscariam ver como os usuários interpretam as informações e como constroem significados diversos e imprevisíveis para a informação a partir de suas distintas vivências, experiências e contextos socioculturais. Algo que confirma a mudança de estudos centrados nos sistemas para estudos centrados no usuário das estruturas. Para Gasque e Costa (2010), esse caminhar ocorreu a partir dos anos de 1990 com o surgimento de novas abordagens sociais mais centradas nos usuários do que nos sistemas e baseadas nos processos sociológicos. Nesse sentido, os estudos acerca do uso da informação organizacional apresentam características interdependentes de funcionalismo estrutural e de abordagens que se concentram no usuário da informação, considerando-se o contexto social, cultural e da interatividade – paradigma social.

Especificamente na organização, Choo (2003) define categorias ou processos para a gestão da informação situada no paradigma social. O modelo proposto pelo autor talvez seja uma transição dos estudos centrados no cliente ou usuário da informação, isoladamente, para os estudos de gestão da informação por processos interdependentes, uma vez que no ambiente organizacional o cliente, interno e externo, necessita da informação como insumo primordial para as rotinas e procedimentos organizacionais de criação de significado, construção de conhecimento e tomada de decisão.

Martins (2014) destaca que o pensamento de Choo (2003) a respeito do gerenciamento de informações está intimamente relacionado com o conceito de gestão do conhecimento por estar voltado para a Teoria Organizacional: como as “organizações que aprendem” ou “organizações aprendizes”. Uma organização deve aprender a todo o momento com o processo informacional, com os fluxos e caminhos da informação no ambiente organizacional, com a retroalimentação e o bom uso dos canais de informação. Comporta-se como um sistema aberto que absorve informações, energia e matéria do ambiente externo e transforma esses recursos em conhecimento, processos e estruturas que produzem bens ou serviços que são consumidos no ambiente. A relação entre organizações e meio ambiente, ou meio externo, é tanto circular quanto crítica: as organizações dependem do ambiente para os recursos e para a justificativa de sua existência. Como o ambiente é crescente em complexidade e volatilidade, torna-se imperativo que as organizações aprendam o suficiente sobre as condições atuais e futuras do meio ambiente com o objetivo de usar esse conhecimento para desenvolver um comportamento adaptativo.

Percebe-se que no trabalho de Choo (2003), o enfoque é centrado na necessidade, busca e uso da informação. Sobre a utilização da informação nas organizações, o autor considera que a informação é um componente intrínseco de quase tudo o que uma organização faz. Porém, sem a clara compreensão dos processos organizacionais e humanos pelos quais a informação se transforma em percepção, conhecimento e ação, as organizações não são capazes de perceber a importância de suas fontes e tecnologias de informação.

Araújo (2010) salienta o trabalho de Capurro,apresentado em 2003, sobre a sistematização da informação e afirma que o texto, além da qualidade teórica, vem sendo muito citado na área de CI, no Brasil e no exterior. Nesse trabalho, Capurro estabelece que

[...] a ciência da informação nasce em meados do século XX com um paradigma físico, questionado por um enfoque cognitivo idealista e individualista, sendo este por sua vez substituído por um paradigma pragmático e social ou, para tomar um famoso conceito cunhado por Jesse Shera e sua colaboradora Margaret Egan em meados do século passado (Shera 1961, 1970) e analisado em profundidade por Alvin Goldman (2001), por uma epistemologia social (“social epistemology”), mas agora de corte tecnológico digital. (CAPURRO, 2003, p.3).

Baseado na visão relativa ao ambiente funcional, estrutural e informacional nas organizações, fundamentado nas ideias de Davenport, McGee e Prusak (MARTINS, 2014), Choo identifica seis processos críticos no gerenciamento da informação: identificação das necessidades informacionais, aquisição da informação, organização e armazenamento da

informação, desenvolvimento de produtos e serviços de informação, distribuição da informação e uso da informação.

Para Araújo (2010), quando se trata de gestão da informação, Choo é um dos mais significativos teóricos da abordagem social, em que se considera o coletivo de interações capazes de gerenciar os contextos nos quais a informação é usada.